Na manhã seguinte, levantei cedo e fui para o convés do navio onde os marujos já estavam realizando seus trabalhos. Intimei um dos marujos para simular uma luta com espadas para que eu treinasse meus movimentos aprendidos na guerra passada. A espada era um pouco mais pesada do que eu lembrava e no início atrasou um pouco os meus movimentos. Toda vez que fôssemos cravar a espada no oponente, parávamos com a ponta próxima ao peito para que o outro entendesse que era a hora de parar, pois havida sido “morto”.

Não demorou para que tivesse uma fila de pretendentes querendo lutar ou se aproveitar para encostar um pouco em mim, porém eu impedia a maior parte deles com golpes e saltos. Então, Bae se colocou a minha frente para lutar.

—Só não se ofenda em perder para um jovem marujo. – Ele provoca.

—Acho que perder para uma princesa é pior.

Ataco-o com a espada, passando com a lâmina perto de seu quadril e ele se admira. A partir dali, começa uma luta simulada intensa com golpes, rolamentos, saltos e manobras. Bae era bom com os ataques, porém deixava um pouco a desejar em suas defesas, e foi assim que eu também o venci, quando derrubo sua espada no chão e aponto a lâmina para o seu peito, assoprando uma mecha do meu cabelo como charme final.

—Tudo bem, admito que você luta como um homem.

Aquilo faz meu sangue subir.

—Você é ridículo.

—Bom dia?

Gancho chega cauteloso até o convés, sentindo o clima de tensão no ar. Passo por ele entrando novamente no navio para guardar a espada, quando sinto alguém atrás de mim. Viro-me ainda enfurecida, vendo Gancho se aproximar com as mãos erguidas.

—Vim na paz.

—O que você quer?

—Quero saber do seu plano. Do que eu lembro de ontem a noite, você falou sobre ter uma ideia de...

—Pegue a espada. – Lanço-a para ele e o mesmo a pega ainda no ar.

—Você luta?

—Lutei na guerra.

—E você não acha que eu já não sei lutar? Eu sei usar a minha espada muito bem.

—Vamos ao que interessa. - Ignoro-o.

Explico a ideia detalhadamente do início ao fim. Mostro a ele um golpe com a espada que irá ser realizado em Barba Negra, então eu guio o seu punho fazendo um movimento descendente e então de ataque, quando percebo que Gancho me olha pelo canto do olho.

Por alguns segundos os dois ficaram parados sem saber como prosseguir, quando alguém grita do lado de fora, fazendo com que nos afastássemos e saíssemos para o convés.

—Ela dormiu com um marujo antes do Capitão! – Um dos barbudos que limpa os canhões apontou para mim.

Vi Bae então numa roda de homens, possivelmente conversando disso, então percebo que ele contou para a tripulação inteira. Provavelmente eu estava vermelha de raiva e podia facilmente pular no pescoço dele, mas aí todos começaram a repetir sempre a mesma coisa enquanto apontavam para mim.

—Ela precisa ser punida!

—Por que eu e não ele?! – Aponto para Bae.

—Hey! – Gancho dá um grito que faz todos se calarem. – Alguém me explica o que está acontecendo?

—Capitão, a princesa atacou Bae na cama! Você conhece as regras, capitão. Ela precisa ser punida. – Schmitt responde com calma.

Gancho leva a mão à testa esfregando-a enquanto suspira forte. Eu sabia que piratas tinham regras de conduta entre o capitão e marujos um tanto quanto machistas, mas aquilo me deixou perplexa e claro, arrependida. Bae não parecia nada com o bom moço que se mostrou naquele dia.

—Se o capitão não quer fazer, nós assumimos! – Alguém diz.

Um dos barbudos me segura pelos braços para amarrá-los atrás das costas, empurrando-me para que eu caísse de joelhos no chão. Me debato algumas vezes e quando vejo um deles se aproximando com um chicote eu tento escapar, gritando.

—PAREM! – Gancho grita. Depois de alguns segundos pensando, continua – O que vocês estão achando? Querem passar por cima da minha autoridade?! Lembrem-se de quem sou eu que os mantenho vivos. Soltem-na!

Todos ficam perplexos e imediatamente soltam as minhas mãos e se oferecem para me ajudar a levantar, porém eu recuso e levanto-me sozinha. Eles se curvam diante de mim como piedade, desculpando-se do ocorrido.

—E ela continua sendo a princesa! Deveriam se envergonhar!

—Mas são as regras, Senhor. “Quem quebrar qualquer regra será banido” ... – Um deles diz.

—Querem tanto saber? Dormi com ela sim! – Gancho me olha rapidamente de canto de olho e continua – Satisfeitos?

—Nossa, acabei de virar a princesa prostituta. – murmuro enquanto passo ao lado de Gancho para ir para o meu quarto.

—Terra à vista! – Schmitt grita enquanto olha pela luneta.

—Schmitt, prepare as crianças. Certifique-se de que todas comeram e estão bem. – Gancho diz.

Eu permaneço sentada na proa do navio com a minha manta por cima da roupa e minha espada preparada. A ilha se aproximava cada vez mais e ao atracarmos, me posiciono na saída do navio. As crianças começam a descer pela rampa até a areia em fila, uma por uma, amarradas pelas mãos.

—Emma. – Gancho se coloca ao meu lado. – Eu não tive escolha por ter dito aquilo.

—Você preferiu manchar a minha reputação do que a sua, eu entendi.

—Não é bem assim.

—Só siga o plano. – Corto-o ao ver que as crianças já haviam descido quase todas – Lembre-se: Ele vai leva-las e você me entrega como refém. Eu encontro Henry e você aparece lá com a chave.

Começo a descer a rampa com o capuz cobrindo parte do rosto, e então Gancho para do meu lado. Percebo estarmos de frente para o Barba Negra ao ver em suas botas o símbolo de uma caveira de barba.

—Trouxe outra refém. Ela tentou furtar meu navio e achei que ela merecia virar uma de suas prisioneiras junto com as crianças, afinal ela pode ser mais útil e resistente.

—Deixa eu dar uma olhada nessa belezinha....

Barba Negra retira o meu capuz e o plano vai por água abaixo. Espremo meus olhos e engulo a seco, até criar coragem de abrir os olhos. Gancho mal respira ao meu lado, assim como eu.

—Ela me parece familiar.... – Ele me analisa. – Ah, claro! A Princesa Emma! Mas que honra! Guardas! Levem-na para mim! Que oferta de bom gosto, Capitão....

“Dane-se o plano” foi o que eu pensei antes de chutar Barba Negra no estômago na tentativa de escapar dos guardas.