A água está morna, contrastando com minha pele fria e com o banheiro gelado.

As espumas cobrem meu corpo por inteiro, correndo desde os dedos dos meus pés até a minha garganta. Apoio minha cabeça na beirada da banheira e encaro Astrid, sentada em uma cadeira de madeira acolchoada no canto do banheiro. Seus olhos parecem distantes, tristes e encaram um ponto aleatório no chão. Suas mãos, fortes e delicadas ao mesmo tempo, seguram um roupão azul escuro. Sua boca, encurvada e pensativa.

—Você está bem? – Pergunto para o vazio.

—Estou. – O vazio responde. Ela balança a cabeça, acordando do transe. – Precisa de algo?

—Não, obrigado. – Olho para o teto, respirando devagar.

Demoro um ou dois minutos até abrir a boca novamente:

—Qual o nome dele?

Ela se assusta, colocando uma mecha de cabelo para trás da orelha.

—Nome dele? – Ela ri, desconcertada. – Ele quem?

—O garoto que você ama.

Seu sorriso se desfaz.

—Ora, não seja bobo.

—Você não me engana, sabe disso, não é? – Eu sorrio e ela me olha preocupada. Ajeito-me na banheira, ficando sentado. – Não precisa me dizer o nome dele, mas eu sei que existe alguém.

—Ah é, sabichão?

—É. – Sorrio, encarando-a por uns dez segundos. – Pode me passar o roupão?

—Já vai sair? – Pergunta, levantando-se e estendendo-o em minha direção. Seguro-o.

—Tenho uma coisa para fazer. – Ela vira-se enquanto levanto-me e coloco o roupão.

—Sério? – Diz, ainda virada. - Mas hoje foi a entrevista e o castelo está vazio. Todos estão descansando.

Aproximo-me dela por trás e seguro seus braços, sussurrando em seu ouvido:

—Exatamente.

—Você ainda vai acabar sendo pego. – Desvencilha-se e me empurra, rindo.

—Você também. – Dou de ombros.

—O que você quer dizer... você sabe...? – Ela pisca várias vezes e rapidamente, levando para longe qualquer pensamento. – Deixa para lá. Aliás, você não me falou nada sobre Elsa ter aparecido aqui.

—Contarei amanhã, está bem?

Ela afirma com a cabeça e observo-a massagear o próprio pescoço, preocupada.

—Astrid? – Chamo-a.

—Oi. – Olha-me.

—Você pode confiar em mim. – Digo, suas expressões são marcantes, doloridas.

Ela encara o chão, e percebo que o chão é muito interessante quando você não tem mais nada a falar.

***

—Está atrasado. – Sua voz massageia meus tímpanos. – Tive que dizer ao meu pai que ia ao jardim. Ele vai olhar pela janela daqui a pouco para ver se estou lá.

—Desculpe, não acontecerá novamente. – Sorrio.

—Certamente não. – Fria, como sempre. – Até porque nos encontrarmos às escondidas não é algo que uma princesa deve fazer.

—O que você queria conversar? – Desfaço o sorriso.

—Meu pai ficou bravo. – Novidade. – Não poderei mais aparecer na porta do seu quarto. Ele não gosta de você.

—É o seu pai que está participando da Seleção ou é você?

—Respeite. – Ela aconselha. – Acima de tudo, ele é o Rei.

—Você tem razão. E eu não deveria ter ficado sem camisa para atender a porta.

—Não tem problema. – Ela fala, talvez rápido demais, mas finjo não notar. – Quer dizer, tem. Quer dizer... escute, nada disso irá se repetir. Nos encontraremos apenas em encontros marcados de verdade. Encontros que a mídia poderá discutir sobre, sem meu pai surtar. – Seu nariz sempre se empina quando ela dá uma de mandona. Acho adorável.

—Faz sentindo. – Digo e ela afirma com a cabeça.

—E... Eu queria falar com você sobre os adjetivos que você usou para me descrever. O que você quis dizer com tudo aquilo?

—Aquilo o que, exatamente?

—Você disse que eu era misteriosa. – Ela também olha para o chão, igual Astrid.

—Você é.

—Acha que eu escondo segredos de propósito?

—Eu nunca disse isso. – Franzo o cenho. Ela pigarreia, sem ação. Abraça o próprio corpo.

—Então, eu acho que é só isso. – Despede-se. – Devo ir embora agora.

—É. Acho que sim. – Respondo, sem querer responder.

—Até amanhã? – Ela pergunta. Suas feições são mágicas, seus olhos são obras de arte. Seu cabelo cai por sobre seu ombro. Um cabelo longo e selvagem. Perco-me em sua boca.

—Quer sair hoje à noite?

Ela se assusta.

—É brincadeira, né? Jack, tudo ainda está muito recente. A mídia...

—A mídia só quer um romance.

—Mas eu não quero. – Rebate imediatamente. Droga.

—Não foi o que eu quis dizer. – Conserto meu erro, até porque não foi mesmo o que eu quis dizer. – Eu quis dizer que podemos sair juntos, a mídia vai ficar falando que é um romance, mas nós vamos saber que não é. É só um encontro normal como qualquer outro. E isso, claro, se a mídia nos pegar, o que acho muito difícil de acontecer hoje.

—Não sei, não me parece certo.

—Tudo bem, não vou te forçar a nada. – Levanto minhas mãos, brincando.

Ela morde o lábio inferior. Céus.

—E se...

—E se? – Esperança crescendo dentro de mim é como uma bomba prestes a explodir. Mas eu me contenho.

—E se sairmos escondido? Ninguém conta nada a ninguém. – Bum! Você está sorrindo demais, Jack. Pare de sorrir feito um idiota! É isso, estou perdido.

—Mas você acabou de dizer que...

—Não há câmeras hoje. E eu realmente preciso conversar com alguém.

—Hoje?

—Não me faça mudar de ideia. Encontre-me aqui às 22:00, tudo bem? Não diga a ninguém. – Ela não sorri, está preocupada com o rumo disso.

—Tudo bem. Até lá.

—Até.

Leva seu corpo para longe de mim, na escuridão. Deixando-me apenas com um sorriso bobo no rosto e um coração acelerado.

Agarrei-me ao meu fio de sanidade e saí do transe.

Mais tarde, eu teria um encontro proibido para ir.

***