Grant mal teve tempo para descansar completamente. As pernas latejavam numa dor desgraçada, que começou a trazê-lo de volta à consciência. Não estava nada bem. Aquele não parecia o “Estilo Asgard” de tratar um agente da S.H.I.E.L.D, mas... Bem, ele não era mais um agente. Nunca o fora de verdade, talvez. Seus olhos começavam a demonstrar sinais de vida e em alguns instantes ele conseguiu abri-los lentamente. Acordou e viu uma figura sentada à sua frente. Com um elmo dourado em mãos, a criatura assistia Ward gemer ao sentir toda a dor voltar como agulhas perfurando o tecido de suas pernas. Ele definitivamente precisava de cuidados médicos.

– Dia difícil? – a criatura perguntou.

– Sempre foram – ele rastejava como um verme pela cela diminuta – Será que eles não entendem que eu não serei útil nesse estado? – ele gritava de dor.

– Também acho.

O ser que estava envolto num manto esverdeado levantou-se e ergueu seu cetro para ele, passando-o por cima de seus ferimentos. Imediatamente, Ward sentiu uma pontada forte e o tecido começou a se regenerar, pondo fim àquela dor agonizante. Em questão de segundos, sua perna estava sã.

– Mas o que...

– Loki – a criatura se apresentou para ele – Ao vivo e em cores.

– Percebi, pelo elmo – Ward pôs-se de pé, esticando as pernas novamente – E pela... Bem, pela roupa toda.

– Vocês humanos – ele soltou uma risada debochada, falando sério logo em seguida. – Energúmenos que só sabem reconhecer algo sob uma única feição.

E em um estalar de dedos, uma fumaça o envolveu e ele assumiu outra forma. A dela.

– Grant? – O Trapaceiro falava com a voz de Skye – Senti tanto a sua falta! Por onde você esteve? Estava com saudades do meu O.S.

Ward apenas franziu a testa e deu dois passos para trás.

– Por que você está me evitando, Grant? – ele continuaria a provoca-lo, até a ferida arder em sua alma – Até onde eu sei, o único traidor aqui é você – disse, apontando o dedo em seu rosto. – Todos confiaram em você. E você e seu pequeno Hitler interior destruíram com tudo o que tinha. Inclusive a mim.

– Desgraçado – Ward disse, cerrando os dentes. – Não se passe por ela. Você é impuro demais para isso.

Loki deu uma gargalhada farta, voltando à sua forma original.

– Nossa, quanta bravura! – ele bateu palmas, irônico. – Poderia jurar que um minuto atrás você estava agonizando... Aliás... Isso me lembra de que eu merecia pelo menos um “obrigado” cheio de gratidão sincera. O que acha? Não custa nada tentar...

– Você nunca faz nada de graça. Qual o seu jogo?

– Eu não sou o Rumplestiltskin, meu caro. Desculpe-me decepcioná-lo.

– Rumple o quê? – Ward não entendeu a referência.

Loki arfou, entediado.

– Vocês me entediam. Todos vocês. Humanos tolos e ignorantes! Não conseguem fazer nada direito. Nenhuma ordem sequer conseguem executar sem que eu tenha de intervir! Viu o que aconteceu com o seu papai, Garrett? Virou fumaça! Tudo por que não soube ouvir a voz da verdadeira sabedoria – Ward ficava cada vez mais confuso – Eu a coloquei ao lado dele para que pudesse dar continuidade ao meu plano, mas não... Ele deixou-se encher de si mesmo... Energúmeno!

– Peraí, do que você tá falando? – Ward aproximou-se das grades de sua cela, colocando as mãos sobre o metal gélido. – Você conhecia o Garrett?

– Claro que conhecia, humano ignorante! – ele levantou-se da cadeira, aproximando-se de Ward. – Precisava de um pequeno exército de cabeças pensantes naquele lugar – ele estalava os dedos, procurando a palavra correta – Patético.

– Se nos odeia tanto, se odeia tanto a Terra, porque tem um pequeno exército lá? – Ward perguntou, começando a ficar cheio daquela conversa.

– Depois dos últimos acontecimentos com a Srtª Foster... Bem, digamos que eu compreendi que Midgard pode ser melhor explorada – ele voltou a sentar-se narrando a história enquanto gesticulava. – Vocês são arrogantes, egoístas, cheios de si... Cheios de desejo de dominação. Se acham muito espertos, e conseguem ser quando se organizam, construindo mutualmente. Apenas peguei tudo isso para usar a meu favor. Sabia que Thor colocaria Heimdall para me vigiar depois que eu destruí sua linda esposinha, então recrutei alguns evolucionistas na sua querida “Terra” – ele pronunciou com certo nojo. – E pronto! Eis a minha fórmula de sucesso.

– Então – Ward começou a juntar as peças – É por isso que estou sendo acusado! Eu não conspirei contra Asgard, nem contra os nove reinos. Era você o tempo todo! – ele gritou e começou a chutar as paredes da cela.

– Cuidado para não machucar as pernas de novo. Não estarei aqui pra consertá-las! Considere isso como um presente, pelo serviço que você prestou a mim sem ao menos saber. Você conseguiu ser útil apesar de tudo.

E ele desapareceu.

Ward estava enfurecido. Loki o havia enganado e não era o único. Essa conspiração não podia contar com uma única pessoa. Tirou sua caderneta do bolso e começou a rabiscar alguns nomes, relacionando cada um a sua função. A Hidra poderia muito bem ser sobre isso. Não, isso já faz muito tempo... Bem, nunca se sabe. Loki sempre teve tudo muito bem arquitetado, poderia estar realmente metido nisso.

– Garrett, Raina, Quinn – ele balbuciava os nomes, concentrando-se em descobrir onde isso dava. – Não, Quinn não parecia saber de muito... Mas ele tinha o Gravitonium – uma luz acendeu-se em sua cabeça. – O Gravitonium – ele repetiu. – O que mais no mundo – no meu mundo pelo menos – poderia alterar a lógica da ordem do universo?

(...)

– Hey, amiga – a garota aproximou-se de Jemma silenciosamente, parando ao seu lado enquanto ambas assistiam Fitz dentro daquele compartimento gelado. – Alguma novidade? Como ele está?

– Na mesma – o olhar entristecido de Jemma estava cercado por duas manchas negras ao redor dos olhos. – A única coisa que fiz foi calibrar a câmara.

– E você? – ela perguntou, apenas para ouvir a voz da amiga por mais alguns segundos.

– Na mesma.

Skye apenas colocou a mão no ombro da amiga e puxou-a contra si, encaixando a cabeça de Simmons no seu ombro. Não conseguia fazer nada que a deixasse melhor, mesmo após um café-da-manhã reforçado. Toda vez que Jemma lembrava-se de Fitz e daquele oceano sufocante, sua cabeça latejava e ela sentia um arrepio percorrer sua espinha. Aquilo não seria fácil de superar.

– Vou entrar na sala – ela soltou-se de Skye, enxugando uma lágrima calada com o dorso da mão. – Preciso trocar o soro dele.

– Tá – a voz da garota saiu fraca, sentindo o abismo que se formava entre as duas. – Qualquer coisa... Eu estarei por perto.

– Tá – Simmons tentou sorrir, sem sucesso. – Obrigada, Skye.

A bioquímica entrou na sala e antes que pudesse segurar o soro, desabou em pranto. Era por sua causa que ele estava ali. Preso a todos aqueles tubos, quase sem vida. Ela não sabia o que fazer, e ter que esperar sua melhora só fazia com que seu coração se apertasse mais a cada segundo. Não poderia imaginar continuar sem ele. Sem o seu melhor amigo a quem ela cuidou e protegeu todo esse tempo.

– Fitz – Ela segurava a mão dele, enquanto Skye assistia a cena, também chorando do lado de fora da salinha – Eu fiz panquecas hoje – a cientista soluçava e Skye não suportou ouvir aquilo. – Coulson fez chocolate quente – Jemma conseguiu sorrir em meio às lágrimas, imaginando como ele reagiria às palavras dela. – Você precisava ter visto a expressão da May...

Simmons relatava tudo o que acontecera naquela manhã, numa tentativa de esquecer o que realmente queria despejar. Seus olhos ardiam com as lágrimas salgadas e estavam vermelhos. Ela nunca havia se imaginado sem ele, estavam juntos há tanto tempo que ela nem mesmo conseguia se lembrar de quando não se conheciam. Ele havia se tornado seu braço direito, seu ombro amigo. Era simplesmente o cara que estava do seu lado durante todo o tempo. Não podia viver sem ele.

– Fitz – ela chamava mais alto como se tentasse acordá-lo de um sono profundo. – Você não pode me deixar... Leo! Por que você fez isso?

A bioquímica começava a alterar ainda mais o tom de voz. Skye já havia deixado a janela para chorar sozinha nos arredores do Bus. Assistir o sofrimento da amiga apenas adicionava mais tristeza ao seu próprio sofrimento.

– Leo! Leo! – ela chorava desesperada, segurando sua mão. – Leo, acorda, por favor! Eu não sei se consigo viver se você não estiver vivo! Fitz!!

Os gritos de Jemma chegaram até May que estava passando pelos corredores naquele momento. Imediatamente ela correu até Skye, que estava limpando as lágrimas, sentada sobre a rampa de carga do Bus e acenou para que ela viesse ajuda-la. Por mais que May entendesse a dor da cientista, Skye seria melhor em consolá-la. Ou não.

– Simmons – Skye aproximou-se da amiga, colocando a mão no seu ombro para tira-la do chão. – Vamos. Você precisa sair daqui.

– Me larga! – a bioquímica empurrou o braço da amiga violentamente, voltando a chorar desesperada. – Saia daqui! Vocês duas!

Skye olhou para May que devolveu um olhar espantado. “O que fizeram com a Jemma?” Ela estava fora de controle, e se continuasse daquela forma, a Cavalaria teria que intervir.

– Jemma, querida – May usou seu tom mais suave para dirigir-se à garota em prantos. – Ele não está morto. – Melinda aproximou sua mão do ombro dela, sabendo que ela não ousaria empurrá-la. – Faz apenas sete dias. Fitz é um garoto forte, corajoso. Ele vai sair dessa.

Jemma apenas pôs-se pé e encarou a asiática. Ela estava furiosa com as duas mulheres à sua frente, não sabia exatamente o porquê. Será que não poderia ter um minuto para explodir? Custava deixar ela sozinha, lamentando sua dor como se o tivesse perdido para sempre? A resposta estava expressa nos olhos de Skye. Ela não deixaria Simmons passar por isso sozinha e ela não era a única.

– Vamos, você precisa descansar – May continuava – Seus olhos entregam que você não dormiu nada hoje à noite.

– “Apenas sete dias”? – Simmons trouxe à tona as palavras da piloto. – Apenas sete dias?!

May e Skye se entreolharam lá atrás. Isso não seria bom.

– Você acha que foi fácil pra mim? Ouvir o Fitz dizendo que ia morrer pra me deixar viva? Você acha que ele me deu escolha? Como acha que eu estava me sentindo quando nadei por 90 metros até a superfície, imaginando que meu amigo já estava morto nos meus braços, como você acha que...

– Eu perdi minha filha de nove anos, Jemma.

Nesse momento, o espanto veio das duas garotas mais novas que estavam na sala.

– Eu sei como é se sentir impotente e culpada. Eu queria ter impedido, queria ter ido junto com ela. Mas não deu. – May fraquejou na última palavra.

Simmons levantou-se do chão e ficou estática na frente das duas. A ficha havia caído. Leo não estava morto. Por que então ela estava surtando e machucando as pessoas que amava?

– May, eu... Sinto muito – a cientista limpava as lágrimas, sentindo-se mal por ter feito a piloto se expor daquela maneira. – Eu não quis...

– Jemma, vamos... Está tudo bem.

Skye pronunciou-se, sabendo que May já havia falado mais do que devia.

– O soro – a cientista lembrou-se e voltou atrás, trocando rapidamente a bolsa de soro que estava presa ao braço do rapaz. – Vamos.

As três seguiram pelo corredor em direção à sala de reuniões. Coulson precisava checar os relatórios da ultima missão e Skye precisava atualizar o banco de dados. Alguns novos agentes estavam dando entrada na nova lista. May caminhava de cabeça baixa e em silêncio. Aliás, ela e Simmons estavam assim. Skye estava entre as duas e quase podia tocar o sofrimento que emanava da alma de cada uma. Ela apenas caminhava, tentando conter sua angústia por vê-las dessa forma. Estava entre dois corações quebrados.