A Ultima Fuga

Capítulo 68- O encontro (parte 2)


O cortinado estava abaixado. Ela viu uma sombra sobre os travesseiros. Aproximou-se com suavidade, pensando que afinal, ia ver sua baba.

Foi então que ela escutou um ruído às suas costas. Ouviu a porta se fechar, e a chave girar na fechadura.

Emily se voltou e soltou um grito de imenso pavor

De pé, com as costas para a porta, estava Lord Noel!

Depois do primeiro grito que escapou de seus lábios, Emily sentiu-se como se estivesse congelada e paralisada. Não podia correr nem fugir. Nem mesmo podia dar um passo. Encarava Lord Noel, com os olhos arregalados de medo, enquanto examinava o aspecto

dele os olhos duros a contemplavam com uma expressão que ela conhecia muito bem. Os lábios cruéis estavam torcidos em um sorriso sem humor. Parecia-lhe mais alto do que antes. A largura dos ombros, e a força das mãos faziam-na se lembrar, com um súbito tremor, dos castigos que ele lhe infligira. Lord Noel não falou.

Apenas permaneceu de pé, encarando-a, até que Emily perguntou em voz tremula e medrosa: - Por que... está aqui? Onde... estou?

– Vou responder primeiro à sua última pergunta disse ele. Você está em minha casa.- diz Noel

– Sua... casa?- diz Emily

– Sim, é minha! Foi aqui que a mãe sua prima morreu há cinco anos passados. Agora herdei esta casa. Eu não sabia o que fazer com uma propriedade tão inútil, quando me lembrei de você.- diz Noel

– De mim?!- exclamou Emily com dificuldade.- Mas... me disseram que... Ella... estava aqui... Onde está ela?

Olhou para a cama com ansiedade. Constatou que se encontrava vazia.

– Se lhe serve de consolo, não tenho a menor ideia sobre o paradeiro de sua criada.- diz Noel

– Mas... a freira... a freira me disse que Ella estava doente!...- diz Emily

– A freira!- Lord Noel riu.- Você sempre foi ingênua e fácil de enganar, querida Emily. Não foi preciso muita habilidade de minha amiga, embora ela seja uma atriz, para convencer você a vir aqui.

– Então... foi uma... armadilha? - sussurrou Emily.

– Uma armadilha. Se é o nome que prefere. Eu prefiro pensar que você desejava me visitar, Emily. Achei que queria agradecer-me por ter você em minha casa durante tantos anos!- Diz Noel

Emily notou que ele zombava dela.

– A casa não era sua -replicou Emily com raiva.- Eu morava com minha prima. Quando ela morreu, o senhor abusou de sua condição para me forçar a um casamento absurdo!

– Que você conseguiu evitar, com uma habilidade inegável!- exclamou Lord Noel- Parabéns, Emily. Pensei que tinha dominado seu gênio, mas estava enganado. Eu deveria ter surrado você com mais violência...

Houve um tenso silêncio.

– Não pode... me manter... aqui- gaguejou Emily- Eu quero... ir embora.

– Primeiro, há certas formalidades a serem completadas.- diz Noel

– Minha... esposa... vai me procurar...- diz Emily

– Acho que não -disse Lord Noel- Se minha informação é correta, ela deixou Londres. Só voltará amanhã.

– Como... sabe...?- gritou Emily.

– Minha querida, não deve subestimar minha inteligência- retrucou Lord Noel- Você não é a única pessoa com inclinação para a intriga. Estive esperando que sua esposa se ausentasse. Eu sabia que nem mesmo o seu encanto iria prendê-la para sempre a seu lado. Quando eu soube que ela ia viajar, compreendi que minha oportunidade chegara.

– Oportunidade... de quê?- diz Emily

– De duas coisas: em primeiro lugar, Milady, exijo dinheiro!- diz Noel Falava com cinismo. Quando viu a expressão de alívio do rosto de Emily, acrescentou:- Segundo, eu quero você!

– Não sei... o que... quer... dizer.- diz Emily

– Será preciso explicar?- interrogou ele. Sua voz era tão ameaçadora

Emily.falou depressa: - Eu lhe darei dinheiro... todo o dinheiro que quiser... se me deixar ir agora... imediatamente.

–Já é um passo na direção certa! ele sorriu. Foi tolice sua ter fugido de mim. Tudo teria sido mais fácil, querida Emily, se eu tivesse o controle do seu dinheiro. Mas, como a situação se apresenta agora, temos que admitir que mereço uma parte justa. Mas as coisas não são tão fáceis como poderiam ter sido.

– Quanto quer?- diz Emily

Lord Noel caminhou em direção a uma secretária que estava a um canto do quarto, em frente à janela. Baixou os olhos para um papel sobre a folha de mata-borrão. Então, como se a luz não fosse suficiente, caminhou para a janela, e abriu-a com estardalhaço.

– Aqui está um cheque, Emily. E também uma carta. Você vai preencher o cheque no valor de cinco mil dólares. Depois assinará esta carta, dando-me o poder de receber o dinheiro. Assim, não haverá problemas quando eu apresentar o cheque.

Emily caminhou depressa pelo quarto em direção à escrivaninha. Sentou-se na cadeira e segurou a pena. O cheque já estava feito, no valor de cinco mil dólares. Ela assinou seu nome e, sem se preocupar em ler a carta assinou-a também.

–Agora... que tem o dinheiro... posso... ir embora? -disse ela.

Ele riu: - Como vai fazer isso, Emily? Você me desafiou muitas vezes. Mas acho que, fisicamente, eu sempre fui vencedor.

– Eu já lhe dei o que queria -falou ela com decisão. Vou lhe dar o dinheiro, sem protestar... Agora, preciso ir. Se eu não estiver em casa...

Lord Noel riu: - Se não estiver em casa, o que vão fazer? Sua Esposa está a caminho de Epsom. Seus criados estão acostumados à vida estranha e imprevisível dos nobres. Você está visitando uma doente... Seria natural ficar retida por alguém que precisasse de você...

Ela notou o tom de maldade em sua voz. Estremeceu e empalideceu: - Deixe-me... ir.

As palavras eram um sussurro.

– Os bancos já estão fechados a esta hora- disse Lord Noel- Você vai ficar até eles abrirem amanhã de manhã. Para que não tente me enganar, como já fez de outras vezes.

– Eu não vou fazer isso de novo... eu lhe prometo... -gaguejou ela.- O dinheiro já é seu... Posso emitir outro cheque de cinco mil... contanto que eu possa ir embora...

– Terei mais cinco mil em outra ocasião -respondeu Noel- Na verdade, minha querida, devo explicar meu plano mais minuciosamente. Pretendo receber dinheiro de você, sempre que eu precisar. Você sabe, não sou tão ambicioso para pedir muito de uma vez. Isso Poderia levar o banco a fazer perguntas a sua esposa. Então prefiro que me de cinco mil dólares, periodicamente, sem levantar suspeitas.

Fez uma pausa, percebendo que Emily o ouvia com atenção. Cada músculo do corpo da jovem estava tenso.

Lord Noel prosseguiu: - Inteligente e instruída como você é, já sabe agora que seria bobagem de minha parte fazer chantagem contra você. A menos que eu tivesse alguma coisa para usar na chantagem. Não acha?

– Não sei... o que está... tentando dizer.- diz Emily

–Acho que sabe - retrucou Noel- Você é uma garota inteligente! Sempre foi... inteligente demais! Eu- gosto de mulheres tolas, que não se opõem durante muito tempo... embora seja divertido dominá-las, torná-las submissas... como pretendo fazer com você...

– Diga o que quer! -gritou Emily como se não pudesse mais suportar aquela voz sarcástica.

– Quero você! -respondeu ele.- Eu sempre quis você! Não compreendeu que, como eu não podia odiá-la, sentia prazer em surrá-la? Havia alguma satisfação naquilo, Emily. Mas não suficiente para mim. O que pretendo agora, é torná-la minha. E como você não vai querer que sua esposa saiba que você a traiu... vai me pagar para guardar segredo.

Calou-se. Quando voltou a falar sua voz era dura:

– Você vai me pagar não somente uma vez, mas sempre que eu lhe pedir dinheiro. Vai pagar e continuar pagando, para que sua bela esposa não abandone ou não a expulse de

sua casa.

– Como pode... sugerir tal coisa?- perguntou Emily-. Como pôde... pensar em alguma coisa... tão sórdida. Tão degradante?! Eu... preferia morrer...

Lord Noel riu: - Como vai conseguir morrer? Não pode se matar a facadas... sem ter uma faca... Não pode dar tiro em você mesma, sem um revólver..

Ele tirou uma pistola do bolso, enquanto falava. E atravessando o recinto, colocou-a sobre a lareira: - Ali ela está segura. Você não poderá tirá-la de mim. E agora, Emily, acho que não temos mais nada a dizer. Dispomos da noite inteira para discutir esses assuntos. Podemos combinar os detalhes de nossa convivência. Agora, estou desejando beijá-la. Já não é como antes, que você tinha uma governanta para guardá-la como um cachorro fiel. E eu tinha sua prima, para vigiar cada movimento, cada olhar que eu dirigia a você, cada palavra... sua prima era muito ciumenta!

Enquanto falava, Lord Noel tirou o casaco e colocou-o sobre uma cadeira. Usava um colete trespassado, que brilhava sob o fogo da lareira. Quando se voltou para Emily, em mangas de camisa mas com a gravata ainda presa com elegância ao redor do pescoço, ela soltou um grito de terror e correu para a janela.

Estava pronta a se atirar dali. Lord Noel a seguiu com rapidez. Em três passadas estava a seu lado. Agarrou-a e tomou-a nos braços, no momento em que ela segurava o caixilho da janela que dava para uma varanda.

– Pensa realmente que pode fugir de mim?- perguntou ele.

Havia uma nota divertida em sua voz. Ele prendeu-lhe os braços para beijá-la. Ela quase perdia a respiração. Depois, passou um dos braços por sua cintura e com a outra mão, sem que ela pudesse se mover, tirava seu casaco, arrancando-o dos seus ombros.

– Deixe-me ir! Deixe-me ir!- gritou Emily, começando a lutar.

Ela lutou contra ele, mas enquanto fazia, sabia que sua resistência era inútil. Ele se inclinou sobre seu rosto, os lábios procurando os dela, as mãos segurando seus braços, imobilizando-a.

Ela moveu a cabeça de um lado para o outro, compreendendo que estava nas mãos dele.

– Não adianta lutar- disse ele, cinicamente- Não quero bater em você até deixá-la sem sentidos... Mas você parece não compreender que não há fuga! Fique sabendo que desta vez você não pode escapar!

Emily lutava com todas as suas forças. Ela podia sentir seu coração batendo tão depressa, que era difícil respirar. Queria gritar, mas sua garganta parecia fechada. Nenhum som saía de seus lábios.

Então, Lord Noel segurou-a com uma das mãos, e ergueu seu queixo com a outra. Virou o rosto de Emily, rudemente, em direção ao seu, e colou sua boca à dela. Ela sentia terrível repugnância dos lábios dele.

Tudo parecia escurecer, mas ela sabia que precisava continuar lutando, embora sentisse que suas pernas não iriam obedecer-lhe por muito tempo. Com um ultimo esforço Emily rezou para que pudesse morrer. No entanto, ainda gritou por socorro e pela vida.


Nesse instante, ouviu-se um tremendo abalo na janela. E, imediatamente, uma chuva de vidros quebrados.