Almejar

Capítulo V - Inquietações


A quente manhã de domingo tirou Cebola da cama bem antes do previsto. O rapaz não havia dormido naquela noite, estava preocupado com o almoço com seus pais e os sogros.

Ainda não havia dito aos pais sobre o almoço e faltava coragem para dizer, mesmo que seu tempo estivesse acabando. Pegou seu celular e lá havia um áudio de Carmem, enviada durante a madrugada.

“O almoço vai ser às duas.” a voz dela soou sem ânimo algum.

Cebola apenas reagiu com uma joia e, após abandonar o aparelho na cama, apertou os olhos.

“O que eu vou fazer?” questionou-se.

A fim de esfriar a cabeça, decidiu caminhar um pouco na rua. Àquela hora da manhã, era comum encontrar algumas pessoas caminhando em uma praça próxima à padaria Joaquim, para onde foi.

Sua grande surpresa foi encontrar um rosto conhecido andando por lá.

“Oi, Mônica! Bom dia!” cumprimentou e ela o olhou, tinha em mãos uma sacola da padaria.

“Cebola! Bom dia! Menino… está tão ansioso assim para seu almoço de hoje? ‘Tá com cara de quem não dormiu à noite.” observou risonha.

“Tá tão óbvio assim?” perguntou e ela assentiu.

“Um pouco. Quer conversar sobre isso?” perguntou e o rapaz pareceu se aliviar.

“Adoraria, mas… hoje não é seu dia de folga?” questionou e ela sorriu doce.

“Só alguns minutinhos não vão me fazer mal. Fora que minha colega de casa tem um almoço com os pais hoje e está dando uma geral na casa.” respondeu.

Os dois se sentaram em um banco da praça sob uma árvore, o sol já estava quente.

“Eu… eu estou preocupado com a reação dos meus pais no almoço.” iniciou direto.

Mônica franziu o cenho.

“Dos seus pais? Geralmente, os noivos se preocupam com a reação dos sogros…” comentou.

Cebola respirou fundo.

“Tem uma coisa que eu não te disse, Mônica. Eu… a Carmem… os pais da Carmem são pessoas bem frias e materialistas, não por acaso ela é pouco sentimental daquele jeito. Então, pra agradar eles, eu disse que meus pais também eram assim, só que eles são o oposto disso. E acho que eles não vão ficar muito felizes pela mentira e nem pela… pela principal razão de eu ainda estar com a Carmem.” confessou.

“E qual é essa razão?” ela perguntou.

O rapaz mordeu o lábio inferior.

“O estilo de vida. Mônica, eu fui um ótimo aluno na escola, sou um ótimo aluno na faculdade e fui muito bem no meu intercâmbio, mas até agora não me trouxe grandes oportunidades.” revelou.

“Leva um tempinho pra isso acontecer.” ela pontuou.

“É, mas eu sou mais imediatista! Os contatos poderosos, as propostas futuras que me esperam e até mesmo o acesso a lugares fodas que já fui e vou… tudo isso pode ser possível graças ao meu relacionamento com a Carmem.” o rapaz completou.

“Mas também pode acontecer sem isso, só que não tão rápido e fácil assim.” ela comentou.

“Essa é a questão. Eu… eu quero isso o mais rápido possível!” Cebola respondeu.

Mônica o olhou surpresa, mas nem tanto. Sabia o quanto o contato com alguém influente podia abrir portas, não por acaso aceitou trabalhar no casamento de Carmem. Porém, sabia que Cebola poderia se arrepender da escolha.

“Entendo seu lado, Cebola. Mas acho que as coisas são um pouco mais sérias, tanto no ramo profissional quanto pessoal.” comentou.

“Por causa do amor, você fala? Bom… a Carmem não faz o estilo apaixonada. Acho que ela nem me ama.” o moreno supôs.

“O amor também é um ponto, mas tem seus pais e seus sogros. Já começou com uma mentira, como acha que vai ser quando a verdade vier à tona? Sem contar que acha que os pais da Carmem vão reagir como quando souberem que esse casamento é por interesse?” ela perguntou.

“Eu me viro com meus pais e… não duvidaria que o casamento dos Frufru também tenha sido por interesse.” Cebola se defendeu.

“Pode até ser, mas a família rica da história é a deles. Pensando por esse lado, quem tem a ganhar com este casamento? Você ou a filha deles?” a moça perguntou.

Cebola umedeceu os lábios.

“De certa forma, os dois. Não vamos nos esquecer que ela fez o pedido de casamento.” respondeu.

Mônica o encarou, questionando-se se ele sabia sobre a competição com Amanda.

“Olha… não cabe a mim julgar as escolhas dos noivos, mas tenho uma pergunta: acha que vocês dois, tendo os sentimentos que têm um pelo outro, viveriam uma boa vida de casados?” perguntou.

O rapaz pensou por alguns segundos.

“Acho que sim. Eu gosto da Carmem e talvez teríamos algum acordo para que ninguém seja infeliz. Você trabalha na Dream, já deve ter pelo menos ouvido falar de casamentos assim. Eles podem não ser o ideal, mas atingem o objetivo.” respondeu.

A moça o encarou bem. Ao mesmo tempo que parecia certo de suas escolhas, seu nervosismo somado ao fato de ter confessado tudo mostrava que não tinha tanta segurança nelas.

“Está mesmo disposto a ir até o fim com isso, Cebola? Hoje é um dia decisivo.” questionou-o.

Cebola suspirou. O estilo de vida que seu relacionamento proporcionava era sedutor, mas ainda havia um lado seu, um menos ambicioso, que duvidava se essa era a coisa certa a se fazer. Afinal, futuramente, teria bons resultados profissionais, porém, sua pressa falava mais alto.

Seu olhar se voltou para a wedding planner com uma interrogação. Já havia percebido antes que, diferente do que esperava de algum funcionário da Dream, Mônica parecia se importar mais com o bem estar do cliente do que com o caro casamento que tinha em mãos.

“Você… você sabe que se eu pular fora, você fica sem o casamento que pode alavancar sua carreira, né?” perguntou sincero.

Mônica assentiu com um riso.

“Sei. Eu gosto de pensar na felicidade dos noivos, Cebola. Além disso, lembra do que eu te falei sobre o pré, o durante e o pós casório? Estamos em um ponto crucial do pré: saber se o noivo de fato está disposto a continuar.” explicou.

“Se eu disser que sim, você ainda seria a wedding planner?” perguntou.

Foi a vez de Mônica pensar. Aquele casamento fugia de tudo que considerava ser um futuro casamento saudável, além da falta de amor, era uma bagunça construída em cima de mentiras, omissões e interesses. Tinha tudo para dar errado, porém, no fim das contas, a escolha era do casal.

“É claro. Eu só não quero que vocês se arrependam.” garantiu e ele sorriu, segurando em suas mãos.

“Muito obrigado, Mônica!” agradeceu sorridente.

“De nada. Bom, vou indo agora. Boa sorte com seu almoço. Até mais!” disse se levantando e tomando seu caminho.

Cebola saiu de lá sentindo as costas pesarem menos, peso este que pareceu ter caído nos ombros de Mônica.

*

Enquanto isso, em seu apartamento, Nikolas lia alguns comentários de seus vídeos enquanto tomava café da manhã. Uma pergunta com várias curtidas chamou sua atenção.

Nik, a Keika falou numa caixinha que vocês terminaram. Quando vai falar o motivo? Impressionante como esse povo me cobra por uma coisa pessoal…” negou com a cabeça.

Seus olhos foram até onde estava a caixinha aveludada. Deixou seu cereal em cima da mesa e a pegou. Ao abrir a caixa, observou o anel com uma pedra bonita e respirou fundo, sendo transportado até o dia em que ia pedi-la em casamento.

Havia arrumado o local e pedido a comida favorita dela. Suas mãos suavam e seu coração acelerou quando ela passou pela porta. Porém, a moça de curtos cabelos negros e feições asiáticas pareceu ignorar tudo.

“Nikolas, eu quero terminar.” falou direta.

“Terminar? Por quê?” questionou.

“Eu… eu gosto muito de você, mas eu me apaixonei pelo Nik e não tanto por… você.” falou e ele franziu o cenho.

“Acho que não entendi…” comentou.

“O Nik que eu vejo nos vídeos é um pouco diferente do Nikolas que eu vejo no dia-a-dia. Agora eu percebi que aquele dos vídeos que conquistou meu coração. Você é um cara legal, mas… não podemos continuar com isso.” ela começou.

“Mas… mas posso tentar…” ele falava até ela negar com as mãos.

“O problema não é você, sou eu! Eu acho que eu só sinto admiração por você. Eu ‘tava tão em êxtase por viver o sonho de uma apaixonada adm de fanpage, de conseguir ter alguma coisa com o ídolo, que eu me iludi e te iludi. Eu… eu sinto muito! Adeus, Nikolas!” concluiu antes de sair rapidamente.

“Keika!” chamou, sem obter resposta.

Junto das lembranças, veio a dor. Fazia meses que a moça havia rompido o relacionamento e Nikolas ainda não havia superado. Nikolas havia a amado, principalmente por achar que Keika não estava com ele apenas por se tratar de Nik, o geek, e sim por gostar verdadeiramente dele, o que não era verdade. Toda essa dor havia o levado a escolher o semi-ead, a fim de evitar encontrar ela e os fãs que insistiam em perguntar sobre os dois, e à abertura da loja física, mas mesmo assim ela ainda rondava seus pensamentos.

O rapaz saiu de seus pensamentos com o toque de seu interfone e foi atendê-lo. Assim que a pessoa chegou no apartamento, cruzou os braços.

“Podia jurar que era hoje o almoço com seus sogros.” comentou. Era Carmem ali.

“Ainda ‘tá cedo. Eu tinha que te falar pessoalmente o que eu consegui. Lembra daquela chácara que você gostou? É nossa! Consegui fechar com eles.” revelou, mostrando a conversa a ele em seu celular.

Nik arregalou os olhos.

“Mas como? Eles disseram que estavam ocupados!” questionou.

A moça sorriu orgulhosa.

“Simples, eu sou Carmem Frufru. O que eu quero, eu consigo.” gabou-se.

O rapaz riu enquanto a abraçava.

“Vou ignorar sua presunção. Obrigado, Carmem! Tenho certeza que eles vão amar. Aliás, ela amou o convite que você escolheu.” disse e a amiga sorriu, abraçando-o de volta.

“Mesmo? Que maravilha! Sabe o que eu pensei pra ser a lembrança? Planta! Seus pais gostam de lugar aberto e mato. Fora que aposto que as plantas são as filhas favoritas da sua mãe.” falou e ele fez uma careta, cruzando os braços novamente.

“Que nada! Mas eu gostei da ideia. Só que não dá pra ser qualquer planta… tem uma floricultura perto da minha loja, dá pra eu ver o que eles recomendam.” falou enquanto desbloqueava seu celular, a fim de conferir informações sobre a floricultura.

“Eu vou com você. Você não entende de plantas.” a moça se ofereceu e ele riu.

“E você por acaso entende?” perguntou e ela deu de ombros.

“Eu não tenho ciúme das plantas da minha mãe, é um início.” defendeu-se e ele riu.

“Abre às nove, dá pra ir. E eu não tenho ciúme de planta, só digo que minha mãe gosta mais de mim do que de plantas. Enfim, o que seus pais disseram do almoço e do pedido?” mudou o foco enquanto se sentava.

A moça também se sentou.

“Disseram que eu soube escolher, eles gostam do Cebola. Perguntaram se eu ‘tava grávida por causa da pressa, eu disse que não e foi isso. Ah, mas ganhei de presente de casamento um apartamento novo, só falta eu escolher onde eu quero e eles cuidam do resto. Você vai comigo ver alguns, né?” perguntou.

Nik levantou a sobrancelha.

“Eu? Não tinha que ser, sei lá, o cara que vai morar lá com você?” perguntou.

“O Cebola tem aula presencial a semana inteira.” a moça o lembrou.

“Eu também tenho aulas, só não são presenciais. Fora elas, tenho bodas pra planejar e uma loja pra cuidar. E se o Cebola for com você durante o almoço ou outro horário livres?” falou.

A moça suspirou.

“Eu também trabalho, sabia? E as bodas é coisa nossa, não só sua, rapaz.” falou e ele riu.

“Tenha dó, Carmem! Você vive saindo de lá a hora que bem entende. Duvido que teria problemas em sair pra ver seu apartamento com seu noivo.” falou e a moça revirou os olhos.

“Tá… eu vejo se ele pode. Mas se não puder, você vai deixar a Agnes cuidando de tudo, o que ela faz muito bem, e me acompanhar. Afinal, olha só, você é o dono!” falou e o amigo riu.

“Tenho certeza que ele vai tirar um tempinho.” falou e a amiga cruzou os braços seriamente.

“Por que você ‘tá fugindo de fazer as coisas sozinho comigo?” perguntou direta.

Nikolas a olhou bem, o biquinho avermelhado e cenho franzido mostravam a chateação.

“Eu não ‘tô fugindo, mas agora você está noiva.” lembrou e a amiga deu de ombros.

“E daí? Noivas não podem ter amizades?” falou.

“Sim, mas se você quer ser convincente nesse teu noivado, precisa ser vista com ele e fazer coisas com ele.” o amigo ressaltou.

“Uma coisa não anula a outra. Fora que, enquanto Denise não volta, você é minha única voz da razão.” ela respondeu.

“Ah, então sou sua segunda opção? Bom saber.” o rapaz brincou e ela riu.

“Você me entendeu! Por que a caixinha ‘tá aqui?” apontou para o objeto.

Nik suspirou.

“Acho que vou vender. Me traz lembranças ruins.” respondeu.

Carmem o olhou.

“Sabe… você nunca me disse exatamente por que vocês terminaram.” entrou no assunto.

O rapaz olhou para o nada.

“Ela que terminou comigo. Ela se apaixonou pelo Nik que ela via nos vídeos, só por ele.” respondeu sem rodeios.

A loira piscou um olho de cada vez.

“Espera aí… ‘tá me dizendo que durante um ano ela não se tocou que você tem uma vida fora da internet?” perguntou.

“Meio que isso.” respondeu.

A loira não conseguiu evitar uma gargalhada.

“Desculpe, mas isso é muito ridículo! Ela conseguiu realizar o sonho de muita fã de namorar o ídolo e jogou fora só porque ele tem uma vida diferente fora da internet?” comentou.

“Aposto que teve mais motivo e ela não quis dizer. Ela parecia… cansada da relação. Quando começamos a namorar, ela ganhou fãs e haters. Isso é desgastante.” comentou.

A moça deu de ombros.

“É… talvez. Por que nunca quis contar o motivo?” perguntou.

O rapaz suspirou.

“Eu amei aquela garota, Carmem. A gente gostava de muitas coisas em comum, nos divertíamos, eu me sentia bem com ela e achei que era recíproco, que seria pra sempre! Então, quando acabou, eu me senti vazio. Aí tudo que eu queria era esquecer, então decidi seguir em frente. Tentei não frequentar os mesmos lugares e me ocupar o máximo possível, tudo pra esquecer dela. Mas… nunca foi uma tarefa fácil.” confessou e a amiga o olhava atentamente.

Nik encarou o teto e esticou as pernas.

“Às vezes, eu invejo esse seu desprendimento amoroso. Talvez eu teria sofrido bem menos se fosse assim.” completou.

Naquele momento, muita coisa fez sentido na cabeça de Carmem: a loja física, a opção pelo semi-ead, as saídas menos frequentes onde costumavam ir, o desânimo do rapaz, tudo. Sentiu-se um pouco mal por não ter descoberto antes, mas não foi isso que focalizou.

“Não, você não deveria invejar isso. Um de nós precisa ter sentimentos, não acha?” falou tocando-o no ombro e ele não disse nada.

“Sinto muito que tenha passado por isso, Nikolas. Ninguém que acredita no amor deveria passar por uma coisa dessas. Ainda mais um cara como você, que é legal, fofo, responsável, cozinha meio mal, mas nunca desiste de tentar, que sempre me ajuda com minhas loucuras, que tem ciúmes de planta… e que é alguém que é muito mais que um youtuber.” começou, chamando a atenção do rapaz.

“É uma pena que a Keika tenha te reduzido a isso, perdeu um cara que seria um ótimo marido.” confessou sem nem perceber as palavras saindo mais doces de sua boca. Aquilo havia saído de seu coração.

Os olhos castanhos de Nikolas se fixaram com os claros de Carmem por alguns segundos. Nada era dito em palavras, mas o olhar reconfortante dizia o bastante. Um tanto constrangido, ele desviou o olhar.

“Ér… valeu! Falando em casamento…preparada pro seu grande almoço?” levantou-se.

Carmem umedeceu os lábios, ajeitando o cabelo.

“Não estou preocupada com isso. O casamento vai… ér… acontecer. Eu… tenho que ir agora.” falou se levantando e o amigo assentiu.

“Claro! Me mantenha informado.” falou e ela assentiu.

“Sim. Você é o padrinho! Eu… a gente vai se falando.” disse e ele assentiu.

Após um caminho silencioso e constrangedor até o portão, Carmem entrou em seu carro sem saber ao certo o que havia acontecido consigo.

“O que foi aquilo que eu falei?! Eu penso tudo aquilo, mas não precisava falar em voz alta! Calma, Carmem… recomponha-se!” repreendeu-se.

Nik, por sua vez, se jogou em seu sofá. Carmem não estava errada, ele de fato estava tentando evitar sair com ela, afinal, não sabia se era pela carência ou por algo reprimido, mas vinha a achando mais atraente.

“Para com isso, Nikolas! Ela ‘tá noiva! Desiste!” reclamou consigo mesmo.

Olhou novamente para a caixinha e pegou seu celular.

“Vou chamar a Mônica pra sair! Ainda 'tá cedo, vou esperar um pouco. Espero que não tenha o mesmo final.” falou.

*

Mais tarde, no apartamento perto da faculdade, Agnes falava com os pais ao celular.

“Estamos quase chegando. Estaremos em 4, certo?” a mãe disse.

“Sim… nós três e meu namorado.” respondeu.

“E esse rapaz sabe que é seu namorado?” a voz do pai soou.

“É claro! Por que não saberia?” perguntou.

“Nunca vimos nem foto… me pergunto se ele realmente existe.” disse e ela umedeceu os lábios.

“Existe. Quando chegarem, me avisem que desço.” encerrou a ligação.

A moça se sentou e olhou ao redor um tanto nervosa. Nenhuma das meninas estava lá, ambas haviam ido visitar suas famílias, e Penha e Sofia estavam offline, então não tinha o apoio moral que precisava para não surtar e colocar tudo a perder.

O som da campainha quase a assustou, ao abrir a porta acabou sorrindo, era Cascão.

“Oi, Agnes! Como prometido, estou 70%.” ele disse prestes a tirar seus sapatos.

“Não, não precisa tirar. Entra!” falou e ele entrou. Ele tinha uma sacola consigo.

“Tá tudo bem? Parece ansiosa.” perguntou.

“Estou um pouco. Faz um tempo que não vejo meus pais e… não sei bem o que esperar.” respondeu.

“Relaxa. Nosso plano vai dar certo, os coroas vão ver que você ‘tá melhor e talvez até te elogiar. Acha uma boa falar sobre a ida no Bidu?” ele perguntou.

A loira negou com um riso.

“Acho melhor não. Tenho certeza que o lugar não seria o favorito deles.” disse.

“Beleza. Precisa de ajuda com alguma coisa? Sei lá… arrumar a mesa?” perguntou apontando para a mesa, já com algumas coisas em cima, mas não arrumadas.

Sem que percebesse, Agnes mediu o rapaz dos pés à cabeça e se lembrou tanto das várias vezes que o via suado quanto de momentos da noite anterior, em que ele interagia muito perto de alguém, até mesmo tomar um gole da cerveja de alguém. Automaticamente, fez uma feição enojada.

“Pela sua cara, a resposta é não.” ele riu enquanto se sentava no sofá.

A loira arregalou os olhos.

“Não! Eu… desculpe, Cascão. Não ‘tô insinuando que você é sujo, mas sempre te vejo suado, você chegou a dividir bebida ontem…” falava até ele rir mais.

“Calma! Não precisa se explicar, não. Eu ‘tô suave, de verdade! A propósito, dizem que é chato ir pra um almoço de mãos abanando, então eu trouxe um suco de laranja. É daqueles natureba mesmo e não foi feito por mim.” estendeu a sacola e ela pegou.

“Obrigada. Você também gosta desse suco ou coisas orgânicas?” perguntou indo lavar a embalagem e ele negou risonho.

“Eu me alimento direito, mas também sigo o estereótipo de estudante que se alimenta mal às vezes. Mas costuma aparecer alguma coisa verde no meu miojo ou uns nuggets no meu prato feito.” brincou e ela franziu o cenho.

“Você e as meninas daqui de casa são parecidos, adoram se alimentar mal. Já vi elas comendo sushi de café da manhã!” comentou arrumando o que faltava na mesa e ele riu.

“Mas assim que é bom! Já comeu pizza adormecida? É maravilhoso! Mas já que você é toda fitness, por que te incomoda eu sempre estar suado? Mostra que me exercito, que prezo pela minha saúde.” falou e ela riu.

“É mais a sensação do corpo suado que me incomoda, não o motivo de estar suado.” explicou.

“Ah, sim. E como você faz quando sua durante a atividade física?” perguntou.

“Eu tomo banho.” respondeu simples e ele riu.

“Mas como fica o intervalo entre a saída de onde você suou e a chegada na sua casa?” questionou-a.

“Eu não malho num lugar nojento feito uma academia. Eu malho sozinha, aqui em casa, e às vezes faço caminhada.” a loira respondeu.

O rapaz assentiu.

“Me responde uma coisa… como você sobrevive na faculdade? É um lugar com muita gente. Ou você faz ead?” perguntou.

Agnes deu um riso.

“Eu não estou nesse nível, Cascão. É que na academia é diferente.” explicou e ele assentiu.

A conversa foi interrompida pelo toque de seu celular, seus pais haviam chegado.

“São eles!” falou e ele sorriu.

“Confia! Vai dar tudo certo.” garantiu e ela deu um sorriso antes de ir buscar os pais.

Os pais de Agnes já estavam na terceira idade. Ao virem Cascão, pareceram avaliá-lo. O rapaz, por sua vez, não se intimidou por um segundo sequer durante a apresentação de Agnes.

“Então você é o misterioso namorado da Agnes…” o senhor disse, olhando-o dos pés à cabeça.

“Isso mesmo! É um prazer conhecer vocês! Posso chamar de vocês, né?” falou e a senhora sorriu.

“É claro! Até porque senhor e senhora estão no céu!” disse se sentando ao lado do marido.

Cascão e Agnes se sentaram lado a lado, sem se tocar.

“Bonitinho você… como foi que se conheceram?” a mais velha perguntou.

Os dois se entreolharam, não haviam combinado isso.

“Na faculdade.” ela respondeu.

“Ah, é? Vocês são do mesmo curso?” o pai perguntou.

“Não, eu faço Educação física.” o rapaz respondeu.

“Ué… e se conheceram como? Agnes não é a pessoa mais comunicativa do mundo…” a mãe reparou.

“Ah, sabe como é… trombadas nos corredores, troca de olhares… vocês têm uma filha muito bonita, com todo respeito, é claro.” ele respondeu.

“E como conseguiu quebrar a barreira dessa menina?” o pai perguntou.

“Ah… acho que ela decidiu abrir o coração.” falou e sorriu para a moça, que sorriu de volta.

“Faz o que da vida, Cássio?” a mãe perguntou.

“Atualmente, só estudo. Mas estou batalhando pra ser um jogador de futebol.” respondeu, chamando a atenção do mais velho.

“Mesmo? Mas jogador raiz ou esses modinhas, que nem jogam de verdade? Que futebol bom mesmo era o do meu tempo! Os jogadores sabiam o que era futebol.” ele falou gesticulando com as mãos.

“Concordo com o senhor.” o rapaz mentiu.

“E que time é teu?” o pai de Agnes perguntou com um sorriso ladino.

“Pai!” Agnes repreendeu.

Cascão riu, apontando o dedo para o mais velho.

“Quase me pegou. Nesse caso, ninguém. Mas já que falamos de times, eu sou corintiano.” respondeu.

O mais velho o olhou muito sério, quase o assustando, antes de abraçá-lo fortemente.

“Minha filha… uma escolha boa nessa vida você fez! Eu também sou gavião, rapaz!” exclamou sorridente, apertando Cascão no abraço.

“Tá esmagando o menino, Gavião velho!” a esposa reclamou rindo.

“Vai que estou diante do próximo Sócrates? Isso não é nada!” ele exclamou e Cascão riu.

“Seria um sonho! E uma honra!” comentou.

“Sabe quem é o Sócrates? Agnes, case-se com este rapaz!” falou e ela franziu o cenho.

“Vamos comer?” perguntou e todos se levantaram, rumo à mesa.

“O que você fez pra gente? Finalmente aprendeu a cozinhar? Ou ainda tem medo de tempero dar doença e faz tudo aguado?” a mãe interrogou.

“Isso já passou. E fiz o prato favorito de vocês: pernil suíno assado.” revelou e Cascão arregalou os olhos levemente.

“Pernil?” perguntou incomodado.

“Não me diga que não come carne, garoto?!” o pai dela disse sério.

“Eu como, mas não de porco.” respondeu.

Agnes cobriu a boca.

“Desculpe, Cascão! Eu não sabia!” falou sincera.

“Não, tudo bem. Eu como outra coisa.” ele sorriu.

Eles começaram a se servir e comer.

“Por que não come porco, rapaz?” o homem perguntou curioso.

“Eu tinha um porco de estimação quando era criança, então nunca me senti bem em comer carne de porco.” Cascão respondeu.

O mais velho estalou a língua.

“Frescura, hein? Tem problema em ver a gente comendo também?” ele disse irritado.

“Pai!” ela disse.

“Não, pode ficar à vontade.” Cascão disse tranquilamente.

“Liga com ele não, Cássio. Você mora longe daqui?” a mãe da moça perguntou.

“Não, moro bem perto.” respondeu.

“Então deve que não sai daqui.” o pai disse mordendo um pedaço de carne.

“Não… eu respeito muito a vontade da Agnes, ela prefere ir com calma. Então não pulamos etapas.” respondeu e a moça franziu o cenho para ele, mas logo entendeu a intenção dele ao ver os pais sorrindo satisfeitos.

“Menino respeitoso… isso é bom. E conhece as meninas que moram aqui?” a mais velha perguntou.

“Já vi.” respondeu.

O almoço passou com algumas conversas corriqueiras, mas Agnes viu que Cascão de fato se virava bem. Tanto que ele mesmo soube como se retirar sem parecer forçado.

“O almoço estava maravilhoso, amor. Adoraria passar o dia com vocês, mas tenho alguns compromissos agora. Foi um enorme prazer conhecê-los. Na próxima, eu lavo os pratos, Agnes.” acenou.

“Que casal é esse que não se despede com um beijo?” a mãe perguntou direta.

Os dois se entreolharam.

“Ah… a gente… a gente prefere se beijar sem alguém junto.” a moça respondeu.

“Sim! E é até desrespeitoso beijar a filha de vocês na frente de vocês.” o rapaz completou.

“Não nos importamos. Demonstrar sentimentos nunca é demais pra um jovem casal.” a mãe disse sorridente.

Os dois se olharam novamente. Agnes gelou quando Cascão se aproximou, mas se surpreendeu quando ele beijou o topo de sua cabeça.

“Tchau, amorzinho!” disse e logo deixou o local.

A moça ainda estava surpresa quando os pais se dirigiram a ela.

“Gostei desse teu namorado. Tem lá seus defeitos, mas… é bem respeitoso.” o pai disse.

“Sim, ele é.” falou sincera.

“Vamos pro hotel, precisamos descansar da viagem. Mas queremos sair com vocês nesses outros dois dias. Quero ver se ninguém está mentindo pra nós.” a mãe disse e a moça engoliu em seco.

Assim que eles saíram, a moça se jogou no sofá, aliviada.

“Não acredito que deu certo! Cascão realmente leva jeito! Acho que não foi um mau negócio no fim das contas!” comemorou e olhou em volta.

“Bom… hora de limpar essa sujeira!” falou ainda sorrindo.

*

Na enorme casa de Carmem, o almoço havia demorado a sair. O clima estava tenso.

Os pais de Carmem pareceram não se importar com a diferença social dos pais de Cebola, principalmente pelo fato de já terem procurado sobre eles antes mesmo de Cebola sonhar em apresentá-los.

Já os pais de Cebola estavam irritados, além de saberem em cima da hora sobre o casamento, descobriram ali que o filho havia dito que eram frívolos e materialistas. Porém, diferente do que Cebola esperava, eles não entraram na mentira, muito pelo contrário.

“Não sei o que penso sobre esse casamento… não sei se vejo tanto amor, companheirismo e maturidade para acontecer um casório.” a mãe de Cebola opinou.

“Isso vem com o tempo. Achamos muito positivo Carmem querer se casar com um rapaz tão ambicioso feito nós. O casal crescerá junto.” o pai da moça disse.

“Não sei se penso o mesmo. Não sei se Cebola fez a escolha certa… em se casar agora.” o pai dele disse, completando após a esposa chutar sua perna.

“Estão preocupados demais. Independente de sermos favoráveis ou não, eles vão fazer a escolha que for mais valiosa para eles.” a mãe de Carmem disse.

A mãe de Cebola olhou irritada para o filho, que evitava contato visual. Carmem, por sua vez, parecia ignorar tudo enquanto usava o celular.

“Será que somos os únicos que vemos que está tudo indo rápido até demais? Por que essa garota quis casar tão rápido? Parece até golpe!” a mãe de Cebola esbravejou.

A mãe de Carmem riu.

“Com todo respeito, por que minha filha iria querer dar um golpe no seu filho? Seria mais fácil ser o contrário, não?” perguntou presunçosa.

Cebola não soube se a sogra teve a intenção de humilhar, mas conseguiu. Os pais de Cebola abriram a boca incrédulos, mas não disseram nada, ficando um silêncio constrangedor.

“Estamos perdendo o foco aqui. Assim como meus pais, eu gosto de aproveitar o momento certo para investir, então decidi investir no meu relacionamento. O que vai ser bom para nós dois, não é, Cebola?” Carmem se pronunciou e o noivo assentiu.

“Claro!” respondeu.

“Vocês não precisam se preocupar. Nós dois sabemos o que estamos fazendo, sabemos os prós e os contras e decidimos continuar. É uma coisa que com ou sem a colaboração de vocês vai acontecer, então acho que pode ser mais legal vocês aceitarem o fato e aproveitarem o acontecimento. Não é todo dia que seu primogênito fica noivo e vai se casar em menos de um mês, meus queridos sogros.” ela completou calma.

Os pais do rapaz se entreolharam. Para a infelicidade deles, tinham que concordar com ela.

“Tudo bem. É difícil ver meu menininho crescendo.” a mãe disse.

“Mãe…” ele disse e ela sorriu.

“Entendo sua preocupação. Mas temos que aceitar os fatos.” o pai de Carmem falou.

“Bom… então o que temos que fazer?” o pai de Cebola perguntou.

“Nada. Tudo que diz respeito ao evento casamento, minha wedding planner está cuidando. Tem a participação dos pais dos noivos e escolha de convidados.” Carmem respondeu.

“Mas e o orçamento disso tudo?” o pai de Cebola perguntou um tanto preocupado.

“Não disse para eles, Cebola? Somos os donos da Dream. Então tudo que precisarem para o casamento, pode contar conosco.” a mãe de Carmem garantiu.

“E onde vocês vão morar?” a mãe de Cebola perguntou.

“Ah, esqueci de te dizer, Cebola. Meus pais me deram um apê de presente. Só falta escolher e mobiliar. Se demorar, podemos ficar por aqui por enquanto.” Carmem disse e ele assentiu.

“Conheço um designer de interiores que vai fazer um ótimo trabalho!” a mãe da moça disse.

“Bom… a lua de mel de vocês será um presente nosso!” o pai de Cebola disse.

“Tem certeza? Tínhamos pensado em um lugar romântico, como Paris! Ou até mesmo um tour por alguns outros países.” o pai dela disse.

Os pais de Cebola franziram o cenho.

“Isso a gente vê depois! Vamos focar no que é mais imediato! A wedding planner ‘tá cobrando a gente pela lista de convidados!” Cebola interferiu.

“Nossa família é grande, mas… não sei se poderão vir todos. Avisar com menos de um mês de antecedência é loucura! Mas podemos pelo menos ver se aceitam.” a mãe dele disse.

“Temos alguns amigos que precisam estar lá e até mesmo ocupar um espaço de prestígio, sendo padrinhos, por exemplo.” o pai da moça disse.

“Por mim, tudo bem. Tudo bem pra você, Cebola?” ela perguntou e ele assentiu.

“Claro, mas tem uma pessoa que eu queria colocar como padrinho. Sei que vai parecer estranho, mas… a Mônica, nossa wedding planner, poderia ser a madrinha? Ela tem sido muito importante.” ele perguntou.

Carmem riu.

“Olha, Cebola… Mônica é legal, mas não acho uma boa ideia misturar trabalho com vida pessoal.” falou e ele assentiu, sem muito ânimo.

“Antes de fazermos essa lista, temos uma parte não muito agradável, mas necessária. Falamos com nossos advogados e trouxemos isso para vocês dois assinarem.” o pai de Carmem colocou um documento na mesa.

“Um acordo pré-nupcial?” a mãe de Cebola leu de cenho franzido.

“Ninguém espera que eles se divorciem no futuro, mas é uma medida de segurança para os dois. Confiamos em você, Cebola, mas pensar a longo prazo é importante. É o que dizem, Seguro morreu de velho.” o outro explicou com a voz forçosamente amigável.

Cebola riu e assinou, sem nem ao menos ler.

“Achei que você ia ler primeiro…” Carmem comentou surpresa.

“Eu confio nos meus sogros.” disse sorrindo para eles, que sorriram de volta.

Seus pais não gostaram muito, mas decidiram não falar nada. Ficaram algumas horas montando a lista de convidados, os quais, boa parte, Cebola e Carmem sequer conheciam.

O caminho até a residência de Cebola foi silencioso, mas ao entrarem, a matriarca liberou sua raiva.

“Você viu como eles tentaram nos humilhar, Cebolácio? Tem certeza que quer fazer parte dessa família? E por que você mentiu sobre sermos frios e materialistas? Nós jamais iríamos ser iguais a eles!” esbravejou.

“Desculpe, eu só ‘tava tentando ser aceito.” ele se explicou.

“Com mentiras? Se você precisa mentir para ser aceito, tem algo muito errado nessa relação.” o pai disse.

“Cebola, seja sincero conosco. Você realmente a ama ou só está com ela por dinheiro?” a mãe perguntou.

Cebola os olhou bem. Não havia sido educado para se relacionar com alguém por mero interesse, muito pelo contrário, seus pais pensavam igual a Mônica, talvez por isso tenha se identificado tanto com ela. Todavia, ainda queria alcançar seus objetivos de maneira rápida.

“Eu realmente gosto dela. E se aceitei me casar com ela, foi porque eu realmente sei o que estou fazendo.” falou indo para seu quarto.

“Espero que não se arrependa dessa decisão, meu filho.” a mãe falou.

O rapaz suspirou no batente de sua porta.

“Eu também espero.” falou para si mesmo antes de pegar o celular.

“Cascão, ‘tá a fim de dar um rolê mais tarde? ‘Tô precisando muito esfriar a cabeça.” mandou um áudio ao amigo.

“Brota!” o outro respondeu, fazendo-o rir.

*

Não tão longe dali, Mônica e Milena estavam na sala de casa após terem passado um tempo com suas respectivas famílias. Com elas, via chamada de vídeo, no notebook de Mônica, estava Magali.

“E é isso! Esse casamento ‘tá cada dia mais complicado. É puramente por interesse! Dos dois lados! Só que algo me diz que o Cebola é quem vai sofrer mais. A gente conhece os Frufru, eles só pensam em dinheiro! E ele não é rico!” Mônica desabafava.

“Esse casamento é uma chance de ouro pra minha carreira, mas ele foge de praticamente tudo que eu penso sobre um casamento. Eu não sei se realmente devo continuar.” confessou.

“Claro que deve, Mônica! Você está planejando o casamento, se eles não ligam pra própria vida conjugal… é problema deles. Eu acho que o amor é sim fundamental, mas a Carmem já mostrou que não ama ninguém e o Cebola parece aceitar isso, então não tem muito o que fazer.” Magali aconselhou.

“Vai ver pra eles isso é um relacionamento normal. Anormal seria ter um sentimento envolvido, e não só um jogo de interesses.” Milena comentou.

“Não sei… só sei que é muito esquisito. Mas eu prometi pro Cebola que continuaria com eles, então vou continuar.” a outra disse.

“Esse Cebola aí… por que você se preocupa tanto com ele?” a cacheada perguntou curiosa.

Mônica deu de ombros.

“Acho que me identifiquei com ele. Sei lá… ele parece ser a pessoa mais abandonada nisso tudo, diria que até perdido. Ele sabe o que ‘tá fazendo, mas parece não ter se ligado da dimensão da coisa que ele ‘tá se enfiando.” respondeu.

“Você tentou avisar, se ele não quis ouvir… já é com ele.” Magali comentou e a outra apoiou a cabeça na mesa.

“Deve ser. E você, Mi? Seu cliente está te enlouquecendo?” perguntou.

“Até que não, ele é legal. Mas cismou que tenho que descobrir sozinha umas coisas, pra ficar espontâneo, só que não vai rolar. Temos menos de um mês e editar aquilo vai me dar trabalho demais pra ficar brincando de Sherlock Holmes. Vou perguntar pro Nimbus.” respondeu.

“Vai decepcionar o astro excêntrico.” Magali falou.

“É um risco que estou disposta a correr. Ele vai entender que temos um prazo curto.” ela disse.

“Nem me fale em prazos! Feliz mesmo é a Magali! Que não precisa se preocupar com nada disso.” Mônica falou e a amiga riu.

“Não posso dizer que não estou. Ultimamente, minha grande preocupação tem sido não errar o idioma. Mas nem falamos sobre a vida amorosa de vocês, onde estão os contatinhos?” perguntou.

No mesmo instante, o celular das duas vibrou.

Milena gargalhou enquanto Mônica franzia o cenho.

“Há! Do Contra me mandou uma foto em um cômodo dizendo: a luz daqui fica ótima pra uma parte da entrevista, não acha? Adivinha onde fica o lugar?” falou rindo.

“No quarto dele? Porque se for… o cara flertou.” Magali disse.

“Não, a lavanderia! Olha… Esse mini documentário vai ficar muito diferente.” disse ainda rindo enquanto o respondia.

Mônica ainda olhava atônita para o próprio aparelho.

“Que cara é essa, Mônica?” Magali perguntou.

“A mensagem foi do meu insta… o Nik me chamou pra sair! Até achei que era fake, mas é ele mesmo!” falou e as outras duas sorriam.

“Aceita! Ele é uma gracinha e você não sai com alguém há séculos!” Milena sugeriu.

“Aceita! Você precisa esquecer um pouco do casamento lá.” Magali falou.

“Ele é o padrinho, então…” Mônica lembrou.

“Se você falar sobre o casamento com ele no encontro, eu vou até aí te dar um puxão de orelha!” Magali ameaçou, fazendo a amiga rir.

“Eu nem sei se eu vou.” respondeu.

“Por que não? O que você tem a perder?” Milena perguntou.

“Ah…” ficou sem uma resposta. Achava o rapaz bonito, era solteira e não tinha nada para fazer.

“Tá bom, eu vou. Mas a senhorita vai me acompanhar!” falou apontando para Milena.

“Quer que eu fique de vela? Sério isso?” a outra perguntou.

“Escolho um lugar que pode ser coincidência você estar. Não gosto de ir sozinha aos primeiros encontros!” explicou e a amiga riu.

“Tá bom, mas vou ficar longe. Onde você vai ser?” perguntou.

Mônica pensou por um instante.

“Ele é um gamer, mas gosta de sair. Não acho legal um lugar que vão ficar parando ele, então não pode ser um habitat natural dos fãs nerds dele, mas também não pode ser um lugar aleatório… Um boliche?” perguntou.

“Que linha de raciocínio é essa, Mô? E boliche é romântico?” Magali perguntou rindo.

“Ah… sei lá. Talvez.” Milena disse.

“Então vai ser isso.” a outra falou, enviando mensagem ao rapaz.

“Vai chamar a Agnes também?” Milena perguntou.

“Acha que chamamos? Não sei se ela aceita… se bem que ela foi com o Cascão no Bidu… deve estar outra pessoa agora! Vou chamar! Aí ela até te faz companhia.” falou mudando de aplicativo.

Magali riu.

“Adoraria estar aí pra ver isso, me mantenham informada!” pediu.

*

Mais tarde, Nimbus entrou no apartamento do irmão e revirou os olhos ao vê-lo meditando, já havia se acostumado, mas não deixava de ser estranho.

“Levanta daí! Vamos sair!” falou desligando a música.

“Pensei que tinha te dado minha chave apenas para emergências. E estou ocupado.” o outro respondeu sem mudar sua posição.

“É uma emergência. Prometi pros nossos pais que não te deixaria mofar aqui dentro, então vamos sair.” explicou.

“Que pena.” comentou, fazendo o outro bufar.

“Vai, Do Contra! Vai ser bom pra você ir pra algum lugar além de show.” falou.

“Eu saí ontem.” o outro lembrou.

“Com a fotógrafa não conta.” Nimbus respondeu.

“E por que não? Foi divertido. Até pensei em pedir pra ela deixar eu ir mais vezes.” falou.

Nimbus franziu o cenho, lembrando-se da conversa com os amigos do irmão.

“Papo sério agora. Você sabe que a Milena é só sua fotógrafa, né?” perguntou sério.

DC virou a cabeça na direção dele, sem tirar os óculos escuros.

“Acho que não entendi sua pergunta.” falou.

“A relação de vocês é apenas profissional. A simpatia dela é profissional, vocês não são amigos.” Nimbus afirmou.

O outro riu enquanto se levantava e tirava os óculos de sol.

“Nimbus, é óbvio que eu sei que é uma relação profissional, mas o que me impede de tentar deixar menos formal? Não gosto desses protocolos de frieza, as coisas têm fluído bem justamente por tudo estar mais leve.” explicou.

“Só não quero que você se magoe quando o contrato acabar e ela não precisar mais falar com você se não quiser.” o mais velho disse.

“Esse é seu problema, Nimbus. Você vive demais no futuro e esquece do presente.” DC disse.

“E o seu é o oposto, nunca pensa no futuro. Não é à toa que está cheio de problemas, não é, Maurício?” rebateu, deixando o irmão sem resposta.

“Olha… não acho ruim você querer ter uma relação mais leve com ela, mas não se esqueça que ela só está tentando fazer o trabalho dela da melhor maneira, não buscando uma amizade. Tenta não se decepcionar! Agora vai trocar de roupa!” concluiu e o outro respirou fundo.

“Aonde vai me levar?” perguntou e o outro sorriu.

“Você vai gostar.” falou rindo.

DC foi se arrumar pensando no que o irmão havia dito. Gostava da espontaneidade que tinha com Milena, mas, de repente, surgiu uma dúvida.

“Será que ela realmente só está sendo profissional e depois desse mês… acaba?” perguntou-se olhando para seu reflexo.

Aquilo inquietou DC, a ponto de pegar seu celular e olhar o contato de Milena. Até pensou em perguntar, mas o grito de Nimbus o apressando o fez apenas continuar a se arrumar.

Os jovens, dentro de suas próprias inquietudes, rumaram para suas atividades, sem imaginar que caminhos poderiam se cruzar naquela noite.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.