A Terapeuta

Capítulo XXVIII


Capítulo XXVIII

“A ausência apaga as pequenas paixões e fortalece as grandes”.

François La Rochefoucald

Ponto de vista por Isabella Swan – Cinco meses, vinte e nove dias e duas horas após a partida de Edward.

—Vocês estão esquecendo o que realmente importa na relação de vocês. Agatha, não importa o que a vizinha pensa ou deixa de pensar sobre o seu casamento com August. Você está feliz do jeito que está agora? –Minha paciente acenou com a cabeça em afirmativa. –Pois então. Ser feliz é o que realmente importa e, bem, se me permite dizer, vocês dois me parecem realizados.

O casal sorriu para mim, e meu interior se encheu de satisfação por dentro. Aquele era um caso complicado, que eu tentava resolver há quase dois anos. Apesar de os dois serem jovens no quesito idade, eram velhos no quesito casamento. Casaram-se aos dezesseis anos, obrigados pelos pais por conta de uma gravidez não planejada. Eles realmente se amavam, mas o desgaste dos anos e a falta de liberdade desde muito cedo fez com que os dois não se reconhecessem mais e, consequentemente, não se conectassem mais, nem um com o outro, nem com eles mesmos. Nada pude fazer para que isso fosse melhorado e, com o passar do tempo, pararam de vir ao meu consultório. Após várias brigas, ele saiu de casa. Agatha iniciou um curso na faculdade, fez amigos; August refez suas amizades antigas, arranjou novas, e havia até trocado de emprego. No meio de tudo isso, encontraram-se e combinaram de sair novamente, como antigamente: encontros leves e divertidos, sem preocupações com o dia seguinte. Perceberam, assim, que ainda se amavam: voltaram a namorar, mas não a morar juntos. Acreditavam ser melhor assim. Voltaram às sessões de casal no meu consultório, e encorajei-os a manter o que criaram entre os dois. Agora, Agatha, em sua última sessão, parecia preocupada com o que uma vizinha fofoqueira espalhava dela pelo bairro.

—Obrigada, Dra. Swan. Eu realmente estou. Tenho momentos ótimos com o homem que sempre amei. –Eles se olharam e sorriram um para o outro. –Sem perder minha liberdade. Eu acho que era o que faltava, sabe? Ter uma vida com o August, claro, mas não ter uma vida girando ao redor dele. Esse tempo que nos mantemos afastados fez toda a diferença.

Eu concordava, de verdade. Via esse exemplo muito nítido em Edward. Eu fiquei triste com sua partida? Sem dúvidas. Eu queria que ele morasse mais perto? Claro que sim. Porém, eu sabia que era necessário, pois a vida dele não era, e eu nem queria que fosse, voltada apenas para mim. Lá, em Harvard, ele tinha uma vida. Fez amizade com alguns colegas, alguns professores; estudava bastante, e fazia exercícios físicos diariamente com um amigo e o cachorro desse amigo. Eu, tinha a minha família aqui: encontrava-me com Mandy toda a sexta para comermos algo e vermos algum filme; encontrava-me com Rose todo o sábado para qualquer passeio que surgisse e, no domingo, eu e Tanya costumávamos ir ao parque com seu filho tomar um sol. Isso pode soar surpreendente, mas ela se mostrou uma ótima amiga e, por algum motivo, ela achava o mesmo de mim. Uma vez por mês, eu e James nos encontrávamos para colocar as conversas em dia, porque antes de ele ter sido meu namorado, foi (e continua sendo) meu melhor amigo. Edward estava bem com isso, eu estava bem com isso. Resumindo: apesar da distância e da saudade enorme, estávamos ótimos, e lidando com a situação da melhor maneira possível.

—Que ótimo! Afinal, é por isso que estou dando “alta” para vocês dois. Já possuem condições de cuidarem um do outro sozinhos novamente. –Eu ri, e eles me acompanharam, achando graça em minha brincadeira boba. –Eu fico feliz por vocês terem, finalmente, se acertado, independente da forma em que isso ocorreu. Ninguém além de vocês dois tem algo a ver com isso. Lembrem-se sempre!

Os dois saíram de meu consultório de mãos dadas, rindo um para o outro, felizes. Eu tive uma sensação plena, um sentimento de trabalho cumprido, finalmente. Eu amava o meu trabalho, ainda mais quando o retorno era assim tão gratificante.

—Jenna, já está pronta? Passou da hora de irmos embora! Eu ainda tenho que dirigir quilômetros, vamos! –Para ser sincera, ainda faltavam uns vinte e cinco minutos para o expediente, de fato, acabar. Porém, eu era a minha própria chefe e estava dizendo um belo foda-se para os horários. Hoje era meu último dia de trabalho, e o horário já estava reduzido: trabalhamos apenas até o meio dia. Eu sairia de férias do trabalho por um longo mês e iria para Cambridge, apenas para ficar perto do meu namorado pelo maior tempo que eu pudesse. Ele teria apenas duas semanas de recesso, mas eu pretendia alugar um apartamento pelo mês inteiro. É claro que ele não sabia disso ainda, afinal, eu não seria Isabella Swan se não preparasse alguma surpresa para o meu amorzinho. Na verdade, eu talvez fosse me surpreender também. Algumas escolhas deveriam ser feitas, por bem ou por mal. A grande questão era: eu me arrependeria da escolha que eu fosse seguir?

—Nunca vi você tão ansiosa, chefa. –Eu revirei os olhos. Primeiro, porque Jenna estava claramente debochando de mim e, segundo, porque eu odiava ser chamada de chefa.

—Quando o seu namorado morar em Tão, Tão Distante, isso vai ter volta, Jenna. –Ela riu da minha falsa cara de brava. Peguei minha bolsa, apaguei as luzes, dei uma última olhada para o meu querido consultório, esperei por Jenna, e fechei a porta. –Nos vemos mês que vem, Jen. Me deseja sorte. –Abracei-a e, finalmente, corri em direção ao meu carro. As malas já estavam nele, arrumadas por mim ontem à noite. Tudo para que eu visse Edward o mais rápido possível.

Eu mal podia esperar para vê-lo, abraçá-lo, beijá-lo outra vez. Eu realmente amava aquele homem, e faria tudo para que nosso relacionamento desse certo, apesar de toda e qualquer distância física que pudesse existir. Emocionalmente, estávamos mais conectados do que nunca, eu sabia disso. E era o que bastava.

(...)

Eu estava exausta. Não aguentava mais dirigir. Realmente, vir até Harvard para ver Edward seria considerado uma prova de amor, pois só com muita força de vontade para não desistir no meio do caminho.

Tudo bem, talvez eu esteja exagerando um pouco. O trajeto era longo, mas nada impossível de fazer. Era apenas o meu nervosismo acompanhado da minha ansiedade se manifestando.

Finalmente, avistei a universidade de Edward. Eu havia dito a ele que esperaria lá fora, mas meu namorado insistiu para que eu entrasse, estacionasse meu carro, e esperasse por ele. Ele queria me mostrar seu dormitório, e me apresentar para alguns colegas. Eu quis negar, dizer que não era necessário, mas apenas consenti quando senti a sua animação. Aquilo era importante para ele, então eu poderia lidar com isso, sem problemas. Apresentei-me na portaria e, como orientado por Edward, estacionei meu carro próximo ao prédio 15. Nós marcamos de nos encontrar ali exatas 18h, no entanto, eram 18h30min e eu permanecia esperando. Não querendo dar uma de namorada neurótica e controladora, evitei ligar para ele. Porém, a preocupação falou mais alto uns 5 minutos depois. Liguei, e minha chamada foi direto para a caixa de mensagens. Olhei seu visto por último no WhatsApp: nada. Sua última entrada no aplicativo de mensagens havia sido de manhã cedo. Será que alguém havia sequestrado Edward? Ou pior, será que ele estava me traindo com uma universitária muito mais bonita e muito mais nova do que eu?

Fique calma, Isabella. Eu pensava. Ela pode ser mais bonita e até mais nova, mas você tem um diploma lindíssimo de graduação. Graduação com louvor, ainda. Sim, eu tinha. Mas isso não estava me consolando no momento.

Quando eu estava prestes a ligar para Tanya e dizer a ela que devolveria Edward para sua ex-mulher, ou seja, ela mesma, vi Edward se aproximar do estacionamento. Ele olhava atento, procurando o meu carro, o que não requereu muito esforço, visto que era um dos poucos ainda presentes no campus, aquela hora. Eu desci do carro rapidamente e, quando o vi ali, finalmente na minha frente, após tanto tempo, tantos meses, tantos dias, tantas horas, esqueci a preocupação e minhas neuroses, e abracei-o com força até não poder mais. Depois disso, lancei vários beijos babados em seu rosto todo, não me importando em parecer ridícula, ou até mesmo desesperada.

—Eu estava com tanta saudade de você! –Beijei sua boca, interrompendo qualquer coisa que ele falaria em resposta. –Você acha bonito isso, Edward? –Parei de beijá-lo, e também de abraçá-lo. –Me trair?! Logo no dia em que eu vim para cá, de tão longe, só para ver você? –Meu namorado arregalou os olhos, na certa tentando fingir que não sabia do que eu estava falando. Homens... Sempre tão iguais.

—Eu não sei do que você está falando, Bella. –Revirei os olhos. O discurso masculino era sempre o mesmo.

—Assim, eu fiquei esperando por você aqui um tempão! Por que a demora? Esqueceu que eu viria? Estava com que mulher?!

—Não seja boba, amor. Eu só tenho você, e só quero você. –Edward riu, entrelaçando seus braços ao redor do meu corpo, puxando-me para mais perto dele. –Eu só queria aproveitar bem esses dias que eu ficaria com você. Então, consegui convencer meu professor a antecipar minha prova final: em vez de ser apenas terça que vem, ele aplicou a prova individualmente para mim hoje, sexta. Por isso eu demorei, desculpe não avisar, mas só soube disso hoje, em cima da hora.

Edward era inacreditável.

—Então você nem teve tempo para se preparar para a prova? –Ele riu, como se eu estivesse falando algum absurdo.

—É claro que eu estudei, amor. Umas duas semanas atrás. Você sabe que eu não gosto de deixar na para a última hora. Revirei os olhos. Eu sabia, mas não conseguia deixar de me impressionar com isso. Afinal, quem estuda duas semanas antes para todas as provas do semestre? Eu certamente não estudava, até por que, como a maioria dos universitários, sempre tinha aquela matéria que não dava tempo de estudar. Como Edward conseguia? –Tenho uma notícia para você. –Meu namorado parecia animado quando disse isso. E eu fiquei receosa. Quais as chances de ele dizer “vou terminar com você pois encontrei o amor em uma bunda e barriga muito mais definidas do que as suas”?. Ou ainda: “estou com muitas saudades, me mudarei para a sua casa hoje”. Apesar de essas duas coisas serem opostas, me apavoravam de qualquer maneira.

Tudo bem, a ideia de terminar comigo me apavorava mais. Ou não.

—Diga, meu bem. –Entramos no carro. Eu esperei que ele me falasse para onde ir, mas nada veio. Então simplesmente fiquei sentada no banco do motorista, enquanto esperava que ele me dissesse algo.

—Consegui um estágio em um escritório de advocacia muito grande aqui na cidade. Eu vou ter a oportunidade de crescer na empresa e, além disso, o salário é bem razoável para um estágio, apenas.

—Edward, isso é maravilhoso! –Abracei-o. –É realmente maravilhoso! Parabéns! Estou tão orgulhosa de você. –E, de fato, eu estava. Não querendo dar uma de psicóloga, mas já sendo, Edward havia mudado muito dos últimos tempos para cá. Eu sabia que uma parte disso se devia a mim, mas eu só mostrei a ele que a vida não se restringia a escolhas malfeitas no passado, e que ninguém deveria ser prisioneiro delas. Ele se libertou, e isso era mérito apenas dele, e de mais ninguém. Edward não mudou apenas a sua vida, mas a minha também quando entrou nela: tanto quanto paciente, tanto quanto namorado.

E por tudo isso e muito mais, era que ele merecia que minha escolha fosse ele. Não por estar em um relacionamento abusivo em que eu enxergava Edward como o centro do meu universo, mas sim porque eu o amava, do fundo do meu coração, e isso não podia esperar cinco anos. Na verdade, agora, quatro anos e meio. Não por colocá-lo em primeiro lugar, mas sim por perceber que uma mudança de ambiente, de hábitos, seria muito interessante, além de bem-vinda.

—Não sei o motivo de termos entrado no carro, amor. –Ele sussurrou, ainda abraçado em mim. Era tão bom tê-lo por perto. –Eu disse que levaria você para conhecer meu dormitório, lembra? O resto da faculdade e tudo o mais, também, e...

—Podemos fazer isso outro dia. Vamos ter muito tempo. –Edward me olhou surpreso ao perceber minha interrupção.

—Você acha que duas semanas são muito tempo? Então nem sentiu minha falta todos esses meses.... Você voltou com o James, é isso? –Eu revirei os olhos e ri de suas especulações sem sentido.

—Não, não acho que duas semanas sejam muito para ver meu namorado universitário. –Brinquei. –E é por isso mesmo, que uns dois meses atrás, mandei meu currículo para cá a fim de conseguir uma vaga na especialização da universidade. E adivinha? Eu fui aprovada.

Edward parecia sem palavras. Primeiro, vi um sorriso iluminado, o mais bonito que eu já vi, saltando em seu rosto. Depois, apareceu a expressão de preocupado.

—Você não precisa abrir mao da sua vida por minha causa. Você sabe, se está muito difícil para você, eu posso, quem sabe, terminar mais perto o curso de Direito, quem sabe em outra faculdade e... –O interrompi novamente, beijando-o.

—Edward, eu não estou abrindo mão de absolutamente nada por você. Não vê? Eu acabei de dizer que vou começar uma especialização na minha área, aqui. Sabe quantas pessoas sonham com isso, e não conseguem? Eu estou vivendo a minha vida, isso sim. Saindo da minha zona de conforto. E isso é bom, sabe? Eu sempre quis me especializar mais. E, na verdade, eu vou abrir um consultório aqui. Vai ser pequeno, porque eu não posso vender o meu lá. Ainda irei duas vezes por mês para lá, atender meus pacientes fixos e tudo mais. –Sorri. –Vai ser uma correria danada e dará um certo trabalho, mas eu estou empolgada.

—Você tem certeza?

—Eu nunca tive tanta certeza. Eu quero e posso ter o melhor dos três mundos: a especialização, meu trabalho, e você.

Edward olhou-me fixamente nos olhos e eu correspondi seu olhar. Ele parecia feliz, admirado e surpreso. Missão completa com sucesso, Srta. Swan.

—Obrigada por me fazer perceber que a vida não é apenas cinza, Bella.

—Obrigada por me fazer enxergar que as cores da vida podem ser muito mais bonitas quando temos alguém com quem admirá-las.

Sorrimos um para o outro. Dei a partida no carro, sorrindo para o nada como uma boba, sabendo que meu namorado estava do mesmo jeito no banco ao meu lado. Eu não sabia para onde estávamos indo, mas eu gostava da sensação de se deixar levar, pelo menos uma vez.

Amor é concessão, mas, ao contrário do que a maioria das pessoas dizem, essa concessão não precisa ser o fim, e sim o começo de uma linda história.

FIM

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.