Café Musain

Os Amis estavam reunidos como sempre faziam depois da aula, a única coisa diferente é que estavam esperando o líder chegar. Todos estavam estranhando este fato, afinal Enjolras era o único que nunca se atrasava para uma reunião. Ao notarem a também ausência de Combeferre, logo pensaram que ambos foram resolver algum problema, mas não podiam negar que ainda era estranho, os dois não iriam simplesmente sumir sem avisar ninguém. Já estavam considerando sair para procurá-los quando ouviram barulhos na escada e os viram subindo. O que não faltou foi comentários tanto preocupados quanto irônicos. Combeferre ficou um pouco perdido com tantas pessoas falando ao mesmo tempo, enquanto Enjolras ainda estava com um olhar meio sonhador. O loiro havia ficado assim o caminho inteiro, não prestava atenção no amigo que tentava a todo custo puxar uma conversa. Quando fora convidado para acompanhá-lo, Combeferre sabia apenas um pouco da história de Enjolras, mas depois ficou sabendo de tudo. O rapaz achou que isso foi uma das – se não a – maior ironia do mundo, quem diria, o menino que cresceu com a princesa se tornaria um homem com a pretensão de acabar com a monarquia. Ao contrário do que o amigo pensava, ele não desacreditou em seu líder em nenhum segundo, mas não pode negar que pensou que talvez ele desistisse da revolução quando viu o olhar de Enjolras sobre Belle e o dela sobre ele. Se Jean estivesse lá iria adorar, o poeta logo falaria que aquilo era amor. Por fim Joly veio lhe perguntar o que tinha acontecido com Enjolras, então decidiu que já era tempo de todos os Amis saberem a verdade do jeito que tinha sido prometido à ele por Enjolras. Fez um barulho com a garganta e todos o olharam.

-Enjolras, acho que está na hora deles saberem... – ele disse e o líder suspirou

-Saber o quê? – Bossuet perguntou alternando seu olhar entre os dois.

-Saber onde estávamos e o motivo. – Enjolras respondeu e viu que tinha a atenção de todos. Olhou para o chão como se estivesse tomando coragem e olhou de volta para eles – Eu e Combeferre estávamos no Palácio das Tulheiras para receber a princesa Belle.

-O quê? – ouviu Bahorel falar alto e em seguida ouve um aumento da conversa. Todos estavam discutindo como e porquê de Enjolras estar “de bem” com a monarquia. Enjolras simplesmente balançou a cabeça negativamente e olhou para Combeferre meio que pedindo ajuda, depois só ouviu um grito de Joly que fez todos ficarem quietos mais uma vez.

-Vamos deixar Enjolras terminar de explicar não é mesmo? – disse e acenou com a cabeça para o líder, como se pedisse para ele continuar.

-É claro! Que a família do Enjolras era rica todo mundo sabia, mas pelo menos eu quero saber por que ele estava agradando a nobreza! – disse Feuilly

-Bom, é que eu estava lá a pedido do meu pai...

-Do seu pai? – Courfeyrac perguntou – O quê ele tem haver com os Bourbon?

-Pelo amor de Deus! Deixe-o falar! – gritou Grantaire do fundo da sala.

-Obrigado Grantaire. – o loiro agradece e recebe um aceno de mão de volta – Acontece que o meu pai é amigo do Rei.

Quando Enjolras termina de falar, todos os Amis ficam estáticos. Não sabiam o que falar ou fazer, o pai do líder era um amigo de Luís XVIII e era no mínimo uma coisa muito irônica.

-O... o seu pai é amigo do Rei? – Jean pergunta e Enjolras confirma com a cabeça. Logo Combeferre se vira para ele com um sorriso pequeno no rosto.

-Espera que tem mais! – ele fala

-Mais? – Jean pergunta – O que pode ter a mais?

-Continua Enjolras. Por favor. – Combeferre fala se virando para Enjolras e tira o sorriso do rosto quando vê a cara não tão boa de seu líder.

-Então... o que tem a mais? – Joly pergunta

-O que tem a mais é que eu cresci com a Belle, eu digo, com a princesa. – ele fala se atrapalhando um pouco no final – Mas eu não sabia quem era ela, eu pensava que ela era minha prima. – ele fala rapidamente em seguida e nota o estado de choque dos Amis e o sorriso no rosto de Combeferre, pelo visto ele tinha adorado essa situação.

-Tudo bem... – Courfeyrac fala devagar – Importa-se de articular um pouco mais?

-Quando a princesa nasceu, ao invés de levar ela junto com ele, o rei decidiu aceitar a proposta do meu pai e a deixou com ele. Eu cresci achando que ela era minha prima, quando a gente tinha uns sete ou oito anos ela foi embora e só anos mais tarde eu descobri que ela tinha ido para a Suíça a fim de se proteger de Napoleão. – ele fez uma pausa e olhou para ver se todos ainda estavam prestando atenção e depois continuou – Resumindo, depois a gente se encontrou de novo, meus pais me contaram que ela era a princesa, ela foi embora de novo dessa vez para a Áustria e agora ela voltou. Fui porque meu pai havia me pedido e também porque queria vê-la, não vou mentir para vocês. Eu queria ver Belle. Só levei Combeferre para não ficar sozinho no meio dos nobres e perder a cabeça.

-Uau – fala Bossuet

-Calma que tem mais uma coisa. – Combeferre fala novamente

-O que é agora? – Jean pergunta e Enjolras se vira para Combeferre repetindo essa mesma pergunta. Combeferre chega mais perto e sussurra a palavra festa.

-Ah! – Enjolras fala um pouco alto – O Rei vai dar um baile em homenagem à princesa, mas ela conseguiu fazer com que esse baile fosse aberto ao público.

-Repetindo as palavras dela: “eu só quero que o povo desfrute de tudo o que os nobres e os ricos podem”— Combeferre o interrompe e Enjolras esboça um sorriso ao se lembrar desse momento.

-É! E ela me disse para convidá-los em seu nome. – Enjolras fala para os Amis boquiabertos – Nós todos somos convidados da Princesa.

-Sou só eu ou todo mundo acha isso estranho e irônico? – Grantaire pergunta – Eu digo, nós, os Amis, somos convidados da Princesa. – ele diz se levantando – Justamente o grupo revolucionário! – ele termina dando mais um gole na garrafa de vinho.

-Eu sei que é estranho. – começa Enjolras – Contudo, eu acredito em Belle. Não acredito na monarquia, no rei e nem na princesa... eu acredito que a menina com quem eu cresci ainda é aquela mulher que eu vi sair da carruagem. – ele continua – Essa atitude dela, de enfrentar o pai para que o baile fosse público demonstra isso, ou vocês acham que qualquer nobre iria pensar em fazer esse pedido? Eu acredito nela...

-Então, se você acredita nela, eu acredito também. – fala Grantaire e todos concordaram. Ouviram mais um barulho na escada e depois constataram que era Gavroche. O menino esta muito suado, devia ter corrido mais do que o normal.

-Vai ter um baile daqui a uma semana em homenagem a princesa Belle e todo cidadão francês está convidado! – Gavroche falou entre suspiros e viu Courfeyrac dando risadas e vindo em sua direção.

-Nós sabemos – ele falou dando tapinhas no ombro do garoto – Acabamos de ficar sabendo...