Ainda Vou Domar Esse Animal

A Escola da Alien (Bônus 7)


O João e a Mari voltaram de viagem há pouco mais de um mês. Trouxeram sombreros para todo mundo, mas o pior foi o presente da Alien. Aquela lá é louca como o animal. Ela, dando continuidade para a obra dele, acrescentou mais um personagem para a saga do Marciano e da Mimosa: Muchacho, o marciano mexicano. Aquela louca desenhou um alienígena vermelho, com um bigodão verde, sombrero e poncho. Agora, as aventuras do et e da vaca giram em torno das pirâmides maias e astecas. Ninguém merece! Isso deu uma ideia de porco para o Ricardo e ele está desenhando uma espécie de volta ao mundo, com marcianos de vários países.

Eu, agora, estava aproveitando para cuidar um pouco de minhas orquídeas. Desde o nascimento do Marciano, as tenho negligenciado, não que o Ricardo não cuide delas, mas ele deu a estufa para mim e deveria ser minha responsabilidade. Eu gosto, mas meus filhos não me deixam muito tempo e, o pouco que me sobra, o Animal me rouba, não que eu esteja reclamando, mas se isso resultar em outro alien eu capo ele. Dois já dá para rir e chorar e estou ficando sem apelidos.

—Se escondendo de nós, Coelhinha? –O Ricardo apareceu com o Marciano no colo e me deu um selinho, antes de se afastar e ficar me olhando trabalhar.

—Eu só estou vendo como estão minhas orquídeas. Algum problema? A Alien está bem?

—Ela está lá animada com o Moacir e tentando decidir qual mochila ela vai usar para a escola. –Ele falou “escola” com um ódio que até me assustei.

—Você ainda não consegue aceitar que sua garotinha está crescendo e vai para a escola amanhã, não é?

—Como eu poderia? Ela ainda é muito pequena, Sofia! Deveria ser proibido mandar crianças tão novas para a escola. Eles vêm com essa de que é para socialização, mas tem um estudo que comprova que toda criança é egoísta. Você acha tão bonitinho aqueles grupinhos juntos que parecem que estão interagindo e se divertindo, não é? Isso é uma grande mentira. Até uma certa idade, as crianças podem até ficarem em grupos, mas cada uma fica isolada em seu próprio mundinho e ai da outra criança que tentar meter a mão no brinquedo alheio. Não admira que haja tantas brigas entre os pequenos. –Ele desabafou.

Eu apenas fiquei olhando para ele e tentando segurar o riso. Desde que a Bianca vai completar 4 anos, nós tivemos que arrumar uma escola para ela, mas isso não significa que ele esteja feliz. Ele resmungou com a compra do material escolar e tentou colocar obstáculos para as escolas que visitamos. Olhamos 5 até ele se decidir por uma que ele achava segura. Outro problema foi o transporte. Meus sobrinhos vão de van e minha cunhada me passou o número do cara que trabalha com isso, mas ele quase surtou quando eu dei a ideia. Aguentei meia hora de por que não deveríamos deixar nossa garotinha na van. Por fim, o Moacir, que também não aguentava mais ele reclamando, se ofereceu para levar e buscá-la todo dia que eu não pudesse.

—Ela vai completar 4 anos, amor. Ela precisa ir para a escola. –Falei.

—Precisa? Lá eles só irão ensinar ela a amassar massinha, rabiscar uma folha de papel, merendar e tirar uma soneca. Isso nós podemos fazer em casa e bem melhor, ensinando algo que realmente valha a pena. Ela já até consegue identificar os números e algumas letras. Eu ensinei. A escola será uma perda de tempo! Ela está mais adiantada que qualquer um lá.

—Não duvido disso, mas ela precisa ir para a escola. Quanto mais cedo ela começar, mais cedo ela poderá acabar. Não queremos que ela fique atrasada em relação aos demais, queremos?

—Não. –Resmungou.

Eu olhei para ele e a carranca que ele tentava manter no rosto era adorável. Eu sei que não era para eu achar graça, eu entendo os medos dele, mas ele é um pouco dramático. Ele faz muita tempestade em um copo de água.

—O Marciano já comeu? –Perguntei, ao ver o meu garotão, de 8 meses, se mexendo nos braços dele.

—Ainda não.

—Vamos alimentar esse bebê, então. Leve ele para dentro que eu já vou lá.

O Ricardo foi resmungando um pouco. Eu terminei o que estava fazendo, me limpei e fui dar de mama para ele. Ele já estava criando dentinhos e doía pra cacete, mas, sabendo do humor do Ricardo e o quanto ele acha lindo me ver alimentando o Zé, eu deixei que o pequeno Marciano mordesse um pouco meus seios. Vou me arrepender depois, mas se isso fizer o Ricardo se acalmar, valerá a pena.

Não fez. Ele continuou bufando e andando de um lado para o outro até a hora que nos deitamos na cama. Nem deitado ele sossegou. Vez ou outra eu também escutava alguns bufos e resmungos vindos dele. É, amanhã o dia será longo...

***

Eu levei a pequena Alien para a escola. O Ricardo veio junto e ainda foi sentado no banco de trás para poder ficar abraçado com ela. Ela estava muito animada e, para o desespero de seu pai, não parava de matracar sobre a escola. Assim que chegamos, ela desceu do carro, me deu um beijo e correu para abraçar o Ricardo.

—Eu te amo, pai. –Ela falou.

—Também te amo, Alien. Cuidado lá, hein. Me prometa: se tiver algum problema, fale com a professora e eu venho correndo. –Ele pediu.

—Tá bom.

Ele a abraçou mais uma vez e ela saiu correndo para dentro da escola.

—Ela ainda é tão pequena. A mochila é maior que ela. – Ele sussurrou, com os olhos cheios de lágrimas.

—Ei, ela vai ficar bem. Nós vamos ficar bem. –Falei, o abraçando pelas costas e escondendo o meu rosto lá. Eu não vou mentir, também estava assustada, mas alguém precisa ser forte aqui.

Dirigi de volta para casa. Durante todo o dia, ele ficou agarrado ao Marciano. Ele vai estragar esse garoto como ele estragou a pequena, mas eu não posso reclamar agora. Ele nunca ficou tanto tempo longe dela. A escola tinha também a opção de tempo integral, mas, com ambos os pais em casa, não precisamos de nossa filha afastada mais que o necessário. Optamos só pelo matutino. Meio dia e vinte estaremos lá no portão para pegar nossa pequena Alien.

***

Chegamos à escola não era nem meio dia. Fomos os primeiros pais. O Ricardo, fazendo jus ao seu apelido, andava de um lado para o outro como um Animal enjaulado. Assim que deu o horário, a Bianca provou que era filha de seu pai e foi a primeira a sair. Ela correu para os braços do Ricardo e ele para os dela. Me lembrou aquelas cenas de filmes românticos, foi engraçado de ver. Ele a pegou no colo e veio caminhando para mim com um sorriso no rosto e uma Alien que não parava quieta.

—Como foi o seu dia, amor? –Perguntei, beijando o topo da cabeça dela.

—Foi legal, mamãe! Brincamos de massinha. A tia Débora ensinou a gente a fazer a letra a, mas eu já sabia.

—Você gostou então? –O Ricardo perguntou, triste.

—Gostei, mas eu gosto mais de você, papai. O senhor é mais inteligente que a tia Débora e sabe ensinar melhor.

E isso fez brotar um sorriso bobo no rosto de um velho Animal.

—Fez algum amiguinho? –Ele perguntou, mais animado.

—Fiz! Acredita que tem um garoto chamado Pedro? Como o Imperador Don Pedro das suas histórias. Ele parece ser legal. Ele me deu um biscoito no lanche.

E isso tirou o sorriso bobo do rosto de um animal. A pequena continuou tagarelando do pequeno Pedro e o Ricardo perguntou sobre outras crianças. Segundo ela, os outros eram chatos, apenas o Pedro era legal. É, acho que a escola vai ser a menor preocupação dele agora. Sinto que ele já odeia esse Pedro. Tenho pena dela quando ela chegar na época de namorar, o Ricardo vai ser um sogro pior que o meu pai.

Fim!