Olhava para a carta como se fosse um inseto esquisito e nojento.

- O quê? - foi tudo o que consegui dizer durante meia hora. Como sabiam que havia um velhinho ao meu lado? Será que tinham conhecimento de que esse era meu avô? E, por que meu avô saberia responder minhas dúvidas? Ele, como a própria carta diz, é só um velhinho, com muitas lições de vida mas, com certeza, sem idéias tão delirantes quanto as que continham naquela carta. Quem eram eles? Como sabiam meu nome? Quem me jogara aquela carta? Porque ela não poderia ter vindo voando do além.

Vovô se levantou, avisou que iria preparar o almoço e foi, sem esboçar nenhuma surpresa. Como uma pessoa educada faria, ele não leu a carta, então não tinha motivos para tanta confusão como eu. Mas ele viu uma carta caindo no meu colo sem remetente e muitas palavras, viu minha expressão e ouviu a única frase que consegui pronunciar, ficou ao meu lado por minutos e simplesmente se levantou e foi fazer o almoço. Ou ele realmente está velho ou tem alguma coisa estranha acontecendo. Prefiro confiar na velhice, pois ela é mais real que o "mundo dos contos". Por favor, quem acha que vai enganar alguém com isso?

- Vovô o senhor precisa de ajuda aqui na cozinha?

- Não querida, obrigado.

Olhei para duas panelas grandes cheias de água, uma caixa não muito pequena de morangos, e vários legumes ainda com casca em cima da mesa.

- Tem certeza? - perguntei, já pegando uma faca para descascar as batatas.

- Tenho sim, vá fazer alguma coisa que te interesse.

- Vô, eu te ajudei a pegar milhares de uvas lá fora e acha que descascar alguns legumes vai me dar mais trabalho?

- Se começar não vai poder parar e eu não quero te prender - ele não parava de arrumar desculpas para me deixar fora da cozinha, mas mesmo assim com um leve sorriso educado.

- Você ficou esquisito do nada ou é impressão minha? - falei rindo, mas ele não viu.

- Esquisito? não, não estou não. Você que esta imaginando coisas? - ele mexia, rapidamente, com uma colher de pau uma panela enorme com um molho de cheiro estonteante.

- Então posso ficar e ajudar?

- Pode - ele falou na defensiva, sem entender muito bem o que fiz. Coitadinho, enrolar a cabeça de um velhinho não é coisa que se faça. Mas o que iria fazer, deixa-lo trabalhar sozinho no almoço? Além de que precisava entender um pouco do que acontecera com a carta e seu comportamento.

tentei puxar assunto, uma, duas, três vezes, mas ele parecia sempre ter algo mais importante para resolver. Como a super salada que precisava de atenção redobrada para ser montada, ou o arroz que devia estar devidamente temperado. Ate que o tempo foi passando, fomos entrando em assuntos supérfluos e acabei esquecendo de falar sobre isso.

O papo na mesa do almoço estava bom, falávamos de futuro e arrependimentos, brincávamos com os outros, e tentar entrar no assunto da carta era logicamente impossível.

- Vovô, hoje te ajudo a tirar a mesa, mas aproveita que a preguiça só me abandonou nesse momento, duvido outros dias me aperceber de novo. - disse Crinta.

- Que bom que você se ofereceu Crinta, até que enfim teve força de vontade para ser educada - Crinta olhou-a feio, contudo sabia que erra brincadeira - mas também vou ajudar. Assim, o nosso querido avô não precisa fazer mais esforço, já fez muito por hoje - disse Lourey.

- Vocês podem ajudar meninas,mas também vou tirar.

- Não, não vai. Hoje nós limpamos.

Não precisei dizer nada, iria tirar a mesa de qualquer jeito. Soou meu mal educado ficar calada e não me oferecer, mas tratei logo de ajudar. Vovô me olhou esquisito, parecia querer que eu não fizesse isso, porém virou a cabeça e foi para a sala, minhas irmãs nunca deixariam o velhinho trabalhar mais.

Este é o último capítulo disponível... por enquanto! A história ainda não acabou.