Abelhas

Idas e Vindas


Era muito cedo pra pensar em filhos, casamento, família? Era o que eu ia descobrir assim que os pais da Anna chegaram à cidade naquela sexta-feira à noite. Quando namorava com Jade eu sempre convivi muito bem com os pais dela, talvez porque fossem meus vizinhos, mas agora era diferente, era a segunda namorava que tive da vida. Mil coisas passavam pela minha cabeça, será que eles aprovariam nosso namoro? Com que roupa deveria me apresentar a eles? Muitas garotas pensam que homens não passam por esses momentos de nervosismo, pensam errado. Pra mim sempre foi normal, minha mãe nunca teve problema algum com Jade ou seus pais, ao contrário, minha mãe sempre me deu bastante apoio.

Anna me ligou numa terça-feira à noite avisando quem seus pais estavam vindo de Pittsburgh, foi naquele momento que me desesperei e comecei a entrar em meu estado de noites mal dormidas. Ela marcou um jantar em família no sábado à noite, pois seria uma viagem cansativa e ela queria poder ter toda a manhã de Sábado para ficar com os pais, que já não via há umas semanas. Excelente, eu poderia fazer hora extra na colheita durante a manhã de sábado, um ótimo meio de ocupar a minha mente nesse meio tempo. Naquele sábado não havia nada demais, todas as coisas pareciam um tanto quanto paradas, nem parecia verão. Pude notar um grande carro estacionando próximo algumas quadras depois da minha casa, achei que meus vizinhos estivessem se mudando, era um casal jovem que mal apareciam em casa, pois trabalhavam em outra cidade; pela pouca conversa que tive com eles sempre notei que eles queriam muito sair daquela casa dada como herança pelos pais de um deles, parecia um ponta pé inicial pra se aproximarem do trabalho e começarem uma família de verdade, fiquei feliz por eles, se é que meus pensamentos estão certos.

Na verdade, eu estava certo. Saindo daquele grande carro pude ver uma garota linda, parecia ter a minha idade. Suas roupas eram um tanto quanto diferentes, não via muitas garotas da minha cidade usando saias modernas com belos suéteres no verão e com cabelos muito arrumados.

As horas passaram rápido, depois de me arrumar pro trabalho e observar as coisas que aconteciam ao redor da minha própria casa eu fui trabalhar, quando menos esperei faltavam apenas duas horas para o encontro com os Parks. Vesti uma camisa pólo, um par de calças jeans, e procurei arrumar o meu cabelo o máximo que pude pra compensar as poucas roupas que tinha. Não era algo que eu me preocupava tanto, ou parei de me preocupar durante os anos que se passaram. Também não íamos a nenhum lugar muito sofisticado, era um simples restaurante perto do centro da cidade. Minha mãe não parava de soltar elogios quando me viu descendo as escadas, parecia até a noite da minha formatura.

“Não acredito que você já vai conhecer os pais dela.” – disse minha mãe alegre.

“É, nem eu.”

“Você parecia meu bebê ontem, depois conheceu essa garota e agora está tendo responsabilidades, não de um homem, mas de um cavalheiro.” – disse ela bastante orgulhosa.

Eu já estava ficando bastante corado e sem graça.

“Eu acho melhor eu ir logo, não quero causar má impressão” – disse.

Ela me cumprimentou e me desejou boa sorte.

“Também gostaria muito de conhecer os pais da Anna. Traga-os aqui na próxima vez, talvez amanhã. Creio que sejam tão bons quanto ela” – pediu minha mãe.

Senti um leve frio na barriga enquanto ligava o carro. Pensei em comprar algum presente pra levar, mas fiquei confuso achando que talvez os pais dela fossem interpretar isso de uma forma errada, afinal, eu não os conhecia. Depois de exatos 7 minutos dirigindo eu cheguei ao restaurante, onde estacionei o carro e desci. Era um restaurante típico de cidade pequena, com pequenas mesas quadradas, quase toda mobilha forrada em madeira e bastante quadros. Parecia muito com esses restaurantes que se encontra nas estradas, mas esse não era bagunçado e as pessoas não eram tão malucas.

Lá estava Anna com seus pais em um lugar próximo ao canto da parede, pareciam estar se divertindo muito. Os pais dela aparentavam ser mais velhos do que eu pensava, talvez na casa dos 60 anos. Sua mãe era bastante magra com um cabelo cacheado e curto, algo bem de época, usava roupas bastante justas. Seu pai tinha pouco cabelo e parecia ser uma pessoa bastante confiante pelas suas expressões faciais, não sei bem como descrever, era bastante sorridente. Quando a Anna me viu de longe acenou para mim enquanto se levantava. Ela estava ainda mais linda com seus longos cabelos loiros e soltos, com roupas justas iguais a da mãe e com os olhos ainda chamando a minha atenção apesar de termos passado quase o verão todo juntos.

Abracei-a e a beijei levemente, em seguida cumprimentei seus pais. Beth e Andrew Park. Me senti bastante confortável na presença deles. Não falamos muito até pedirmos os nossos pratos, que contavam com batatas amassadas, batatas fritas e frango.

“Fico realmente feliz por estar conhecendo você Noah. A Anna sempre nos falou muito bem de vocês, especialmente sobre como se conheceram e de como estavam trabalhando juntos.” – falava o pai dela sempre com uma alegre expressão.

“O prazer é todo meu. Vocês têm sorte de ter uma filha maravilhosa.” – disse um pouco inseguro apesar de tudo.

“Anna nos falou muito sobre você querido, mas conte um pouco mais sobre sua vida, família... Você caça?” – perguntou a sua mãe em um tom bastante curioso.

“Não, não.” – ri.

“Costumava caçar com o meu pai quando eu era menor, ele era militar e costumava caçar comigo, acredito que como forma de treinamento e de diversão. Depois que cresci passei a não me interessar muito. Também não tive muito tempo, pois sou o mais velho dos meus irmãos e tive que começar a trabalhar cedo após a morte do meu pai.” – respondi.

“Eu sinto muito pelo seu pai. Como sua mãe está reagindo?” – ela perguntou novamente.

“Ela está ótima. No início foi muito difícil pra todos nós, eu nunca sabia o que falar pra os meus irmãos em relação a isso. Foram tempos difíceis para todos.” – continuei.

“Em que você e sua mãe trabalham?” – perguntou o Sr. Park.

“Minha mãe é professora, atualmente ela está parada por conta do verão, mas em poucas semanas voltará à escola. Eu trabalhava num apiário, depois eles fecharam e agora eu trabalho na colheita junto com a Anna.” – respondi.

Anna parecia imóvel, prestava bastante atenção à conversa e ao mesmo tempo à comida. Cruzou seus braços ao redor do meu pescoço por um tempo. Houve um silêncio.

“Bom, eu não sei muito sobre vocês...” – disse quebrado o gelo.

“Oh, desculpe querido. Eu sou psicóloga e o Andrew trabalha com venda de automóveis. Ambos ainda moramos em Pittsburgh e sentimos muita falta da Anna.” – disse a Sra. Park.

“Bom, não vão ter que esperar muito, pois o verão está quase acabando.” – respondi.

“É verdade. Eu espero ver vocês dois em breve antes de viajarem.” – respondeu ela.

“Na verdade, nunca falei isso pra Anna, mas queria muito ficar aqui se ainda for da vontade dela, vejo o carinho que ela tem por essa cidade. Temos tudo que precisamos aqui.”

Seus pais pareciam um pouco confusos com o que eu estava dizendo.

“Mas querido, Anna não vive nos Estados Unidos há muito tempo. Esqueceu?” – disse ela.

“O quê?” – agora eu estava confuso.

“Sim. Lógico que vocês serão sempre bem-vindos em Pittsburgh durante os verões que puderem sair do trabalho voluntário na África do Sul.” – disse o Sr. Park.

Eu não estava entendendo, a comida estava me fazendo suar diante daquela situação. Trabalho voluntário? África do Sul? Morar lá?

“Desde que a Anna se envolveu com trabalhos sociais da sua igreja ainda no colegial ela sempre teve bastante compaixão por aquelas pessoas. Será maravilhoso ter vocês 2 lá.” – continuou o Sr. Park.

Anna estava com a cabeça baixa. Me levantei da cadeira e pedi um tempo, disse que não estava me sentindo bem. Assim que deixei o restaurante e entrei no carro vi a Anna gritando pelo meu nome e se desculpando por algo que eu estava irritado demais para prestar atenção. Eu vivi uma mentira durante o verão inteiro? Ela acha que pode se aproveitar de mim e depois simplesmente ir embora? Eu sei muito bem como é isso, e agora tudo estava se repetindo.

Estacionei o carro em frente à minha casa. Todas as luzes já estavam apagadas. Vaguei ao redor da casa, depois notei que havia alguém sentado no banco próximo as árvores. Era aquela garota que tinha visto cedo. Ela virou e me encarou. Foi um susto. Era Jade.

“Corações partidos? Bem-vindo ao time.” – disse ela sem me olhar.

“Como sabe? Como chegou aqui?” – conversei com a sua mãe.

Ainda não conseguia entender em como Jade havia voltado pra cidade, como ela tinha mudado e o que estava fazendo alí.

Me sentei ao seu lado. Ficamos sentados enquanto olhávamos para o nada ao nosso redor.