Acordei com o sol na minha cara.

O jeito mais clichê de se acordar num sábado de sol. Um ensolarado e quente sábado.

E quando eu digo quente, é realmente quente. Eu estava suando. Não, eu estava ensopada de suor. Necessitava de um banho imediatamente.

Olhei para o lado, esperando encontrar Trish deitada no colchão ao lado, mas só encontrei um bilhete.

Ally,

Eu fui para casa mais cedo.

O calor está infernal!

Mais tarde eu falo com você!

Tenho uma SURPRESA!!!

Beijinhos, Trish ♥

Olhei para o relógio ao lado da cama. Dez horas e trinta e nove minutos.

Cedo de mais para um sábado, mas eu derreteria se esperasse mais.

Levantei-me e fui ao banheiro. Despi-me e entrei debaixo do chuveiro com a água fria. Eu odiava dias quentes. Além de quase derreter, eu não tinha nenhuma desculpa de como esconder meus cortes.

Lavei os cabelos, e logo já estava mais fria e sem calor.

Como estava sozinha em casa (e como eu ficaria assim nos próximos seis meses), coloquei um short jeans e uma regata, deixando meus cortes e cicatrizes á mostra.

Fui à cozinha para, finalmente, ingerir algo que não fosse industrializado (ou alcoolizado).

Abri os armários e a geladeira. Eu realmente precisava ir ao mercado.

Peguei uma parte do dinheiro que Dallas havia deixado, coloquei algumas pulseiras para não ter olhares curiosos na rua, e calcei um tênis.

O mercado era perto de minha casa, então fui andando mesmo. Só compraria o necessário, afinal, não conseguiria carregar tudo.

Peguei meu celular, e as chaves. Sai de casa, tranquei a porta, e assim que coloquei os pés na rua, alguém trombou em mim.

Era uma garota ruiva. Ela usava roupas de corrida, uns óculos Ray-Ban. E tinha um ipod em suas mãos. Estava ouvindo uma música muito alta, que transpassava o fone de ouvido. Eu conheci como Green Day.

Mas ela passou como se nem tivesse me visto. Como se estivesse tropeçado no próprio pé.

Eu não sabia se ela não prestou atenção por causa da música, ou realmente ela não me via.

Eu já havia pensado nessa opção uma vez. As pessoas passavam por mim e não me viam. Ninguém nunca olhou para mim.

Em algumas ocasiões, nem meus próprios amigos me viam.

No pequeno tempo que passei de casa até o mercado, e do mercado até em casa, consegui refletir bastante.

Já estava em casa guardando as compras.

O mundo girava e eu estava parada. Faltavam apenas cinco dias para eu me formar. O que eu faria?

Qual seria meu futuro? Eu não havia pensado em nada!

Eu não posso depender de Dallas para tudo.

Como eu queria que meu irmão estivesse aqui comigo.

Dallas sempre foi meu porto seguro para esses casos de eu precisar de alguma coisa. Ele me amparava, conversava comigo, me ajudava a decidir, me ajudava com qualquer problema.

Quando aconteceu o.. Ah! Foda-se. Quando eu fui estuprada, ele me amparou me ajudou em tudo. Não sei quantas noites fiquei chorando com ele consolando-me.

Cada pesadelo, ele me acalmava.

Cada choro, ele secava.

Cada vez que eu caia, ele me segurava.

Limpei a pequena lágrima que caiu em meio a meus pensamentos.

Terminei de guardar as compras. Coloquei uma lasanha congelada no micro-ondas e deixei esquentando.

Levaria aproximadamente vinte minutos.

Subi as escadas para pegar um moletom. O tempo havia mudado e estava nublado e frio.

O que não era normal para Miami. Apesar de estarmos no início de Dezembro era bem raro de se ter frio no inverno.

Logo a comida estava pronta.

Sentei-me a mesa e comecei a comer. Somente a lâmpada branca da cozinha estava ligada. O resto da casa meio escura, por causa do tempo nublado.

Como a vida estava monótona e pacata.

Eu acho que sempre foi assim, eu que não percebia.

Peguei meu celular e coloquei alguma música para tocar. Antes de eu fazer qualquer coisa, havia duas ligações perdidas. Era o número de Dallas. E haviam sido feitas na madrugada. Como eu não havia visto antes?

Mas isso era impossível!

A hora que a ligação foi feita, Dallas ainda estava dentro do avião. Foi pouco depois de eu ter saído de casa para a LIV.

Retornei a ligação.

Chamava, chamava, chamava e ia para a caixa postal.

Liguei novamente.

O mesmo acontecia.

Eu já estava ficando apreensiva. Se algo aconteceu a Dallas?

Ele era a única pessoa que eu tinha na vida! O que seria de mim sem ele?

Não, eu não poderia pensar nessa possibilidade. Comecei a chorar, só por pensar em Dallas não estar mais vivo.

Liguei novamente.

No quinto toque, alguém atendeu.

Alô?

– Dallas? É você?

– Eai maninha! Como ta a vida aí em Miami sem mim?

Soltei um longo suspiro, e dei um sorriso.

– Dallas! Seu.. Por que não estava atendendo? – Sim, eu estava brigando com meu irmão, que por sinal é cinco anos mais velho que eu.

– Te pergunto o mesmo maninha... Eu te liguei antes, e você não atendeu. – ele suspirou pesadamente. – O avião teve que fazer um pouso forçado no Texas, mas logo consegui outro e já cheguei à Austrália. Estou são e salvo, não se preocupe.

– Ok... É que eu me preocupei..

– Não se preocupe Ally, seu irmão sabe se cuidar.. Tenho que ir. Depois nos falamos.

– Ok. Tchau Dallas.

– Tchau tchau, maninha.

E ele desligou.

Larguei o celular em cima da mesa.

Apoiei os cotovelos na mesa e escorei a cabeça nas mãos.

Meus dedos estavam gelados. Coloquei-os em cima de meus olhos fechados. Isso aliava a dor de cabeça que eu sentia a todo o momento.

Acho que era excesso de estresse ou excesso de problemas e pensamentos. Era muito para mim.

Assustei-me com Someday do Nickelback tocando. Era a música favorita de Trish, e ela insistira para que eu colocasse somente o refrão como o toque de seu número.

– Oi Trish...

Alicia! Eu, o ruivo e o loiro estamos te esperando aqui na minha casa com uma surpresa. Sem reclamar, nem negar. Venha aqui e traga uma mochila com algumas trocas de roupa e um biquíni. Tchau, tchau amiguinha! – e por fim ela deu uma risadinha, desligando o aparelho.

Soltei um pequeno sorriso. Aqueles três estavam aprontando e me levando junto. Eu poderia querer outra coisa? Pelo menos a monotonia iria embora.

Olhei para o relógio. Duas e quarenta e três da tarde.

Peguei algumas mudas de roupa, e meu biquíni. Meu diário caso eu quisesse escrever algo. Celular, carregador. Minha caneta da sorte.

Assustei-me (novamente) com Someday do Nickelback tocando.

Venha logo Alicia! Não é você que está tendo que aguentar duas crianças aqui! – ela fez uma pausa – Dezmond, larga isso, me devolve! Austin, como é que desliga essa.. Pessoa, se é que eu posso chama-lo assim!

Desliguei o aparelho rindo da cena que acabara de ouvir. Como não amar essas pessoas?

Coloquei o último objeto dentro da mochila, e a fechei.

Fechei a casa, e andei até a casa da mexicana.

Chegando lá, avistei uma picape azul em um ótimo estado, estacionada em frente à casa da família De La Rosa.

Bati na porta e antes da segunda batida, a porta se abre e sou puxada para dentro.

Trish me abraça, e da um sorriso ao ver que eu vi com uma mochila e com tudo o que ela pediu.

– Garotos! Ela chegou! Vamos! – ela gritou escada à cima, e Dez e Austin desceram correndo.

Dez me deu um simples abraço e Austin fez o mesmo.

– Aonde vamos? – perguntei, não entendendo nada.

– Para Cocoa Beach! – a latina disse, levantando os braços.

Meus olhos quase saíram das órbitas.

Cocoa era uma das melhores praias da Florida. Não.. Não era uma das melhores... Era A melhor.

– Meus pais tem uma casa lá, e perguntaram se eu não gostaria de convidar meus amigos para ir. Já que estamos nos últimos dias de aula, e ninguém ficou em nenhuma recuperação. – Dez falava e levava as coisas para a picape.

– Mas teremos só quatro dias e três noites lá, já que temos que estar aqui no fim de semana para a formatura. – Austin desceu as escadas com duas mochilas e continuou a fala do amigo.

– E como nós fomos espertos e compramos nossas roupas da formatura antes, podemos relaxar á vontade. – Trish finalizou.

– Mas você precisa aceitar a proposta né Ally? Se não, não vamos... – Austin falou.

Dez apareceu na porta, e encostou-se no batente da mesma.

Olhei para os três. Eles pareciam animados para a viagem. Trish fitou-me esperançosa.

Mordi o lábio inferior.

– Ok. Vamos... – Dez e Austin comemoraram com um toque estranho. Trish lançou os braços para o alto, comemorando. – Com uma condição! – continuei e todos me olharam curiosos.

– E qual seria a condição? – Austin perguntou.

– Eu vou na caçamba! – gritei e corri porta á fora até a picape, subindo na caçamba.

Os três riram saindo da casa. Trish trancou a casa.

Dez falou algo para Austin, e o mesmo sorriu e concordou. Trish entrou no carro, e Dez fez o mesmo.

Austin subiu na caçamba junto comigo e sentou-se ao meu lado, largando as mochilas.

Trish abriu a escotilha.

– Comportem-se crianças! Temos três horas de viagem pela frente!

– Pode deixar Trish! Vamos nos comportar bem! – Austin disse, passando o braço sobre meu ombro.

Sorri, corando levemente. Trish revirou os olhos e fechou a escotilha, sentando no banco do carona.

Desvencilhei-me de seus braços.

– Você não cresce né? – falei, rindo.

Ele deu de ombros, pegando o violão que estava ao seu lado.

Ele dedilhou algumas notas.

– Você toca? – perguntei.

– Não Ally... Eu não toco. Isso é somente uma ilusão de ótica! É uma miragem! – ele falou, e o sarcasmo era quase um objeto concreto.

Lancei-o um olhar reprovador e ele riu.

Logo começou uma melodia bem conhecida.

Today I don't feel like doing anything
I just wanna lay in my bed
Don't feel like picking up my phone
So leave a message at the tone

Realmente, ele cantava essa música melhor que o próprio Bruno Mars.

'Cause today I swear I'm not doing anything
I'm gonna kick my feet up then stare at the fan
Turn the TV on, throw my hand in my pants
Nobody's gon' tell me I can't
I'll be lounging on a couch, just chilling in my snuggie
Click to MTV so they can teach me how to Dougie

Trish abriu a escotilha novamente, e agora todos conseguiam ouvir Austin cantando.

Oh, yes, I said it
I said it
I said it, 'cause I can

Acompanhei-o no refrão.

Today I don't feel like doing anything
I just wanna lay in my bed
Don't fell like picking up my phone
So leave a message at the tone
'Cause today I swear I'm not doing anything
Nothing at all

Eu cantei a próxima parte, imitando os mesmo gestos de Bruno Mars no clipe, arrancando gargalhadas de Austin.

Tomorrow I'll wake up
Do some P90X
Meet a really nice girl
Have some really nice sex
And she's gonna scream out this is great
(Oh, my God, this is great)

E assim passamos às três horas de viagem, rindo, cantando e, bem.

Sendo felizes.

Mas, essa felicidade duraria muito tempo?