A Promessa

Qual Será O Fim?


O quarto em minha volta rodou me deixando tonta e desequilibrada, meus joelhos bateram ao chão e as lágrimas caíam em minhas bochechas fugindo de tudo o que eu havia passado, de tudo o que eu ainda poderia passar. Maxon se ajoelhou ao meu lado perguntando se eu estava bem, pondo suas mãos em meus ombros tentando me levantar. Minhas pernas ardiam o suficiente para me fazer chorar com a dor, minha mente lembrava da noite passada e o medo estava ali, estava em meu corpo tendo espasmos.

Contar ou não contar. Contar ou não contar. Contar ou não contar. Contar ou não contar.

Eram as duas opções que eu tinha em minha frente com Maxon ao meu lado. Suspirei fundo sentando no chão, esticando as pernas para dá de cara com partes do jeans sujos de sangue. Maxon puxou ar com a boca e eu precisava escolher uma opção.

— Maxon.

— O que é isso? – ele perguntou nervoso, levantando-se do chão, os olhos fixos em minhas pernas. - O que é isso Karlla?

— Eu me machuquei. – falei engolindo o nó na garganta.

Ele saiu do quarto em um segundo e no outro já estava de volta com uma caixa branca nas mãos e com certeza não era a que eu estava procurando. Maxon deixou-a sobre a cama e sem um pingo de hesitação, enfiou uma mão na dobras de meus joelhos enquanto a outra estava em minhas costas, me ergueu levando até a cama.

Tão príncipe.

Tão cavalheiro e eu precisava me decidir.

Maxon abriu a caixa, tirou uma enorme tesoura e cortou metade do tecido que cobria minhas pernas, a principio achei que iria desmaiar ao ver a quantidade de sangue que havia ali, sangue vermelho vivo sobre um tom mais escuro, mais seco. Cada ferimento era uma tira perfeita, estava inchado quase roxo com líquido amarelado nas bordas. Para qualquer descrição, estava terrível.

— Acho que infeccionou. – Maxon disse despejando líquido transparente em um vidro no algodão.

Ele não tirava os olhos das minhas pernas e fazia aquilo tão cuidadoso que me assustou.

— Onde você aprendeu tudo isso? – perguntei ao vê-lo passar o algodão molhado pelos cantos de cada ferimento, limpando o líquido amarelado.

— Técnica. – respondeu com um sorriso. – Eu e meus irmãos brigávamos muito e já houve momentos em que eu saía machucado, tive que aprender a cuidar de mim.

— Suas mãos estão melhores? – perguntei ao vê-lo trocar de algodão.

— Cuidei delas. – Maxon respondeu virando-as para mim, ainda havia partes rosadas mas quase todas cicatrizadas. – Agora me diz, o que foi isso?

Oh Deus, chegou a hora de decidir.

— Não quero saber se tem alguém te esperando, não quero saber por onde você andou ontem, mas quero saber como conseguiu isso. – Maxon disse apontando para minhas pernas.

— Ah, você vai querer saber aonde andei ontem. – falei deixando-o confuso, intrigado ao erguer uma sobrancelha para mim. – Primeiro. – baixei a voz me inclinando para mais perto. – Você precisa falar baixo. – Maxon concordou com a cabeça pressionando os lábios, seus olhos castanho brilhavam de curiosidade para mim.

Respirei fundo e contei sobre a mensagem que havia recebido quando ainda estava no hospital. Contei que me virei para ele e o vi conversando com Larissa baixando a cabeça escondendo um sorriso enquanto ela falava algo e descansava uma mão em seu ombro, falei que nesse mesmo instante sai da recepção, contei sobre a fábrica abandonada, sobre a mulher e sem comentar minha descoberta recente. Contei sobre desmaiar e ser levada para um lugar que eu não fazia ideia de onde seria, contei sobre a sala branca mas deixei minha conversa com a mulher de fora. Contei sobre Kent e hesitei ao contar sobre minhas pernas, sobre o chicote, mas por fim, tive de contar. Contei sobre o pedido de roubar os papéis e a caixa e sobre o celular novo. Ao final, Maxon estava de queixo caído. Espantado com tamanha loucura, talvez com raiva pela agressividade e aliviado por eu ter contado.

Meu celular tocou outra vez antes mesmo que um de nós falasse alguma coisa, era Kent. “Que porra você está fazendo?” ele gritou na outra linha. Eu já não me importava, já não tinha medo ou apreensão por mentir porque Maxon estava ali, sabia de tudo e eu me sentia segura com ele. Segura o suficiente para me deixar corajosa, para me fazer atuar muito bem. “Não encontrei a caixa.” Foi minha resposta rápida. “Então faça alguma coisa ou eu mesmo subo ai.” Kent disse me deixando nervosa, me desarmando. “Não posso procurar com ele aqui.” Falei encarnado Maxon em minha frente, observando cada piscar dos meus olhos. “Quero os papéis.” Kent falou e eu concordei com a cabeça mesmo sabendo que ele não veria, desliguei o celular e suspirei.

— Por favor não diga que é perigoso para mim. – falei antes que Maxon pudesse me deter. – Estou bem agora que te contei a verdade e eu vou até o fim.

— Onde isso vai terminar Karlla? Qual será o fim? – Maxon perguntou preocupado, seus ombros encolhidos talvez com decepção, talvez com tamanha apreensão com nosso futuro incerto.

— Tirei fotos de todos esses papéis. Eu sei que Aaron vai pirar, mas eu preciso entregá-los.

— Você está se arriscando demais. – ele disse.

— Por vocês! E eu sei que todos irão me odiar e eu quero que isso aconteça, por que será mais fácil. Mas isso não pode acontecer com você. – falei olhando suas mãos sobre a cama, observando-as se erguer até meu rosto, fazendo-o encará-lo.

Não. De modo algum poderia aguentar Maxon me odiando. Em momento algum eu poderia desejar isso.

— Eu nunca vou te odiar. – ele sussurrou. – Esqueça tudo o que eu disse aquela noite. Isso nem mesmo importa. Eu vou sempre está aqui por você. Para você.

Sorri, mas queria beijá-lo, concordei com a cabeça piscando várias vezes para não chorar. Maxon se ergueu e pegou uma calça de moletom em seu guarda-roupa, era folgado o bastante para não tocar em minhas pernas. Ele ficou no quarto enquanto desci até o estacionamento, até o carro em que Kent estava.

— Belas calças. – ele disse quando entrei no bando do passageiro.

— Aqui. – entreguei os papéis e esperei que ele os analisasse. – Eu não sei onde a caixa está, mas posso fazer Maxon falar.

— Porque não fez isso antes? – ele perguntou sem paciência.

— Porque eu preciso de tempo!

— Sua amiga não tem tempo! – Kent gritou irritado. – Venho a noite e nem pense em dizer uma só palavra a esse mauricinho. Você sabe o que te espera. – e sorriu desviando seu olhar para minhas pernas.

Concordei com a cabeça e sai o mais rápido que pude do carro, observando-o acelerar e atravessar o estacionamento como um louco.

Deus.

Forcei minhas pernas a correrem o mais rápido que podiam de volta ao apartamento, fechando a porta ao passar e tendo um déjà vu daquele momento. Observei a sala completamente vazia e silenciosa, observei o corredor, suas portas e respirei fundo. Fechei os olhos encostando a cabeça na porta, ouvindo Maxon chamar meu nome uma duas três vezes e ignorando-o por está perdida nos pensamentos, por voltar aquela noite no Setor 45. Voltar ao acidente e assistir tudo outra vez na cadeira vip e de longe.

Estávamos bêbados e sorridentes, Maxon havia apostado com Dylan e corriam no estacionamento até pouco antes da entrada. Apertei o olhar observando tudo de longe, esperando o momento até que o carro apareceu, correndo como um louco esbarrando no corpo de Dylan arremessando-o para longe no mesmo instante em que Maxon pulou para o arbusto na calçada oposta. Vi o carro passar por nós, que assistíamos e sair do estacionamento.

— Karlla? – Maxon disse mais uma vez.

Abri os olhos e o encontrei tão perto, inclinado para meu rosto, as mãos em meus ombros.

— Karlla? Está tudo bem? Ele te fez algo?

— Sei quem matou Dylan. – Maxon se afastou, deu um passo para trás tirando as mãos do meu corpo, olhando para mim esperando uma resposta e eu a tinha.