Aquele encontro certamente fora inesperado.

A maneira que aquela criança parecia docilmente frágil e inocente poderia mudar de uma hora para a outra. Não queria confiar nela, mas se via sem opções. Sabia que o mundo ali do outro lado daquele corredor precisava de pessoas que confiavam em si.

Se não houvesse confiança, toda a luta seria em vão... Aquele século inteiro se escondendo, seria inútil. Olhou para a cabeça que suportava uma cabeleira havana, ainda hesitante. Este, que era um humano, seguia silenciosamente o caminho, sem ao menos se preocupar com o que lhe aguardava. – Não pedia conselhos, assemelhava com quem já havia visto aquilo diversas vezes.

— Sabe, Frisk... — A voz tímida e seca de Flowey iniciou, chamando a atenção da criança para si. Ambos podiam sentir a grande pressão que o terreno vermelho sangue oferecia em maldade, aos inocentes que ainda prestavam sua caminhada para fora dali. Timidamente, libertou um suspiro. — Eu gostaria de fazer parte de algo maior.

Em resposta, o humano olhou curiosamente. Ainda soava confuso, mas parecia não admitir aquela questão. O sorriso compreensivo que formou em seus lábios, deixou com que a flor entendesse que era para continuar a dizer. – E então, Frisk questionava internamente: O que havia dado em Flowey para querer uma aproximação tão repentina?

— Ah, claro... Você não entenderia isso rapidamente. — O monstro resmungou entediado, logo revirando ‘os olhos’. A criança riu, de forma auditiva deixando em seguida o medo de lado. — É sério, garoto.

— Algo maior? Tipo o quê?

O timbre de Frisk era distante e amedrontado. Visivelmente aterrorizado pela ambientação do lugar: Tenso e mortífero, talvez não tivesse se acostumado com tudo aquilo. Era muita informação.

— Oh, tu sabes. — Respondeu. — Algo além de ser uma flor assustadiça e uma planta que é carregada por uma criança numa bota, para lá e para cá.

Abaixou a cabeça, deixando com que Frisk pudesse visualizar os detalhes do parceiro com precisão: As pétalas douradas cavoucadas e diversas perfurações deixavam um aspecto dramático ao monstrinho. É claro que Frisk decidiu permanecer em silêncio, pois suspeitou que se pronunciasse algo como Flowey parece frágil dessa forma, não ouviria o resto da tese proposta.

Decidiu prestar atenção nas Ruínas: As paredes eram carminadas, ainda moldadas em tijolos eivados – questionou-se o motivo, mas pôde pressupor que foram golpes desferidos ali. –, o soalho totalmente repleto de poeira e um rastro de algo que um dia poderia ter sido uma plantação. Parou no caminho, olhando para os monstros. Estes exibiam feições furiosas em direção à criança, mas não reagiram. Outros até mesmo recuaram, se depositando na fresta do calhamaço.

“Ah, agora eu entendi.”, expressou para si mesmo. Olhou para Flowey, que ainda estava silenciosamente murcho. As cores douradas estavam se tornando um amarelo mirrado, chegando ao ponto de ser deplorável.

— Não pensava que você se via como alguém tão... Indefeso. — Ciciou, após um longo tempo. Esteve idealizando uma frase que não parecesse ofensiva ao pequeno amigo.

— Não fale de ti na terceira pessoa, seu idiota. — Chutou brutalmente a frase, chegando a ‘cruzar’ os ‘braços’, que não eram nada além de folhas destroçadas e mordidas.

O silêncio entre os dois fora o suficiente para refletirem se faziam parte de algo. Em tentativa de aliviar a tensão, Frisk suspirou. Um pigarro logo em seguida fora feito, anunciando sua frase:

— Você acha que eu faço parte de algo maior?

Sim, ué. — Retrucou ríspido. — Você veio de uma cidade grande, com inúmeras pessoas soltas por aí. Por que você não seria parte de algo maior?

O garoto não pôde evitar que o flashback passasse em sua cabeça: Lembrou-se então, de que não havia escolha no Subsolo. Teria de ir embora, caso quisesse viver. Afinal das contas, devaneou: Era sair ou sair, afinal.

Dada a asserção no momento, a dupla só conseguia se preocupar com o que iria acontecer dali em diante: Precisava sair das Ruínas, coisa que Toriel provavelmente não deixaria acontecer. E mesmo que deixasse, o que pudesse vir a seguir seria algo pior.

— Eu não quis dizer no sentido de... — Hesitou. — Fazer parte de algo, onde nem sabem que você existe, Flowey.

Para a surpresa e espanto de Frisk, a flor falante executou uma risada impensável. Parecia escarniar em relação ao comentário do humano, galhofando ainda mais alto, era convidativo aos outros monstros a ser aproximarem, para ver o que se passava ali. Quando a casquinada deixou de ser atuada, o humano se recuperou do susto que havia tomado.

— Ah, fala sério... Não fique triste, garoto. Pensa pelo lado bom de você não ser visto... Hum... — Como se fosse uma sentença sem argumentos, Flowey dispôs-se a pensar silenciosamente, ainda buscando algo convincente ao humano. — Tipo, você pode fazer o que quiser! Não há preocupações em relações aos seus erros... Ninguém vai nota-los.

— Esse é o problema... Eu gostaria de ser notado...

Em termos de ‘não ser reconhecido’, quiçá Flowey tivesse razão. Mas o que fazer quando tu querias ser notado?

A hilaridade repetiu-se, mas fora feita desempapada. Não havia ‘humor’.

— Duvido muito, Frisk. O mundo é cruel com as pessoas que são vistas... Toda e qualquer fonte de felicidade é sugada por esse egoísmo, inveja e ódio massivo sem razão alguma. — Suspirou. — O segredo para suceder bem é permanecer oculto.

O tom sincero na voz no ser florido entregava de bandeja coisas que já aconteceram, mesmo que não tenha dito: Já esteve em inúmeras situações indesejadas e invulgares por ser algo tão destacado e chamativo. As atribulações eram vigorosas quando não estava incógnito.

Diferentemente desse momento, seus problemas eram pequenos: Lidar com Toriel defrontando diretamente. A personalidade psicótica e maníaca a tornava muito estranha, não era a melhor pessoa para se ficar por perto. Não havia solução para aquela... Monstra. Em mediante a taciturnidade acometida, Frisk ousou proferir:

— E se formos bons com o “mundo”?

Na mente da criança, havia uma lógica praticada: “Entre estar certo e ser gentil, escolha ser gentil. De certos, o universo está cheio.”, proferiu com um suspiro após repensar na sua congruência.

— Aí você enlouqueceu de vez, moleque. — Retorquiu em um tom indômito, misturado ao pânico de imaginar a cena. Tentando recobrar a serenidade de antes, arfou. — Se você for gentil, irão te matar... Ninguém mais preza por piedade.

— Mas eu irei lhes dar piedade, mesmo que eu morra no processo.

Dada à elocução, o humano cessou sua caminhada em frente a uma casa com a tonalidade mais rubra, com detalhes alabastrinos, apesar de serem tons escuros e aterrorizantes. Conjecturou silenciosamente, que aquela moradia fosse à de Toriel. Em sinal de desaprovação, Flowey achava ensandecida a ideia da criança... Estava amedrontado. Apesar de seus conflitos e demônios internos, o silêncio entre eles era confortável o suficiente.

Ainda assim, encobria as palavras ditas anteriormente na conversa. Ambos sabiam melhor do que ninguém que se quisessem superar dificuldades teria que ter proximidade um do outro.

— Sabe Flowey...

— O que foi? — Indagou ainda intratável.

— Talvez até não pareça, mas você para mim faz parte de algo gigante.

Em sinal de surpresa, as pétalas de Flowey reavivaram-se em um áureo amarelo. Frisk achou a mecânica do amigo interessante, dando uma gracejada leve. A planta riu comovida, mesmo estando acostumado com as besteiras que ouvia do párvulo. De longe, assentiu concordando que essa era uma das melhores.

Humano idiota.

— Obrigado, Frisk... Você faz parte de algo maior para mim, também.

Eles só não suspeitavam de uma coisa: Ambos eram algo muito maior do que imaginavam.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.