Alinhamento Astral.

Capítulo 4 - Uma chance para escolhermos


Capítulo 4 - Uma chance para escolhermos

CHARLIE

Alguns meses depois... 8 de setembro de 2013.

– Charlie, você não pode ficar assim! - ouvi a voz de Luali me chamando.

Levantei meu olhar para Lua, um pouco alheia.

– Ahn? Assim como? - perguntei.

Ela bufou, jogando seus cabelos negros e ondulados como a mar para trás e fazendo um coque frouxo. Ela desabou no colchão de ar à minha frente e sua expressão se tornou mais tristonha. Acho que tão tristonha quanto meus cabelos cinza fosco e meus olhos ainda vermelhos poderiam demostrar que eu estava. Eles não saíram da cor vermelha desde o dia em que resgatamos a irmã de Thalia. E por falar em Emily, ela acabou mesmo ficando na Caçada com a irmã, que a trata como uma boneca. Não sei se rio ou se choro.

– Pensativa assim. - ela disse, mexendo em suas cobertas.

Estávamos no acampamento das Caçadoras, em nossa barraca. Ainda não saímos da Philladelphia desde que trouxemos Emily. Não porque não quisemos, mas foi por falta de ordens da Lady Ártemis mesmo. Assim que Nico e Leo - e penso neles com alguma coisa apertando em meu peito - voltaram para o tal Acampamento Meio-Sangue que eu quis ir embora dali. Sair dali o mais rápido que eu conseguia.

– E por quê não? - perguntei, enquanto via algumas faíscas coloridas saindo da ponta dos meus dedos.

Luali observou as faíscas atentamente, provavelmente pensando em alguma resposta concreta para me dar. Ela sabia que meu estado de espírito estava perfeito para não apenas usar feitiços, como também brincar com eles. E eu não sabia o motivo exato disso, mas desde a missão no Central Park que, sei lá, eu sentia que estávamos diferentes.

– Porque é errado. - ela disse.

As faíscas explodiram de repente e nos abaixamos sobre o colchão, protegendo nossas cabeças até que fosse seguro. As mechas em meu cabelo se alteraram para um azul escuro confuso.

– O que é errado? - eu perguntei e de repente me senti ridícula.

Acho que no fundo eu sabia exatamente o que era, mas não tinha a menor intenção de admitir. Éramos Caçadoras, oras, isso não podia estar acontecendo. E era proibido!

– O que nós estamos sentindo. - Lua respondeu mesmo assim e abaixou a cabeça.

Ela devia estar pensando a mesma coisa: era algo proibido e que não deveríamos nunca estar sentindo. Mas, poxa, era meio inevitável!

– Garotas, Lady Ártemis apareceu e quer uma reunião com todas as Caçadoras! - Emily apareceu em nossa barraca nos chamando.

Eu e Lua nos entreolhando. O que será que a Lady queria?! Será que ela desconfiava de alguma coisa?! Não havia nada que pudéssemos fazer a não ser sair da barraca e ver o que acontecia. No centro do semicírculo de barracas prateadas estava uma garota ruiva de mais ou menos doze anos. Lady Ártemis em pessoa estava no centro do círculo formado pelas quase suas trinta Caçadoras.

– Lady Ártemis. - disse Thalia formalmente, à frente do grupo. Ela fez uma referência e todas nós a imitamos.

– Minhas Caçadoras. - a Lady disse. Eu ainda não havia me acostumado com receber ordens de alguém mais jovem que eu. Chegava a ser engraçado, mas da Lady Ártemis emanava um certo poder que chegava a ser intimidador. - Venho-lhes trazer um aviso.

– Que aviso seria esse, minha Lady? - perguntou uma Caçadora, que reconheci sendo Allana.

– Hoje é um dia importante. - a deusa disse. - Haverá um alinhamento entre o planeta Vênus e a Lua, que acontece apenas raramente ao longo da História. E existe um trato entre eu e Afrodite.

Ela suspirou, olhando para o rosto de cada uma de nós. Eu já sentia os fios da minha nuca se arrepiando apenas com a expectativa do que poderia ser. Em se tratando de Afrodite e pela expressão no rosto de Lady Ártemis, nada muito comum do que passávamos.

– Tanto ela quanto eu sabemos que muitas de vocês não entraram na Caçada apenas por opção e que podem ou não estarem apaixonadas. - eu apertei a mão de Lua, que eu nem percebera estar segurando. E agora?! - E não são poucas. Meu trato com Afrodite é de que, toda vez que ocorra esse alinhamento, as Caçadoras tenham o direito de passar o dia livre com seus amados.

Olhei para Lua pelo canto do olho. Finalmente teríamos a chance que tanto esperamos por meses! Mas uma dúvida se abateu sobre mim: será que eles se lembravam de nós?! Já faz tanto tempo!

– Então eu concedo a vocês o dia livre. - a Lady continuou. - E outra cláusula desse trato seria o livre arbítrio.

Todas as Caçadoras se entreolharam, procurando algum tipo de explicação. Senti meu coração bombeando ainda mais sangue do que antes.

– Ao fim desde dia, cada uma de vocês poderá decidir entre continuar na Caçada, ou sair em busca desse amor. - a deusa completou, antes de desaparecer.

E então o alvoroço se iniciou, com algumas Caçadoras xingando Afrodite, outras permanecendo caladas, decidindo-se se iriam atrás ou não. Mas eu e Lua não participamos disso. Nós nos entreolhamos e a resposta veio de forma imediata quando ela sussurrou a palavra "vermelho", olhando diretamente para a minha irís que se tornara quase permanente há meses.

E um segundo depois, corremos de volta para nossa barraca, para pegarmos nossas mochilas.

~*~

– Lua, como você tem certeza de que eles ainda se lembram de nós? - eu perguntei, descendo do lobo que nos levara até o Acampamento Meio-Sangue; a insegurança batendo com força total em mim.

Estávamos em frente ao famoso pinheiro de Thalia, aquele que Luali me explicar durante a viajem que fora a força existencial da nossa tenente durante anos. Dali podíamos ver todo o Acampamento do modo como Luali, Nico e Leo descreveram - ter que mencionar o nome deles fazia meu estômago revirar - e eu me sentia encantada. Mas eu também estava insegura e Lua viu isso em meus cabelos arroxeados quando desceu de York. Enviou York e Lancaster de volta ao acampamento na Philladelphia. Nós os chamaríamos de volta quando necesserário.

– Charlie, relaxe! - ela disse, colocando a mão em meu braço em um modo carinhoso. E meus cabelos mudaram para o lilás e Luali sorriu. Lilás significava que eu estava mais confiante. Mas eu apenas um pouco. - Pense que como a Lady Ártemis nos deu um dia livre, resolvemos passar aqui para que eu lhe mostrasse o Acampamento, que você não tinha ideia que existia.

– M-mas... - roxo novamente.

– Charlotte Hastings! - Lua exclamou e eu a olhei com os cabelos alaranjados. Ela deu um passo atrás, com as mãos levantadas em forma de rendição. - Charlie! Sem mas ok?!

– Eles podem estar lá! - eu exclamei, sabendo que ela entenderia bem quem seriam eles.

– Charlie, coloque na sua cabeça eles podem não estar ali. Existe outro Acampamento, lembra?!

Eu respirei fundo, sentindo meus cabelos retornarem ao lilás mais claro. - Tudo bem. Mas se eu sentir a aura deles, eu corro pro Chalé de Ártemis.

– Ou pro de Hécate. - disse Luali, sorrindo.

Eu revirei os olhos. - Tanto faz!

– Vamos logo, sua enrolada!

Luali me puxou pelo pulso e eu quase não consegui acompanhar seu ritmo. E era meio difícil com uma mochila prateada em um ombro e o arco com a aljava de flechas no outro. Fora que minha locomoção motora nunca fora das melhores e meu all star preto quase derrapava pela grama da colina. Eu observava a tudo de modo maravilhado. Era incrível como tudo aquilo existia entre um vale. Se eu soubesse de sua existência na época em que eu encontrara as Caçadoras, eu jamais teria aceitado entrar no grupo de Caça. Alguns campistas nos olhavam curiosos, outros nos olhavam intimidados. Não era comum Caçadoras virem sozinhas ao Acampamento.

– Ora, o que vemos aqui. - um centauro disse simpaticamente quando nos aproximamos do que Lua chamou de Casa Grande. Ele estava jogando cartas com um senhor barrigudo e com camisa havaiana e que tomava Coke Diet. Meus instintos de Caçadora me alertaram de que era um deus. Só não tinha ideia de qual era. - O que fazem sozinhas aqui, Caçadoras?

Eu olhei nervosamente para Luali, com os cabelos dourados. O centauro e o senhor barrigudo me olharam confusos e curiosos, mas nada disseram sobre minha habilidade.

– A Lady Ártemis nos liberou durante um dia inteiro. - Lua disse, olhando meio receosa para os dois.

Ambos se entreolharam. - Hoje por acaso acontece alguma coisa nos astros?! - o centauro perguntou, como se quisesse apenas confirmar.

E antes que eu percebesse, eu já assentia em concordância. - Vênus se alinha com a Lua.

– Aquela vaca da Afrodite não sabe quando parar de mexer com quem não deve. - o senhor barrigudo disse e um trovão soou no céu. - Eu não disse mais do que a verdade.

O centauro revirou os olhos, antes de se virar para nós. Para mim, na verdade. - Luali, eu já conheço de alguns anos, mas qual seu nome, querida?

– Charlotte, mas prefiro que me chame de Charlie. - eu disse, tentando parecer o mais educada possível.

– Meu nome é Quíron. - o centauro disse. - Imagino que queiram ir para os Chalés. Sabe qual seu pai ou mãe olimpiano?

– Hécate. - eu respondi e ele pareceu surpreso. - Sei que sou filha única. - continuei, sorrindo sadicamente.

– Realmente é. - ele concordou. - Lua sabe qual o Chalé de Hécate, não?!

– Acho que preferimos o de Ártemis mesmo, já que não ficaremos muito tempo. - Luali disse. - Precisamos estar de volta ao anoitecer com nossa decisão.

– Entendo...

– Já podem ir, Luanna e Carly. - o barrigudo irritante disse. - Quero terminar a partida de pinochle.

Eu revirei os olhos avermelhados. - Obrigada, senhor Quíron, acho que Lua pode me ajudar agora.

Virei as costas para eles e comecei a andar, com Luali me seguindo.

– Quem era aquele imbecil? - eu perguntei, meus cabelos alaranjados.

– Era Dionísio, Charlie, se fosse você não o xingaria assim. - Lua advertiu. - Vamos logo para o Chalé deixar nossas coisas.

Começamos a andar em direção aos Chalés que formavam um ômega, com vários campistas nos olhando. Mas apenas começamos, pois logo ouvi uma voz que fez meus pés travarem e meu coração dar um solavanco. Ele era o motivo por eu estar ali e agradecendo a Afrodite por ter feito esse trato com a Lady Ártemis. Ele era o motivo por eu estar ali naquele Acampamento, para tirar a prova de que o achava que sentia realmente era um sentia.

Lua?! Charlie?! O que fazem aqui?!

Virei-me, encontrando os olhos negros de Nico. Havia confusão em seu olhar, mesclado com algo que eu não reconheci.

Eu não tinha ideia do que fazer, mas de uma coisa eu tinha certeza: meus cabelos estavam se tornando vermelhos como meus olhos.