A Promessa

Só Pode Ser Brincadeira.


Estava tão ansiosa e desesperada que não consegui esperar que a luta terminasse para provavelmente ouvir um não alto e duro de Maxon, ele não confiava em mim para ser forte, ele não acreditava que eu pudesse ajudar, ele tinha certeza que eu só piorava as coisas. Mas eu poderia mudar, poderia fazer com que ele acreditasse em mim e não subestime a coragem – que bem lá no fundo – eu sei que tenho e Louis devia saber por me entregar o endereço. Ele devia acreditar em mim e eu não iria decepcionar ninguém. Não dessa vez. Não iria me passar por louca, não iria fazer drama, não iria chorar e faria qualquer coisa para proteger meus amigos.

Para proteger Maxon.

Pela primeira vez não prestei a atenção nele ao sair da sala e passar pelo porão, pela primeira vez estava focada demais para parar e observar Maxon em sua revanche. Eu não sabia se ele estava ganhando, não sabia quem era o adversário e minha curiosidade – pela primeira vez – não estava por perto ou não queria saber, talvez por está mais curiosa em saber quem é a pessoa que mandou duas mensagens com codinome “A”. Talvez curiosa para agradecer por ser avisada pela aposta, talvez gritar e surrar por ter estragado meu momento com Maxon, talvez matá-la por – talvez – ser o dono desse jogo absurdo.

Felizmente não havia Camila na porta do porão, não sabia onde Manu ou Larissa estavam e não iria parar agora, passei como um vento esbarrando em Julia. Desequilibramos caindo ao chão, ela resmungando palavrões e eu lamentos por achar que conseguiria sair sem ser vista.

— Kar? – Mylena perguntou chocada ao me ver, erguendo uma mão para mim enquanto Julia já se levantava e limpava o jeans. – O que está fazendo aqui? – ela perguntou.

— Não tenho tempo para falar agora. – falei ao levantar, passando pelas duas torcendo para que não me sigam, para que não perguntem nada, para que não avisem a Maxon.

— Para onde você vai? – Julia gritou, mas eu não queria responder, não queria que viessem comigo porque eu precisava fazer sozinha.

Ilusão minha.

— Eu não sei, mas você não vai sozinha. – Mylena disse ao meu lado, apressando os passos para manter meu ritmo, assim como Julia. Olhei de uma para outra enquanto sorriam e acabei concordando, não tinha tempo para parar e fazê-las ficar.

Não tinha tempo para perder.

O endereço que Louis havia dado era perto da faculdade, sendo assim fomos andando – quase correndo – até chegarmos a uma casa velha e caída em uma rua deserta, sem luz e casas habitáveis. Tivemos que checar duas vezes no bilhete se era o endereço certo, tivemos que respirar fundo antes de abrir o pequeno portão do jardim – que parecia mais um lixão. Estávamos tensas observando todo o lugar a cada passo que dávamos. O jardim poderia ser lindo se fosse cuidado, se limpassem todos aqueles restos de mesas, cadeiras, eletrônicos e plantassem algumas flores aqui e ali. A casa não tinha chance alguma de ser bonita, a madeira no piso de entrada rangia com nosso peso, a porta estava entreaberta mostrando o quão escuro estava lá dentro e as janelas ao lado estavam com vidros quebrados e as cortinas rasgadas. Pegamos nosso celulares ao parar frente a porta, Julia a abriu com um único movimento e ascendeu a lanterna, Mylena e eu fizemos o mesmo, entrando tão apreensivas iluminando o chão, o teto e as paredes.

— Não pode ser aqui. – Mylena disse se aproximando a uma aberta na parede, provavelmente levando ao outro cômodo.

— Shhh... Vamos olhar tudo. – Julia falou indo até as escadas, ou o que restou delas. Parou e se virou para nós. – Vou subir.

— Não Ju! – pediu em um sussurro desesperado. Ela apertou o olhar para mim e suspirou, subiu um degrau, depois outro e outro.

Mylena já estava na outra sala e me vi sozinha no Hall de entrada, encarando as escadas com as pernas travadas, a respiração ofegante e o frio na espinha. Eu poderia ficar ali e esperar por elas, poderia deixá-las fazer o trabalho sozinhas e apenas esperar. Mas não, eu tinha de fazer algo, tinha de agir – mesmo achando que não iríamos encontrar nada ali. Respirei fundo e fui até a entrada para um cômodo no lado oposto aonde My havia entrado, parei na abertura e iluminei todo o lugar antes de entrar – só para ter certeza que estava seguro – e por pouco não gritei, por pouco minha mão não chegaria a tempo na boca para prender o grito.

Respirei fundo e entrei, iluminando a mesa coberta por papeis rabiscados com uma letra quase ilegível. Passei o olhar por cima seguindo ao computador – estranhamente – novo em relação a toda casa, parecia desligado e por experiência resolvi não mexer. Fui até a única parede com o papel de parede intacto e passei a lanterna do celular por todos os papeis presos nela, revelando fotos que eu mesma não conhecia. Era algo como se alguém tivesse tirado sem que soubéssemos.

— Julia? – falei tão calma que me estranhou, sem tremer as mãos ou chorar com um bebê.

Julia e Mylena apareceram quase no mesmo instante, com as sobrancelhas no alto da testa e queixos caídos tão chocados quanto eu ao ver aquele cômodo.

— Não pode ser. – Mylena disse olhando a foto que eu iluminava. – Julia. Não pode ser. – ela repetiu.

— Só pode ser brincadeira. – falei voltando a encará-las.

Era visível o professor Will Herondale com suas mãos na cintura da aluna, Julia que sorria tão apaixonada quanto ele, tão felizes mesmo estando escondidos em algum prédio da faculdade. Pude vê-la se esforçar para não correr. Havia fotos em que Maxon está beijando alguém que eu prefiro não conhecer, havia fotos do Aaron saindo do prédio das aulas, havia fotos minha e das minhas amigas no primeiro dia de aula saindo do Morgan, havia a foto que o time de futebol havia tirado para o jornal da faculdade, havia fotos do grupo de xadrez, das garotas Gama e do teatro.

— Vamos pegar tudo isso e sair daqui. – Mylena disse juntando todos os papeis desarrumados na mesa. Julia pulou para meu lado puxando sua foto com o professor.

— Vamos levar essas aq... – paramos de repente com o barulho vindo do segundo andar.

Um barulho estridente de algo caindo no chão que nos fez parar, congelar sob as pernas trêmulas que ameaçavam cair a qualquer momento. Minha curiosidade já havia corrido a muito tempo e mesmo assim, eu não poderia sair. Nos entreolhamos por um instante – aquela velha conversa com o olhar – repreendendo umas as outras por ser visível a vontade de subir. Mylena dobrou os papeis e colocou no bolso de trás da calça, caminhando em direção a abertura na parede, fazendo Julia segui-la. Tirei algumas fotos da parede e me virei para segui-las, esbarrando – por ser tão desajeitada – na mesa onde estava o computador e fazendo-o ligar mostrando uma imagem que eu desejaria nunca mais poder ver. Apressei os passos até as escadas subindo cada degrau lentamente com o medo dele ceder com o peso das três e tentando não surtar com a imagem brilhando em minha mente.

A imagem que noutra vez éramos eu e minha mãe.

E que agora era

Maxon.

E, provavelmente, sua mãe.

— Acho que foi aqui. – Julia disse ao parar frente a única porta fechada e intacta no corredor.

Olhei em volta esperando um susto, esperando ver alguém escondido entre as sombras pronto para gritar e nos fazer chorar – borrando as calças. Olhei observando onde estávamos, provavelmente um corredor de quartos, mas quem havia morado aqui? Quem poderia ter – e saber – tanto sobre nós? E porque aquelas fotos? O que são esses papeis?

As perguntas dissiparam da minha mente quando Julia abriu a porta revelando um quarto vazio exceto pela corda presa no lustre do teto, exceto pela cadeira caída desajeitadamente e vazio exceto pelo corpo de alguém que eu conhecia muito bem, preso a corda pelo pescoço. Mylena deu um passo para trás com o impacto daquela cena e eu queria verdadeiramente gritar e correr, Julia se virou e me encarou como se suplicando para sairmos e eu não podia rejeitar aquele pedido, não poderia negar.

Fui a primeira a me virar e correr para fora da casa.