P.O.V – LeeTeuk on

Eu estava comendo cereal na minha varanda quando escutei o choro alto e agudo de um bebê. Uma nova criança havia nascido. No mesmo instante corri para a sala de estar deixando a tigela cair sobre a varanda e peguei o telefone, discando rapidamente o número de Heechul. Antes que chamasse pela primeira vez, HeeChul atendeu.

– Ele nasceu – ele disse sem que eu me manifestasse.

– Quem é ele? - perguntei ansioso e nervoso, mas sem demonstrar nada, eu conseguia sentir que aquela criança havia nascido, mas não conseguia sentir nada além do que isso.

– É um menino, Lee Donghae – respondeu Heechul com a voz indiferente, conhecendo como eu o conhecia, ele ainda devia estar acordando de seu curto transe.

– Temos que achá-lo – disse simplesmente escutando o fim da ligação.

Coloquei o telefone no gancho e olhei tudo envolta seguindo calmamente de volta para a varanda. Não havia tanta urgência em encontrar o garoto assim, porque Heechul provavelmente veria se algo ameaçasse sua vida, mas eu queria garantir que ele estaria o procurando. De pé na porta da minha casa, observei a tigela no chão, o cereal espalhado e o leite escorrendo pela madeira. Eu poderia muito bem deixar aquilo para outro momento, mas minha necessidade de perfeição, me fez esticar o braço esquerdo para aquela bagunça e levitar as bolinhas de cereal e a colher de volta para a tigela. Eu não comeria aquilo. Com um gesto de mão e usando da força do pensamento, trouxe a tigela até mim e a levei calmamente para a pia da minha arejada e solitária cozinha.

Olhei em volta para ter certeza que estava tudo em ordem, forcei a maçaneta da porta da cozinha para baixo, só para ter certeza que estava tranca e segui para a sala de estar. Com um movimento de mão, trouxe o pequeno molho de chaves para mim e deixei a casa a trancando em seguida. Meu sobrado ficava um pouco distante dá tão falada civilização, meus vizinhos eram a densa floresta e os campos verdejantes, eu me sentia bem naquele ambiente. Embora realmente não precisasse de um, entrei no meu carro e parti em direção a cidade onde eu encontraria com Heechul.

Durante o percurso, liguei o rádio apenas para não ficar no silêncio, mas não tocava nada que prestasse e acabei deixando em uma estação qualquer. Aproximadamente trinta minutos em alta velocidade depois e eu havia chegado à cidade. Fui obrigado a diminuir a velocidade para que não causasse nenhum acidente e guiei o carro calmamente até um bar na periferia de Seul. Deixei o carro estacionado na rua e entrei no bar ajeitando meu casaco de couro marrom, estávamos no inverno e o frio não poderia ser o mais cruel. Heechul e Siwon me esperavam sentados em uma mesa perto da saída dos fundos, ambos estavam bem agasalhados com casacos de couro preto e bebiam algo que não consegui reconhecer de primeiro momento, mas com certeza devia ter álcool.

– Onde está KangIn? - perguntei sério sentando à mesa com Heechul e Siwon, eu havia dado tempo suficiente para que ele chegasse.

– Ele não virá – respondeu Heechul com desprezo.

Fitei a face de Siwon que nada expressava e bufei baixinho, dando aquele assunto por encerrado. Heechul nunca errava e pelo seu tom, KangIn tinha motivos desprezíveis para não comparecer a nossa breve reunião. Olhando desconfortavelmente para Heechul, que mantinha seus olhos presos ao seu copo, tomei fôlego para perguntar:

– De onde ele é? - eu fazia uma referência clara ao novo garoto que havia nascido.

– Eu não consegui ver – respondeu Heechul brincando com o copo de bebida. No mesmo instante eu e Siwon nos entreolhamos surpresos.

– Você não viu? - perguntei com dificuldade e ele apenas balançou a cabeça negativamente sem se desconcentrar do que fazia.

– Como isso é possível? - perguntou Siwon sem acreditar, Heechul era nossos olhos e ouvidos do futuro, qualquer coisa que acontecia ele podia ver, mas desde o momento que ele anunciou que uma nova criança como nós chegaria ao mundo, ele se comportava de modo estranho.

– Eu simplesmente não vi onde ele nasceu – disse Heechul sério, passando os olhos rapidamente por Siwon e voltou-se para mim – Você não consegue sentir nada?

– Não – respondi de modo inaudível.

O garoto devia estar muito longe, por isso eu não conseguia senti-lo, mas aquele nome era coreano e eu havia ouvido seu choro quando nasceu, não era possível que ele estivesse tão distante assim. Ficamos em silêncio refletindo sobre o destino daquela criança, nós precisávamos encontrá-la, antes que mais alguém fizesse isso. Siwon deu um grande e ruidoso gole em sua bebida e bateu com o copo na mesa chamando a atenção de todos. Limpando a boca com o dorso da mão direita, ele anunciou:

– Devemos nos separar.

– Não a urgência em encontrá-lo, ele está em segurança onde quer que esteja – retrucou HeeChul indiferente.

– Por quanto tempo? - perguntou Siwon mantendo seus olhos fixos em Heechul – Você não conseguia dizer o seu nome até o momento do nascimento, quem dirá que você vai prever um perigo antes que ele aconteça? - embora suas palavras ferissem, seu tom era calmo e controlado – E o LeeTeuk também não pode senti-lo... - subitamente Siwon se calou deixando as palavras no ar.

Fitei a face séria de Heechul. Ela estava voltada para baixo e seus cabelos negros caiam sobre a face. Sem mais nem menos, Heechul se levantou e jogou algumas notas de wons na mesa, ele disse que precisava ir. Eu conseguia sentir que ele estava magoado, mas além disso, ele estava decepcionado. Voltei meus olhos para Siwon que dava um último gole desconfortável em sua bebida e me levantei.

Desconfortável e intrigado com toda aquela situação, procurei por auxilio na zona pobre de Seul. Assim que estacionei meu carro em frente a uma casa humilde, um garotinho de cinco anos de idade veio me receber. Ele estava muito bem agasalhado, mas suas roupas eram antiquadas. Ele exibia um sorriso alegre e emanava uma energia incomum. Heechul também tinha certeza de seu futuro, mas nesse momento eu buscava por seu pai.

– Tio Jung-su – disse ele animado vindo me receber com um abraço.

– Kyuhyun – respondi com um sorriso e o abraçando. O erguendo em meus braços, perguntei – Onde está seu pai?

– Lá dentro – respondeu ele apontando com o indicador pequeno e gordinho para a casa.

Sorrindo em agradecimento, o coloquei no chão e entrei em sua casa. A casa estava bagunçada e escura, como eles não possuíam aquecedor, tudo ficava fechado durante o inverno e era possível sentir o cheiro de mofo no ar. Atravessei a sala cozinha em poucos segundos e cheguei a uma sala reservada e com pouca luz, onde um homem robusto residia em uma poltrona de couro antigo atrás de uma grande mesa de madeira.

– A que devo a honra de sua visita? - ele perguntou em um tom audacioso sem se mover do seu lugar. Seu rosto estava encoberto pelas sombras.

– Um novo garoto nasceu, Lee Donghae, preciso que o encontre – disse em tom autoritário sem nada expressar, JinWook já estivera em momentos melhores, mas se ele queria bancar o mercenário, eu bancaria o patrão.

– Então a outro garoto... - comentou ele em um pensamento alto e se ajeitando na ponta da poltrona – Vou procurá-lo, mas não se esqueça do meu pagamento – seu tom era tão desprezível quanto as coisas que eles faziam por dinheiro.

Sem dizer nada, dei as costas e o deixei em seu recanto escuro, naquele momento eu acreditava que sua busca seria rápida, por causa de seus contatos no mundo inteiro, mas eu estava redondamente enganado.

Doze anos depois e eu estava andando pelas ruas movimentadas de Seul. Como era verão eu usava roupas leves, mas a minha aparência era exatamente a mesma. JinWook havia me ligado, dizendo que finalmente havia descoberto o paradeiro do garoto e agora eu esperava impaciente por Kyuhyun. Doze anos de espera para enfim descobrir onde Donghae estava, doze longos anos de espera e ansiedade. Eu andava distraído quando um jovem esbarrou em meu ombro. Procurei sua face no mesmo instante com uma carranca irritada, mas deixei que meus músculos faciais relaxassem quando encontrei o sorriso maroto de Kyuhyun, que agora era um belo jovem de dezessete anos. Ele havia crescido bastante, mas não havia desenvolvido músculos, ele era apenas um nerd magrelo.

– Tio Jung-su – disse ele com seu sorriso maroto – Eu só te entrego o endereço se me levar com você.

Revirei os olhos e fiz sinal para que ele me acompanhasse. Kyuhyun era um nerd, mas gostava de se sentir importante e no meio de tantos mutantes de grande porte como eu, Heechul e Siwon, ele se sentia como se fosse alguém. Seguimos até o apartamento de Heechul, que era grande e luxuoso e ficava no centro da cidade. Deixei meu carro no estacionamento e subi de elevador na companhia de Kyuhyun que não parava quieto um segundo sequer. Ele se movia de um lado para o outro, arrumava o cabelo na frente do espelho, perguntava sobre Siwon e alguns vezes notei que ele falava sozinho. Assim que porta do elevador se abriu, a porta do apartamento foi aberta por Heechul que parecia tão ansioso quanto eu.

– Tio Heechul – disse Kyuhyun animado passando pelo anfitrião, que apenas lhe deu um tapa na cabeça, ele odiava ser chamado de tio.

Cumprimentei o dongsaeng com um sorriso torto e segui para dentro do apartamento. Siwon estava sentado no sofá com uma caneca vermelha e fumegante nas mãos. Impertinente como Kyuhyun havia se tornado, ele sentou-se ao lado de Siwon tirando sua mochila preta das costas e retirou seu notebook antigo de dentro dela.

– Aprendeu alguma coisa nova meu pupilo? - perguntou Siwon com bom humor, os dois possuíam dons semelhantes e Kyuhyun fazia de tudo para se mostrar superior ao seu mestre.

– Na verdade sim, mas preciso de duas internets ligadas – respondeu o jovem com um sorriso presunçoso, fazendo Siwon arquear a sobrancelha esquerda, ele não tinha a capacidade de mexer com a internet, na verdade seu poder era um tanto limitado em comparação ao que Kyuhyun fazia com computadores e jogos.

– Podemos deixar as demonstrações idiotas de poderes para outro momento? - perguntou Heechul sério.

– Como você ainda não sabe qual é o endereço? - perguntou o jovem com seu sorriso presunçoso que irritava a Heechul.

– Porque você não tem a intenção de me entregar, muito menos a qualquer um que esteja aqui e grande coisa você se teletransportar de um computador para outro via internet – desdenhou Heechul.

– Como é que é? - perguntou Siwon engolindo a seco – Você consegue se teletransportar pela internet?

– Era uma surpresa – esbravejou Kyuhyun levemente alterado, mas rapidamente voltou a ficar tão calmo como ele nunca ficava – Nossa, que paz – ele comentou um pouco intrigado, mas então semicerrou os olhos para Heechul – Pare de brincar comigo hyung! - exclamou ele em conflito interno com suas emoções.

Heechul apenas sorriu em resposta.

– A informação Kyuhyun – o lembrei antes que ele jogasse um vírus no notebook de Heechul e os dois começassem a brigar como da última vez.

– Aqui está – disse ele puxando um papel pequeno e resistente do fundo de sua mochila preta.

Heechul paralisou no mesmo instante entrando em um de seus transes, mas a resposta estava tão próxima, que apenas peguei o papel ignorando o seu estado. Em poucos segundos ele voltaria ao normal, eu só esperava que ele não viesse com nada do tipo 'O fim do mundo está próximo'. Pelo tipo de papel, reconheci como sendo de foto e ela estava virada para baixo. Na parte branca estava o endereço e um nome.

– Brasil – li em um sussurro baixo, notando que Siwon parava curioso ao meu lado.

– Não é possível – disse Heechul saindo do seu transe – Não pode ser o mesmo garoto, eu sei que seu nome é Donghae.

– Você se enganou feio tio, o nome dele é Pedro Assunção, nasceu em uma cidadezinha brasileira e é um antissocial magrelo.

– Como você? - perguntou Siwon com um sorriso.

Kyuhyun apenas fez uma careta. Ignorando as palavras de Heechul que insistia que aquele não era o garoto certo, virei a face da foto para mim. Um garoto de cabelos castanhos sorria sem muita vontade para a foto, um garoto de feições coreanas.


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