POV Susan

Ter Jamie tão próximo era desconcertante.

Perdi o momento em que a conversa tranquila se extinguiu e que ele começou a me encarar com demasiado ardor. Ele esquadrinhava meu rosto com seus olhos, gravando cada detalhe. Eu também gravava os detalhes de sua pele: sua barba por fazer o fazia parecer mais velho do que ele realmente era e seus olhos chocolate me prendiam de tal maneira que era impossível eu conseguir me libertar.

Não vi também o momento em que paramos de andar. Em um minuto estávamos andando e conversando tranquilamente, no próximo estávamos parados no meio de um corredor nos encarando, esperando o momento para algo acontecer; o que aconteceria?

Até agora não consegui compreender o que fez Jamie simpatizar tanto comigo. Talvez tenha sido a minha idade. Mas acredito que fui eu mesma. Ele me disse uma vez – logo que me resgataram – que eu era valente por ter conseguido viver tanto tempo nesse mundo novo e estranho. Queria tanto que ele soubesse da verdade sobre mim. Queria poder revelar a todos quem eu sou nesse exato momento. Queria que todos já estivessem preparados psicologicamente.

Mas sinto que não é a hora. Não já, não agora, não hoje. No tempo certo eles irão descobrir. E se esse tempo certo for o nunca eu não irei me importar, se isso significar que eu ficarei com essa minha família pelo resto de minha vida.

Uma luz batia em um dos lados de seu rosto, cujo eu podia ver apenas parcialmente. Ele andou um passo para o lado, aproximando seu corpo do meu. Virei meu corpo de modo que ele ficasse pronto para se encostar à parede – eu sabia que estava me armando, me preparando. Eu sabia o que aconteceria depois disso.

Ele se aproximou mais um passo e eu recuei um pouco. Ele avançou para cima de mim até que não houvesse mais espaço; eu estava encurralada entre a parede e seu corpo. Deixei meus olhos caírem de seu rosto para seu peito em certo momento e segui o movimento descontínuo de seu peito que sua respiração provocava.

Ele pegou meu queixo entre seu polegar e o indicador e ergueu meu rosto para que eu encontrasse em cheio o chocolate e o escuro.

Eu não desviaria mais meus olhos. Eu sabia disso.

Ele atraiu mais meu rosto, puxando meu queixo até nossas respirações descompassadas se confundirem e eu obrigar-me a fechar os olhos. Algo se movia dentro de mim. Era a brasa. Era o calor. Era o ardor. Era o fogo.

Mantive meus lábios entreabertos quando ele roçou seus lábios nos meus. Faltava pouco. Muito pouco. Pouquíssimo.

Ele escorregou sua mão de meu queixo para entrelaçar seus dedos em meus cabelos negros como a noite. Sua outra mão se prendeu em minha cintura. Pousei minhas duas mãos na curva entre seu ombro e seu pescoço. E esperei.

Não demorou.

Ele finalmente jogou lenha na fogueira. E eu parei de controlar meus movimentos.

Seus lábios eram macios e cálidos e envolveram os meus como um manto em um dia frio; eu não queria que eles fossem embora. Ele me empurrou contra a parede com mais força, me atando melhor. Peguei seu rosto entre minhas mãos e o puxei mais contra mim, não querendo escapar de seus carinhos e não querendo que ele escapasse dos meus.

Compreendi que tudo estava se modificando. O mundo também poderia se modificar. A vida poderia ser modificada. A vontade nos modificaria.

E então eu soube. Rápida e definitivamente. Breve e eternamente. Soube que tudo ficaria bem, mesmo quando a minha verdade fosse descoberta. Talvez seja expulsa. Talvez seja ignorada. Talvez desejem nunca ter me conhecido ou me resgatado. Contudo, será temporário.

O que me fez descobrir isso? Simples. O amor. Eu o senti. Ele que nos modifica. Ele que mexe conosco. Ele que nos faz pessoas melhores.

O amor e a vida. Duas palavras, cada qual com quatro letras. O que isso significa? Que elas exercem a mesma função em nossas vidas? Mas a palavra “viver” tem cinco letras. Afinal, o que é tudo isso? O que é amor? O que é amar? O que é vida? O que é viver? Qual a diferença entre tudo isso?

Pelas experiências que eu tive em vida, posso inventar algumas definições. Talvez não contentem. Talvez estejam completamente erradas. Talvez eu as mude amanhã. Mas elas estão vivas (Mas o que é isso? Eu ainda não defini, certo?) no agora e isso sempre bastou para mim.

O amor. É algo forte, realmente. Não existe egoísmo quando se trata dele. Vence tudo, vence todos. Não impõe limites. É singular. É eterno. É imortal. É infinito. É tudo isso pelo menos enquanto dura. É aquilo que você deve tomar cuidado para não falar na hora errada para a pessoa errada. Ele é reconhecível; engana, mas quando acerta faz tudo valer à pena. Você o sentirá poucas vezes na sua vida, ou muitas. Por poucas pessoas, ou por muitas. Por um alguém, ou por todos que você conhece. Na hora H isso não vai importar. Ele existiu. Ele existe. Ele está vivo, aqui e agora. Ele é seu e ninguém poderá duvidar. E se alguém duvidar, talvez você possa dizer: “mas eu também te amo”.

E a vida? Aguenta firme que você já vai entender porque eu continuei lutando mesmo quando mais da metade do mundo desistiu. Vida foi a palavra que inventaram para nomear o que estamos fazendo. Estamos vivendo o tempo todo. Não há como acreditar na vida e duvidar do amor ou vice-versa. Eles são interligados (São. Nada de “estão”. É isso que precisa ser entendido). Você precisa amar a vida para vivê-la, certo? E então existe aquilo de modificar palavras (aliás, existe isso dentro da vida. Não estamos vivendo enquanto fazemos isso?). Certa vez uma pessoa muito especial leu um livro para mim e nesse livro dizia: “Vá. Vá em frente. Apenas faça.” O nome do livro era GO. Depois fiquei pensando. Vá. Vida. Existe algo em comum com essas duas palavras. Se cortarmos o ID de “vida” se forma uma nova palavra. Vá. Viva. Não fique parado esperando. Ame. Lute. Sobreviva.

E foi com a certeza que senti pensando sobre essas palavras que eu separei meus lábios dos de Jamie.

– Jamie – sussurrei, clamando por sua atenção.

Ele respirou fundo, não querendo afastar nossos rostos.

– Por favor, não me diga que o que estamos fazendo é errado – ele pediu, mantendo nossos rostos colados, preparados.

– Não, não – sorri levemente, sentindo seus lábios se moverem junto com os meus. – Só queria dizer que... eu... estou apaixonada – sim, eu recuei. Maldito receio.

– Sério isso? – ele perguntou, sorrindo pronunciadamente contra meus lábios.

– Sim, mas não era isso que eu iria dizer.

– Então o que era?

Parei por um momento, me preparando para o que diria em seguida.

– Só digo se você prometer que não dirá nada quando eu terminar - me mantive com os olhos fechados, esperando a promessa.

– Tudo bem, eu prometo – depois de um tempinho ele me respondeu com a voz aparentando preocupação.

Abri meus olhos. Duas bolas de chocolate me encaravam, esperando impacientemente. Sorri.

– Eu te amo – disse em uma voz alta, clara e cheia de convicção.

Ele arregalou os olhos e abriu a boca ameaçando dizer algo. Segurei firme em sua nuca e colei nossos rostos novamente, deixando nossos lábios perigosamente próximos.

– Você prometeu – eu estava pronta para beijá-lo, mas antes disso precisava falar mais uma coisa. - Não diz nada.