[https://www.youtube.com/watch?v=8BRdY0NR08g&list=PLHewLtkhA4h01XSXM4wOBOYG03MPmMQ_w]

Ally

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Minha cabeça continuava encostada no ombro de Austin.

Eu só ouvia o som de nossas respirações e das ondas quebrando na areia.

Chegava a ser reconfortante. Eu não pensava nos problemas que haviam acontecido. Não pensava em Dallas. Não pensava no que ocorrera há alguns anos atrás. No fato de eu ter sofrido na mão e Alexia e de Jack. Nem no fato de eu ter crescido sem pai. Muito menos na morte da minha mãe. Eu não pensava em tudo o que já me falaram. Nos lugares que fui deixada. Em nada.

Ok... O fato de eu não pensar nisso, me fez voltar a pensar nisso...

– Ally... – o loiro tirou-me de meus devaneios.

Levantei a cabeça. Estalei o pescoço. Ficar na mesma posição por muito tempo, não foi bom.

– Posso te perguntar uma coisa? – ele questionou um pouco receoso.

– Claro! Fale. – respondo-o, interessada no que viria a seguir.

– Sabe quando eu te segurei pelos pulsos, então...

Ele foi interrompido por Dez aproximando-se.

– Pessoal. A janta já está pronta! – o ruivo falou sorridente.

Assentimos e seguimos o ruivo até a casa.

Logo quando entramos um belíssimo aroma já inundava nossas narinas.

– Lasanha? – Austin perguntou, parecendo uma criança ao ganhar seu presente no Natal.

Yap! - Respondeu Trish ao colocar a forma na mesa de jantar.

Austin e Dez logo já estavam sentados à mesa saboreando a comida.

– Ahm.. Eu já volto... – falei e fui em direção ao banheiro.

Ao entrar, tranquei a porta.

Olhei-me no espelho. Será que Austin havia visto meus cortes?

Lavo o rosto e as mãos. Seco-as rapidamente e vou para a sala de jantar apreciar o jantar.

–--Depois---

Após o jantar (com direito a muitas risadas e elogios a Trish pela comida maravilhosa), Austin deu a ideia de virarmos a noite vendo filmes, e todos concordamos. Com exceção de mim.

Por favor, eu estava morta de cansaço!

Despedi-me de meus amigos e subi as escadas. Já passava da meia-noite.

.

Austin

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Sim. Pela primeira vez na vida, eu, Austin Monica Moon, estava confuso em relação a uma garota.

Conseguiram entender isso? Eu estava confuso em relação a uma ga-ro-ta.

Nem eu me reconhecia. Depois daquele beijo da Ally, da dança na LIV, depois ela pedindo pra ninguém saber do que aconteceu quando nos conhecemos. E ainda ela nadando. Meu deus, que corpo era aquele?

Como eu não sabia que essa garota existia no Marino High School?

Mas, se bem, que se eu soubesse, eu nem conheceria ela direito. Ela teria o mesmo final de todas as outras. Na cama e depois nunca mais.

No momento estou em meio a meus pensamentos, e Trish e Dez estão assistindo Atividade Paranormal.

– Ah.. Garotos, eu vou indo. O sono é mais forte que eu. – a baixinha disse, levantando-se do sofá e subindo as escadas – Boa noite!

Devolvemos o “boa noite” a ela.

Quando Trish desapareceu no andar de cima, a televisão foi desligada por Dez.

– Eai cara, fala.

Questionei-me interiormente sobre o que eu deveria falar a Dez. Nem eu mesmo sabia.

– Falar o que? – perguntei.

Ele revirou os olhos e encostou-se ao sofá.

– Disse a Ally sobre o que viu na praia? – ele soltou.

Olhei para a escada vendo se nenhuma das garotas estava lá.

– Dez! – repreendi-o. – Fale mais baixo!

– Ta... – ele revirou os olhos, novamente.

– Mas não.. Não consegui falar.. – falei, com expressão decepcionada.

Eu estava preocupado com Ally. Quando eu a segurei pelos pulsos, ela só não começou a chorar, pois eu a soltei. Será que ela havia se machucado? Ou pior, se automutilado?

Não.. Tirando o “desentendimento” que ela teve com aquele filho da puta da LIV, ela parece ter uma vida perfeita.
Mora com o irmão. Estuda numa das melhores escolas de Miami. Parece que ela é só mais uma adolescente sem problemas na vida.
Diferente de mim, obviamente.

– Austin! Em que mundo você está? – Dez me alerta. Pelo tom de sua voz, ele deveria estar me chamando a um bom tempo.

– Ah! Desculpa cara.. Acho que vou ir dormir.. Boa noite. – falei rápido, subindo as escadas.

Todas as luzes do andar de cima estavam apagadas, e com as portas fechadas.

Só uma luz azulada vinha do quarto de Ally.

Aproximei-me do quarto da garota e a vi.

Ela estava sentada no chão, em frente da janela. Via-se a lua lá fora, e sua luz era a única coisa que iluminava.

Seus braços abraçavam seus joelhos, e sua cabeça estava encostada na parede.

Ela estava com os olhos fechados. Algumas lágrimas rolavam em suas bochechas. Ela abriu os olhos e olhou para mim assustada.

– A-austin! – Ally passou o dorso do punho no rosto, limpando as lágrimas. Seus pulsos, novamente estavam cobertos por um casaco.

– Ally.. O que aconteceu? – falei, agachando-me a sua frente.

Ela deu um sorriso triste e olhou para baixo.

– Problemas. Somente problemas... – a morena disse em meio a um suspiro cansado.

– Quer conversar sobre? – tentei.

– Uhum. – ela murmurou, limpando as lágrimas.

Levantou-se do chão, e pegou minha mão. Guiando-me até o andar de baixo.

Dez não estava mais lá. Provavelmente subiu e (avoado como só ele é), passou reto pelo quarto da morena.

Ela pegou a chave que estava no porta-chaves ao lado da porta, e nós saímos da casa.

Caminhamos pela rua de paralelepípedos até a areia gelada. Percebi que ela tremia, e que estava de pés descalços.

Abracei-a de lado, e ela mandou um sorriso triste, novamente.

Ao chegarmos onde a areia era bem macia, sentamo-nos no chão.

Ela respirou fundo.

– Há alguns anos atrás, eu sofri alguns problemas. Coisas que qualquer pessoa passa. Não aceitação por algumas pessoas. Problemas em família. Problemas escolares. E o problema que tive com Jack, que você já sabe.

Assenti. Dava para ver como era difícil pra ela falar isso.

– Mas isso pode acontecer com qualquer pessoa. – ela fala e suspira, contendo o choro. – Só que desde sempre eu tive problemas. Minha infância foi difícil. Foi difícil para mim e para Dallas. Ele teve que me criar. Ele sacrificou sua infância e sua adolescência pra cuidar de mim.

Ela para de falar um pouco e algumas lágrimas caem.

– E isso foi um peso pra mim. Além de aguentar os problemas dele mesmo, ele tinha que aguentar os meus. Eu me sentia mal por ele. – ela falava, e me olhava tristemente. Percebi que profundas olheiras marcavam seus olhos. – Foi quando eu tive meu primeiro contato com a exclusão da sociedade. Austin. Eu não tinha pai. E minha mãe era uma alcoólatra maluca! – ela soluçava e falava ao mesmo tempo.

Fiquei meio em choque com a quantidade de informação. Então ela também crescera sem pai, nem mãe?

– Eu tinha inveja dos meus colegas de aula, falando de seus pais com tanto orgulho. E eu não podia fazer o mesmo. Quando eu tinha torno de dez anos, eu fiquei órfã, Austin! Órfã! Sabe o quanto é difícil para uma criança viver sem uma mãe e nem um pai? – ela chorava, gritava e soluçava. Sim Ally. Eu sei como é isso. Infelizmente eu sei.

– E ainda por cima, era zoada por todos. “Olha, ela é órfã!”, “Hey Alicia, onde está seu pai para te buscar?”. – ela imitava. – Ou o que foi o meu limite. “O que vai dar de Dia das Mães para sua mãe, quem sabe uma garrafa de cachaça?”.

Só se via dor no rosto de Ally. Era difícil para ela falar aquilo. E eu estava me culpando por ter perguntado se ela queria conversar.

Ally cariciou seus pulsos por cima do casaco, e puxou as mangas para baixo.

Em sua pele branca, via-se marcar vermelhas e roxas. Linhas, cortes. Cicatrizes.
A abracei novamente. Ela voltou a chorar.

– Foi meu limite, Austin. Eu não aguentei. Cheguei a bater em alunos do meu colégio antigo. Minhas notas só pioravam. Ninguém sabia do que estava acontecendo comigo. – ela soltou-me e olhou-me com aqueles olhos castanhos gigantes. Eles estavam opacos, sem nenhum brilho. Fiz uma nota mental, faria aqueles olhos voltarem a brilhar novamente.

– Dallas achou que fosse algum tipo de problema na escola, e nós resolvemos que o melhor seria me trocar de colégio. – ela limpa as bochechas encharcadas de lágrimas. – Quando eu me formei no ensino fundamental, fui direto para o Marino High School. Onde ninguém sabe que eu sou órfã. Ou que eu tenho problemas. Para todos eu sou só a garota que tira notas altas, e que não se encaixa nos grupinhos populares. – ela ficou séria e me encarou. – E você é o primeiro que sabe disso tudo.

– E por que estava chorando quando eu entrei no seu quarto? – perguntei e percebi que nossas mãos ainda estavam unidas.

– Havia sonhado com minha mãe. Eu a via se embebedando, e não podia fazê-la parar. Foi só um sonho ruim.

Processei tudo o que ela havia me contado. Era informação de mais para mim, mas tentei manter a calma.

– Sabe, você foi corajosa pelo fato de me contar isso, mesmo nem me conhecendo direito. – Eu disse a ela, sorrindo minimamente.

– Loiro, nós nos beijamos quando nos conhecemos. E você acha estranho o fato de eu te contar algo sem te conhecer? – ela falou, e cruzou os braços.

– Ei! Não me chame de loiro. – Eu disse, imitando seu gesto.

– Isso foi um *déjà vu? – Ally disse, e eu soltei uma pequena risada.

Ela deu um meio sorriso, e me abraçou fortemente.

– Obrigada por me ouvir. – ela sussurrou no meu ouvido.

– Não foi nada, mas está na hora de eu te contar a minha história.

Separei o abraço, e ela me olhava confusa.

É... A conversa ia ser longa.