— Isso é tão... espetacular! Você estava aqui quando foi construído?

Klaus gargalhou pela sua indagação enquanto a olhava, totalmente alheia às suas risadas, rodopiando em meio ao Coliseu.

— Acredite ou não, amor, o Coliseu é bem mais velho que eu. Eu sei que na sua cabecinha todas as coisas velhas do mundo são do meu tempo, mas este lugar foi construído aproximadamente no ano 72 d.C.

— Todas pode ser que não, mas muitas sim. Bem, depois de nossa estadia em Paris e suas lembranças de como estava o céu no dia em que a Torre Eiffel foi inaugurada, eu prefiro sempre preguntar.

A loira rodopiou mais duas ou três vezes como se estivesse se apresentando a uma plateia invisível. Ali, naquele lugar, há varias centenas de anos, pessoas paravam para se entreter. Era tudo tão interessante para ela.

— Quantas pessoas cabiam aqui?

— Umas noventa mil.

Caminhou e caminhou, até que voltou seu olhar a ele, que continuava parado no centro do anfiteatro, observando-a. Não pôde deixar de sorrir: estava tão grata pelos últimos meses.

Viajar, conhecer lugares, ver como pessoas diferentes vivem... Nunca tinha imaginado que aquilo lhe faria tão bem. Não tinha a ver com status, luxo ou ostentação, mas sim com liberdade, com paz de espírito e aceitação do quanto o mundo pode ser diferente. Eram cores, lugares e pessoas novas que pintavam em sua alma nuances e perspectivas totalmente novas.

Viu as covinhas de seu híbrido surgirem quando ele sorriu ao perceber que era observado. Care sentiu um aperto no peito, o aperto característico de amar alguém tão singular e inigualável. Klaus não era parecido com ninguém. Ele era um espírito livre, uma sabedoria viva, uma caixinha lotada de experiências ... Droga, seu amor tinha mil anos. Mil anos! Tinha vivido tanta coisa...

Nesses momentos se sentia insegura. Era perigoso amar tanto alguém que já viveu tanta coisa. Mas olhando-o assim, sorrindo com suas covinhas à vista e seus olhos claros brilhantes não podia pensar nada além do fato de que, durando 10, 100 ou mil anos, o amor que tinham desenvolvido um pelo outro nesses meses era tão imponente e histórico quanto aquele anfiteatro.

— Para onde vamos depois daqui? — indagou assim que alcançou o pescoço dele. Nem tinha percebido em qual momento tinha corrido a seu encontro.

— Eu pensei na China. Posso te dizer com certeza que há muita coisa a se ver por lá.

Dito isso se aproximou mais encostando demoradamente seus lábios nos dela, puxando o inferior no fim. Care se perguntava se era normal depois de tanto tempo ainda ficar com sensações estranhas nas pernas quando ele fazia isso.

— Você conhece o mundo todo? — perguntou quando se recompôs. Estranhamente, ainda não tinha perguntado isso.

— Provavelmente, não. O mundo é bem grande, amor.

— Pois se eu tivesse mais de mil anos já o teria conhecido por completo! — ele murmurou um “não duvido” desdenhoso, mas ela continuou sua falácia — E já teria aprendido a maioria dos instrumentos musicais do mundo, além dos idiomas e dialetos. Acho que teria me formado em varias áreas diferentes também, mas disso não tenho certeza. Pode ser que ficasse entediada de saber tanto, no fim. Faria tudo que fosse de novo mundo. Em todas as épocas. Aliás, não sei por que você não fez isso.

Ela o esperou rir, mas quando fitou seus olhos nele, o viu olhá-la de um modo sério e profundo antes de falar:

— Estou fazendo algo novo agora. Neste instante.

Care sorriu o que o fez acompanhá-la.

Amar alguém daquele jeito dava um medo danado, era algo novo para os dois e com certeza perigoso, mas ambos concordavam: tinha lá suas vantagens.

~~ ~~ ~~

Por algum motivo as correntes ardiam como o inferno. O que poderiam ter colocado nelas?

Klaus ergueu a cabeça com dificuldade a tempo de captar a exata hora em que sangue começava a pingar de seu pulso esquerdo. Ótimo, odiava aquelas correntes ainda mais agora.

Tentou de todas as formas, usou toda sua força, mas nada adiantava contra aquele metal. Tentou raciocinar um modo de se soltar que não usasse a força bruta (já que esta não parecia funcionar), mas nada lhe passava pela cabeça. O outro pulso começou a sangrar também.

Quando tentou a última vez soltar-se usando a força, um homem apareceu. Ele era alto e usava uma capa preta, com um capuz que lhe cobria o rosto. Klaus deduziu ser um homem por sua estatura e suas mãos, que estavam à vista.

— Não adianta tentar, Niklaus. Estas correntes foram feitas especialmente para você. Esta cela foi feita especialmente para você. Hoje é o dia em que será julgado.

Antes que o híbrido conseguisse falar qualquer coisa, o homem iniciou seu monólogo, listando variados tipos de atrocidades e pecados que ele tinha cometido. O estranho lia sem pressa alguma um papel enrolado, que pela espessura do rolo era bem extenso.

— Caso número 686: morte de um casal de jovens. Motivo: transformação para aumento de número do exercito do acusado. Ambos não viveram mais que seis meses depois da transformação. Caso Número 687: traição deliberada...

Já haviam se passado horas e Klaus sabia que seus gritos não interrompiam o homem de continuar sua acusação. Seus pulsos sangravam livremente, sua garganta estava seca, parecia não se alimentar há semanas. Decidiu por esperar para ver o que acontecia ao terminar a lista de crimes. Era a única coisa que podia fazer.

O último caso foi o número 16.859, ao qual Nik nem mais conseguia prestar atenção para saber do que se tratava. Estava fraco demais, cansado demais, faminto demais. Sua mente só voltou à realidade quando escutou que sua sentença seria pronunciada.

— O réu é sentenciado a morte, e como apenas sua vida não serve como alívio para os afetados por suas crueldades, após sua execução, a justiça dará sequência à aplicação da sentença na forma da aniquilação de todos seus parentes, descendentes e cônjuge.

Klaus queria ter gritado. Queria ter saído daquelas correntes e ter levado sua filha, sua mulher e seus irmãos para longe, mas quando sem perca de tempo seu acusador atravessou seu coração com uma estaca de carvalho branco, a única coisa que lhe restou foi morrer sabendo que tinha acabado com a vida de todos os que amava.

O grito que estava preso em sua garganta ganhou vida quando enfim abriu os olhos. Estava sentado na cama e aos poucos sua visão se acostumava ao quarto escuro, iluminado apenas pela luz da lua que entrava pela grande janela de vidro.

Uma brisa suave fazia com que a cortina fina e branca dançasse graciosamente, enquanto o ar gélido da noite era sentido em sua face.

Retornou à realidade: não estava preso, nem sendo julgado, estava num hotel de luxo, na Itália, com a mulher que amava.

Virou-se rapidamente para trás lembrando-se de checar se ela estava bem. Ao que parece seu grito e rompante a havia acordado, já que seus olhos azuis o estavam fitando esperando uma resposta.

A loira ensaiou que ia levantar-se, puxando o lençol branco para cobrir seus seios desnudos, porém foi logo parada por seu companheiro que a impediu de se levantar. Em questões de segundos lá estava ele, deitado entre o vale dos seios dela, fazendo de tudo para controlar sua respiração ainda acelerada.

Sentiu quando os dedos da loira adentraram seus cabelos em uma carícia simples, porém confortadora.

— Eu ainda posso morrer. Um dia. — Care o ouviu sussurrar.

— Todos podemos morrer, meu amor. Todos. A ideia de imortalidade é muito relativa, mesmo para nós. Tudo pode acontecer com qualquer pessoa.

Klaus levantou-se do aconchego de seu seio, e deitou-se de frente para a mulher ao seu lado. Tirou os fios loiros que lhe caíam sobre os olhos e fitou demoradamente seus olhos azuis antes de sussurrar devagar as palavras que nunca achou estar pronto para dizer:

— Eu te amo. E se um dia eu morrer, quero ter a certeza de que sabe disso.

Caroline fechou os olhos e respirou, sentindo o peso daquelas palavras. A verdade é que ela sabia tanto o quão difícil era para ele dizer aquilo, que nunca esteve preparada para ouvir. Mas quando abriu os olhos e viu as orbes esverdeadas do homem que amava percebeu que na verdade era tudo simples. Amá-lo era simples e, apesar de tudo, certo. Por isso a única coisa que pôde fazer foi sorrir e dizer baixinho, como em um segredo:

— Eu te amo também.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.