Akuma No Riddle: Nove Anos Depois

Capítulo 7 - Mudança Radical


***POV HARU***

Tokaku-san e eu alugamos um apartamento quase do outro lado da cidade. Tokaku pretende me fazer arrumar um emprego até mesmo fora do Japão, se necessário, e fugir daqui o mais rápido possível. Mandei meu currículo para uma empresa no Chile e outra na Suécia ontem à noite. Nenhuma das duas respondeu ainda.
– Acho que eles te perderam de vista, por enquanto – comenta Tokaku-san, pouco antes de sair – já sabe as regras. E minha pistola tá na gaveta do criado-mudo.

Quase três horas depois de Tokaku-san sair, o smartphone vibra, indicando uma nova mensagem. Desbloqueio a tela. A empresa do Chile, uma tal Laboratorio Mariño de Ciudad de Allende, respondera minha mensagem. Aparentemente, gostaram do meu currículo. Comemoro silenciosamente. Pedem para que eu me apresente em Santiago em quatro dias.

***POV TOKAKU***

As passagens de avião foram bem caras, mas tínhamos algumas economias sobrando justamente para esses casos de emergência. Tiramos um visto de curto prazo para ficar no Chile e quando Haru tiver assegurado esse emprego, vamos estender o visto para longo prazo. Haru passou a viagem toda estudando espanhol e tentando me ensinar o pouco que sabe. “Obrigada” é “gracias”, “olá” é “hola”, “meu nome é Tokaku” é “mi nombre es Tokaku” ou algo do tipo, o resto já esqueci. Temos que passar por um pequeno processo migratório – sou salva pelo ótimo inglês de Haru, que aliás, foi o que a qualificou para este emprego. Dói no fundo da alma ver todas as nossas economias se esvaindo tão rápido, “mas é por uma boa causa”, digo para mim mesma. Haru poderia ter vindo sozinha e economizado dinheiro, mas nem pensar que vou deixá-la sozinha, ainda mais num país estrangeiro e sendo alvo de assassinos.

***POV KOBAYASHI***

Azuma-san não compareceu hoje. É preocupante. Talvez esteja pensando preparar algum ataque-surpresa antes de nós. Preciso falar com Daigo-senpai. Como que por coincidência, recebo uma ligação dele nesse mesmo momento.
– Kobayashi-kun. Pode falar agora? – olho ao redor. Só as câmeras de vigilância e as cadeiras metálicas.
– Sim.
– Azuma e Ichinose fugiram do país – meu queixo despenca.
– Como é?
– Estive monitorando a conta bancária de Azuma. Elas compraram duas passagens para Santiago, no Chile – coloco as mãos na cabeça, sem conseguir acreditar.
– Bem, e o que está esperando? Consiga os documentos e as passagens, vamos para o Chile no primeiro avião de amanhã.

***POV TOKAKU***

Enquanto Haru vai para a entrevista de emprego, eu a espero na mesa da calçada de uma lanchonete bem em frente ao escritório, aparentemente uma filial do laboratório de Ciudad de Allende na capital. É um prédio de vidro e metal, todo branco, localizado em uma avenida larga e movimentada. Exceto nos filmes estadunidenses, nunca tinha visto tanto ocidental junto. Mantenho o olhar quase 100% do tempo na entrada do escritório. Há uma enorme bandeira do Chile pouco antes da entrada. Talvez seja uma empresa estatal?

Quando vejo a imagem de Haru saindo, destacada entre os ocidentais, levanto um pouco mais a cabeça. Ela se mistura na multidão, mas não a perco de vista, enquanto espera o semáforo abrir para os pedestres, e atravessa a rua a passos largos e com um sorriso aberto no rosto. Sorrio por dentro também. Ela conseguiu.

Ela se senta na cadeira de madeira à frente, carregando uma pasta de documentos nas mãos, e confirma o que eu já tinha deduzido.
– Parabéns – digo, simples – e vai começar quando?
– Eles vão pagar nossa passagem para Ciudad de Allende – “graças aos deuses”, penso – e devo começar na próxima semana.
– E quando vamos para Ciudad de Allende?
– Eles vão ligar e avisar. Dei o telefone do albergue pra eles. Nossos celulares não funcionam aqui – alugáramos um quarto num albergue barato na periferia da cidade por alguns dias – Tokaku-san... – Haru sorri de uma maneira diferente, agora. De uma maneira tímida – eu perguntei, e... – ela trava, como se não soubesse como continuar – hm... como dizer...
– O que é? Se quer dizer algo, diga logo.
– Ok. Eu estava checando e descobri que... no Chile, o casamento entre pessoas do mesmo gênero é legalizado, então, hm... eu pensei que talvez seria legal se... se a gente se casasse, você não acha? Mas é só uma ideia.

Meu coração para por um segundo. Droga, como reagir? Como reagir? Como reagir? Como reagir? Essa era a última coisa no mundo que eu esperava que ela fosse falar. Haru me encara com expectativa. Só depois de uns dez segundos percebo que estou com a boca aberta e totalmente paralisada.
– Éééééééé... – a resposta me parece tão óbvia. Mas a surpresa foi grande demais – é claro que eu aceito, mas assim, do nada.

Haru abre um sorriso ainda mais aberto do que antes; fala um tanto alto demais que sabia que eu ia aceitar e se levanta pra me abraçar, quase derrubando a mesa e atraindo os olhares de todos ao redor. Logo, ela me envolve num beijo voraz e apaixonado. Sinto seu corpo apertado forte contra o meu. Suas mãos seguram minhas costas com força e carinho ao mesmo tempo. Já nem consigo mais me importar com os vários olhares concentrados na gente.