No dia seguinte, sofri um acidente na aula de Defesa contra as Artes das Trevas e tive que ir para a enfermaria. Minha testa tinha um galo enorme e minha mão direita estava levemente torcida. Fiquei deitada na maca relaxando enquanto Madame Eton cuidava de mim. Quando estava tomando um xarope, duas crianças do 1º ano entraram (uma menina e um menino), estavam com as pernas mexendo freneticamente. Imaginei-os dançando e dei risada. Os meninos me olharam com cara amarrada e cobri o riso com a mão esquerda. Me virei para o lado e fechei os olhos, não estava dormindo, mas estava sonhando. Sonhava que estava mergulhando, não via nada além de vultos, eram sereianos e eles me trouxeram de volta à superfície. Me despedi deles e voltei para a realidade.

Quando fui liberada da enfermaria, uma voz distante em minha mente ordenou que eu fosse para os jardins. Estranhei, mas fui sem protestar. Quando estava bem longe, meus movimentos viraram automáticos, peguei minha varinha e fiz flores no ar. As flores dançavam e fadas se aproximavam de mim. Estava muito entretida com elas, eu dançava junto. Eu ouvia vozes que se repetiam “volte, Leslie, volte”, não dava atenção a elas, continuava a dançar. A voz se repetia, não era a mesma distante de minha cabeça, mas uma voz doce, uma voz de mãe. De repente eu vou parando de dançar e de sorrir também... Minha mãe, minha mãe falava comigo e pedia que voltasse... Eu queria voltar, mas parecia que uma força não deixava.

–- Pare! Deixe-me voltar! Por favor, pare!

Mas a força estranha não parava. Lutei até que não aguentei, então eu desabei no chão cansada e comecei a chorar. Estava chorando quando um homem muito grande me pegou no colo e me levou para dentro da escola, era Hagrid.

Fui levada direto para a sala do diretor. Estava nervosa, sabia que não devia estar tão longe matando aula. Mas estava cansada e não tinha o que fazer. Fui depositada ali, na porta, de frente para um poleiro vazio, intocado. Aproximei-me e o toquei levemente, era liso e embaixo havia cinzas.

–- A ave foi embora junto com seu dono – uma voz atrás de mim fala de repente, eu me viro assustada – uma história bonita! Sente-se Leslie, Rúbeo me contou onde você estava.

Andei até a escrivaninha da sala e me sentei em uma cadeira. Fiquei olhando para minhas mãos até que percebi que o silêncio significava que era minha vez de falar.

–- Me desculpe diretor. É complicado... Se o senhor compreende, prefiro não explicar...

–- É claro. Bem pode ser que isso a ajude – ele anda até um armário próximo e retira uma bacia com um liquido um tanto estranho – Veja, é simples, retire os pensamentos excessivos de sua mente e deposite nela, depois mergulhe sua cabeça – o diretor se afasta.

Em que isso me ajudaria? Resolvi tentar. Peguei minha varinha e repeti o movimento do professor. Mergulhei minha cabeça na bacia e me deparei com uma eu saindo da enfermaria. Eu estava revivendo os momentos de hoje. Como eu segui a voz distante. Como eu não liguei para a voz doce. Mas uma coisa em que reparo é de onde vem a voz doce, não é minha mãe, são as árvores, elas se moviam no mesmo ritmo da voz. Isso é muito até pra mim! Não compreendo! Retiro minha cabeça assustada e vejo que ela permanece seca

–- O que é isso, senhor?

–-Uma penseira. Se já terminou, pode ir.

Eu passo por ele e saio da sala. Estou confusa, mas vou até a aula de adivinhação normalmente. Tenho que aturar a Sibila a aula inteira. O cheiro forte e perfumado da sala me dá sono, mas me recuso a dormir. Estou assustada, estou com medo.

Quando as aulas do dia acabam, no fim da tarde, reúno toda a minha coragem e volto aos jardins. Sinto os ventos em meus curtos cabelos, fecho os olhos e sorrio. Aquela brisa me renova, o som do farfalhar das folhas. Os ventos em meus ouvidos. Me supreendo com um som que vem atrás de mim, deve ser Soluço. Me viro e é ele mesmo, sorrio e ele diz como quem está indignado:

–- Passeando pelos jardins sem mim Lisle?

–- Estava só pensando... Sentido o vento!

–- Você está muito estranha comigo Leslie! O que foi?

–- Nada, que bobagem.

Gostaria muito de ter contado a ele, mas não sei o que acontece comigo, prefiro guardar tudo só pra mim. Nós dois sentamos na grama e observamos o pôr do sol em silêncio. Quando está quase escuro nós voltamos para jantar.

Sento ao lado de Greta e ela diz:

–- Quase nem falou comigo o dia todo! Sou sua melhor amiga Leslie, sabia?

–- Me desculpe... Hoje não foi muito legal pra mim.

–- Não vai me contar o que aconteceu não é?

–- Não, me desculpe de novo...

Greta suspira e sai da mesa rumo ao salão comunal da Corvinal. Eu suspiro também e começo a comer, estou faminta. Quando termino vou dormir. Fico a semana inteira sem falar com ela, a garota está brava comigo e sei que deveria contar a ela, mas não consigo, são coisas minhas.