All 4us

Capítulo 1


Aqui estou eu, uma adolescente (quase adulta) lembrando da sua infância. Lembro como se fosse hoje o dia em que encontrei minha mãe praticamente morta no banheiro. Nunca me contaram o motivo da morte dela, mas tinha um pote de remédios do lado dela, e provavelmente, ela tomou todos, e acabou tendo uma overdose. Desde aquele dia, uns homens com um uniforme preto escrito "Emergência" me levaram para um lugar, um lugar que, se eu pudesse escolher, nunca teria vindo.

Não que eu não goste desse orfanato, eu gosto, todos me trataram bem e me tratam até hoje, mas eu não aguento ficar presa, nesse lugar aonde eu faço tudo, sem precisar sair de casa. Admito que dei sorte, pegando um orfanato grande e de bom potencial, porém eu queria estar na minha casa, aquela casa que eu me lembrava vagamente,porém , não esqueci.

Eu queria ter vivido a minha vida livre, saído nas ruas, ter convivido com pessoas de diferentes maneiras, ter ficado acordada até de madrugada, ter feito besteiras, saído das regras. Mas é muito difícil fazer isso presa dentro de quatro paredes a maior parte do tempo.

Por sorte peguei um quarto só meu, acho que é por que sou uma das mais velhas e que está a mais tempo no orfanato. Daqui a duas semanas faço 18 anos e, perante a lei, estou permitida de viver minha vida sem ter que dar satisfação para ninguém.

Aqui no orfanato temos hora pra tudo. Hora pra comer, para ver televisão, para dormir... eu simplesmente não aguento mais ! Sou uma adolescente de 17 anos com hormônios a flor da pele, que nunca beijou, nunca transou e nem nunca fez nada de errado ou ruim. As vezes passo das 22h acordada e me acho foda, só porque atrasei alguns minutos para dormir. O pior é que nem dá para não obedecer as regras, afinal, quem consegue ficar com um ar-condicionado ligado e no escuro por mais de 10 segundos ?

Tenho umas amigas aqui, mas poucas. Sou a única menina de 17 anos aqui. Todos os outros que tem a minha idade ou são mais velhos que eu são meninos, então o que resta é fazer amizade com meninas mais novas. Tem uma menina que nasceu no Brasil mais morou aqui em Los Angeles a vida toda, e assim que seus pais morreram num acidente de carro ela veio para o orfanato. Sinto pena dela, ela teve uma perda dupla. Eu pelo menos não conheci meu pai, não sei se ele está vivo, morto, nem seu nome eu sei. Já ela não, ela conhecia o pai dela, e ele também morreu. Ela tem 14 anos, mas diria que se você olhasse pra ela diria que ela tem uns 18. Ela é linda ! Não sei o por que mais o corpo dela é demais. Ela diz que é por causa do sangue brasileiro e eu acho que é por causa disso mesmo. Todo mundo que fala do Brasil se refere a meninas com bundas gigantes, coxas grossas, belos seios e braços "grossos", resumindo, todo mundo fala que elas são gostosas.

Admito, ela é linda e talvez, na linguagem dos meninos ela seja "gostosa". Queria ser como ela. Ela tem lindos e longos cabelos mel claro, olhos verdes e aquele corpo. Ela é gente boa, e tanto fisicamente quanto mentalmente parece ter 18 anos (como eu disse antes).

As vezes, quando eu não estou muito ocupada tweetando ou ouvindo música eu chamo ela para o meu quarto para bater uma papo, jogar uma conversa fora, ou fazer qualquer coisa que me tire do tédio. Ela adora a ideia, já que se ela for para o meu quarto não vai ter que ficar com as meninas de 6/7 anos que dormem no mesmo quarto que ela. Por ela ter entrado a pouco tempo no orfanato, ela fica em um quarto "comunitário". Deve ter umas 30 camas (beliches) e vários órfãos para ocupa-las. O quarto é muito grande, as vezes me perco nele. É muito falatório, é muito empurra empurra e as vezes me arrependo de ter saído do meu quarto.

No orfanato temos atividades diárias e cada um escolhe o que quer fazer. Por eu ser alta, escolhi volei, e por eu gostar, escolhi handball. Faço também natação e as vezes umas aulas de canto.

Outra coisa que temos de diferente também é a escola. Nossa escola é dentro do orfanato. As salas são dividias por idades e como eu tenho 17 anos estou na sala de um bando de garotos nojentos e chatos que vivem me perturbando na sala. Sou o tipo de garota... como se fala mesmo ? ... nerd. Não que eu queira estudar e fique triste se tiro 9, não é isso. Eu só estudo o suficiente direito, para não ter que estudar duas vezes. O raciocínio disso é lógico, e acho que invés de nerd, eu sou é inteligente.

Meu dia é resumido em acordar -> ir para escola -> aula de volei -> aula de handball -> voltar para o meu quarto pequeno porém aconchegante -> fazer os deveres de casa (irônico ser de casa se eu estudo na minha própria "casa") -> tomar banho -> dormir -> repetir tudo de novo e de novo e de novo e de novo.

Ah, você deve estar se perguntando o que eu faço nos finais de semana né.. então.. eu não faço ... nada. Na verdade, normalmente eu ajudo a "Tia Rosalinda", que é a dona do orfanato, e por mais jovem que seja também precisa de ajuda ( ela tem 40 anos, sendo que o orfanato tem 20 anos). É claro que ela tem ajudantes, mas eu acho que ela merece a minha ajuda. Ela cuidou de mim como se eu fosse filha dela. Sou uma das pessoas que passou mais tempo no orfanato e isso fez com que ela se apegasse a mim, e eu também me apeguei a ela. Eu ajudo-a com as crianças (entre 2 e 6 anos). Adoro crianças. Eu acho que é a melhor e mais rápida fase da vida, então eu acho que elas merecem uma ajudinha de vez em quando. Eu levo elas para brincar no parquinho, eu dou banho nelas, dou almoço a elas, e por mais chato que pareça ser, eu acabo me divertindo.

Se você acha que eu nunca saio do orfanato, pensou errado. Toda terça-feira eu vou com a Tia Rosalinda para o supermercado. Nas quartas eu costumo andar de bike pelo quarteirão e nas sextas, uma vez ou outra eu saio para dar uma volta e ver como é a vida real.

Estou ansiosa para o meu aniversário de 18 anos. Finalmente vou pegar minhas malas, dizer "Hasta La Vista" e meter o pé do orfanato. Destino? Faculdade de Artes de Los Angeles. Futuro ? Atriz.

Sim, atriz. Quero seguir a única coisa que eu sei que a minha mãe fazia e gostava, atuar. Ela não era profissional, longe disso, porém ela amava atuar. Lembro vagamente de umas duas vezes em que fui a um teatro para vê-la atuar. Não me lembro como era, porém me lembro que ela gostava. Ela sempre falava : "Em você, vou realizar o meu sonho."

Eram 21:30h e a Megan, a garota de 14 anos, brasileira (lembra?) bateu na porta do meu quarto.

Megan : Oi Lily.

Lily : Oi.. Megan.... Já está quase na hora de dormir, quer alguma coisa?

Megan : Na verdade, quero sim. Por favor deixa eu dormir no seu quarto aqui com você hoje ? As crianças estão insuportáveis, elas estão chorando, todas em conjunto e me deixando maluca. Eu pego o colchão da minha cama e coloco no chão. Porfavo-o-o-o-o-or.

E agora ? E se eu deixasse e ela quisesse dormir lá todas as noites? Nada contra a Meg, mas, eu iria perder toda a minha "privacidade". Pensando de outra forma, daqui a duas semanas eu estaria livre para viver a minha vida, e ela talvez pudesse ficar com o meu quarto. Vamos logo, Emily, se decida....

Lily: Ah, claro. Pode dormir aqui sim.

Megan: Não vai te encomodar ?

Lily : Não, relaxa ! Pega lá o colchão e o travesseiro e vem logo, besta.

Megan : Sabe que eu te amo né ? E eu não sou besta.

Lily : Talvez um pouco.

Megan : Não sou nad...

Lily : Vai logo pegar a porra do colchão por favor ? Eu vou tomar banho e quando eu entro para tomar banho eu tranco o quarto.

Megan: Calma, espera, eu to indo, não tranca o quarto ok ?

E ela me deu um abraço que eu recebi como um "obrigada por me deixar longe daqueles pirralhos pelo menos por uma noite."

Megan, se eu não me engano, faria aniversário antes de mim. Ela fará 15 anos dois ou três dias antes de mim. Então eu terei 18 e poderei sair e ela ainda estará aqui, trancada por mais três anos.

Se você parou para pensar "Ei, como que a Lily vai pagar a faculdade dela?" eu tenho a resposta. Minha mãe tinha uma poupança. Ela tinha cento e cinquenta mil dólares guardados. As vezes eu paro e penso o quanto ela foi idiota em não usar esse dinheiro em certos momentos, mas agora, que eu vou precisar dele mais que nunca, agradeço a deus por ela não ter gastado.

Com esse dinheiro, posso pagar a faculdade inteira de uma vez só. Assim não corro o risco da Lily consumista entrar em ação e eu não ter dinheiro para pagar a faculdade no próximo mês. Como a faculdade é de artes, o tempo é menor e só fazemos um ano e meio de faculdade. Pagando tudo de uma vez só, daria uns cinquenta mil dólares, e o melhor, sobraria cem mil.

Com os outros cem mil eu tenho que comprar roupas dignas a uma faculdade daquele porte, pagar o aluguel de um apartamento para mim, comprar um celular bom, e claro, guardar o resto para comida, medicamentos, talvez até um plano de saúde.

Eu tenho um Nokia, aquele Nokia tijolão sabe? Que se ele cair no chão quebra o chão e não ele (o que até é bom por um lado, porque sou desastrada demais). Eu sempre via TV , com aqueles atores com Iphones nas mãos, e eu aqui com um Nokia tijolão.

Megan voltou rápido, demorou uns 5 minutos e assim que entrou no quarto arrumou a sua cama e se jogou nela.

Megan : Você é uma santa ! Vai pro céu, sabia ?

Lily : Hã, como assim ?

Megan : Eu gosto das crianças, mas não aguento mais. É choro pra lá, "ele me deu língua" pra lá, gritos, brincadeiras sem graça, e o pior, algumas me chamam de tia. O-B-R-I-G-A-D-A por ter me tirado de lá.

Lily: Sei como é, passei por coisas iguais a essas, mas quando eu tinha 14, a pirralha que chorava e me deixava louca era você !

Megan : MENTIRA ! Eu era super legal, e ainda sou.

Lily : E pouco modesta também né....

Megan : Talvez um pouco.

Lily : Falou besta, vou tomar banho.

Megan : Vou dormir.

Lily: Isso significa que vai parar de falar né ? GRAÇAS A DEUS !

Megan : Idiota.

Lily : Talvez um pouco.

Sim, a Meg era super legal perto de qualquer outro que ainda estava no orfanato. O melhor na Meg é que, ela é madura.

Peguei um pijama, minha toalha, abri a porta do quarto e fui pro banheiro. Sim, você leu isso mesmo. O banheiro não era no quarto e por isso eu sempre deixava para tomar banho tão tarde. Se eu fosse tomar banho as seis horas da tarde eu ficaria numa fila gigante esperando saírem no banheiro.

Voltando a história, eu sai do quarto e fui para o banheiro. Tomei banho ao som de Beatles e provavelmente cantava tão alto quanto a música. Quando voltei para o quarto, Meg estava acordada lendo uma revista que um tal de Justin Bieber estava na capa. Assumo, ele é bonitinho, mas pelo o que eu já escutei de música (Baby, baby , baby oooh) eu prefiro muito mais um Beatles, Pink Floyd, Evanescence, U2, Rolling Stones, Bon Jovi etc. Afinal, quem é Justin Bieber perto de Paul McCartney ?