Chapter XXV-Novos Amigos e Lugares Secretos

Alanna Sif Haddock

Como sempre, eu me atrasei para a primeira classe. Mas, daquela vez, eu pelo menos tinha uma justificativa: além de o estande do ''A'' ser simplesmente o mais cheio, meu escaninho ficava na parte mais inacessível de todas dentro daquela escola. Para melhorar, eu dei um belo azar: a diretora estava na minha sala quando eu bati na porta.

– Senhorita Alanna Haddock –ela disse, depois de eu entrar e correr para uma cadeira – Espero que isto não se repita.

– Não se repetirá – eu disse, mas podia imaginar o que Uri diria: 'com certeza vai se repetir'. Sorri com o pensamento, colocando meu livro de Química em cima da mesa. Olhei para o lado enquanto a Rainha continuava falando, constatando que uma loira ao meu lado mascava chiclete enquanto encarava a mulher desinteressadamente. Charlotte Montgomery.

– E, como eu estava a dizer antes de ser brutalmente interrompida pela batida da Senhorita Haddock, os atrasos serão punidos com detenção após as aulas por três dias. A detenção acontecerá na sala B13, com a professora Prudência (N/A: Prudência é a governanta do palácio da Cinderella, uma chata profissional), e durará meia hora após o último horário– ela anuncia, e me olha fulminante – Creio que está claro que as senhoritas Haddock e Montgomery lhe farão companhia começando por amanhã.

A garota ao meu lado ajeita a postura e coloca as mãos sobre a mesa indignada, dispondo de uma feição revoltada que julgo ser o espelho da minha. A diretora limita-se a olhar-nos com um sorrisinho perverso mal contido. Eu engulo em seco e me recosto na cadeira, entendendo porque a chamam de Rainha Má. Eu podia sentir toda a raiva que aquela mulher poderia lançar sobre nós naquele simples olhar.

– Por hora é só. Se tiverem alguma dúvida, poderão simplesmente ir até seu orientador, que eu creio – faz uma pausa enquanto dá uma vista de olhos na prancheta que tinha nas mãos – ...tratar-se da Senhorita Darling – ela finaliza sua fala e se vira para a porta –Tenham um bom dia, décimo ano.

Bufo, deitando a minha cabeça sobre a mesa pesadamente, desalinhando assim a minha franja. Tento soprá-los para cima, o que claramente falha, então me endireito e arrumo o cabelo de modo a ficar inteiramente para trás da faixa que usava. Só depois me apercebo do professor que, por acaso, era nada mais nada menos que o Chapeleiro Maluco.

Ótimo. Como se minha vida não pudesse ser mais louca.

– Eu sou Maluco, mocinha, não louco – ele disse, como se lesse meus pensamentos – Mas não importa. O que importa é a química. Ah, a Química Encantada. Sabiam que–

Minha mente viajou enquanto o Chapeleiro divagava sobre chás feitos a partir de reações químicas e como iríamos aprender a fazer todo tipo de explosões e chás deliciosos. Em vez disso, eu pensava em como eu iria explicar para mamãe sem levar uma bronca que eu havia pegado detenção no primeiro dia de aula. Ela já andava emburrada comigo desde que a deixei a ela e ao meu pai na mão para conversar com Uri durante a feira de usados, e eu tinha certeza que agora ia pegar pelo menos uma semana sem sair de casa para motivos que não envolvessem a escola.

– Relaxa. É só falar que vai pra casa do seu melhor amigo –Charlotte diz ao meu lado, enquanto desenha algo em seu caderno, e eu penso que as pessoas estavam realmente conseguindo ler minha mente hoje – Vocês já não descolam mesmo.

– Seria uma ótima solução se meu melhor amigo não fosse parte do problema – considero.

– Então fala que vai para minha casa fazer lição. Parece que já somos colegas de laboratório mesmo, e podemos ser o álibi uma da outra. – pisca.

– Eu mal te conheço.

– Charlotte Montgomery, muito prazer – ela estende a mão, que eu aperto.

– Sou Alanna Haddock.

– Eu sei perfeitamente quem você é. Seu cabelo não engana ninguém.

– Mas –

– Sim, você é bastante fácil de ler.

– Mocinhas! – o professor nos chama a atenção, impedindo que eu responda – Não querem pegar três dias na detenção, querem?

– Elas já têm três dias na detenção, professor – responde uma voz irritante e presunçosa que, quando olho para trás, reconheço pertencer a Spencer Smith.

Argh. Segunda, primeiro horário e Spencer Smith. Não podia melhorar.

– Ah, têm? – ele perguntoua, olhando para a aba de seu chapéu – Pois pegarão mais três se continuarem! Assim como você, senhorita Smith, e você, senhorita Mouse, se continuarem nesse ba-fá-fá!

Rio baixinho, trocando olhares com Charlotte. Talvez ser colega de laboratório dela fosse ser divertido, afinal.

–x-x-x

A aula de química parece demorar mais que , mas quando finalmente acaba, Uriah está me esperando do lado de fora da porta. Ele se endireita e desencosta da parede ao me ver, e me abraça quando chego perto.

– Bom dia, Sif.

– Péssimo, na verdade, Steve.

– Péssimo e ainda agora começou?

– Já consegui três dias de detenção – explico, e Charlotte aparece.

– Pelo menos, foram três dias de detenção comigo – a loira brinca, e eu sorrio. Ela tinha o nosso tipo de senso de humor – Eu tenho Álgebra agora. Vocês?

– Geografia até o lanche –respondemos em uníssono, e eu damos um high five ao perceber que vamos ter pelo menos uma aula juntos.

– Acho que nos vemos mais tarde então – a garota diz, e acena antes de correr corredor afora. Meu melhor amigo levanta as sobrancelhas.

– Agora és amiga de Charlotte Montgomery? – pergunta ainda seguindo a loira com o olhar.

– Idiota – digo colocando-me à frente dele.

– Eu só ia dizer que podias apresentar-nos, mas que seja –Uriah pisca-me o olho e dá um sorrisinho, mas eu perco um pouco da boa disposição que ganhei ao vê-lo. Ele, meu melhor amigo há incontável tempo, repara – Ei. O que houve?

Balanço a cabeça.

– Nada. Vem, meu armário é lá no primeiro andar ainda. Vamos nos atrasar – eu devolvo, voltando a sorrir, e o puxo corredor afora.

– Qual é?

– 112 – eu digo, e ele abre sua pasta enquanto descemos as escadas.

– Por sorte, a sala é a A9.

– As duas ainda são do outro lado do prédio. Anda, vamos nos atrasar.

–x-x-x-

Dois períodos depois estamos descendo para o refeitório acompanhados por Festus O'Crown que discute comigo sobre o que deveria ser feito para parar a guerra contra Wonderland. O O'Crown argumenta que o melhor é uma solução essencialmente diplomática, ao passo que eu discordo dizendo que é uma ofensiva reforçada com um cerco ao Palácio, quando Jasper Snow aparece ao seu lado.

– Vá lá Festus. Nós todos sabemos que já tentaram isso e a única coisa que se conseguiu foi matar o diplomata – o garoto diz, colocando a mão no ombro de Festus, que revira os olhos – Ei, Uriah. Olá, menina do cabelo vermelho que eu tenho quase certeza que se chama Lanna.

– É Alanna, na verdade – eu estendo minha mão, que ele aperta – Você conhece o Uriah?

– Literatura PA – ele explica.

– Ah. Você quer dizer Minhoca de Livro™ – eu devolvo – Só pra constar, o primeiro livro dele foi 'Como Patinar'.

– Deu certo? – Jasper pergunta, ao que meu amigo sorri e dá de ombros.

– Então empresta pro Jasper, que ele é um fracasso na patinação – Festus sorri, e todos rimos um pouco do Snow. Ele mesmo, porém, para de sorrir quando vê algo (provavelmente alguém) no final do corredor e acotovela o loiro. Fest também para de rir e limpa a garganta, ajeitando a mochila nas costas –A gente deveria ir, na verdade. O Sean e a Lottie devem estar nos esperando.

– Ela odeia que a chamem assim – eu advirto, enquanto eles caminham para longe, e Festus me dá um último sorriso ao passo que Jasper indaga retoricamente:

– Por que acha que ele chama ela assim?

Eu e Steve rimos mais uma vez enquanto a dupla se afasta de vez. Porém, em vez de procurarem por Charlotte (que estava com os Li), eles pegam uma mesa com uma outra garota loira que parece tentar se esconder dentro da cortina que seu cabelo faz à sua volta. Dou de ombros comigo mesma e me volto para Uri.

– E aí? Vamos pegar uma mesa, Cap? – pergunto.

– Nah. Tenho uma ideia melhor –meu melhor amigo nega, e ajeita a mochila nos ombros – Vem. Achei um lugar hoje cedo, com Jasper, mas acho que ele não reparou.

– Tá bom – digo, seguindo-o para fora do edifício principal.

Ele guia-me para o pequeno bosque dos fundos, e acha um caminho de pedras à leste, que devia seguir para oeste. Ele sequer olha para trás antes de se jogar floresta adentro, e eu não tenho opção sequer seguir sua mochila e o lampejo de sua camisa vermelha. Um minuto depois ele para, e posso ver que o lugar é uma clareira protegida do sol pelas árvores de grande porte. No meio da clareira, um banco de madeira (com encosto de costas, graças ao bom Odin) repousa, e meu amigo se senta lá. Eu assovio, andando até ele.

– Impressionante – considero, me jogando no banco – Mas longe e cansativo.

– Vale a pena – ele defende.

– Vamos ver. Se aparecerem moscas, vou embora na hora.

– Nah.

– Veremos.

Incrivelmente, não aparecem moscas. Nenhuma, na verdade, o que só pode significar uma coisa. Magia. Óbvio que eu demorei um pouco para perceber, mas tem algo ou alguém mantendo tudo afastado. Nem os pássaros pareciam cantar.

Colocando o meu misto frio de lado e ficando de pé em silêncio, olho à minha volta. Uriah me encara com uma expressão que mistura confusão e divertimento, mas eu faço um sinal bem claro de silêncio para ele. Pelo menos obediente ele sabia ser. Depois de andar um pouco, consigo localizar cabelos ruivos e volumosos no meio da folhagem. Uma menina. Eu diria que ela tem a nossa idade, se fosse pra adivinhar, e que o garoto ao seu lado era seu irmão. Embora os dois estivessem sentados de costas para nós, eu podia sentir que era a aura deles que estava mantendo tudo o que vivia afastado.

– Ei – chamo, colocando a mão no ombro da garota. Ela se vira rapidamente, assustada, e deixa seu lance cair. O garoto ao seu lado dá no pé, sumindo pela mata em questão de segundos – Calma, não precisa se assustar. Qual é o teu nome?

– V-Valentine – ela diz, pálida como um fantasma – Valentine Skellington.

Oh. Aquilo explicava.

– Peraí. Skellington como em Jack Skellington? – Uriah se levanta animado, e caminha nós – Você é filha do rei da abóbora?

Valentine assente timidamente.

– Nós somos os maiores fão do teu pai! A sério! – eu grito, animada – O Halloween é nossa festa favorita desde sempre!

– Que bom que gostam – ela se põe de pé e passa a mão em sua saia, triando a grama – Ele adoraria conhecê-los.

– Eu sou Steve e essa é a Lanna – meu melhor amigo nos apresenta, e estende a mão. A garota aperta – Você é nova por aqui?

– Acabamos de nos mudar de Halloween Town. Literalmente –Valentine responde – Eu e meu irmão, eu quero dizer. O que saiu correndo.

– Fazer amigos não é exatamente a mais fácil das tarefas. Eu entendo ele – Uriah diz.

– Eu não, mas que seja. Boa sorte pra ele – eu replico, sincera – Qual é seu próximo período, Tine? Posso te chamar de Tine, né?

Ela dá uma risadinha antes de me responder.

– Acho que sim – diz, e então fica pensativa por dois segundos – O quarto período é... Biologia. Biologia Bruxa, PA.

–PA em Bio? Nada mal pra uma novata- Uri a cutuca com o cotovelo, enquanto andamos de volta para a escola.

– Digamos que eu já dissequei uma porção considerável de coisas - ela considera, com uma cara de nojo, que eu espelho - E vocês?

–História Mágica, PA- eu respondo.

–Química Encantada- meu melhor amigo emenda.

–Te prepara. O professor é doido de tudo- eu aconselho, me lembrando das observações do Chapeleiro sobre chá e explosões -Temos o mesmo quinto?

–O meu é Álgebra- Steve diz, e eu vibro internamente.

–Ótimo. Chegue primeiro e guarde meu lugar, ok?- eu peço, e então me viro para a ruiva -E você, Tine?

–Álgebra também- ela dá de ombros -Vejo vocês mais tarde?

–Pode apostar- eu sorrio, e pego o pulso do meu melhor amigo enquanto ele acena com a outra mão -Te vemos lá!

Assim que ela nos dá as costas eu começo a puxar Uriah para o refeitório, me lembrando que Festus também era PA em História. Meu amigo solta-se, porém, parecendo cansado de eu ficar puxando-o de um lado para o outro:

–Você tem de parar com isso.

–Tá bom. No mesmo dia em que o cabelo de Cherish parar de brilhar- eu ironizo, me referindo ao cabelo mágico de sua irmã.

–Tá. Ponto seu- ele admite, e continua andando -Mas machuca.

–Oh, eu machuquei o nenêzinho?- brinco, e aperto sua bochecha.

–Idiota.

–Falou o melhor amigo dela.

–Para com isso.

–Isso o quê?

–Tirar comigo.

–Não é minha culpa se você não tem a aptidão para tiradas, caro Capsicle.

Ele rola os olhos e bufa, sem parar de caminhar ao meu lado. Mordo o lábio em excitação. Talvez a escola pudesse ser legal, no final das contas.