After Ever After-Interativa

Chapter XXXI - Superficialidade e Escuridão


Spencer Smith

Eu odiava aquela escola. Realmente odiava.

Se Malik me ouvisse dizer isso, provavelmente diria que eu odiava praticamente tudo, o que é mentira. Existem muitas coisas que eu não gosto. Mas a escola eu detesto.

Era o meu primeiro ano no Ensino Médio, e eu ainda não havia me acostumado com a ideia de fazer parte dos mais novos da escola. Quero dizer, na minha última escola, eu era da turma dos mais velhos. Os mais velhos populares. Os mais velhos populares que podiam fazer tudo o que queriam simplesmente por serem mais velhos. E aí, da noite pro dia, viro a mascote da escola e a 'assistente' da nova rainha da escola - posto que eu costumava ocupar.

Então, caso eu não tenha conseguido fazer meu ponto (meio impossível), eu realmente direcionava grande parte do ódio por mim contido para Ever After High. A única pessoa que tinha aceitado ouvir isso tudo e fazer um comentário minimamente aceitável no final fora Tristan, que falara que pelo menos eles têm clube de moda, como eu sempre quis. Nem Ella De Vil, minha melhor amiga virtual, havia conseguido ouvir tudo sem me cortar e dizer que aquilo era uma porcaria. E se nem a Ella consegue, é porque a coisa está feia.

De qualquer maneira, eu descobri bem cedo que o melhor a se fazer era, ser a pequena Destiny Snow. Pelo menos eu ganharia status quando ela fosse para a faculdade ano que vem.

Então lá estava eu, andando ao lado da abelha rainha da escola, junto à Lily Mouse, fingindo prestar atenção ao que ela dizia. E, acredite em mim, eu sou muito boa nisso.

— Aí ela me mostrou o anel como se fosse a melhor coisa do mundo e eu fiquei tipo, "menina, se toca"– ela dizia, como se fosse o fim do mundo – Quero dizer, aquela coisa não tinha nem dois quilates. Sério.

— Wow. Que ultraje – eu comentei, como se realmente estivesse ouvindo tudo o que Destiny falara.

— Eu sei, né. Mas tenho mais o que discutir no momento – a Snow sorriu, travessa, e eu coloquei meu celular na bolsa – Vocês não vão acreditar em quem é o meu colega de laboratório.

— Quem? – Lily perguntou interessada, e eu assenti, encorajando Destiny a contar.

— Ahren Queen – ela revelou, e Lily pulou logo em cima da frase.

— Ele é tão badboy— a menina praticamente suspirou, ao que eu franzi as sobrancelhas e Destiny fez uma cara de desprezo.

— Max O'Crown é um badboy. Ahren Queen é um esquisitão – Destiny pontuou, mas abanou a mão como se aquilo fosse irrelevante – O ponto é, sua irmã gêmea e Augustus Hook estão na mesa ao lado.

— Ai. Meu. Deus – eu digo, e aposto que meus olhos brilharam – Ele já ameaçou transformar ele em o quê?

— Em um sapo e em uma formiga, na verdade – Destiny continuou, maldosa – Mas espere pelo melhor. O professor Lewis, de laboratório e física, queria ver o que cada um sabia fazer com um tubo de ensaio. O Queen fez um troço azul e gosmento, que explodiu quando Augustus encostou e a voz dele ficou muito esquisita. A turma inteira começou a rir dele, e Ahren ainda ganhou pontos para nós dois antes de ser mandado para a diretoria.

Lily desatou a rir escandalosamente, enquanto eu me resumi a um sorriso maldoso e um chacoalhar de ombros que indicava diversão. Aquilo parecia ter sido extremamente divertido de se ver, mas infelizmente, eu ainda era só uma primeiranista. Ops.

Eu estava prestes a fazer algum comentário perspicaz quando o sinal que indicava final do intervalo entre aulas tocou. Eu chegaria atrasada na única aula com a qual eu realmente contava para alguma diversão, o laboratório de química.

Com um tchau rápido para minhas amigas, saí andando apressadamente para meu escaninho, que era, por sorte, perto da sala. Chegando lá, abri a porta de metal rapidamente e com força, e ouvi-a bater em alguém. Fechei-a de leve e vi um garoto alto, moreno e lindo, diga-se de passagem, afagando o próprio ombro (onde o armário provavelmente o acertara).

— Me desculpa – sorri para o garoto, embora eu não soubesse se realmente me fizera algum mal acertar ele – Não foi a intenção.

— Claro que não – ele sorriu de volta, e estranhei que não se apresentasse – Não se lembra de mim, não é mesmo?

— P-perdão? – pergunto, desconcertada. Eu com certeza me lembraria de conhecer um menino tão bonito assim.

— Eu te conheço, Spencer – o menino disse, e eu devo ter ficado com cara de interrogação – Vejamos... aniversário do teu irmão...dois anos atrás.

Então algo estalou dentro da minha cabeça e tudo subitamente fez sentido. Eu estava falando com Finn Haddock, o melhor amigo de Malik. Olha, em minha legítima defesa, há dois anos ele era menor, bem mais fraco e usava um corte de cabelo muito diferente (para não falar que parecia usar uma máscara de borbulhas). Uma menina nunca diria que era a mesma pessoa.

— Finn! – exclamei, e ele sorriu – Me desculpa de novo! Fazia um tempo que não te via, e-

— Ah, não, não tem problema. Não é como se nos tivéssemos visto muitas vezes de qualquer forma – meu Deus, ele não para de sorrir – E você também está muito diferente. Era só uma garotinha quando te vi.

— Você também está bem mudado – eu sorri, examinando-o o mais discretamente possível. Era bem verdade: Finn havia melhorado muito a aparência.

Eu ainda o mirava, enquanto ele contava algo sobre a irmã enquanto tirava um livro pesado do armário, quando a porta da sala C03 se abriu violentamente. Uma mulher que reconheço como Wendy Darling coloca-se para fora e fuzila o garoto com os olhos, apoiando as mão nos quadris e batendo seu pé.

— Senhor Haddock! – ela diz, fazendo com que Finn se vire rápido até demais para ela – Atrasado de novo?

— Mil desculpas, senhora Darling – ele pediu, pegando o livro que havia derrubado no chão – É que achei a senhorita Smith nos corredores e ela estava precisando de ajuda com seus livros.

— Eu n-

Ele cutuca com o cotovelo e pergunta:

— Se importa se eu entrar agora?

Ela me mirou antes de responder, analisando a justificativa de Finn. Por fim, suspirou e apontou para dentro da sala.

— Entre logo, Haddock. Eu não quero ter de te marcar falta logo na primeira semana – a professor constatou, e o garoto sorriu em despedida para mim enquanto se ia afastando. Antes de realmente entrar na sala, me deu uma piscadela que provavelmente queria dizer até mais e sumiu. Parece que, como Malik, Finn tinha um lado rebelde. Meu lado preferido dele, por assim dizer. A professora, porém, continuava na porta – E você senhorita Smith. Perdeu alguma coisa por aqui?

— Não, senhora Darling – disse, sorrindo o mais inocentemente que conseguia antes de arrancar o livro e o caderno de História da Magia do armário e fechá-lo com força –Tenha um bom dia.

— O mesmo para você – e bateu a porta de sua própria sala.

Soltei o ar e relaxei as costas antes de bater na porta da sala C02. O professor de História veio rapidamente até a porta, e me olhou torto ao abrí-la. Admito que deve ter sido por causa do olhar que eu lhe dei primeiro – que era justificável, considerando que quem tinha falado comigo era uma coruja

— Suponho que a senhorita seja Spencer Smith? – ele perguntou, ríspido pousado na maçaneta da porta, e eu assenti rapidamente – Ah, nossa atrasada. Meu nome é Arquimedes, seu professor de História da Magia.

— Perdão?

— Arquimedes, como o matemático – ele repetiu, como se fosse burra – Entra, anda logo. Como chegou atrasada, acho que posso me dar ao luxo de escolher um lugar para você. – diz, voando para um poleiro de pássaro que estava no centro da sala.

Só tinha um lugar naquela sala que eu queria, e, por acaso, era ao lado da garota que usava um lindo Alice + Olivia. Ela tinha grandes cabelos ruivos, pele branca e olhos verdes, além de um ótimo senso de estilo. Porém, Sr. Arquimedes, apontou um lugar na primeira fileira, entre Jasper Charming-Snow e um garoto oriental. Torci meu nariz, algo que não deve ter passado despercebido à coruja que soltou uma gargalhada bem alta (pelo menos acho que foi uma gargalhada).

— Senhor, eu realmente-

— Quietinha e sentada, senhorita Smith – ele me cortou brutamente, e eu pisei forte até a cadeira – Espero que tenha gostado de seu lugar, pois é seu até o final do ano.

Não contive minha cara de espanto, o que fez Jasper rir baixo e balancear a cabeça enquanto anotava algo sobre a Era Clássica. Bufei ao me sentar, reparando que a aula já continuava, e abri meu livro na página indicada pelo quadro. Aquele seria um longo ano.

Frederick Allen Frost

Eu cheguei em casa relativamente cansado naquele dia. Quinta-feira era dia de educação física para todos os segundanistas, e o professor Olympia realmente não entendera que pegou uma turma nada nivelada, fora que, para o físico dele, nenhuma atividade nunca cansaria. Tenho a certeza que caso não tivesse o dom do gelo de meu pai e mãe, teria suado feito um porco.

Fui direto ao meu quarto, girando o meu bastão entre os dedos, a mochila pendurada desleixadamente em um dos ombros. Matt, que estivera colocando o carro na garagem, parou na porta do meu quarto quando me viu jogado na cama.

— Sabe, Freddy, você é meio cansado demais pra um menino de dezasseis anos — meu irmão sorriu, encostado no batente.

— Engraçado, Matt. Muito engraçado — devolvi, num tom de quem não acha graça nenhuma. Eu normalmente era mais feliz e calmo, mas realmente não estava na disposição para piadas.

— Não, sério — Matt replicou, realmente mais sério, e eu levanto os olhos para ele — Você deveria começar alguma atividade física.

— Você já me disse isso mais ou menos dez vezes só essa semana.

— Doze. E é porque você precisa.

— Olha, se for te deixar mais satisfeito, eu vou voltar a fazer kung fu.

— Na academia dos Li? — Matt mostra interesse, mas eu só assinto enquanto me sento na cama — Eu ouvi dizer que os filhos de Mulan e Shang estão dando aula agora também, para as turmas de mais velhos. Muitas crianças pequenas entraram na academia.

— Ótimo — resmungo, colocando a mochila em minha escrivaninha — Quem é que nunca quis ter aula com aquela carranca que chamamos de Mei Lin Li?

— Isso é por causa da vez em que você zombou dela e ela acidentalmente te deixou com o braço luxado, não é? — ele pergunta, com certo divertimento. Eu não disse nada, esvaziando o conteúdo da mochila azul — Ah, pelo homem na Lua. Eu tava brincando. Você realmente não superou isso?

— Ela me humilhou publicamente, Matthew. Não é como passar por cima de você me enchendo o saco ou congelando minha língua.

— Você realmente tem de largar dessa, Freddy.

Viro-me bruscamente para a porta, onde Matt ainda estava parado.

— Olha, eu não me lembro de ter te chamado aqui e tenho dever para fazer, além de que combinei com um amigo de ir ao cinema antes da aula — digo, venenoso, mas Matt continua no batente. Seu olhar se torna suspeito.

— Seu amigo — ele diz, os olhos presos em mim, mas eu encaro o chão — Você vai sair com o Breu, não é?

— Não é da sua conta.

— Na verdade, não mesmo — meu irmão suspirou, surpreendendo-me. Ele, tal como, basicamente, todo o resto da família, tinha essa linda mania de implicar com minha amizade com o Breu — Só espero que você saiba o quê está fazendo, Fred.

Suspiro, olhando meu irmão nos olhos.

— Sim, Matt, eu sei.

Matthew sorri de leve antes de sair da porta e entrar em seu próprio quarto, e ouço a cadeira se arrastando num sinal de que ele estava indo fazer para casa também.

Bom. Não que eu fosse exatamente fazer para casa.

Tiro o meu caderno de desenhos da mochila, sentando-me à minha escrivaninha, e abro a primeira gaveta para achar meus lápis 6B perfeitamente alinhados e apontados. Saco um e começo a fazer os traços.

Eu havia me inscrito para o jornal da escola, cuja primeira reunião seria no dia seguinte. Eu não era exatamente bom com notícias, mas tinha ouvido de que eles poderiam usar alguém que pudesse desenhar e fazer quadrinhos. Daí eu falei com a Fada Madrinha, editora-chefe, que disse que adoraria ter-me como desenhista. Alice, sua assistente, deu a sugestão de ser tudo no anonimato, algo do que eu particularmente gostei e acabei concordando. Por isso, eu não poderia contar a Matthew que estava desenhando, ou ele iria querer ver. Eu também não iria participar das reuniões do jornal nas sextas, mas sim de pequenos encontros com Tristan Smith, fotógrafo e diagramador, além de Alice.

Um pouco mais tarde, eu havia acabado de fazer o desenho à lápis de uma tirinha de três quadrinhos. Tirei o enorme estojo de sessenta e quatro lápis de cor da gaveta no momento em que alguém bateu à porta, virando a folha para baixo.

— Entra! — gritei, e uma fresta se abriu na porta. Os cabelos brancos de meu pai se esgueiraram para dentro, e eu sorri — Ei, pai.

— Freddy — ele me cumprimentou, sorrindo de leve, como se estivesse nervoso. Eu já sabia, por sua atitude, o que ele diria logo em seguida: —Breu está na porta.

— Ah. Claro — eu respondi, me colocando de pé e enfiando meu kimono dentro da mochila que propositalmente havia deixado vazia, assim como minha carteira. A faixa laranja que eu tinha havia um tempo pendia para fora, mas não me importei, pegando meu bastão em cima da cama — Vamos ao cinema, e depois eu vou para o treino de kung fu. Catelyn disse que pode me deixar em casa.

— Está bem — ele disse, saindo da porta quando eu passei — O quê vão assistir?

— O Star Wars novo — dei de ombros, descendo as escadas com ele em meus calcanhares.

— Pensei que fôssemos ver esse junto — meu pai comentou, como que estranhando, e eu parei de andar, olhando para ele.

— Nós vamos.

— Não se você já tiver assistido — ele pontuou, para logo depois acrescentar: — Com o Breu.

Ah. Então aquilo era sobre o Breu.

Meus pais não gostavam muito de Breu, por causa de toda aquela confusão que ele causara no passado, mas nós dois sempre fomos bons amigos. Ele e mamãe ainda ficavam meio desconsertados quando eu saía com ele. A minha mãe acho que foi por todo aquele medo que ela sofrera nos anos em que viveu escondida do mundo (e por ter a certeza de que Breu teve alguma coisa a ver com isso), e o meu pai particularmente não se sentia confortável com o fato de seu filho passar mais tempo com o Breu do quê com ele próprio.

Eu sorri de leve para meu pai.

— Nós vamos assistir juntos — eu lhe garanti — Eu e Breu encontraremos outra coisa pra ver hoje. Quem sabe ''O Regresso''.

Ele sorriu de verdade.

— Certo. Bom cinema pra vocês, e até mais tarde — disse, antes de voltar para cima, provavelmente para seu escritório. Eu estava prestes a sair, já vendo o carro de Breu na rua, quando ouvi minha mãe gritando:

— Frederick! — ela me chamou, e correu até a porta. Tinha um pequeno aparelho cinza em sua mão, que eu fui reconhecer como meu telefone — A diretora disse que você deixou na escola hoje.

— Opa — eu disse, mordendo o lábio enquanto deslizava o eletrônico para meu bolso — Obrigado.

Ela me encarou com um olhar meio assassino. Minha mãe podia ser bem ameaçadora quando queria. E, tratando-se de mim e Matt, isso era na maioria das vezes.

— Se você o perder mais uma vez, vai ficar um mês sem ele. Capiche, mocinho?

Engulo em seco e assinto antes de beijá-la na bochecha.

— Te vejo mais tarde! — digo, saindo de uma vez de casa. Ela fica na porta e me observa entrar no carro, gritando um “Juízo!” antes de eu e Breu virarmos a esquina. Meu amigo ri.

— Você demorou, Frost — ele observa, sobrancelhas levantadas.

— Bom, digamos que eu tive de prometer não assistir Star Wars com você — eu explico, mas logo acrescento — ou com qualquer outra pessoa. Prometi à meu pai e Matthew.

— Que seja. O que assistiremos?

— Tem aquele filme do DiCaprio, ''O Regresso''.

— Está brincando comigo?

— Quê? Tem um monte de elogios e o cara é bom.

— Você sabe que odeio o DiCaprio.

— O que deveria ser impossível, depois de ''Django Livre''.

— Pega esse celular e olha a programação logo, Frost.

Rio, ligando o aparelho depois de colocar o cinto. Eu tinha alguns hábitos esquisitos? Pode-se dizer que sim. Mas o quê eu poderia fazer? Acho que, quando você é filho de uma rainha que já foi considerada má e um cara que traz a diversão dos dias de inverno, além de nascer com poderes de gelo, tudo é meio esquisito.