Eu era a única que permanecia acordada àquela hora da noite. Sentindo uma brisa quente passar pelas grades da janela, daquela cela que tinha musgo em algumas partes da parede e a minha companheira até então... era uma aranha pequenina que formava sua teia no teto, próxima ao portão.

Ficava a observando trabalhar tão perfeitamente na sua armadilha para moscas, o que era bastante nojento, mas era a única coisa que se podia fazer dentro de uma cela. Sentar ou deitar na cama e esperar... a liberdade ou morte.

Ouço os roncos dos meus amigos que dormem exausto depois de tentarem defender suas vidas. Não consigo tirar meus pensamentos de Elisa, também lembro de meus pais, porque não sei aonde estão, somente aquele cara da capa cinza. Depois, temos Harry que no fundo, eu sentia estar bem.

O vento gélido invade meu espaço e sentada sobre a cama, com as costas encostadas na parede, abraço a mim mesma, para me aquecer.

Ouço passos suaves e com certeza, era um elfo caminhando sobre as masmorras, pensei que era Lorraine, mas pelos meus cálculos, ainda não era hora de recebermos refeição... então só podia ser outra pessoa.

Seguro minha curiosidade para levantar da cama, estava cansada demais e continuo a olhar para a parede escura a minha frente, meio entorpecida.

— Você está bem? — Vejo uma silhueta inibir as labaredas da tocha no outro lado da caverna afora, de iluminar meu ambiente, mesmo que pouquíssimo. Quando ouço a voz dele, me sinto mais alegre.

— Porque está aqui? — Abraço minhas pernas e afundo meu rosto, sem olhar diretamente para ele.

— O rei deseja ter uma conversa com você... dependendo do rumo que ela irá tomar... — O interrompo.

— ... poderemos ser libertados, não é mesmo? — Fito seus azuis que estavam meios escuros, por causa do ambiente pouco iluminado.

Ele meneia a cabeça concordando.

Levanto da cama com rapidez, mas uma vertigem me incomoda e ouço a porta da cela se abrir. Com o corpo meio curvado, sinto uma mão nas minhas costas e a outra no meu ombro. Sinto a respiração de Légolas sobre meu rosto e ao erguer meu rosto para ele, estamos bem próximos ao ponto de tocarmos nossos narizes.

Eu coloco a mão em seu peito, ficando de frente para ele e fecho meus olhos, sentindo uma enorme dor de cabeça queimar. Me esforço para aguenta-la, percebendo a expressão preocupada no rosto do príncipe.

— Eu estou bem. — Garanto a ele, apesar de ser mentira.

Levanto do chão com o apoio de Légolas e vou na sua frente, com a mão dele segurando meu braço. Saímos da cela e caminhamos pelas passarelas.

— Onde você vai? — Théo questiona quando passamos pela cela dele.

— Nos libertar. — Respondo rispidamente.

A cabeça queima como fogo ardente e sabia que havia uma expressão dolorosa no meu rosto, mas precisava suaviza-la para conversar com o rei e principalmente, ter a chance de sair desse lugar.

Subimos até chegarmos em duas portas vigiadas pelos guardas, eles abrem após a ordem do príncipe e dou de cara com um longínquo corredor. Do meu lado direito, a uma parede escura com portas trancadas e arcadas com acesso a outros cômodos. Já no esquerdo, temos arcos sobre colunas e uma vista da floresta, mais além uma cidade e depois dela, uma montanha com nuvens cobrindo seu pico.

Fico tão feliz ao ver a luz do dia, apesar do céu estar nublado e aquele ar me ajuda na recuperação da minha saúde. Aos poucos, sinto um bafo quente sair pela minha boca e à medida que ele saia, a dor de cabeça diminuía até não a sentir mais. Também me sinto com as forças renovadas e sorrio com a expressão aliviada.

— Parece que novos ares lhe fizeram bem. — Légolas comenta.

Parecia contente em me ver com a expressão melhorada e eu retribuo o sorriso.

— Agora que me recuperei... preciso mostrar ao rei que não somos perigo algum, para assim ele nos libertar daquelas masmorras. — Digo positivamente.

Caminhamos até o final do corredor e lá fomos para a direita. Todos que passavam por nós, reverenciavam Légolas e por isso mesmo, desde o começo, eu sabia que ele era um príncipe. Basta ver pela sua forma de falar e ser tratado.

Era estranho, príncipes para mim só existiam no Conto de Fadas e agora, estou sendo conduzida por um que incrivelmente era perfeito. Tudo em Légolas o dava a imagem de um homem dos sonhos, apesar de tê-lo conhecido pouquíssimo tempo. Mas não iria me apaixonar por ele, esse não é o meu desejo, porque meu objetivo é encontrar meus pais e tentar sair desse lugar.

Caminhamos por mais alguns minutos e entramos numa ala muito bem vigiada. Ali os guardas nos deram passagem e abriram as portas que davam para uma sala do trono enorme, com uma passarela dando acesso a um pavimento com um trono feito de casca da árvore. Légolas e eu fomos até lá e encontro um homem, mais belo que o príncipe e que tinha a aparência de ser seu irmão... mas era seu pai.

Ele estava sentado em seu trono em cima de uma manta vermelha que se enrolava com a barra de sua veste prateada. Usava também uma calça escura e botas cano longo num tom de ferrugem. Tinha uma coroa de galhos com folhas vermelhas na cabeça e alguns anéis nos dedos.

Quando me aproximei com Légolas no meu encalço, Tauriel que estava relatando sobre a floresta para o rei, se cala. Ela dá espaço para o príncipe me ver e em seguida, encaro os olhos azuis do homem em sua pose imponente a minha frente. Ele me analisa dos pés à cabeça e permanecemos num silêncio constrangedor.

Sorrateiramente vejo Tauriel se aproximar de Légolas e os dois trocarem algumas palavras. O rei permanece com os olhos fixos em mim e por um momento, vejo-o se aborrecer com alguma coisa e permaneço firme a sua frente.

Ada... (Pai...) — Légolas diz e o rei ergue a mão o impedindo de prosseguir.

— Lhe dou a opção de ficar aqui sobre a minha proteção ou partir... — O rei diz.

Fiquei confusa e noto que os dois elfos ao meu lado também, o rei disse aquilo sem mais nem menos e sem eu dizer um argumento que o pudesse convencer. Ele já havia decidido antes mesmo que eu tivesse opções.

— A escolha é sua e cumprirei com o que desejar. Foi a minha promessa... — Ele murmurou no final, mesmo assim pude ouvir claramente suas palavras com um tom amargurado.

Eu sabia que permanecendo aqui, todos estariam seguros e provavelmente conseguiria descobrir mais sobre o mim. Se eu for embora com os outros, estaremos desprotegidos lá fora e não consigo imaginar nenhum dos meninos manuseando uma espada, porque nunca precisaram disso.

Fiz minha escolha.

— Desejo permanecer aqui, prestando serviços ao reino em troca de comida e abrigo. Majestade.

— Não sou sua majestade... me chame apenas por Thranduil e não é necessário prestar serviços ao meu povo, estou lhe convidando e não obrigando. — Ele responde serenamente.

— A conhece meu pai? — Légolas dá um passo à frente, curioso em saber o porquê daquele tratamento diferenciado comigo.

— Meus assuntos não lhe dizem respeito, meu filho.

Légolas me lança um olhar confuso, esperando que eu respondesse, mas devolvo o mesmo para ele; mostrando que também estava confusa.

— Mas faça como desejar... — Meus olhos voltam para o rei. — Meu reino é o seu reino e será tratada como minha protegida. Avise o povo sobre isso, Légolas. É uma ordem.

— Mas... — Antes que pudesse questionar o rei, ele me dá as costas e pede que a gente se retire.

Légolas me conduz para fora da Sala do Trono e no momento que nos afastamos das portas, ele para no meio do caminho e me questiona confuso.

— Você conhece meu pai? — Pergunta.

— Não. Garanto que é a primeira vez que nos encontramos, também estou perdida com essa ordem dele. — Tento convence-lo, mas Légolas continua com uma expressão de dúvida no olhar e esperava não ser chamada de mentirosa por ele.

— Tudo bem. Acredito em você, agora preciso proclamar as ordens do rei.

— Realmente é necessário? Não sou ninguém que precise disso... por favor.

Légolas suspira.

— Não posso ir contra as ordens dele, sabe disso. — Ele diz o óbvio.

— Alteza? — Lorraine caminha pelo corredor e reverencia o príncipe.

— Holland. — Légolas a chama pelo sobrenome e pareço conhece-lo de algum lugar.

Lorraine se aproxima carregando algumas toalhas nas mãos.

— Leve Shara para a ala nobre do reino e mande que preparem quartos na ala um para os companheiros dela. Irei liberta-los nesse momento e preciso que seja rápida. — Ele mantém uma pose séria que me incomoda um pouco.

— As ordens, alteza. — Passa outra serva do nosso lado e Lorraine entrega as toalhas para ela. — Ordene que Tilda e Mendiel preparem cinco quartos que comportem duas pessoas na Ala um. Quatro são pra meninas e um para meninos. Eles estarão indo para lá!

— Sim, senhorita. — A serva meneia a cabeça em concordância e saí a passos largos.

— Agora deixe a senhorita comigo, alteza, que a levarei diretamente para a ala nobre. — Lorraine encara o príncipe com seriedade e ele me entrega a ela.

Nos despedimos e olho de soslaio para Légolas que some do meu campo de visão. Sinto um nó na garganta por causa de tudo que está acontecendo e minha vontade é de voltar atrás na decisão e ir embora. Talvez aqui fosse mais perigoso que lá fora.

— Sabia que conseguiria. — Lorraine envolve nos braços e caminhamos juntas passando por muitos corredores.

— Do que está falando? — Respondo em segredo.

— O rei sabe quem você é e eu também... estudamos juntas no colégio BlackForest. — Ela pisca com um sorriso orgulhoso nos lábios.

— Lorraine Holland... — A medida que me lembro dela, começo a encara-la estupefata. — A garota que morreu num acidente de carro!?

— Nossa... achei que iria esquecer da sua amiga. — Ela debocha num tom magoado.

— Mas... como você veio parar aqui? — Pergunto sussurrando.

— Seu avô, ele me deu a chance de continuar vivendo nesse lugar como uma elfa e pediu que quando você chegasse, cuidasse de você. — Ela esclareceu e coloquei a mão na testa de Lorraine, vendo sua vida passar em meus olhos por alguns segundos. — Nunca mais faça isso sua doida! — Ela ralha comigo.

A pressão das memórias lhe deu enxaqueca, já que em mim não surtia efeito. Coloquei a mão na sua testa outra vez e retirei a dor, ela amenizou a expressão.

— Isso é melhor que paracetamol. — Ela brinca.

É quando passamos por uma arcada escrita: Ala Nobre em élfico e adentramos um belíssimo corredor com retratos em ambas paredes. Ele era largo e as portas eram duplas e esculpidas. O chão de mármore e caminhamos até quase o final, entrando num cômodo do lado esquerdo.

Quase caio para trás com tanta beleza. A primeira coisa que vejo naquele quarto enorme, é uma cama casal grande encostada na parede de frente a porta. Do meu lado esquerdo, havia um pequeno sofá e na parede de frente para ele, duas portas brancas dando acesso a um guarda-roupa embutido na parede, ao lado dele uma outra porta que imaginei ser o banheiro. Dos dois lados da cama, havia uma mesa com vaso de flores e do lado oposto ao banheiro, tinha uma varanda com a mesma paisagem do corredor quando saí das masmorras.

— Não mereço ficar nesse lugar. — Balbuciei.

— E quem te perguntou isso? Me poupe Shara, para uma futura rainha, você é muito boba. — Lorraine debochou de mim.

O quarto era iluminado pela claridade que provinha da varanda e uma janela quadrada acima do sofá de descanso. Caminhei até a cama e me sentei na beirada, sentindo o colchão em meu traseiro ser bastante confortável.

— Senhorita Lorraine? — Três jovens batem à porta. — Podemos entrar?

— Artanis, Nerwen e Mirimiel, entrem e se apresentem a jovem dama. — Lorraine permitiu a entrada das três.

Permaneci sentada na cama e sorrio cordialmente para as jovens elfas a minha frente.

— É um prazer senhorita, sou Artanis. — A primeira elfa me reverencia. Suas madeixas castanhas são longas e onduladas, sua pele branca parece ser a mais pura luz e os olhos, doces e escuros.

— Prazer, sou Nerwen. — Esta tem madeixas escuras trançadas que pendiam sobre seu ombro, os olhos castanhos e expressivos e lábios pequenos.

— Sou Mirimiel, senhorita. — Mirimiel parece a mais frágil de todas, corpo pequeno e olhos calmos num tom azul puxado para o escuro, os cabelos caracóis e claros.

As três usavam um vestido num tom vermelho com marrom. Ele é colado a corpo e possui corpete na cintura, a saia desce fluidamente até os pés e por cima, elas usavam um avental branco amarrado. Os cabelos eram parcialmente soltos.

Se apresentaram e em seguida me reverenciaram com educação.

— Artanis? — Lorraine a chamou e a mesma ergueu a cabeça, encarando a elfa. — Você e as outras duas serão servas desta senhorita que é protegida do rei. Não me decepcionem. — Lorraine as intimida e depois lança uma piscadela para mim, reviro os olhos e não lhe dou atenção.

Sim, senhorita! — As três respondem num coro.

Eu me levanto da cama e caminho um pouco tímida diante delas, mas cumprimento-as com um sorriso e elas retribui o mesmo.

— Bem... eu não estou acostumada em ter serva comigo. — Falei meio perdida. — Mas espero que possamos ser todas... amigas. — Termino esperançosa. — Primeiramente, me chamem apenas por Shara, não quero “senhora”, “senhorita”, “dama” ou algo do tipo. Meu nome é Shara e assim como as chamarei pelo nome, quero ser chamada assim também.

— Se for te agradar... a chamaremos assim. — Artanis me parece ser a “chefe” das três e respondeu concordando.

— Obrigada Artanis. Agora... o que eu faço? — Murmuro para Lorraine que faz pouco caso das minhas palavras.

— Olha... se quiser fazer alguma coisa por aqui, pode ajudar no festival de Nárnia. — Lorraine sugere.

— Nossa será tão emocionante! — Mirimiel saltita ansiosa.

— Mais que emocionante. — Nerwen entra no embalo da amiga.

— Psiu! — Artanis repreende as duas que se aquietam e um sorriso alegre me invade, pois, a felicidade delas me contagiou.

— Está tudo bem meninas... é a primeira vez que ouço sobre esse festival, o que seria? — Pergunto tendo olhares espantados sobre mim.

— De onde a senhorita é? — Nerwen me indaga estupefata.

Lorraine coça a garganta.

— Qual o problema ela não saber? Ela vem de uma cidadezinha bem pequena e com isso, nunca participou do festival e nem sabe sobre ele... igual vocês que não conheciam os Hobbits.

Nerwen encolhe os ombros constrangida e Mirimiel troca olhares com Artanis.

— O Festival Anual de Nárnia, ocorre todos os anos e cada ano, um reino é sorteado em todo mundo para ceder seu espaço para o evento. Todos os povos, nobres e camponeses comparecem... é uma gigantesca festa que começa num dia e termina na madrugada do outro, há muita música, dança e bebida e para surpresa de todos... este ano irá ocorrer aqui no reino do Rei Thranduil. — Lorraine explica e absorvo as informações.

— Este ano veremos o Rei Caspian X bem de pertinho... ele é tão lindo! — Mirimiel se derrete pela sua imaginação.

— Caspian? — Indago.

— É um telmarino que governa Nárnia e mora no país do mesmo nome, que faz fronteira com a Terra Média, aonde estamos. Ele irá vir com seu povo para nos visitar, assim com o Sr. e Sra. de Lothlórien. — Lorraine diz. — Seus avós. — Ela faz leitura labial comigo.

— Que divertido... quero ajudar então. — Finjo me empolgar e as meninas começam a falar tudo ao mesmo tempo sobre como o festival será perfeito. Mas meus pensamentos estão em meus avós biológicos, que verei pela primeira vez.

Em seguida, as meninas preparam um banho maravilhoso sais de banho na banheira de mármore no meu banheiro. Elas esfregam o meu corpo de uma forma que ele começa a brilhar com a luz que o tocava, depois passaram óleo com essência de rosas que deixou meu corpo suave e sedoso, também bastante perfumado. Após isso, saio do banheiro com um roupão de seda cobrindo meu corpo e as meninas me ajudam a colocar um belíssimo vestido azul escuro marcado na cintura que contém uma faixa na barriga e a saia lisa vai descendo fluidamente até o chão e vários botões de rosa da cor da vestimenta vai ocupando espaço até a barra. A princípio, tem a aparência de um tomara-que-caia, mas o decote é reto com um bordado branco nos cantos e as mangas ¾ são transparentes e com bordados dos ombros até o antebraço.

— Como está linda... Shara! — Artanis fica boquiaberta e quando me enxergo no espelho ao lado do guarda-roupa, também me espanto com meu reflexo. Os cabelos negros tinham um caimento que se ondulava com perfeição até a cintura e meus olhos estavam bem expressivos e sedutores, num tom mais escuro que a própria noite. As meninas colocaram um par de brincos de ouro nas minhas orelhas, que era um círculo trançado no meio e pendiam dele, três cristais. Optei por não colocar tiara e deixar os belíssimos fios livres. Coloquei uma sapatilha de salto nos pés que ficou escondida debaixo do vestido.

— Não acha tudo isso exagero? — Perguntei a Lorraine, esperando que ela me desse uma roupa menos chamativa para usar.

— Você é protegida do rei e ninguém te conhece. É necessário que cause uma boa impressão a todos e se comporte como uma dama, para não constranger vossa majestade. Infelizmente se vestirá assim a partir de hoje.

Fico sem saída e sento na cama cabisbaixa.

— Olhe pelo lado bom... — Encarei Lorraine. — Será tratada como uma princesa e muitas se matariam para estar no seu lugar.

— Eu não sou uma princesa. — Respondo com uma seriedade na voz. — Eu não sou ninguém. — Encaro-a com força no olhar e Lorraine desvia. Atravesso o quarto e saio dele, correndo logo em seguida pelos corredores com lágrimas brotando em meus olhos.

Eu não queria aceitar ser diferente... só quero ser normal! Não quero um reino, mas sim voltar para minha vida antiga com família e amigos, fazer faculdade e me preocupar se devo comer um Mcdonalds ou um Subway. Pelo amor de Deus! Eu não quero me preocupar com um mundo que nem conheço... alguém me tire daqui!

Caio no chão, após me debater com alguém que vinha no meu caminho. Ele me ergue rapidamente do chão e com a mão em meu queixo, levanta meu rosto para me encarar.

— Shara... porque está chorando? — Légolas me encara confuso e depois, sua expressão se torna de pura admiração ao me ver arrumada daquela forma. — Você... está tão linda. Porque chora então?

— Eu não quero essa vida. — Respondo amargamente.

— Não quer ser tratada como uma dama da nobreza?

Meneio a cabeça concordando.

— Apenas seja você mesma. — Ele sugere com um sorriso charmoso nos lábios.

Sinto o coração saltitar no peito e encaro o príncipe um tanto exausta. Era coisas demais para minha cabeça aguentar.

— Isso não faz parte do meu mundo... é tudo diferente e eu queria estar com a minha família... meus pais. — As lágrimas continuam a escorrer, quando lembro da mamãe me abraçando e da gargalhada estranha do meu pai.

— Você não é obrigada a aceitar tudo de uma vez, basta abrir a mente para novas possibilidades e permitir que a vida te leve aonde deve ir. — Ele disse feito um sábio. — Já vivi mais de mil verões e sei como se sente, também acho que as vezes perdi meu caminho e não sei para onde caminhar... mas quando livro minha cabeça das preocupações e me permito olhar para as coisas de outro modo, tudo muda.

As palavras do príncipe conseguem confortar meu coração e acabo me aconchegando por alguns segundos em seus braços, ele não recua e afaga os meus cabelos com delicadeza.

— Apenas descanse. — Ele se afasta de mim e ergue meu rosto, secando as minhas lágrimas e para meu espanto, deposita um beijo na minha testa.

— Obrigado... hum... alteza. — Sorrio agradecida.

— Continue me chamando de Légolas, espero sermos amigos a partir de hoje.

— Achei que já éramos. — Brinco divertidamente com ele e o príncipe abafa o riso, retornando a sua postura nobre. — Como estão meus amigos e a minha irmãzinha?

— Seus amigos estão sendo bem tratados pelos outros elfos, agora descansam em suas camas macias, após serem bem alimentados e a pequena Lisa está dormindo junto das crianças do reino.

— Então acho melhor vê-los amanhã? — Sugiro e Légolas concorda.

— Já está ficando de noite e creio que esteja cansada. Aproveite um pouco o quarto e dispense suas servas, assim terá uma ótima noite de descanso.

— Aonde você vai? — Pergunto.

— Patrulhar o reino.

Fico um pouco triste, gostaria da companhia dele nesse momento.

— O que foi? — Légolas me encara com suavidade nos olhos azuis.

— Nada... — Disfarço e ele estreita os olhos me intimidando. — Okay. Apenas queria sua companhia nesse lugar imenso, porque minhas servas me tratam como alguém especial, mas você já me trata como uma amiga e me sinto confortável ao seu lado. — Confesso sentindo o rosto ruborizar.

Légolas parece surpreso com as minhas palavras, mas se mantém calado por alguns segundos, meio pensativo.

— Acho que Tauriel consegue patrulhar sem mim, então o que acha de irmos nos servir no Salão do Banquete? A essa hora, os cozinheiros já colocaram a mesa os pratos de hoje.

Ouço minha barriga roncar antes de responde-lo.

— Irei compreender isso como um “sim”. — Ele ri e eu faço o mesmo. — Vamos? — O príncipe oferece seu braço para me apoiar nele, aceito a ajuda e caminhamos juntos até o Salão que ficava longe da Ala Nobre.

Passamos por vários corredores até chegar em uma arcada dizendo: Salão do Banquete e entramos no recinto grande com uma mesa retangular comportando cinquenta pessoas no centro. Ela é de uma madeira que no nosso mundo é caríssimo e seus cantos são esculpidos. Vejo o rei Thranduil sendo servido pelas servas e Légolas me faz sentar ao lado dele, que por sua vez senta ao lado do pai.

— Sua beleza alegra meus olhos. — O rei me elogia.

— Sou apenas uma garota que recebeu um tratamento de beleza, Thranduil. Não sou melhor que essas servas que nos servem.

Ele solta um gracejo e mantém um olhar reservado.

— Nem mesmo eu sou melhor que eles, mas a minha posição me leva a ser e não posso concordar com você... é uma mulher divina que precisa aprender a aceitar quem é.

— Fala como se a conhecesse tão bem, meu pai. — Légolas intervém na conversa.

— Meu filho, antes que receba qualquer ordem minha, tome cuidado com a sua língua. O que diz respeito a mim ou o reino, só será dito a você quando eu achar que devo dizer.

Uma tensão se faz entre os dois e tento amenizar aquilo.

— Thranduil. — Chamo o rei. — Quero agradecer por tudo que fez e apesar de não o conhecer, espero podermos conversar para eu me familiarizar com seu povo.

— Será um grande prazer para mim. — Ele responde meio enigmático.

Mesmo eu estando um pouco constrangida em comer na frente dos dois, me alimento bem com a comida vegetariana do elfos e aos poucos vou me acostumando com a presença do príncipe e seu pai. No final, um guarda informa à Légolas que Tauriel está a sua procura e ele se despede, depositando um beijo nas costas da minha mão. Fico sozinha com Thranduil e ele se oferece a me guiar até o quarto.

— Espero não estar o incomodando. — Comento, quebrando o silêncio entre nós dois.

— Há quanto tempo está aqui? — Ele pergunta olhando para a frente.

— Dois dias.

— E porque sua família veio com você?

— Foi um acidente.

Nós paramos de frente ao meu quarto e ele se despede mim com uma reverencia e beijo na minha testa. Entro no meu quarto e sinto um enorme fardo nas minhas costas.

— Como foi o jantar? Fiquei te procurando até a ver no Salão do Banquete sua coisa. — Lorraine ralha comigo.

— Por favor... me ajuda a tirar esse vestido. — Faço pouco caso de suas palavras e o quarto estava sendo iluminado por lamparinas que havia colocado na parede, mas a luz da lua cheia adentrava o recinto e por um momento, vejo minha amiga ficar parada olhando para a porta.

Minhas costas estavam despidas e vejo as se iluminarem bem na minha marca de nascença, uma rosa que parecia ter sido desenhada a mão nelas.

— Majestade? — Lorraine diz com a voz embargada e tento cobrir minhas costas, me virando para encarar os olhos azuis do rei me observando.

— Nos dê licença, senhorita. — Ele manda.

— Por favor. — Eu a paro, mas ela me olha sem opções.

— Estarei lá fora. — Diz mentalmente para mim e ela passa de cabeça baixa pelo rei, fechando a porta ao sair.

A cada passo que Thranduil dava... eu temia pelo que poderia acontecer. Ele estava bem sóbrio, isso significa que sabia o que estava fazendo e eu tive mais medo ainda. O quarto ficou escuro de repente e era iluminado apenas pelos raios de luz da luz cheia que tocavam a minha pele e a do rei. Eu não estava nua, apenas com as costas aparentes, mas meu estomago se revirava por dentro.

Virei meu rosto quando ele me encarou e o rei segura me queixo, cravando seus olhos nos meus.

— Você é igualzinha à sua mãe... — Ele diz admirado. — Mas tem os olhos do seu pai... o filho de Aslam. — Thranduil diz com aborrecimento na voz.

Ele sabe quem eu sou.