A Terapeuta

Capítulo XXII


Capítulo XXII

“Se, a princípio, a ideia não é absurda, então não há esperança para ela.”

Albert Einstein

Ponto de vista por Isabella Swan

Quando o despertador tocou no dia seguinte, eu simplesmente não acreditei. Parecia que eu tinha recém chegado do hospital com Edward, totalmente esgotada. Rose sempre me disse que não havia cansaço que não sumisse com uma noite consideravelmente longa de sono. Bem, que merda. Minha irmã estava errada, ao que tudo indicava.

Suspirei ao notar que Edward não estava comigo na cama. Por quê? Tudo bem, eu tinha que dar o braço a torcer: precisava mesmo de uma cama nova. Uma cama nova de casal. Porém, eu sabia que talvez, só talvez, não fosse por isso que Edward não estava lá. Afinal, ele nunca se importou muito em ficar apertado na minha cama de solteiro, desde que estivesse perto de mim. Nosso relacionamento (nós tínhamos realmente um relacionamento?) não parecia muito transparente atualmente. Quer dizer, eu sou uma psicóloga. Uma boa psicóloga. Eu sabia que havia algo incomodando Edward, algum dilema interno, talvez. Ou talvez... Talvez ele apenas tenha se arrependido. Se precipitado ao se declarar para mim. Talvez ele quisesse curtir a vida de solteiro, agora que enfim era divorciado e podia viver sua vida. Afinal, o que eu esperava? Deus, nós nem tínhamos transado! Não que eu ache que os relacionamentos devem ter como base o sexo, mas ele deveria sentir falta. Eu sentia falta, e não estava sem há tanto tempo quanto ele. Nós nos conhecíamos há pouco tempo, contudo, eu confiava nele demais. E amava-o, também. Só não havia surgido a oportunidade ainda. Com toda essa confusão da família dele, James, Mandy, meu retorno ao trabalho...

Merda! Eu precisava ligar para Jenny e dizer que não iria trabalhar nos próximos dias. Não tinha como eu ajudar meus pacientes se eu não conseguia nem ajudar a mim mesma nos últimos tempos. Eu estava preocupada com Mandy e com sua leucemia. Com a compatibilidade de Edward. Com Edward e sua inesperada e misteriosa aflição sutil. Ugh, eu precisava de umas férias bem longe de todos esses problemas, ou de uma boa dose do uísque mais forte que eu encontrasse.

–Consultório da doutora Isabella Swan, bom dia? –Revirei os olhos para o atendimento de Jenny ao telefone. Ela não mudava mesmo. Incrível.

–Jenny, quantas vezes eu já disse para você não me chamar de doutora? Doutor é quem tem doutorado, o resto é necessidade de status. –Revirei os olhos. –Infelizmente, ainda não tenho um.

Sério, esse lance de chamar o pessoal da área da saúde ou da advocacia de doutor me frustrava porque bem, não era verdade. Eu sei. Exagero. Contudo, eu não conseguia evitar. E tinha o direito de não querer ser chamada de doutora pela minha secretária.

–Bella! Já não era para você estar aqui? Você tem consultas agendadas para hoje, muitas, aliás, já que ficou uma semana no bem bom aquele gato! Vamos, volte para a realidade e venha trabalhar. Não só de sexo vive-se, chefa.

Eu precisava parar de ser uma chefe legal e colocar limites em Jennifer, pois ela estava ficando insuportavelmente chata e debochada. Certo, ela sempre foi. Mesmo assim, não era o momento. Se bem que, quem dera ela estivesse certa sobre a parte do sexo...

–Jenny, não é hora para brincadeiras. Desculpe, mas você vai ter que cancelar minhas consultas da semana e marcá-las para o mês que vem. A Mandy piorou da leucemia, se não acharmos um doador compatível o quanto antes, ela... Bem, ela não vai resistir. Não vou conseguir fazer meu trabalho direito tendo isso o tempo todo na cabeça. Tudo bem? Então, só cancele. Feche o consultório, coloque uma mensagem na porta dizendo que estará fechado nas próximas semanas por motivos pessoais, e vá para casa.

Houve um silêncio tenso no telefone. Jenny parecia estar se sentindo culpada pelo meu tom de voz, mas não queria que ela interpretasse assim, longe disso. Eu só estava... Cansada. Cansada de tudo isso, de tantos problemas.

–Jenny, não é com você. Eu só não estou bem, tudo bem? Eu adoro suas brincadeiras e o seu bom humor, só não é o momento certo para elas.

–Eu entendo, Bella. Desculpe-me, eu não sabia. Irei cancelar as consultas. Qualquer coisa me ligue, tudo bem?

–Pode deixar, Jenny. Obrigada por ser mais do que minha secretária quando eu preciso.

Não esperei pela resposta dela. Desliguei o telefone e me joguei na cama novamente, querendo mais do que tudo que ela me engolisse. Estava muito cedo para irmos ao hospital para saber o resultado, para ver Mandy. Muito cedo para ligar para Rose. Muito cedo para acordar Edward. Tudo o que eu podia fazer era ficar deitada ali até o tempo passar, já que eu estava sem nenhum apetite para café da manhã, e preocupada demais para voltar a dormir.

–Você parece meio estressada. –Eu suspirei ao ouvir a voz de Edward, e não me dei ao trabalho de olhar para a porta do meu quarto para vê-lo. Eu sabia que ele estava lá, provavelmente me observando toda horrorosa, com olheiras, cabelo como um ninho de passarinho e um humor péssimo. Infelizmente, ou felizmente, meus problemas estavam me desesperando tanto que eu nem tive tempo de me importar com isso.

–Bem, você não pode me culpar por estar assim, principalmente depois de ontem. –Murmurei sob o travesseiro. Ouvi Edward soltando uma risada fraca.

–Você está certa, não posso te culpar. Entretanto, acho que posso melhorar o seu humor consideravelmente.

–Eu duvido muito. –Como o meu humor poderia melhorar com tudo aquilo acontecendo em minha vida? E além do mais, eu sabia que Edward estava escondendo alguma coisa. Eu sabia. Não que eu queira dar uma de controladora e acompanhar qualquer passo que ele fosse tomar, mas aquele mistério, aquele jeito dele, estavam me deixando frustrada.

Suspirei mais uma vez sob o travesseiro, tentando me controlar. Eu não iria perguntar nada. Não era da minha conta, e com certeza não era do meu interesse, visto que ele nem se deu ao trabalho de se abrir comigo. Quando tudo voltasse ao normal em minha família, tudo voltaria a ficar bem. Não é? Eu tinha esperanças nisso. Contudo, e se não voltasse ao normal? Se Mandy se fosse? Como eu viveria sem a minha sobrinha querida e cheia de vida? Como eu poderia continuar tendo esperanças nesse mundo quando ele é tão injusto a ponto de fazer criancinhas inocentes sofrerem até a morte?

–Bella, pare de pensar. Apenas pare. Mandy vai ficar bem, você vai ver. –O pouco espaço que restava em minha cama de solteiro foi preenchido por Edward. Eu queria virar meu corpo de encontro ao dele, abraçá-lo e chorar até tudo melhorar, mas achei que seria demais. Então, apenas me encolhi mais em um canto da cama para que Edward pudesse se acomodar melhor. Ele me abraçou por trás e me envolveu com seus braços, puxando-me para mais perto. Ao sentir o calor gostoso que emanava de seu peito, eu subitamente relaxei. Era ótimo poder contar com alguém. Era ótimo que esse alguém fosse Edward.

Eu não disse nada, mas o suspiro de contentamento que saiu imperceptivelmente de meus lábios deu a Edward uma resposta positiva, eu acho. Uma de suas mãos, aproveitando-se de que minha blusa de dormir estava amarrotada e curta, começou a fazer pequenas carícias na parte descoberta de minha cintura. Seus lábios foram de encontro ao meu pescoço e um beijo sutil foi depositado lá. Novamente, eu suspirei de pura satisfação ao perceber o quanto Edward me fazia ficar bem com um simples toque. Decidi que era melhor esquecer os problemas e as frustrações por enquanto. Aproveitei por um tempo mais os beijos de Edward percorrendo meu pescoço e, logo após, me virei para ele. Seus olhos se fixaram nos meus e tudo o que eu pude ver ali foi carinho, preocupação, e desejo. E aquilo foi o suficiente para as minhas dúvidas se dissiparem. Ele não parecia estar arrependido de estar comigo. Ele não parecia arrependido por estar ali. Então, fosse qual fosse o que estava afligindo-o, não importava. Pois daríamos um jeito de fazer tudo dar certo. Eu sabia que sim. Eu esperava que sim.

–Você foi a melhor coisa que já me aconteceu, Edward. Por favor, não duvide nunca disso. Você é o homem da minha vida, por mais que isso soe clichê. Obrigada por ter estado tão infeliz antes de eu aparecer. E foda-se se isso me torna uma pessoa horrível. –Eu ri do meu discurso idiota. Era óbvio que eu estava brincando sobre agradecer pela infelicidade dele. Bem, nem tanto assim, eu acho. Edward riu também.

–Que coisa horrível para uma psicóloga dizer, Isabella Swan. Ainda bem que eu não estou dando a mínima pra isso.

Antes que eu pudesse responder, Edward avançou sobre mim. Seu olhar desceu dos meus olhos até minha boca e, logo em seguida, ainda sem desviar o olhar, ele encostou seus lábios aos meus. Aproveitando o raro momento, passei meus braços ao redor do pescoço de Edward e o trouxe para mais perto, aprofundando o beijo. Seus lábios se encaixavam perfeitamente nos meus, e seu gosto, seu corpo, seu toque me faziam esquecer de todo o resto que não fosse ele. Quando o ar começou a se tornar escasso, Edward mordeu meu lábio inferior, logo depois de deixar um leve selinho ali, e se afastou alguns centímetros. Seus olhos voltaram a me encarar e eu tive que fazer um esforço muito grande para simplesmente não me perder neles.

–Eu gostaria de poder passar a vida toda beijando você, Bella. É a melhor sensação do mundo ter você por perto. –A fala de Edward não passou de um sussurro, mas seus olhos ainda estavam fixos nos meus. O jeito que ele me olhou, e o jeito que ele falou... Fizeram com que o aperto em meu coração retornasse um pouco mais forte.

–E você pode, Edward. Não pode? Ter você comigo me faz muito bem também.

Eu queria dizer mais alguma coisa. Perguntar o porquê de ele estar parecendo tão angustiado. Porém, não tive coragem. Só fiquei ali, sentindo-o perto de mim fisicamente, mas longe demais mentalmente. Eu suspirei e fechei meus olhos, sentindo todo o peso dos problemas voltando novamente.

–Bella, eu...

Antes que Edward pudesse falar, seu celular tocou. Eu estranhei, porque em todos esses dias em que estávamos juntos apenas Tanya e sua família louca tentaram entrar em contato com ele e, bem, Tanya deveria estar curtindo a gravidez com seu novo companheiro, e a mãe dele jamais ligaria, do jeito que estava chateada ontem na nossa reunião fracassada. Já o pai de Edward também não parecia ser o tipo de cara que ligaria. Ele parecia ter dado bem o recado ontem: queria que o filho fosse feliz, apesar de tudo.

Quando Edward saiu da minha pequena cama, atendeu ao telefone e começou a falar formalmente, eu soube de onde era. Só podia ser do hospital. O hospital onde Mandy estava internada, onde Edward tinha feito os testes. Os resultados deveriam ter saído. De repente, eu comecei a ficar mais aflita do que já estava, mesmo sabendo que de nada adiantaria. Afinal, as chances de Edward ser realmente compatível com Mandy, uma total estranha, eram quase nulas.

–Bella, era do hospital. –Sim, eu sabia! Eu não estava errada. E agora? Edward parecia pensativo, mas não triste. Ou talvez ele só não quisesse me desesperar, acabar com as minhas esperanças e dizer a verdade nua e crua. Eu queria muito perguntar o que o médico disse, mas me encontrava sem coragem para tal coisa. Como Edward não falou mais nada, não se pronunciou, eu soube: estava tudo acabado. Mandy morreria. Eminha família toda ficaria arrasada. E eu não poderia fazer nada para mudar isso.

–Não precisa dizer nada, Edward. Não há esperanças pra ela, certo? É isso? Tudo bem, eu... Eu preciso ir à casa de Rose, encará-la e dizer isso. Eu não sei se ela vai aguentar, mas... Bem, é meu dever como irmã. Isso. –Eu não sabia se eu chorava, se eu abraçava Edward, ou se eu falava. A realidade dói. Dói muito.

–Amor, não chore. Eu... Na verdade, não é nada disso. Eu estou sem fala porque não estou acreditando no que eu ouvi. –Edward se aproximou de mim, abraçando-me. Eu deixei que ele me consolasse, pois o pior estava por vir. Ele externaria, enfim. Falaria a verdade, sem rodeios.

–O quê? Pode dizer, Edward. Eu aguento. Vou ter que aguentar, na verdade.

Edward lançou-me um sorriso fraco, deu um beijo carinhoso em minha testa e, com seus dedos, delicadamente foi afastando as lágrimas que caíam por meu rosto.

–O médico disse que, por um milagre, eu sou compatível com a Mandy. Eu vou poder ser o doador de medula para ela, Bella. Quer dizer, ainda há uma bateria de exames pelo que eu entendi, e a cirurgia para a retirada, mas se tudo correr bem, e vai, já que o mais difícil é a compatibilidade, e nós já a temos... Bem, é isso. Eu disse que ia dar tudo certo, linda. Não chore.

Edward me abraçou e tudo que eu pude fazer foi retribuir o abraço. Agora, eu não sabia se ria ou chorava de felicidade. Tenho noção de que não ouvi nada do que Edward disse depois de “eu sou compatível com a Mandy”, porque nada mais importava. Mandy não iria embora, não podia ir, não agora que já tínhamos achado o principal: compatibilidade.

Minha sobrinha sobreviveria. Ela ficaria bem. Ela cresceria, iria para a escola novamente, teria amigos, iríamos ao shopping aos fins de semana e comeríamos inúmeros Mc Lanches Feliz escondido de Rose. Ela ainda teria o seu primeiro baile do colegial, seu primeiro amor e seu primeiro coração partido. E eu estaria lá para ajudá-la quando ela precisasse, quando ela fugisse de casa simplesmente por ser adolescente e for contra tudo que os pais dizem.

Mandy ficaria bem. Mandy ficaria viva. Ficaria viva graças a Edward.

Eu seria eternamente grata. Tão grata que palavras como um simples “muito obrigada” jamais serviriam. Por isso, me limitei a abraçá-lo com mais força e chorar em seu peito, no meio do meu quarto, não me importando com o resto.

Não havia espaço para palavras ou preocupações ali, pois aquele milagre, aquela inesperada coincidência, recuperou minhas esperanças e melhorou minha visão do mundo.

Se até Mandy ficaria bem, eu e Edward também ficaríamos, independente do que estava deixando-o tão pensativo esses dias.

Era uma promessa que faria tudo para cumprir.

Até o fim.