A Senhora da Sorte
Foi sem querer, eu juro.
Na meia hora seguinte, Andrômeda mordeu a língua umas dez vezes para não perguntar à Pablo se a família dele roubara o colar. Apensar de sua paciência com essa história de namoro estar se esgotando mais rapidamente do que nunca, ela precisava se controlar para descobrir o que pudesse da forma mais sensata possível.
A mãe de Pablo nunca terminava de contar a história de como ganhara a sua primeira colocação numa competição estadual. Andrômeda não aguentava mais um segundo daquela ladainha, ela não saíra de casa pra ouvir aquilo. Minutos depois o pai de Pablo entrou na cozinha.
— O trânsito está uma loucura! - ele disse.
— Comprou os ingredientes que pedi? - perguntou a senhora Hinostroza.
— Ah, não, não tinha como parar em lugar nenhum ou eu chegaria em casa daqui a duas horas.
— Depois do almoço iremos então.
Pablo deu um sorrisinho rápido para Andrômeda, e ela simplesmente quis torcer o pescoço dele.
O almoço foi uma longa tortura, Andrômeda foi obrigada a sustentar uma conversa com a família Hinostroza tomando todo o cuidado para não chamar a velha bisavó de Pablo de ladra.
— Esse colar ficou tão bem em você, Andrômeda. - disse o senhor Hinostroza de repente.
Andrômeda respirou fundo.
— Está gostando do colar? - perguntou a mãe de Pablo.
— Sim, ele é uma graça. - respondeu Andrômeda forçando um sorriso.
Todos os olhos da mesa se voltaram para ela, até o irmão de Pablo que parecia estar em outro planeta o almoço inteiro a encarou.
O colar era mágico, dizer que era uma graça parecia uma estupidez.
— Mas ele dá sorte, não pode ser apenas uma graça. - disse Lorenzo com a boca suja de molho.
Todos continuaram encarando Andrômeda, e ela resistiu ao impulso de tocar o colar para ter a sorte de acabar com aquela situação, mas todos notariam a grosseria, se ao menos ela tivesse o anel de Lana…
— Eu, hã, não tive tempo de testar, hum, a sorte dele. - disse ela, o que era uma mentira.
— Ela não acredita que o colar dá sorte. - Lorenzo ria descontroladamente.
A senhora Hinostroza ergueu uma sobrancelha.
Andrômeda ficou sem graça e tocou o colar.
— É brincadeira, gente, é claro que ele dá sorte. - disse Andrômeda tentando soar convincente.
Talvez fosse sorte, mas de repente Pablo mudou de assunto.
Assim que o almoço acabou, e Andrômeda ajudou a limpar a cozinha, os pais de Pablo foram para o super mercado.
—Ei, você não quer conhecer meu quarto? - disse Pablo.
Andrômeda torceu o nariz, ela definitivamente não queria estar no quarto de Pablo sozinha com ele. E ela não parava de pensar em uma coisa: se a família de Pablo sabia sobre as joias mágicas, e roubaram o colar de sua família, será que a família dele tinha uma outra joia?
Andrômeda jamais pensaria nisso se não soubesse da existência do anel de Lana, mas se existia um colar e um anel, por quê não poderiam existir outras?
Andrômeda adoraria fuçar a casa inteira para descobrir algo, e estava bolando um plano confuso. Ela agarrou o colar com força e apertou os olhos, e as palavras saíram de sua boca.
— Claro, vamos ver seu quarto.
O plano estava mais concreto em sua cabeça.
***
Pablo a guiou pelos corredores e a levou até seu quarto, e era como ela esperava, cheio de coisas de esporte. Andrômeda deu um sorrisinho.
Havia várias prateleiras no quarto, a maioria tinha bolas de diferentes tipos de jogos, livros e postêrs. Andrômeda viu um taco de baseball, era tudo o que precisava.
— Legal o seu taco. - disse ela.
— O quê?? - disse Pablo assustado.
— O taco de baseball.
— Ah sim, ganhei do meu tio, foi autografado pelo…
Andrômeda pegou o taco, e percebeu que não devia ter feito isso quando viu a cara de Pablo. Fingindo não notar ela começou a apontar o taco e fingir bater em algo, quando “acidentalmente” acertou a cabeça de Pablo.
— Aaaaaaaah. - ele gritou.
— Ai, meu Deus, eu sinto muito.
— Ai ai ai ai.
— Eu não queria bater em você, eu juro.
— Me ajuda a levantar então.
Pablo parecia desesperado, ergueu uma mão para Andrômeda e a outra pressionava a cabeça.
Lorenzo escancarou a porta.
— O que está acontecendo?
— Eu acertei ele com o taco. - disse Andrômeda.
— Ah, sim. Vou sair.
— Você deveria estudar para o seu teste. - disse Pablo.
— Vou sair com a Lamína Jones.
— Ah, sim. - Pablo deu um sorrisinho sofrido.
Lorenzo saiu e fechou a porta.
— Tá rindo de quê? A dor já passou? - disse Andrômeda, furiosa.
— Lamína é bonita. - disse ele abobalhado.
Andrômeda revirou os olhos.
— Você tem que se deitar, eu acho que bati muito forte.
— Você acha?
— Nossa, Pablo, eu tô me sentindo mal, sabia?
— Desculpe.
Ele apertou o travesseiro no rosto e gemeu.
— Vou fazer um chá pra você enquanto seus pais não chegam, já que seu irmão levou o outro carro.
— Você não precisa fazer chá.
— Eu faço questão.
Andrômeda saiu do quarto e foi para a cozinha. Seu plano estava começando a dar certo.
Como esperado, o armário de remédios estava no banheiro, Andrômeda abriu e começou a procurar o que precisava, e lá estava: calmante.
Andrômeda voltou para cozinha tranquilamente e preparou chá para ela e Pablo, quando estava pronto ela gritou:
— Você quer mel ou açúcar?
— Mel. - ele gritou de volta.
Andrômeda amassou o comprimido e colocou no chá junto com o mel.
E voltou para o quarto de Pablo.
— Beba devagar, está bem quente.
— Está com um gosto estranho. - disse ele.
— Será que o mel estava ruim? O meu chá está normal.
— Deve ser isso. - disse ele e bebeu mais um pouco.
— Me diz uma coisa, como sua família foi comprar logo um colar mágico?
Pablo piscava os olhos constantemente, e bebia mais goladas do chá, o calmante estava agindo.
— Não tenho certeza de como minha tataravó conseguiu o colar.
— Hum, entendi. Você acha que foi roubado?
— Tenho a impressão de que foi roubado, ninguém nunca fala muito de como o colar apareceu, mas sempre falam muito do bracelete, e de como a família Torres tem orgulho dele.
— Bracelete? - Andrômeda finalmente estava descobrindo mais coisas.
Pablo agora piscava os olhos e apertava muito, estava quase dormindo.
— O bracelete da família, nossa ancestral Illi Torres o ganhou.
— O que esse bracelete faz?
— Ele dá a super inteligência. - disse Pablo e apagou.
Andrômeda revirou os olhos, e empurrou Pablo com força.
Ele abriu os olhos.
— Onde o bracelete está, Pablo?
— No quarto dos meus pais.
E apagou novamente.
Era tudo de Andrômeda precisava saber.
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