Amor

Capítulo 19


Três meses depois

Assunto: Sim, eu

Olá, Inuyasha. A cuidadora diplomada de minha psiquê afetada é da opinião de que eu poderia lhe perguntar como você está. Então, como você está? O que eu poderia transmitir à senhora terapeuta cuidadosa? Mas sem algo do gênero: ATENÇÃO. MUDANÇA DE ENDEREÇO ELETRÔNICO (...) Lembranças, Kag.

Três dias depois

Assunto: Eu, de novo

Olá, Inuyasha, eu acabo de ler pelo telefone, para a minha terapeuta, o e-mail que lhe mandei na terça. Ela acha que eu não deveria me surpreender por não receber uma resposta sua. Eu respondi: “Eu não me surpreendo.” Ela respondeu: “Mas você quer saber como ele está.” Eu: “Sim.” Ela: “Então você tem de perguntar a ele para que exista uma oportunidade para você ficar sabendo.” Eu: “Ah, tá. Mas como eu pergunto isso da melhor maneira? “Ela: “Amigavelmente.” Eu: “Mas eu não me sinto amigável.” Ela: “Sim, você se sente mais amigável do que admite. Você apenas não quer que ele pense que você se sente amigável.” Eu: “O que ele pensa não me importa.” Ela: “Mas você mesma não acredita nisso!” Eu: “Você tem razão. Você consegue enxergar bem as pessoas.” Ela: “Obrigada, esse é meu trabalho.” Eu: “Então, o que eu devo fazer?” Ela: “Primeiro: faça aquilo que você acredita que lhe fará bem. Depois: pergunte a ele amigavelmente como ele está.”

Cinco minutos depois

Assunto: Eu, de novo, pela segunda vez

Olá, Inuyasha, agora de uma forma bem amigável: Como você está?

Eu consigo de uma maneira ainda mais amigável: Olá, como é que você anda? E ainda é possível aumentar um pouco o grau de amabilidade: Queriiiiiiiiiido Inuyasha, como você está, coooomo você anda, como foi seu Nataaaal, o que será do Ano-nooovo, como anda sua viiiida, como anda o amoooor, como está “Kanna”, perdoe-me, Kaaannaaa? Beijinhos bem simpáticos e amigáveis, Kag.

Duas horas depois

Assunto: Eu, de novo, pela terceira vez

Olá, Inuyasha, eu novamente. Esqueça a besteira que eu atirei em cima de você agora há pouco. Mas posso lhe dizer uma coisa? (É uma das minhas frases do Inuyasha favoritas. Eu sempre imagino você completamente bêbado.) Posso lhe contar uma coisa? – Escrever simplesmente me faz bem!

Amanhã vou dizer à minha terapeuta que eu lhe escrevi, que escrever simplesmente me faz bem. Ela vai responder: “Mas isso foi apenas uma meia verdade.” Eu: “O que seria uma verdade inteira?” Ela: “Para escrever corretamente você teria dito: escrever para VOCÊ me faz bem.” Eu: “Mas eu não escrevo para mais ninguém. Eu escrevo que escrever me faz bem porque eu penso automaticamente que é para VOCÊ.” Ela: “Mas ele não sabe disso.” Eu: “Sabe, ele me conhece.” Ela: “Isso me surpreenderia. Você mesma não se conhece. Por isso veio parar aqui.” Eu: “Quanto custa mesmo sua hora para ofensas desse tipo?” Inuyasha, tudo aí em volta faz parte da mudança, somente as letras são as mesmas. Faz-me bem me prender a elas. Tenho a sensação de que assim eu permaneço minimamente fiel a mim mesma. Você não precisa me responder. Acho que é até melhor se você não o fizer. Nosso trem já partiu, “Boston” (e o que levou a isso) me tirou dos trilhos com um atraso de um ano. Eu estou no compartimento sombrio de um vagão novo em folha e procuro antes de qualquer coisa me orientar. Não tenho ideia de para onde a viagem segue, as estações ainda não foram sinalizadas, a própria direção foi especificada de maneira bem vaga. Se eu olhasse da pequena janela com moldura fosca, pela qual a paisagem desfila, então poderia eventualmente lhe dizer se eu reconheço algo e que lugar poderia ser. Está tudo em ordem? Eu sei que você gosta de minhas impressões. E se você quiser contar de sua viagem, de sua viagem de experiências no expresso “Kanna”, eu vou ouvir atentamente. Portanto: tchau e se aqueça, o inverno está chegando de novo. Correntes de ar gelado endurecem o pescoço e diminuem o campo de visão. Só se vê o que está à frente numa determinada direção. E não o que está nos lados, onde ocorrem as coisas por que vale a pena fazer a viagem. Kag.

Dois dias depois

Assunto: Diga-me apenas...

...se você

Deleta meus e-mails sem ler.

Lê e deleta.

Lê e salva.

Não recebe nenhum.

Cinco horas depois

Fw:

c

Na manhã seguinte

Assunto: Boa escolha!

A melhor escolha, Inuyasha! E como você consegue descrevê-la detalhadamente, justificá-la e formulá-la! Ehh, você acabou tendo câimbra com uma tendinite no pulso ao responder ou ainda vem algo por aí? Cordialmente, Kag.

Dois dias depois

Assunto: Análise do C

Olá, Inuyasha, você sabia muito bem como sua primeira e única letra depois de 16 semanas daria asas à minha imaginação. O que é mesmo que o psicólogo da linguagem Inuyasha Taisho queria expressar com sua resposta? Qual era seu objetivo com isso?

Será que ele queria conquistar um recorde em meu livro pessoal com o menor sinal de vida já escrito?

Será que lhe atraía a ideia de que a receptora do c certamente iria passar uma hora discutindo com sua psicoterapeuta sobre a diferença entre o “c” com ponto, “c” com parênteses e o “c” sozinho, como veio ao mundo, do jeito que Taisho o concebeu?

Será que ele queria começar a falar comigo de uma maneira perfeitamente minimalista, para (de novo) se fazer de mais interessante do que a situação permite?

Ou se tratava somente do conteúdo? Será que ele queria com isso dizer: Sim, eu leio a Kag, além disso eu até mesmo salvo o que ela escreveu, mas eu mesmo não escrevo mais para ela, definitivamente? E eu sou educado o suficiente para comunicar isso a ela. Eu dou um sinal, anêmico, mas um sinal, o menor possível, mas, ainda assim, um sinal. Eu mando para ela um uns risquinhos interrompidos. Era isso?

Esperando alegremente por mais letras, Kag.

Três horas depois

Fw: Uma contrapergunta, Kag: quando você diz FIM definitivamente (como recentemente, há 16 semanas, você talvez possa se lembrar de que dia estou falando), o que você quer dizer

com isso?

FIM?

FIM?

FIM?

FIM?

E por que você não se mantém no a) nem no b) nem no c) nem no d)?

30 minutos depois

Re: 1. Porque eu gosto de escrever.

Ok: porque eu gosto de escrever para VOCÊ.

Porque minha terapeuta diz que me faz bem, e isso ela deve saber, afinal ela estudou.

Porque eu estava curiosa para saber quanto tempo você conseguiria ficar sem me responder.

Porque eu estava ainda mais curiosa para saber como seria a resposta (eu reconheço: eu nunca acharia que seria c).

Porque eu estava, e estou, ainda mais curiosa para saber como você está.

Porque essa curiosidade expressa faz bem para o clima aqui dentro, o clima em minha casa nova, minúscula, estéril, sem vida, com o piano mudo e as paredes nuas, paredes que me projetam na cara interrogações perplexas sem parar. Uma casa que me atirou 15 anos de volta no tempo, sem com isso me deixar 15 anos mais jovem. Agora sou novamente afrontada por meus 35, na escadaria de uma mulher de 20. Agora é subir mais uma vez todos os degraus.

Onde estávamos? Ah, sim, no “fim”, por que eu não me mantenho no “fim”, quando digo “fim”: porque hoje em dia eu vejo algumas coisas de modo diferente do que via há 16 semanas, vejo de modo menos definitivo.

Porque o fim não é mesmo o fim não é mesmo o fim não é mesmo o fim, Inuyasha. Porque cada fim também é um começo.

Tenha uma boa noite. E obrigada por ter escrito! Kag.

Dez minutos depois

Fw: Você se mudou, Kag? Você se separou do Kouga?

Duas horas depois

Re: Eu me mudei, me afastei um pouquinho. Eu me distanciei do Kouga. Agora temos entre nós mais ou menos a distância que corresponde à nossa relação nos últimos dois anos.

Estou me esforçando para que as crianças não sofram com isso. Quero continuar a estar presente para elas, sempre que precisarem de mim. A nova situação é ruim para o Shippou. Você tinha que ver o olhar dele quando me perguntou: “Por que você não está mais dormindo em casa?” Eu respondi: “O papai e eu não estamos nos entendendo muito bem no momento.” Shippou: “Mas à noite não faz diferença.” Eu: “Não se apenas uma parede fina nos separa.” Shippou: “Então vamos trocar de quarto. Não me incomoda ter uma parede fina entre papai e eu.” O que se pode dizer depois disso?

Kouga reconhece seus erros e descuidos. Ele se envergonha. Ele está arrependido, abalado, completamente acabado. Ele está tentando salvar o que for possível. Eu tenho de ver se ainda há algo para salvar. Nós conversamos bastante nos últimos meses, infelizmente alguns anos em atraso. Pela primeira vez nós olhamos por trás da fachada de nossa relação: tudo podre e desolado. Nunca foi trabalhado, nunca foi limpo, nunca arejado, tudo abandonado, com grandes estragos. Será que é possível reparar isso algum dia?

Nós também conversamos muito sobre você, Inuyasha. Mas isso é algo que lhe conto somente se você quiser. – (Como você com certeza quer saber, vamos permanecer em contato via email. Esse é meu plano!) Eu não quero lhe importunar, mas a minha terapeuta está convencida de que você me faz bem. Ela diz: “Eu não entendo de jeito nenhum por que você gasta tanto dinheiro nas consultas comigo. Com seu Inuyasha Taisho você recebe tudo de graça. Portanto se esforce por ele!” Portanto eu me esforço por você, querido Inuyasha. E você está convidado a se esforçar um pouco por mim em retribuição. Boa noite.

Na noite seguinte

Sem assunto

Querida Kag, é uma honra para mim o fato de sua psicoterapeuta me julgar capaz de substituí-la. (“De graça” seria sem dúvida barato demais, mas eu faria um bom preço para você.) E eu naturalmente fico feliz que ela esteja convencida de que eu lhe faço bem. Faça-me a gentileza de perguntar se ela poderia me assegurar também que VOCÊ me faz bem.

Com todo o carinho, Inuyasha.

Uma hora depois

Re: Ela pensa somente em meu bem-estar, não no seu, querido Inuyasha. Se você não sabe o que é bom para você, e se você quiser saber, tem de procurar um terapeuta para você mesmo. Aliás, eu lhe recomendaria, mas com certeza será muito dispendioso.

Tenha uma noite agradável, Kag.

PS: Eh, ei, Inuyasha, eu gostaria terrivelmente de saber como você está. Você não quer me revelar só mais isso? Você não pode pelo menos fazer umas insinuações? Por favor!!

Meia hora depois

Fw: Insinuação um: Estou gripado já há três semanas.

Insinuação dois: Vou ficar sozinho somente por mais três semanas.

Adendo à insinuação dois: Kanna (“Kanna”) está vindo. E vai ficar.

Dez minutos depois

Re: Oh, mas isso é uma surpresa e tanto! Parabéns, Inuyasha, você mereceu mesmo isso! (Estou me referindo naturalmente a “Kanna”, não à gripe.) Lembranças, Kag.

Cinco minutos depois

Fw: Aí me ocorre uma pergunta que fizemos um para o outro há alguns meses e que não respondemos. E ela é: algo mudou entre nós depois de nosso encontro? – De minha parte: Sim! Como eu tenho seu rosto diante de mim quando leio suas linhas, posso reconhecer

muito mais rapidamente como está seu humor quando você me escreve, e o que você realmente quis dizer com determinadas palavras, quando elas com certeza querem dizer outra coisa que não aquilo que aparece ali. Eu vejo seus lábios e o jeito como eles deixam as palavras saírem. Vejo suas pupilas nebulosas e o modo como elas comentam o que está acontecendo. Você escreve: “Oh, mas isso é uma surpresa e tanto! Parabéns, Inuyasha, você mereceu mesmo isso!” E com isso você queria dizer: “Oh, isso deve ser um desgosto! Mas a culpa é sua, Inuyasha, você claramente não merecia nada melhor.” Entre parênteses, você ainda comenta de modo brincalhão: “Estou me referindo naturalmente a “Kanna”, não à gripe.” E isso queria raivosamente dizer: “De todo jeito é melhor uma gripe de três semanas do que a vida toda com essa ‘Kanna!” – Não é verdade?

Três minutos depois

Re: Não, Inuyasha, talvez eu seja amarga às vezes, mas não sou raivosa. Estou convencida de que “Kanna” é uma mulher interessante e que ela lhe faz bem, faz mais bem do que uma alergia qualquer. Me manda uma foto dela?

Um minuto depois

Fw: Não, Kag.

30 segundos depois

Re: Por que não?

Dois minutos depois

Fw: Porque eu saberia o que você começaria a fazer com ela. Porque para você não importa nada como ela é. Porque não quero que você compare sua aparência com a dela. Porque estou cansado. Porque agora eu vou dormir. Boa noite, Kag.

Um minuto depois

Re: Você está escrevendo de modo agressivo e mal-humorado, Inuyasha. Por quê? 1) Eu estou lhe irritando? 2) Você não está feliz? 3) Ou você não possui nenhuma foto dela?

20 segundos depois

Fw: Não.

Estou sim.

Possuo sim.

Boanoite!

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.