A Vida de Um Arqueiro!

Treinamento de arqueiro - I


A vida de um arqueiro!

Respirei fundo e adentrei na pequena casa de madeira que tinha no meio da floresta. Meu coração estava a mil enquanto pensava qual seria meu destino depois que entrasse naquele lugar. A casa era feita totalmente de madeira e parecia ser bem antiga, os moveis eram de couro animal, provavelmente de veado ou porco selvagem enquanto havia um tapete de pele de urso, bem típico de um homem, ainda mais um que vivia sozinho. Encima da mesa de madeira eu pude ver um pequeno bilhete que chamou minha atenção. Vocês já devem ter percebido que sou bem curiosa por isso não duvidei nem um pouco em ir até ele e pegá-lo para ler.

- “Coloque suas coisas em seu quarto e venha me encontrar na parte leste da floresta, seu treinamento começa imediatamente” – li a carta em voz alta e logo mirava Estrela Cadente que estava em meu ombro. Ela me mirou tão confusa como eu estava, mas decidimos ignorar e fazer o que a carta dizia. Fui até o quarto que tinha a porta aberta e deixei minha pequena bolsa encima da cama saindo do quarto logo em seguia.

Estrela Cadente vinha comigo ainda pendurada em meu ombro balançando levemente a cauda. Quando saímos da casa ela saltou do mesmo e foi na direção da parte de trás da casa, por pura curiosidade eu a segui vendo como ela entreva em uma outra casa, só que essa era menor e parecia ter apenas um cômodo, sua porta de madeira um pouco desgastada estava com uma pequena brecha aberta por onde Estrela Cadente havia entrado. Cuidadosamente eu empurrei a porta e entrei me deparando com algo simplesmente incrível! Nas paredes daquela pequena casa estavam pendurados vários arcos diferentes com suas próprias bolsas e flechas. Eram das mais variadas formas e tamanhos, alguns chegavam até mesmo a ser uma escultura de arte de tão belos que eram.

Ainda lembro da primeira vez que toquei em um arco e flecha, a sensação foi incrível e senti que realmente saberia usar um. Sei que parece estranho, mas acho que está em meu sangue esse tipo de coisa, sem falar que nunca me importei com o que diziam sobre os arqueiros. Era o seguinte: por terem habilidades tão peculiares como desaparecer sem mais nem menos, aparecer do nada, não fazer nenhum barulho, serem ágeis, entre outras coisas, muitos achavam que eles mexiam com magia negra por isso mantinham distancia deles o máximo possível. Eu ao contrario achava eles muito legais, adorava essas habilidades e sempre quis saber como eles conseguiam. Agora era minha chance de descobrir.

Dei alguns passos lentos na direção dos arcos e toquei com cuidado a base de madeira, sentindo a textura lisa que tinha o que eu estava admirando. Todos eram incríveis, tinha que admitir, mas um chamou mais a minha atenção do que qualquer outro. Ele tinha o arco moldado de madeira branca, talvez pintado ou de alguma árvore especial, ele formava um dragão de cauda longa, sendo que a ponta da mesma tinha preso a primeira ponta da corda. A cauda se esticava, se juntando com o corpo parecendo um só, tendo as patas tão juntas ao mesmo que nem pareciam existir, logo depois vinha a cabeça que era um pouco alongada e mal tinha diferença entre o focinho e a parte onde ficavam os olhos, era apenas uma depressão tão pequena que mal daria uma curva. A mandíbula do dragão estava fortemente presa, apesar de ainda mostrar seus dentes afiados e assustadores. A mesma prendia com firmeza a outra ponta da corda que seria usada para lançar as flechas. Era simplesmente uma obra de arte e seu eu pudesse gostaria de tê-lo, mas meu treinamento me esperava e acho que não me mataria se eu aguardasse alguns instantes até poder usar essa belezinha.

- Vem Estrela Cadente. – chamei enquanto andava na direção da porta. A mesma me seguiu, pulando em meu braço se escalando o mesmo até chegar em meu ombro. Sorri ligeiramente e acariciei a cabeça dela a fazendo soltar um leve ronronado enquanto caminhávamos para fora daquela cabana.

Fechei a porta com cuidado e dei uma ultima olhada antes de finalmente deixar aquilo de lado. Se não estivesse tão animada com meu treinamento acho que já teria pego aquele arco para me divertir. Caminhei despreocupadamente pela floresta, seguindo uma pequena trilha que tinha no mesmo. Observava tudo a minha volta, vendo as enormes árvores de troncos retos e de um marrom meio escuro e meio claro, os galhos baixos e altos que tinham sendo todos eles grossos e fortes, as folhas verdes viscosas que cresciam em seus galhos formando uma ótima proteção contra os raios do sol, apesar de algumas brechas deixarem passar a luz amarelada do astro rei, deixando apenas pequenos pontinhos de luz no chão. Eles pareciam iluminar pequenas partículas de alguma substancia que provavelmente era poeira, mas que por causa da luz dourada parecia ser pequenos pontinhos mágicos que flutuavam pelo ar. O caminho era cheio de passagens de terra e de grama, sendo que algumas partes possuíam algumas flores pequenas ou até mesmo grandes, cada uma com sua beleza.

Olhei para estrela cadente e a mesma miou como se já soubesse o que eu tinha em mente. Nós duas subimos em uma das árvores que tinham por ali e começamos a pular de galho em galho, tomando cuidado para permanecer nos mais grosso para assim não sermos derrubadas no chão com eles, ou pelo menos eu fazia isso. Estrela Cadente não tinha muito problema com isso já que era pequena e bem leve.

Pude ver em meu caminho alguns pássaros e animais e isso apenas me fazia sentir ainda mais livre, não tinha percebido que estar em um lugar cercado de paredes de pedras estava me fazendo mal, talvez o que eu precisasse era de uma vida ao ar livre e com arqueira talvez tivesse essa oportunidade. Mas onde será que estava aquele cara estranho? Qual era mesmo seu nome? Hum... Hunter!! Isso! Onde será que ele estava? Já estava andando há vários minutos...

Foi só então que vi duas silhuetas um pouco mais a frente. Olhei divertida para Estrala Cadente que me retribuiu com um sorriso mais travesso que poderia colocar em seu rostinho de gata. Ela então subiu um pouco mais nas árvores e procurou as pequenas nozes que usaríamos para incomodar seja quem for que estivesse lá. Aproximei-me sorrateiramente do lugar e vi que era aquele homem estranho que agora seria meu mestre com mais uma pessoa que estava de costas para mim e por isso não podia ver quem era, mas isso não importava. Iria fazer uma senhora aparição.

Em poucos instantes, logo depois de me ajeitar no galho e me preparar para acertar um dos dois, Estrela Cadente apareceu do meu lado trazendo o pequeno saquinho que ela sempre levava presa em seu pescoço e que eu tinha colocado para assim poder colocar os pequenos peixes que ela comia e assim ela o levasse para sua pequena casa, seja lá onde fosse. Ela me entregou com sua calda a pequena noz e logo me preparei para arremessar. Mirei bem na cabeça do que estava de costas para mim, prendi a respiração por causa da emoção, deixei o braço ficar um pouco relaxado e finalmente taquei o pequeno objeto, acertando em cheio a cabeça do garoto que estava conversando com meu mestre.

Segurando as gargalhadas que queriam sair de minha garganta pulei para outro esconderijo enquanto o garoto que tinha atingido passava a mão na parte da cabeça que tinha atingido a noz e logo depois mirava furiosamente a todos os lados, procurando a origem daquele ataque surpresa. Ri ligeiramente e logo preparei para tacar a outra noz, para assim acertar meu mestre, mas quando já ia fazer, já estava até mesmo preparada, algo me parou.

- Nem pense nisso mocinha. – tomei um susto ao ouvir o que aquele homem de cabelos castanhos curtos mal cortados tinha dito tão de repente. Por causa disso acabei escorregando do galho caindo em um amontoado de folhas secas que tinha no chão logo abaixo, sorte que não estava em um galho tão alto. Acabei caindo meio que de costas, com as pernas para cima e a cabeça deitada no amontoado de folhas, tive que erguer a cabeça para trás para assim mirar o homem que parecia ter a sombra de um sorriso no rosto. – Um pouco indisciplinada. – murmurou ele o que me ofendeu um pouco, apesar de saber bem no fundo de mim que era verdade. – Mas menos do que eu esperava para falar a verdade.

- Como soube que estava lá em cima? – perguntei indignada e magoada. Nunca alguém tinha percebido minha presença em minhas brincadeiras, sempre consegui fazê-las e escapar tão rápido quanto tinha feito, ninguém descobria que era eu, e por isso muitos dos guerreiros do castelo não tinham como me acusar. Ser superada dessa maneira era tão humilhante!

- Seus movimentos são silenciosos, mas tem muito que aprender ainda. – a raiva que sentia antes foi embora, enquanto um pequeno aperto em meu peito começou a me incomodar. Ele tinha me elogiado... Ele reconheceu o que eu fazia sem me xingar ou me acusar de alguma coisa. Eu realmente tinha ouvido isso? Realmente tinha presenciado isso? – Agora se levante daí para começarmos logo o treino.

Um sorriso inconsciente apareceu em meu rosto e como se já não bastasse senti meu coração acelerar como nunca antes. Era assim que se sentiam todos que recebiam elogios? Era assim que era sentir satisfação e orgulho? Era tão bom... Estrela Cadente lambia meu rosto tentando chamar minha atenção, mas eu só conseguia ficar pensando nesse sentimento que preenchia, aquela satisfação de si mesma que faz seu orgulho próprio crescer dentro do corpo, o tornando de certa maneira presunçoso. Acariciei a cabeça de minha pequena gata e me levantei ainda um pouco atordoada pelo o que tinha ouvido.

- Ei garota! – meu sorriso desapareceu e olhei confusa para o garoto que aparecera perto de mim, ficando apenas uns três passos de distancia. Fora o garoto que estava conversando com meu, agora, mestre e que lhe havia acertado a noz na cabeça. Agora podia ver melhor sua aparência, tinha os cabelos de um negro profundo bagunçados e rebeldes, mas aparentemente lisos e macios, os olhos eram de um azul marinho profundo e belo, a pele de um moreno reluzente, talvez por treinar muito na luz do sol, era alto devia ter pelo menos seu um metro e noventa ou oitenta e cinco, não menos nem mais. Tinha um corpo atlético, apesar de não ser robusto ao igual o de Tyler. Ele usava uma capa verde escuras com manchas mais claras parecendo que desaparecia com a vegetação atrás, tinha uma blusa negra sem mangas que lhe cobria o dorso e uma calça também negra, usando botas de couro negras. Alguém deveria mostrar ao garoto ai que existia outras cores além do preto. – Da próxima vez vá tacar nozes na cabeça da sua avó!

- Quando você descobrir quem é ela eu lhe agradeceria se me contasse. – respondi sorrindo zombeteiramente para ele e logo caminhando despreocupada até onde estava meu mestre. Não sabia quem era esse garoto, e falando sério, não me importava em saber. Ele seria apenas mais um alvo de minhas brincadeiras e mais um que me julgaria por minha aparência, antes de me conhecer melhor. Como todos faziam. – Sem falar que você deveria ter visto sua cara quando te atingi, foi hilária!

- Ora sua pirralha sem vergonha, devia ter mais respeito com os outros! – gritou o garoto se aproximando furiosamente de mim, mas acham mesmo que eu recuei? Ele podia ser maior que eu, mas nem por isso aparentava perigo. Era apenas mais um garoto idiota que tentava usar o tamanho e a força para intimidar os outros e eu não seria levada com tanta facilidade. O mestre pigarreou e o garoto parou, olhando para mim com raiva, mas não dando mais nenhum passo se quer. Eu sorri vendo que ele tinha medo de um homem que devia ser pelo menos vinte e cinco centímetros menor que ele. – Mestre, como aceita uma garota como essa?! Olha para ela! Pequena, magra, desajustada e completamente desrespeitosa!

- O que já lhe ensinei Leon? Não se julga alguém pela aparência, isso pode lhe levar a ruína em uma batalha. – falou o homem se mantendo indiferente no lugar onde estava e mais uma vez senti meu coração acelerar. De certo modo ele estava insinuando que eu podia ser melhor do que aparentava e era tudo isso que eu pedia para os outros enxergarem! Era tudo o que eu queria mostrar! Sorri enquanto o garoto a poucos passos de mim grunhia de leve. – Agora se preparem que o treinamento vai começar. E se acostume Leon, que até você se “formar” vai ter que aturá-la como sua parceira de treino.

O garoto grunhiu mais uma vez e eu virei meu rosto para vê-lo mostrando-lhe a língua enquanto estrela cadente em meu ombro soltava miados que pareciam mais uma risada de gato. Ele trincou os dentes e se aproximou de onde estávamos, se colocando alguns centímetros a meu lado. Então esperei que o treino começasse, que o mestre voltasse a falar indicando o que era para fazermos.

- Começaremos com um exercício simples, mas básico para o aprendizado dos arqueiros. Star, preste bastante atenção e tente se sair o melhor que conseguir. – assenti confiante. Era isso mesmo que pretendia, faria meu melhor e mostraria a todos o que era capaz de fazer. – Um esconde-esconde. – ta, por essa eu não esperava. Aquele mestre estava pirando ou algo do tipo? – Terão que se manter ocultos na floresta para que eu não os ache. Mas como agora terão que aprender a trabalhar em equipe esse “jogo” terá mais uma regra. Se eu achar um de vocês, o outro será obrigado a sair de seu esconderijo e se entregar. Entendido?

Eu e o garoto sem cor do meu lado assentimos e esperamos o sinal para começar. O mestre ergueu a mão e logo que abaixou eu corri o mais rápido que consegui para a floresta, desaparecendo na mesma. Estrala Cadente se segurava vem firme em meu ombro, mantendo as orelhas de gato bem erguidas para me ajudar na missão que tinha. Subi em uma das árvores e me escondi entre os galhos, lá era onde melhor me escondia e sabia me locomover sem fazer barulho, fiquei então encolhida entre algumas flores bem quieta e imóvel, para assim não chamar a atenção. Procurei o mais rápido que consegui o homem que deveria me procurar.

O vi ainda parado no mesmo lugar onde tudo tinha começado, sem nem mesmo parecer mover a cabeça para procurar em algum lugar. Prendi a respiração, supondo que ele movia apenas os olhos e de repente ele desapareceu. Meu corpo ficou tenso de repente e pude sentir uma presença do meu lado. O mais discretamente possível, movendo bem devagar meu rosto, olhei para o lado me encontrando com a figura do meu mestre no galho bem ao lado do meu, com a cabeça ainda imóvel e parecendo uma estatua de tão parado que estava. Seu corpo quase desaparecia na escuridão e percebi que a capa que usava tinha algo haver com aquilo. Estrela Cadente em meu ombro também ficara quieta até eu lhe mandar um olhar que ela compreendeu perfeitamente.

Rápida como um raio ela saltou do meu ombro para outro galho, parecendo apenas um vulto negro cortando o ar. Ela então saltou para outro, e então outro, e mais um chamando a atenção do arqueiro a meu lado que não perdeu tempo em acompanhar. Eu esperei por alguns instantes e então saltei para o chão, procurando fazer o mínimo de barulho possível e me escondi entre uma árvore e um arbusto que tinha por perto da mesma. Deixei-me imóvel novamente, o coração aos saltos e a respiração ainda presa, queimando meus pulmões que pediam ar com urgência. A doce sensação da adrenalina que me mantinha viva novamente percorria meu corpo, tão costumeira que quase não a percebia, mas sabia que estava lá. Olhei discretamente em volta, procurando alguma coisa que pudesse chegar a me denunciar, ou que me indicasse que o arqueiro estava perto.

Havia percebido que ele era realmente bom, detectava qualquer movimento seja ele qual for e por isso tinha que tomar cuidado. Nem me preocupei em procurar meu companheiro, ele era evidentemente mais velho que eu nessas artes místicas dos arqueiros e não devia ter muitos problemas em se ocultar e deixar de fazer barulhos. Eu, ao contrario, não tinha tanta experiência assim e tudo o que sabia era por causa de minhas brincadeiras que sempre fazia pelo castelo. Mas agora não tinha pessoas inexperientes, agora era um homem que era acostumado a esse tipo de serviço e já tinha demonstrado que era capaz de me encontrar.

A adrenalina aumentou meus sentidos e agora conseguia ouvir melhor do antes. Os sons da floresta enchiam meus ouvidos enquanto procurava algum sinal de vida humano no lugar. Meu coração ainda batia acelerado e procurava pensar que se fosse encontrada estaria morta, assim a adrenalina não ia embora e eu estaria segura. Pensei então que poderia saltar para outro esconderijo, deslizar pelas sombras e assim ficar em uma parte mais oculta da floresta e ficar escondida até tudo parecer se acalmar e o sinal fosse dado para eu sair.

Analisei o vai e vem das árvores, suas sombras, onde estavam mais escuras e eu poderia me esconder. Olhei o terreno para ver onde poderia pisar e onde poderia fazer barulho. Depois de tudo calculado em minha mente, deslizei o mais rápido que consegui pelas sombras, indo de uma árvore a outra procurando me manter oculta em suas sombras. Quase não respirava e meus músculos estavam tensos, preparados. Foi só então que encontrei uma brecha entre dois arbustos onde meu corpo entraria com facilidade e poderia me manter escondida, sem que ninguém percebesse.

Rapidamente me encolhe entre os arbustos e esperei novamente ouvir algum barulho que denunciasse a presença humana, seja ele qual for. Também procurava encontrar Estrela Cadente, que podia me localizar pelo cheiro, como um animal essa era uma vantagem e do jeito que era astuta muito provavelmente tinha escapulido do arqueiro, pelo menos isso eu esperava. Foi então que um leve barulho ecoou pelo ar e meu corpo teve a reação de um ligeiro sobressalto. Não deu para controlar aquilo, foi uma pequena mexida e depois nada, não me movi, nem mesmo respirei. Esperei que não tivesse revelado minha localização, que aquele leve movimento que fiz tivesse passado despercebido. Mas...

Algo segurou a gola de minha blusa azul com branco, que escorria até além da saia e chegava a dobra do joelho, mas e na frente, perto do umbigo se abria e por isso não tampava a parte da frente de meu corpo. Fui puxada para cima, sendo tirada de entre os arbustos e ficando completamente exposta ao meu mestre que me olhava com os olhos indiferentes. Amaldiçoei-me em pensamentos porque sabia que o erro tinha sido meu, sabia que eu havia me denunciado e que o mais lógico era perder. Estrela Cadente saltou em meu ombro e eu lhe sorri um pouco triste, acariciando sua cabeça para mostrar que tinha feito um bom trabalho.

Meu mestre me dirigiu até onde tudo tinha começado e então me deixou no chão. Logo depois o garoto sem cor apareceu, saltando de uma árvore e mostrando que respeitava as regras do jogo. Fiquei com a cabeça um pouco erguida e um pouco baixa, não encarava ninguém porque sabia que tinha falhado no que era preciso naquele treino. Estranhamento meu mestre colocou a mão em minha cabeça e a acariciou com cuidado.

- Foi muito esperto da sua parte fazer a gata ocultar sua presença. – elogiou e eu o mirei um pouco surpresa. Tinha percebido? Foi depois de ver que era Estrela Cadente ou foi antes? Seja como for já eram três elogios em um dia! Já estava sendo um ótimo começo. – Agora temos que mudar essa sua reação de surpresa quando escuta um barulho. Se estivesse no meio de uma guerra com pessoas experientes como eu estaria morta agora. Mas como hoje é seu primeiro dia teremos tempo suficiente para concertar esse sua falha.

- O-obrigada. – falei quase sem voz. Ele se afastou de mim e foi felicitar o garoto logo a frente. E olhei para Estrela Cadente e ela miou feliz, mostrando que também tinha ficado contente de alguém ter percebido minhas qualidades. Sorri para ela e fiz um pequeno carinho em sua cabeça, ela ronronou prazerosa e passou a cabeça em meu pescoço retribuindo a caricia.

- Agora treinaremos suas habilidades de camuflagem. Você já mostrou ter qualidade em se esconder Star, mas como disse antes ainda tem muito o que melhorar e para isso teremos que ver como usa as sombras a seu favor. – assenti compreendendo e esperei ele falar o que era para eu fazer. Ao parecer dessa vez seria apenas eu. – Passe de uma sombra para outra, tentando se manter oculta de mim e de Leon. Faça seu melhor.

Assenti e me preparei. Novamente analisei os movimentos das árvores com relação ao vento, calculei quando deveria ir e então disparei entre as sombras procurando usá-las para ocultar minha presença. Fui de um lado para o outro, pulei de árvore em árvore correndo o máximo que podia e quando terminei parei na frente dos dois com a respiração agitada e as pernas um pouco tremulas por tê-las forçado a ir ao máximo. Meu mestre me mirou atentamente e eu o encarei, esperando seu julgamento. Nem me preocupei em olhar para meu parceiro, em minha opinião achava que ele me colocaria um tanto de defeitos para parecer superior a mim. Era o que quase todos faziam pelo menos.

- Precisa aprender a se manter oculta e silenciosa ao mesmo tempo. Tem que se mover com mais agilidade para passar uma sombra para outra e ainda não sabe como desaparecer completamente entre elas. – falou e eu assenti compreendendo. Tinha muitas coisas que melhorar e esperava conseguir no tempo que ficaria em meu treino. Novamente, com o ato carinhoso ele levou uma mão até minha cabeça e bagunçou um pouco meus cabelos de cores tão peculiares. – Mas tem talento. – Sorri inconscientemente me sentindo feliz por ter encontrado alguém que percebesse do que era capaz. – Agora fiquem ai enquanto eu vou buscar algumas coisas para vocês, sem confusão.

Sentei-me no chão e fiquei observando ele se afastar. Estrela Cadente deitou em meu colo e eu fiquei acariciando sua cabeça distraidamente pensando se como arqueira poderia descobrir alguma sobre meus pais. Era divertido esses treinamentos, apesar de ser puxados e bem complicados se pensassem bem. O vento soprou e senti meus cabelos se afastando de minhas costas sendo empurrados para trás. Era bom finalmente se sentir reconhecida.

- O que quis dizer? – perguntou o garoto que agora se encontrava ao meu lado. Eu o mirei sem entender e ele apenas retribuiu o olhar com um desinteressado e indiferente. – O que quis dizer quando falou que caso eu soubesse quem era sua avó era para te contar?

- Ah! Não é nada, eu só não conheço ninguém da minha família. – falei dando de ombros, para variar escondendo o que realmente sentia quando falava sobre isso. Incomodava-me, dizer que não tinha família que era uma garota sem um pingo de conhecimento sobre seus próprios ancestrais. – Cresce como a única acolhida que não sabia sobre seus parentes. Agora podemos falar de outra coisa? Tipo, como virou um arqueiro? Não lembro de você como Acolhido.

- Porque não sou um de vocês. – respondeu virando o rosto para outro lado e encarando a floresta que tinha ao nosso redor. – Vim de uma família de arqueiros e quando completei meus dezesseis meu pai me enviou para a ordem. Hunter foi o único que viu qualidade em mim e desde então esta me treinando.

- A quanto tempo você treina? – perguntei curiosa enquanto Estrela Cadente pulava em meu ombro e logo depois se colocava em minha cabeça me fazendo rir ligeiramente. Acariciei novamente sua cabeça e encarei o garoto que apenas suspirou.

- Quatro anos. – falou e eu parei um pouco para pensar. Quatro anos era tempo suficiente para completar meu treinamento e ser a melhor, assim provaria a todos que podia ser boa, que podia merecer atenção! Um pequeno sorriso apareceu em meu rosto enquanto imaginava como poderia ficar nesse tempo. – Não vai dizer nada? – eu o mirei sem compreender o que queria dizer. – Não vai caçoar da minha cara? Dizer como posso estar tanto tempo treinando? Ou qualquer coisa do tipo?

- Desculpe, mas os alvos das minhas zombarias são outros. – respondi sorrindo e piscando um olho para ele, mostrando que para mim não tinha nada haver o tempo que levava para se aprender alguma coisa. Voltei meu olhar para cima e tirei Estrela Cadente de minha cabeça a erguendo para que a mirasse desde cima. – Não é Estrela Cadente. Ainda vamos acabar com aquele brinquedo de cachorro que ousou falar mal da gente!

Estrala Cadente miou alegre e eu sorri. Minha melhor e única amiga, ela sempre estava do meu lado e eu do dela, por isso se alguém a maltratasse como aquele homem tinha feito ia pagar caro, muito caro! Foi então que o mestre saiu de trás das árvores trazendo consigo uma sacola grande de couro que foi deixada no chão pelo mesmo. Curiosa, me aproximei para ver o que tinha dentro, erguendo o pescoço quando ele abriu a bolsa e dela tirou um arco de madeira negro que reluzia como se fosse até mesmo de metal, algumas faixas brancas passavam por ele no centro de sua curvatura e paravam antes de chegar nas pontas dos dois lados, deixando uma parte para mostrar a cor da madeira. A fina linha que prendia uma ponta a outra do arco era meio grossa e também negra dando para ver perfeitamente dependendo dos ângulos que se colocava o arco. Meu mestre tacou o arco na direção do garoto sem cor que o pegara com facilidade e novamente se voltou para a bolsa tirando dela agora uma aljava de couro negra com partes brancas das linhas que costuravam os componentes da aljava, as flechas que tinham dentro eram de cabo também negro, as penas na ponta da flecha eram brancas e a ponta dela onde tinha a parte de metal formava um triangulo fino que reluzia com os raios do sol que passavam pelas copas das árvores. Novamente meu mestre o entregou para o garoto sem cor.

Foi então que meus olhos brilharam quando o vi tirar de dentro da bolsa aquele belo arco que era moldado como um dragão, branco como a neve. Não era muito grande e tinha a impressão que seria próprio para mim. Minhas mãos formigaram para encostar nele, para segurá-lo e usá-lo e me surpreendi quando meu mestre o levou até mim. Mirei o arco e depois a ele, completamente confusa e pela primeira vez indecisa do que fazer. Com cuidado e um pouco de temor levei a mão até o arco e o segurei, tendo a incrível sensação de poder e conhecimento. Acreditava que sabia usá-lo, realmente acreditava. Estiquei um pouco a corda e apontei para algum lugar como se realmente estivesse me preparando para atirar. Era incrível!

Foi então que o mestre me entregou uma pequena aljava, tinha flechas proporcionais ao tamanho do arco, seus cabos eram esbranquiçados e as penas na ponta eram de um azul bem claro. A aljava era branca com detalhes azuis que lhe contornava quase por completo. As pontas de metal das flechas também formavam um belo triangulo que reluzia com a luz do sol. Toquei de leve a ponta constatando que era bem afiada.

- Esse vai ser seu arco daqui por diante. Então tome conta dele. – assenti ainda um pouco atordoada e então um enorme sorriso surgiu em meu rosto. Coloquei uma flecha no arco e apontei para uma árvore que tinha alguns metros a minha frente, fechei os olhos e mirei puxando lentamente a flecha para trás, esticando a linha quase transparente do arco e logo soltei. Mas diferente do que eu imaginava a corda bateu em meu braço, fazendo uma forte dor surgir no mesmo me obrigando a soltar o arco e ocasionando da flecha cair no chão a poucos centímetros de mim.

- Precisa de uma luva como essa. – falou o garoto sem cor mostrando a luva que estava em sua mão esquerda e que antes eu não havia percebido. Era negra para variar e pegava praticamente todo seu braço até um pouco acima do cotovelo. Foi então que me lembrei de minha luva prateada que deveria ter deixado em minha bolsa dentro da cabana que tinha ido antes de vir para cá. – Ela protege seu braço quando isso acontece.

Foi então que ouvi um miado e Estrela Cadente apareceu do meu lado puxando com sua boca minha luva prata de arqueiro. Sorri para ela e peguei a luva acariciando sua cabeça como forma de agradecimento.

- Quando foi que pegou isso espertinha? – perguntei sem esperar realmente uma resposta e coloquei a luva sobre minha mãe esquerda, tampando a dita marca que ninguém percebia, por incrível que pareça. Voltei a posicionar a flecha no lugar e mirei o lugar que antes pretendia acertar. Puxei a flecha para trás e esperei um pouco e então a soltei, e dessa vez a corda apenas acertou o couro enquanto meu braço ficava em segurança. A flecha cortou o ar e acertou o tronco da arvore, um pouco mais ao lado do que eu queria, mas acertou. – Eu queria que tivesse sido mais para o centro.

- Como é sua primeira vez essa tentativa foi muito boa. Não espere que sempre vai conseguir de primeira. – falou o mestre, mas eu não me sentia satisfeita, me levantei posicionei outra flecha e apontei, mas de novo não tive um resultado bom.

E foi assim a tarde inteira. Quando finalmente o sol começou a se por voltamos para a pequena cabana que antes havia estado primeiro. Fui, graças a deus, a primeira a tomar um banho colocando para dormir uma camisola azul bem folgada para assim dormir cômoda. Não me importava de estar entre garotos, como gostava de dizer, não havia nada em meu corpo que pudesse chamar a atenção, pelo menos não que eu via. Depois que sai do banheiro fui ver o que tinha para jantar e como não vi nada sendo preparado decidi que eu mesma prepararia o jantar essa noite.

Pode não parecer, mas sei algumas coisinhas de culinária graças a Carol que muitas vezes não me via do lado dela e preparava as comidas comigo observando e aprendendo apenas nisso. Preparei o fogo e deixei a água ferver em uma panela que encontrei por ai, fui até os mantimentos e peguei um pouco de carne, legumes e verduras e piquei a todos em pequenos pedaços com uma faca que também achei por ai. Quando a água estava praticamente fervida coloquei os ingredientes dentro dela e mexi com uma colher de madeira que, adivinhei! Encontrei por ai. Depois de alguns minutos só misturando finalmente ficou pronto e eu apaguei o fogo, peguei alguns pratos que acho que nem preciso dizer que encontrei por ai e coloquei os três na mesa, cada um com um pouco da sopa.

Sentei-me na mesa e comi o que tinha em meu prato, sem nem mesmo esperar que os outros dois aparecessem. Quando já estava na metade de meu prato o garoto sem cor apareceu na porta da cozinha parecendo ter finalmente sentido o cheiro da sopa e como um raio se sentou na mesa e começou a comer. Eu ri e deixei um pequeno pedaço de carne para Estrela Cadente que acabara de aparecer.

- Nossa parece que você não come a dias! – falei divertida tentando conter as risadas que queriam sair da minha boca. Tomei o resto da minha sopa e caminhei até a pia que tinha ali perto lavando o prato que tinha usado e depois andei até a porta. Não era das que comia muito se perceberam.

- Depois de quatro anos comendo apenas carne seca porque ninguém sabia cozinhar acha que desperdiçaria essa chance de ter algo decente? – perguntou enquanto devorava a sopa e logo se levantava e ia até a panela cheia quase até a borda e se servia de mais. Foi só então que ele me olhou sair. – Não vai comer mais? Seu prato quase não tinha nada.

- Não estou com muita fome. – respondi me abaixando para acariciar a cabeça de Estrela Cadente que estava bem do meu lado. Logo me levantei e voltei a caminhar na direção da porta da cozinha para sair e ir para meu quarto. – Pode ficar com toda a sopa.

- Depois fica perguntando porque é tão magra. Não come nada! – ele voltou a devorar a sopa enquanto eu apenas ria. Minha falta de apetite era realmente peculiar, não comia quase nada e nunca me fez mal, apenas me deixou bem magra mesmo. Ri divertida ao pensar nesses meus problemas, era rir para não chorar. Fui até meu quarto e me fechei nele, sentei na janela e apenas mirei o lado de fora, observando as estrelas que reluziam de uma maneira tão bela. Acariciei a cabeça de estrela cadente que estava em meu colo.

- Vou precisar fazer alguma coisa para me divertir Estrela Cadente. Sinto que aquela dor esta voltando. – murmurei levando a mão ao peito e segurando a camisola que usava com força. Estrela Cadente miou preocupada e eu apenas me ajeitei na mesma e logo pulando para fora. A casa era apenas de um andar, simplória e que facilitaria minhas escapadas. Estrela Cadente pulou em minha cabeça e enquanto desaparecíamos pela floresta não percebi que alguém me vigiava.

Subi nas árvores e sem me incomodar com o que estava vestindo pulei de galho em galho indo na direção do castelo e quando cheguei nos muros do mesmo, perto de onde estava a área dos acolhidos, meu lugar favorito para infernizar a vida dos vigias que quase sempre estavam despencando de sono. Sorri para Estrela Cadente, agora teríamos mais chances de não ser pegas, já que para a maior parte das pessoas de lá, eu tinha apenas sumido! E era para nunca mais ser encontrada, pelo menos por um tempo. Me sentei em uma árvore estratégica e peguei umas das nozes que tinha no saquinho que Estrela Cadente tinha pendurado no pescoço e me preparei para lançá-la. Mirei e então taquei acertando em cheio a cabeça de um dos sentinelas.

- Agora entendo como você tem uma mira tão boa. – quase cai da árvore quando ouvi aquela voz e ao me virar para o lado me encontrei com o garoto sem cor se acomodando em um galho próximo ao que eu estava. Ele me encarou de maneira reprovativa. – Será que você não consegue ficar um segundo sem tentar acertar a cabeça de alguém com essas coisas?

- Não reclama antes de tentar. Pode ser bem engraçado, olha só. – peguei mais uma noz, mirei e então a lancei mais uma vez na direção de um dos sentinelas que ao sentir a forte pancada em sua cabeça deu um salto, despertando de seu leve cochilo e mirou todos os lados. Eu ri divertida e o garoto ao meu lado suspirou. – Sem falar que sem mim esses guardas já teriam perdido o emprego de tanto que dormem no serviço.

- Pior que nessa eu vou ter que concordar. – falou ele em um suspiro e eu voltei a tacar uma noz em outro dos guardas rindo a cada reação que eles tinham. – Por que fica fazendo isso? Ouvi Hunter conversando com o Barão antes de te fazerem aquele teste, você faz todas essas brincadeiras, por que? O que ganha com isso? Tem prazer em se divertir com os outros?

- Meus motivos não são meio de discussão. – retruquei ficando agora com o rosto sério e tacando mais uma noz em um dos guardas. Estavam acabando e logo não teria mais nada para me distrair. – Não é por prazer, não é simplesmente por fazer, é por algo que ninguém entenderia então agradeceria se ao invés de ficar me julgando e fizesse algo que prestasse.

- Se esta dizendo para eu incomodar os soldados como você esta fazendo pode ter garantido que não vou fazer! – ia tacar mais uma noz quando parei e virei o rosto para vê-lo. Um sorriso divertido apareceu no meu rosto e então entreguei a noz para ele. – O que foi que eu acabei de dizer?!

- Já falei para não julgar antes de tentar. Agora faça! – ele me mirou um pouco hesitante e logo depois olhou para um dos guardas que estava quase dormindo em seu posto. Sorri quando o vi erguer o braço e preparar, esperou o momento certo e quando o guarda estava quase realmente dormindo, naquela parte boa do sono, bem no inicinho dele, ele tacou a noz que acertou em cheio bem no meio da testa do homem que chegou a cair por causa do susto. As risadas foi geral e eu tive que segurar para não cair do galho enquanto ria. – Falei que era divertido!

- É... Acho que não vai ser tão ruim ter uma companheira de treino afinal. – falou sorrindo carinhosamente. Eu ergui uma mão e neguei com o dedo, fazendo-o ficar confuso.

- Pode ter garantido que vou ser a companheira mais irritante que você já teve algum dia! – disse sorrindo de maneira divertida enquanto ele fazia uma cara de indignação. – Se eu fosse você se preparava Garoto Sem Cor, porque minhas brincadeiras vão para qualquer um!

- Garoto sem cor? – perguntou ele confuso e eu assenti com um enorme sorriso no rosto.

- Só chamo pelo nome aqueles que são realmente dignos ou muito idiotas para entender meus apelidos. Por isso vai ficar sendo Garoto Sem Cor para mim até mostrar alguma qualidade interessante! – exclamei sorrindo ainda mais enquanto o garoto parecia ficar indignado.

Talvez tivesse suas vantagens ter companhia e aquele garoto parecia ser bem divertido!