Amor Perfeito XIV - Versão Arthur

Descobertas Perturbadoras


Kevin Narrando

Estava acabando de fazer aquelas malditas fotos quando ouvi um elogio que me fez sentir náuseas e sair do estúdio.

— Ora Ora... – falei vendo quem estava de pé em minha frente. Sua posição era extremamente ereta e ele mantinha os braços pra trás. E conhecendo linguagem corporal como eu conhecia isso não era um bom sinal. – Se não é o meu irmãozinho. Você veio pra cá sem avisar, não mandou nem uma mensagem em todos esses dias... Aparecer assim é uma surpresa.

— Você precisa parar de magoar a Alice. Ela não tem culpa de eu estar aqui. Pare de descontar nela.

— Era isso que eu queria. – dei um sorriso afrontoso. – Eu sabia que se eu a tratasse mal ela se lamentaria com Murilo e ele te contaria, já que é a única pessoa que você mantem contato além da sua mãe. E quando soubesse você iria me procurar.

— Fez isso pra que eu aparecesse? – ficou ainda mais nervoso.

— O que esperava que eu fizesse? Tentei descobrir a última vez que você usou cartão de crédito, o Danilo quase se ferrou feio me ajudando, tivemos que invadir sua conta e não havia absolutamente nada, nenhum indício! Mandei uma pessoa para o hotel daqui e ele não te viu. Você foi bom em não deixar rastros Arthur.

— Você acha que eu estou com o meu cartão aqui? E acha que eu iria chegar ao hotel e começar a resolver coisas ilegítimas tranquilamente? Você foi bem ingênuo. – ele deu uma risada irônica.

— Sim, confesso. Então foi aí que entendi que tinha que agir com maldade. Usar o meu jeito Kevin de ser. E olha só... Como sempre... Deu certo.

— Não tinha o direito de fazer isso com ela.

— Você tinha o direito de fazer isso com a gente?

— Lógico que eu tinha. – a frieza em sua voz me espantou. – Preciso que você entenda que eu tomei uma decisão. – fiquei com medo do que ouviria. – Quero que me deixe em paz.

— Se você se importa tanto com ela sabe que ela não vai me deixar fazer isso.

— Vou ser bem honesto e claro com você. Depois de tudo o que eu fiz aqui eu vi que o meu destino é ser igual a ele. – dei uma risada não acreditando. – E se eu fosse tão bom assim como todos insistem em dizer, eu não me deixaria ir tão longe.

— Você não tá normal. – olhei seu rosto.

— Só fica na sua. E mantenha Alice segura ou nem isso você é capaz de fazer? Virou mesmo um completo inútil? – ficamos nos olhando. Ele desviou o olhar e encarou o estúdio. Depois sorriu. – Está realizando o seu sonho de princesa? Ainda bem que tenho o Yuri como irmão com quem posso falar coisas realmente masculinas. Imagina ter só irmãs? Que chato que iria ser não é mesmo?!

— Não vai conseguir me magoar assim. Sabe disso né? – quase sorri.

— Não era pra te magoar, era só meu ponto de vista. Mas se acha tanto que quero te magoar, posso te contar algo que fará isso espetacularmente.

— Por que você tá fazendo isso Arthur?

— Para que aprenda que eu não sou mais tão bonzinho. Vai querer que eu te conte ou não? É sobre o Murilo. – fiquei o olhando sem reação. – Ele não foi embora após a virada de ano por causa do namorado dele... Foi por sua causa. – ele sorria enquanto dizia. – E ele passou aquela madrugada inteira chorando comigo. Se ele pudesse ele daria tudo para não viver o que ele viveu com você, é o maior arrependimento da vida dele. Ele não consegue te esquecer, mas quando ele conseguir ele vai te odiar. Você entende isso Kevin?

— Por quê? Por que ele vai me odiar?

— Você o fez viver os piores dias da vida dele. Você trouxe um problema psicológico que ele nem tinha mais. Você é com toda certeza a pior coisa que aconteceu a ele e eu arrisco a dizer que você foi tão devastador na vida do Murilo ao ponto de não deixa-lo ser feliz com mais ninguém. Ele era perdido transando com todo mundo antes... Mas era melhor ser assim do que evitar qualquer tipo de envolvimento por ter um fantasma em sua vida. – ele chegou mais perto. – Espero que tenha entendido bem e viva com esse peso. – ele bateu forte em meu peito e se foi.

Aquele dia eu cheguei a Torres destruído. Minha mãe tentava falar comigo, mas eu apenas concordava e às vezes nem isso. Encontrei Alice me esperando no saguão do hotel. Era tudo que eu menos queria.

— Como foram as fotos? – ela perguntou tentando fingir que não era sobre Arthur que ela queria saber.

— Agora não. Não é uma boa hora. – falei enquanto minha mãe subia. Ficamos apenas nós dois. Não conseguia encara-la e mesmo não querendo magoa-la ainda mais eu o faria se fosse preciso, só pra sair dali e ficar sozinho com a minha dor. Alice passou os braços pela minha cintura e encostou sua cabeça em meu peito. – O que tá fazendo?

— Aprendi com o Muh que quando você nos afasta é quando você mais tá precisando da gente. – ela disse levantando o rosto e depois se encostou novamente. – Vai ficar tudo bem. - sua voz saiu doce e baixinha.

— Não vai. – falei tentando me manter firme. – Ele está em um caminho errado, um caminho que eu já trilhei. Tá perdido, tá iludido, acha que tem que fazer coisas que ele sabe que não faria... É um filho do Caleb legítimo agora Alice. Pegou gosto pela coisa. O Arthur que a gente conhece se foi e não vai voltar. – a afastei de mim. Pensei que ouviria discordâncias e que ela diria que o conhecemos e que ele não é assim... Mas ela parecia tão conformada quanto eu.

— A gente vai trazê-lo de volta. – gesticulei negativamente. – Olha... Eu posso lidar com isso. Não posso é perder você. A natureza do Arthur é humana, boa e gentil... Já você luta constantemente com uma escuridão que quer te dominar. E eu não vou deixa-la ganhar.

— Vamos subir. Eu te devo umas respostas. – ela sorriu satisfeita com o meu pedido. Quem não ficaria era Rafael, já que eu não o veria hoje para ficar com ela contando que tudo o que fiz a ela era parte de um plano.

— Estou chateada por isso. – a ouvi dizer. – Mas nem tanto agora que sei que era por ele.

— Alice... – juntei nossas mãos e vi que ela estava com frio. Diminui o ar e deitei de novo nos tampando. – Você acha que o Murilo vai me odiar um dia? – ela me encarou de uma forma estranha.

— De onde tirou isso? Não. O meu irmão nunca conseguiria te odiar.

— Foi o que Arthur me disse hoje. – suspirei. – E com argumentos incisivos. – me virei de barriga pra cima. – E... Se eu não fizesse tão mal a ele não precisaria que ele continuasse em outro País.

— Ele quis se acertar com você e você estava apaixonado por Rafael.

— Ele estava namorando!

— Sem sentir nada, era bem nítido. Ele ainda te amava Kevin. E te disse isso, não disse? Mas vocês estavam em momentos diferentes. Só estou tentando dizer que ele estar em outro País não tem a ver com o que ele sente por você. Porque ele já viu que mesmo longe ele não consegue esquecer.

— Nem eu consigo esquecê-lo. – nos olhamos. – Sempre vou achar isso tão errado e injusto com Rafael.

— Você teve a oportunidade de estar com Murilo e não ficou com ele... Não foi só por toda carga moral que você carrega em relação a traição e sim por você já estar gostando do Rafa e não conseguir ficar com outro que não seja ele. Esse cara é muito importante pra você. E ele sabe disso. Para de se culpar atoa.

— Falando nele... – mostrei meu celular chamando. Fiquei conversando com Rafael e quando desliguei vi que Alice estava pálida. – O que foi? – ela me mostrou uma mensagem que havia recebido.

“Acho que eu nunca te disse o quanto eu me orgulho de você. Queria que soubesse. Caso as coisas fiquem difíceis se lembre de que é a pessoa mais importante do mundo pra mim.”

— Número descartável. – revirei os olhos. – Ele bloqueou todos nós. Não sei como teve coragem. E se um número desconhecido liga ele não atende. – ela ignorou tudo que eu dizia e se aconchegou em mim abraçando meu corpo e fungando meu pescoço.

— Como foram as fotos? – dei uma risadinha.

— Você realmente quer saber?

— Claro. Daria tudo pra ter ido com você.

— Ah... Muita luz, maquiagem, mãos no meu cabelo... Fica assim, fica daquele jeito... Um saco. Pensei em desistir várias vezes.

— Fez por sua mãe né?

— Sim. Ela queria muito esse contrato.

— Desculpa dizer isso, mas... Você já percebeu que os seus pais de alguma forma estão sempre te usando?

— Já te disse que nem todo mundo tem pais maravilhosos como você.

Conversamos mais um pouco e depois dormimos juntos e no outro dia tive que aguentar meu pai dando indiretas sobre isso.

— Tenho que concordar vocês dois estavam lindos agarradinhos. Desculpa termos visto, você só fechou a porta, não trancou. – minha mãe disse e sorriu.

— Fechar já é um indício de vontade de privacidade.

— Eu iria aceitar de bom grado ser seu sogro de novo Alice.

— Se for uma garota pode ser até uma prostituta. – minha mãe me repreendeu com o olhar. – Foi bom o papo, estamos indo pra casa da vó Isa.

Assim que cheguei procurei Rafael e o encontrei saindo do banho. Eu o olhei de cima a baixo. Pensei que ele sorriria, só que ele continuou sério.

— Você demorou. – sorri com a sua fala. – Eu disse alguma coisa engraçada?

— Calma. Tive que aguentar meus pais fazendo comentários sobre Alice ter dormido lá.

— Estava com saudades. – ele abaixou o rosto.

— É o que acontece comigo... Sinto sua falta o tempo todo. – ele me olhou acho que para ter certeza que eu estava falando sério.

— Estar longe dá sensação de solidão, mesmo quando estou cercado de outras pessoas que gosto, como família ou amigos. Não te ver ontem foi horrível.

— Perdão por não ter vindo aqui.

— Entendo que era tarde e você estava cansado.

— Não era isso. Eu viria mesmo tarde e passaria por cima do meu cansaço. – suspirei. – Alice e eu precisávamos passar um tempo juntos.

— Sabe... Eu não tenho nenhum ciúme de vocês dois. Mas... O fato de você estar sempre a colocando a frente de mim me faz lembrar quem ela é irmã.

— Uma coisa não tem nada a ver com a outra.

— Sei que tem. Agora quando eu cansar de viver assim... Eu vou sair da sua vida de uma só vez, não vou ficar ameaçando.

— Isso já é uma ameaça.

— Não. É um aviso.

— Conversa comigo. – cheguei perto dele. – Você sente que eu sou próximo assim da Alice por causa do Murilo? – ele concordou gestualmente.

— Não é. A gente se ajudou em momentos difíceis. Ela colocou na cabeça que não me deixaria ser o Kevin de antes e aquele jeitinho dela... Acabou me ganhando.

— Tenho a consciência que se quero ficar com você devo entender a amizade de vocês dois e não quero que pense que tenho algo contra a Alice, jamais. É só que... Ai... – ele respirou fundo. – Vocês dois se falaram esses dias e eu estou inseguro.

— Esse caos todo é por isso? – nos olhamos. – Vai. – me sentei na cama. - Pergunta o que quer saber.

— Tenho medo da resposta. Eu sei que vai ser sincero.

— Mas é melhor que ficar na dúvida.

— Vai doer Kevin. – o olhei estreitando os olhos e fazendo uma completa análise do que tanto ele estava se questionando. – É melhor a gente esquecer isso.

— Você vai esquecer? – dei uma risada anasalada. – Não vai.

— O que você sentiu ao ouvir a voz dele? – ele soltou de uma vez tão rápido que quase não entendi. Olhei pra baixo e pensei um pouco. – Não usa palavras que não são verdadeiras. Só diz o que vier a sua cabeça.

— Senti... Vontade de estar com ele. – ele foi até a janela, sem esperar eu acabar de falar. – Não como namorado. Mas... Murilo faz muita falta. Foi esse jeito livre dele que fez com que fôssemos amigos quando eu ainda não era amigo de ninguém. – ele não se moveu. – Vem aqui. – vi que ele não viria então me levantei e fui até ele, me posicionando ao seu lado. – E hoje eu vejo que teríamos muitos problemas no nosso namoro... Com todo esse jeito ele não deixa que lhe digam o que deve fazer e eu já te disse o quanto sou possessivo com você, acho que eu seria da mesma forma.

- Sabe o que é engraçado? – ele perguntou ainda olhando para frente. – Sou inseguro com Luiz, Danilo e qualquer um e você sempre perde a paciência, mas com ele não... Você mantem a calma. Porque sabe que eu tenho razão em sentir insegurança.

— Você nunca vai estar certo em se sentir inseguro em relação a mim. E eu não quero que sinta isso. Nem que pra isso...

— Não. – ele me cortou. – Não quero que me prometa que nunca mais vai ligar pra ele. Fui eu quem te disse pra ligar dessa última vez. Arthur é importante pra gente e ele e Murilo tem uma conexão especial. Se precisar você vai ligar pra ele quantas vezes for. Só aguenta as minhas crises depois. Não é a primeira e nem vai ser a última.

— Na verdade você sabe que não é só pelo Arthur. Murilo faz parte da nossa vida.

— Sim, eu sei. Mas no momento a pauta é essa. E por falar nisso... Você me contou aquilo ontem pelo telefone, mas... Pra mim não faz sentido. Eu conheço o meu melhor amigo e ele não iria querer seguir o caminho do pai.

— A ambição é um vicio... Ele ficou viciado. E outra... Ele voltou a se drogar.

— Que merda! Tá falando sério?

— E eu iria brincar com isso? – suspirei. – Ele disse coisas horríveis para me magoar... Até mesmo que Murilo ainda me odiaria.

— E você não acreditou nisso né? – olhei para o outro lado. – Kevin. – ele pegou em meu rosto e me fez olhar em seus olhos. – Lembra quando terminei com você por causa dele e você saiu pra beber com Diana e Yuri? – fechei os olhos suspirando pesado. A maldita noite que Arthur falou. – Eu fui até você e ele me disse que tudo iria ficar bem e me explicou que era por causa de nós dois que você estava daquele jeito e ainda me pediu para conversar contigo deixando claro que não existia nada entre vocês.

— Ele fez isso? – perguntei sem conseguir acreditar. Ele concordou gestualmente.

— Você acha que alguém que se esforça tanto para ver a pessoa bem com quem gosta iria odiá-lo? Nunca Kevin.

— Preciso de ar. – sai o mais rápido possível. Passei pela sala sem nem notar quem estava lá e fui até a área da piscina parando na lateral da casa, onde eu e Murilo conversamos no natal. Revivi toda aquela conversa e pensei nessa forma como ele fez as coisas e senti falta de ar. Fiquei sufocado. E aconteceu algo comigo que eu nunca achei que aconteceria.

Arthur Narrando

Estava em uma reunião com o meu pai por vídeo e louco para não olhar mais para a cara dele, mas ainda teria que aguenta-lo.

— Você resolveu? – ele perguntou sobre um dos assuntos que tratávamos.

— Claro. Duvidou que eu resolvesse?

— Não duvido da sua capacidade. Mas talvez a sua cabeça esteja cheia e você se perca... Sei que se preocupa com o seu irmão.

— É por ele que estou aqui, não é? Não iria deixa-lo estragar nada. Mas não venha com esse papo sobre a minha antiga vida.

— Antiga Arthur? – sua expressão entregava o quanto não acreditava naquilo.

— Sim. Antiga. Eu não sou mais assim. Não me importo mais com nada. Não agora.

— Você mente bem. Muito bem. Confesso que quase acreditei. E espero que o seu irmão acredite, pelo bem dele.

— Eu o fiz acreditar. Sabia que pra isso teria que feri-lo profundamente e foi o que eu fiz.

— Se você quer mesmo entrar no mundo dos negócios, tem que deixar esse coração mole endurecer. Vai ter que aprender a ser frio.

— Quanto mais eu fizer melhor eu vou ser.

— Eu te ligo amanhã. – nos despedimos e eu voltei a submergir minha cabeça naquilo. Era tanto papel, tanta coisa pra ler e tantos contratos... Joguei tudo de cima da mesa de uma vez em uma atitude impensada e desesperada. Deitei na cama e fiquei olhando para o teto. Não se passou nem dez minutos e eu levantei e sai para comprar um número novo apenas para mandar uma mensagem para Alice. Mandei entre lágrimas e destruí aquela única forma de contato que poderíamos vim a ter.

No outro dia tive que falar novamente com Caleb, como estava sendo em todos os dias. Passei a noite em claro e ele percebeu pelas minhas olheiras e falta de rendimento.

— Você está cansado? – perguntou enquanto me encarava pela tela.

— Não. Tranquilo. – iria voltar ao assunto da reunião, mas ele não deixou.

— Você tem certeza? A sua cara não me parece muito boa. – fiquei calado. – Se precisar de uma pausa...

— Olha só... Eu sei que a gente tem que se aguentar, mas se der pra pular essa parte de fingir que se preocupa.

— Você tá muito desconcentrado. Sua irritação é palpável.

— A gente tem que terminar isso para que eu possa dar o próximo passo. Vamos falar de negócios? Como está o planejamento do evento?

— Tudo indo bem. Semana que vem essa festa vai ser perfeita. É uma pena que não estará aqui. – ele comentou falsamente. – Já confirmei as presenças, todos vão vim.

— Isso é o mais importante. – suspirei. – Eu te ligo mais tarde quando tivermos um balanço geral do que está faltando por aqui.

Desliguei sem dizer mais nada. Essa festa foi parte de uma ideia minha de recuperar a dignidade gestora dele, ele tinha que mostrar aos associados que haviam motivos a serem comemorados e que ele estava bem e acima de tudo que os valorizava. O que na realidade não passava de mentiras.