A outra Potter

A clareira no meio da floresta negra


– Bom, a gente pensou muito sobre quebrar mais de vinte regras da escola para fazer as reuniões da AD e botar a permanência dos alunos aqui da escola em risco. Mas depois de tanto pensar, a gente notou que seria muito estúpido não fazer isso. Temos uma ameaça real lá fora, e quebramos mais de cinquenta no segundo ano. Vinte regras é moleza para nós. E quanto aos alunos: quem não quiser vir, não vem. Simples, fácil e rápido. – falou Hermione, que marcara um encontro com a Potter.

Ela não queria chamar mais atenção do que estavam chamando nas últimas semanas. Então marcou um encontro em que somente ela e a outra estivessem conversando, sem ser um montinho de pessoas debatendo sobre um único assunto. Isso sim, chamaria muita atenção. Lawrence permaneceu séria, somente a olhando, com uma sobrancelha arqueada.

– Tudo bem. – falou sem nenhuma emoção, se virando e ignorando Hermione completamente – Mande a data pela moeda, e lá estaremos. – e assim saiu, deixando a morena estática.

Virou o corredor, passando por alguns alunos que lhe lançavam olhares curiosos. Haviam se passado dois dias desde o ocorrido na aula de poções, e todos ficaram sabendo rapidamente sobre a “discussão” que tivera com Umbridge, e que havia conseguido ganhar. Ninguém conseguia entender era como a Potter havia conseguido convencer os Gryffindors tão facilmente que o professor Snape era o melhor professor de Hogwarts e que todos o amavam. O que era a maior mentira já contada, uma vez que ele era muito odiado por todas as casas de Hogwarts, menos Slytherin.

Lawrence, porém, permaneceu impassível quanto aos comentários, cochichos e murmúrios que enchiam o corredor toda vez que ela passava. Somente eram um bando de desocupados que não tinham mais o que fazer e por isso ficavam espalhando fofocas. Daniel contara para ela na noite anterior, que ao entrar com Draco no banheiro masculino, um monte de meninos do primeiro ano estava falando que ela havia lançado um estupore na professora. Entre risos, o Surrey continuou comentando sobre como estimulara ainda mais a curiosidade dos meninos quando falou em voz alta com o Malfoy sobre como a face de Umbridge havia ficado azul e depois roxa, devido a uma poção das “Multicores”, que havia jogado em cima da mulher.

– Poção das multicores, Daniel?! – perguntou com uma cara brava – Essa poção nem mesmo existe! – a última parte falara rindo.

– Bom, o que importa é que os menininhos saíram correndo do banheiro para espalhar para Hogwarts e o mundo os grandes efeitos que a poção Multicores causara na professora de DCAT.

Mas mesmo assim, tudo aquilo estava sendo desgastante. Até estava levando na boa todas as fofocas, mas começara a se estressar ao perceber que eles pareciam não querer esquecer esse fato. Hogwarts era tão desinteressante, que fofocas vinham somente a cada duas semanas. E por isso permaneciam por bastante tempo.

Ela entrou na biblioteca, onde alguns alunos da Hufflepuff estudavam aritmancia. Ao vê-la, eles começaram o festival de cochichos, que como sempre ela ignorou com sucesso. Se encaminhou até uma estante onde haviam livros de poções, e procurou algum título que a interessasse. Ela sabia muito bem que os livros que tinham probabilidade de falar sobre o feitiço Isolamento Mental estavam na seção restrita, e ela não queria levantar suspeitas entrando lá todo dia. Então estudaria um pouco mais sobre poções.

Se encaminhou até uma mesa ao fundo, onde ninguém se encontrava. Era ao lado da janela, e permitia uma vista da neve que caía do lado de fora. Ver isto a fazia pensar que era muito estranho quando chegava o inverno. Ainda mais numa manhã de sábado como aquela. Um dia sem Sol. Um dia branco e cinza somente, com mais um amontoado de água congelada que todos gostavam de contemplar.

Ela odiava essa ideia ridícula que as pessoas tinham sobre o inverno. Para todos, inverno era somente neve. Mas não para ela.

Lawren sempre fora a favor do inverno como um todo, e não somente a favor de uma chuva congelada. Ela gostava do fato de o inverno ser algo tão bonito, mas tão assombroso. Animais hibernando para poder sobreviver, pássaros migrando para lugares mais quentes e ela amava notar como as formigas trabalhavam no verão, para sua sobrevivência numa estação tão fria. Ela amava tudo no inverno, e quando ele chegava, se sentia estranha. Mais feliz, talvez.

Mas esse estava muito diferente. A sensação de felicidade não estava tão forte. Estava de bem com os amigos, trabalhando em uma pesquisa que finalmente estava rendendo e aprendendo mágicas curativas. Mas mesmo assim, sentia que estava faltando alguma coisa que Hogwarts e ninguém podiam oferecer. Queria mostrar como podia ser boa, e o quadribol era a única fonte. Mas fora expulsa. Agora, com a AD, ela poderia mais uma vez provar para todos o seu potencial. Mas ela sabia que lá, a estrela brilhante seria Harry, e quando chegassem coisas que ela ainda não sabia fazer, seria somente um mero aprendiz. E isso a irritava mais que tudo.

Queria adrenalina. Queria perigo. E isso Hogwarts não podia lhe dar. O maior perigo que enfrentava no dia a dia, era ir ver o professor Snape, e isso nem era diário. Somente uma vez por semana.

Não botava muita fé na AD, mas a notícia de que ela aconteceria era no mínimo satisfatória. Tantos dias sem dormir pelo menos haviam servido para algo. O problema mesmo era que ultimamente, com tantas coisas, o treinamento de mágicas curativas estava ruindo cada vez mais. Ela ainda não aprendera nada, e a ideia de conseguir curar alguém até a grande guerra ficava cada vez mais longe. O que antes era uma grande bola de luz no fim do túnel, se tornara somente um pontinho. Isso era frustrante.

Sentou-se na cadeira estofada, e botou as pernas em cima da mesinha, abrindo o livro sob elas. Enrolou o cabelo e colocou todo para um lado. Puxou as mangas do moletom cinza do Mickey que usava para baixo, e encarou por um momento o All Star branco, pensando em quem lavava as roupas de Hogwarts. Então, por fim, direcionou seu olhar para o livro, começando a ler.

Sua leitura não durou dez segundos.

Logo que começou a ler, Lawrence ouviu os cochichos e mais cochichos e logo ouviu passos apressados vindo em sua direção. Resolveu ignorar até a pessoa chegar e falar alguma coisa, como: “Lawrence, poderia me dar um minutinho da sua atenção? ”. E então ela olharia friamente e tudo iria acontecer como sempre. Mas a pessoa não fez isso. Pelo contrário, ela simplesmente chegou mandando.

Chegou, largou em cima da mesa uma xícara branca com os dizeres “Coffee is always a good idea”, e cruzou os braços, falando com uma voz séria e sem expressão alguma no rosto.

– É melhor que tenha tomado um bom café da manhã e que vá trocar de roupa em quinze minutos, pois temos muito trabalho para fazer hoje. – disse Snape, fazendo Lawrence entender o motivo de tantos murmúrios. Fez uma cara confusa.

– Eu achei que hoje era sábado, e não sexta. E mesmo assim, não há razões para trocar de roupa. – sussurrou, se sentando formalmente e encarando o professor.

– Bom, eu estava pensando que hoje seria o dia perfeito para o seu treinamento, Srta. Potter. A não ser que queira ir para o lado de fora com um moletom e um All Star, por mim tudo bem. – ele falou, ainda sério, com um tom de voz baixo. Lawren percebeu alguns curiosos fazendo silêncio e apurando os ouvidos para ouvir a conversa.

– Vamos para fora? – falou animada, fechando o livro e se levantando – Vamos treinar lá fora?

– Sim. Nós vamos. Com condições: que tome um café da manhã, que troque de roupa e que pelo amor de Merlin, não faça perguntar toscas. – ele disse, já parecendo meio arrependido ao ver a reação animada da menina.

– Ah. Ótimo. Eu vou.... Eu vou ir... Lá trocar de roupa. – falou animada – Quinze minutos, certo? – o homem assentiu, e apontou para a xícara em cima da mesa.

– Primeiro o café.

Ela olhou para o objeto e suspirou, se sentando de novo e o pegando. Olhou para o professor, e tomou da bebida com um olhar aborrecido. Terminou em cinco minutos, pois o líquido estava quente demais. Se levantou prontamente, e já ia saindo, ainda sob os olhares de todos, quando o professor a chamou.

– Você anda muito apressada, Srta. Potter. – ele disse, se virando, vendo-a parar – Eu ainda não terminei o meu comunicado. – ela olhou para ele e voltou, parando de frente para o homem – Quinze minutos, ouviu? Me encontre na frente da casa do Hagrid. – ela assentiu.

– Mais alguma coisa? – perguntou, querendo sair dali o mais rápido o possível. Snape deu um sorrisinho imperceptível.

– Ah, sim. Não vá esquecer de suas botas. – ele falou, e ela fez uma cara confusa.

– O que? Mas eu não tenho nenhuma...

– Agora tem. – ele pegou no chão um par de botas que provavelmente ali largara ao chegar – Você não está pensando em enfrentar uma camada de 30 cm de neve somente com esses tênis chulos, está?

Ela o olhou espantada. A bota na mão do Snape era de cano alto e preta. Era feita de veludo, e parecia ser impermeável. Ia até os joelhos, muito provavelmente, e era realmente muito bonita. Eram típicas botas de caça, e ao pegá-las, Lawrence pode sentir a firmeza. Se precisasse pular de uma árvore, por exemplo, ou até mesmo correr, a bota serviria tanto quanto o tênis de atleta. Era perfeita.

– Ah... Muito obrigada, professor Snape, mas não precisa... – ela falou meio sem graça.

– Se você acha que isso é um presente meu, não se engane. Isso não fui eu que comprei. Essa bota era de outra pessoa, mas eu tenho certeza que servirá perfeitamente em você. Sem elas, você não treina. Ou ela, ou nada.

A garota suspirou e colocou o calçado abaixo dos braços, aceitando-as. De qualquer forma, seriam úteis. Assentiu para o professor, e se virou para sair.

– Não esqueça o casaco. – ele avisou um pouco mais alto, fazendo assim a maioria dos que estavam na biblioteca ouvir.

– Obrigada pelo aviso, professor. Mudou a minha vida saber que preciso de um casaco para sair na neve.

E saiu, deixando o professor com uma imensa vontade de rir.

***

Fechou o casaco na frente do espelho, e se olhou. Uma calça jeans azul escura, uma blusa preta de manga comprida, um sobretudo gigante e preto, junto com a bota que Snape dera. Colocou a varinha dentro da manga da camiseta, e olhou a hora. Faltavam cinco minutos. Seria pontual.

Suspirou, prendeu os cabelos em um meio preso, e saiu do dormitório. Quem estava no salão comunal da Slytherin ficou a olhando, como se fosse uma louca. Balançou a cabeça meio irritadiça e saiu.

Não demorou muito para chegar ao lado da casa de Hagrid, e o professor já estava a esperando. Ele não falou nada, e somente disse a ela para o seguir. Ela assentiu e não falou nenhuma palavra. Entraram na floresta negra, e aquilo era provavelmente um lugar que fizera Lawrence estremecer.

As árvores eram negras, e a neve branca contrastava com elas. Havia uma neblina, e alguns galhos secos que se desprenderam e ficavam semienterrados. Os barulhos de alguns cascos ecoavam no ouvido dela, mas a garota não ousava perguntar para o professor o que aquilo poderia ser. Finalmente poderia continuar treinando, e isso era ótimo.

Ficaram andando cerca de vinte minutos, enfrentando alguns troncos que haviam caído, alguns buracos e alguns troncos dentro de buracos. Depois de dez minutos com um certo pânico, Lawrence passou a achar que a floresta negra era digna de fascino. Era um lugar bonito, acima de todas as coisas. Havia alguns lugares reluzentes, enquanto outros assombrosos, mas mesmo assim, lugares que geravam cada vez mais a sensação de perigo. O que ela estava procurando esse tempo todo.

– Chegamos. – Snape anunciou, e a ruiva se viu em uma clareira.

Era redonda e limpa, somente com a neve branca no chão. Era suficientemente grande, mas não tão gigante. Era cercada de árvores mães, aquelas árvores centenárias, que tinham um tronco do tamanho de cinco árvores normais. Lawren notou que o lugar tinha magia ao redor, pois a sensação que teve ao adentrar a clareira era que havia ultrapassado uma barreira mágica.

– Fiz uma barreira de proteção, junto com um feitiço que inventei. Isso nos protegerá de olhares inimigos, e fará com que ninguém ouça o que conversamos. Os que estão do lado de fora não enxergam nada mais do que uma barreira impermeável de árvore. Isso não impede que eles entrem. Se eles tentarem passar, conseguirão. Mas eu acredito que ninguém será idiota o suficiente de pensar em bater a cabeça em uma árvore. – falou frio e desinteressado na cara fascinada da menina.

– Vamos começar? O que eu posso curar? – ela perguntou animada.

– Calma, Srta. Potter. Precisamos conversar primeiro. – ele disse sério, se escorando em uma árvore, enquanto ela permanecia no meio da clareira.

– Conversar? Pois bem, podemos conversar então. – falou.

– Por que não se senta? É um assunto meio longo.

Isso somente diminuiu a vontade imensa que a garota tinha de treinar. Era um assunto sério, e no fundo, ela não queria saber tanto assim.