A Mensageira

Capítulo 9 - Nova vida


Eu fiz o mesmo, e, ao chegar a meu espelho, não me reconheci. Meus cabelos ruivos e cacheados estavam totalmente desarrumados; meus olhos grandes e azuis estavam brilhantes; minha bochecha estava vermelha; meus lábios, inchados e minhas roupas, amarrotadas.

Tomei um banho rapidamente e escolhi uma roupa confortável: short jeans, camisa estilo nadador vermelha, uma rasteira e, para finalizar, brincos pequenos. No meu cabelo, fiz uma trança embutida. Saí rapidamente e vi que Thiago estava encostado na parede, me esperando.

-Vinte e três minutos. Você está atrasada. –Ele disse, e segurou minha cintura. Senti o cheiro de seu perfume invadir meu cérebro, e segurei nos ombros dele, amassando um pouco sua camisa pólo com listras azuis e brancas.

-Como eu posso me redimir? –Perguntei.

-Eu posso pensar em algumas coisas... –Quando ele ia me beijar, eu desviei meus lábios.

-Eu quero estudar hoje. Pare de me levar pelo mau caminho. –Afastei-me dele. Thiago puxou minhas mãos para seu peito, acima de seu coração.

-Sente isso? –O coração dele batia mais rápido, bem mais rápido. –Ele nunca esteve assim. A culpa é sua. E agora você me nega um simples beijo? Depois de fazer isso comigo? Você é muito cruel.

Beijei minha mão e assoprei um selinho para ele. Ele fingiu pegar no ar e guardou no bolso.

-É melhor do que nada. Vamos? –Ele puxou minha mão.

Chegamos a uma biblioteca no último andar, que parecia mais reservada que a do piso inferior. Era bem iluminada e com estantes lotadas de livros, que iam até o teto.

-Essa é uma biblioteca reservada para os Poderosos, o Diretor e os Quatro Grandes. A biblioteca de baixo atende ás curiosidades e necessidades dos Caçadores Noturnos, dos Caçadores Diurnos e dos alunos em treinamento.

Sentamos-nos em uma mesa mais reservada.

-O que são os Poderosos? –Pergunto, enquanto Thiago procura livros.

-É melhor te explicar cada um separadamente, assim evito mais perguntas. –Thiago se sentou ao meu lado, com uns livros. –Os Poderosos são formandos que desenvolveram de forma mais... Avançada seus poderes. Eles são chamados de Poderosos porque fazem parte do Conselho, e é o Conselho que toma as grandes decisões: leis, punições... Esse tipo de coisa. Já o Diretor, no nosso caso o Joe, é sempre um dos Quatro Grandes da geração passada, a dos meus pais. Ele coordena uma escola dentro do seu perímetro de proteção, que é a área que os Grandes devem protegem de criaturas do mal.

-Que tipo de criaturas? –Pergunto.

-Fantasmas, vampiros, lobos, duendes, sereias, anjos caídos, transformos, feiticeiros, bruxos, guerreiros milenares, piratas do submundo, demônios, espíritos possuídos, gênios, titãs, duendes, semideuses... Claro, nem todos são seres do mal, mas quem causa confusão é detido por nós. É aí que entram os Caçadores Noturnos e Diurnos, se há uma emergência durante a noite, os Caçadores Noturnos agem. Durante o dia, os Diurnos. Determinamos se é um Caçador pelo desempenho. Observamos os alunos durante seu período letivo e vemos quando eles se saem melhor, aí designamos para um grupo. Isso é feito na formatura deles.

-E a gente?

-O que tem, Ellie? –Thiago segurou minha mão e dificultou meu raciocínio.

-O que é um Grande?

-Já te introduzimos esse assunto. É sempre um filho da geração anterior de Grandes, são pessoas que podem controlar os Quatro Elementos. Cada região tem Quatro. Em casos de excesso, um dos Grandes é mandado a outro lugar, como o Will. E ainda há sempre um dos Grandes que entra em contato com o outro mundo, o mundo dos mortos. Esse Grande é descoberto e determinado na formatura. Achamos que é você. Há ainda a possibilidade de algum Grande desenvolver poderes adicionais, mas é extremamente raro, como você e seu dom de controlar pessoas. É quase como se você fosse a...

-A Mensageira. Quem foi ela? –Pergunto.

-É mais uma lenda do que qualquer coisa. Dizem que ela nasceu na época de Roma, e garantia que os romanos dominassem o território que dominaram. Mas então um Imperador ficou com medo dos poderes dela e mandou prendê-la e matá-la. Depois disso o Império começou sua decadência. Até seu fim. Dizem que, ao decorrer dos séculos, o espírito da Mensageira ainda pode estar presente em certas almas de algum Grande. E esse grande se torna quase um Deus. Ele pode fazer qualquer coisa que imagine. É um dom arriscado e muito poderoso, e a maioria de seus portadores não consegue administrá-lo. Olhe Napoleão e Hitler, por exemplo.

-E por que esse nome?

-“Mensageira” porque ela estabelece uma conexão com o mundo dos espíritos e o nosso. Ela se utilizava da força dos mortos para vencer suas lutas, além de estabelecer uma conexão entre os dois lados. Os mortos ESCOLHIAM dá-la forças. Os dois mundos se uniam em uma única pessoa.

-Quantos mundos existem?

-O submundo, o nosso mundo, o mundo dos mortos, o mundo das águas, o mundo dos céus... Acho que são cinco, não? Isso te lembra alguma coisa? –Thiago forçou meu raciocínio.

-A estrela de Cinco Pontas. –Falei automaticamente, não sei como. –O fogo do submundo, a terra do nosso mundo, a água do mundo as águas e o ar do mundo dos céus. Além do mundo dos espíritos. Acertei?

-Isso mesmo. Agora vem. Está na hora de almoçar. –Thiago se levantou e me puxou consigo. Nem percebi que passamos horas ali.

-Depois voltamos? –Pergunto, inspirando seu perfume.

-Claro, é só a hora do almoço, Ellie. –Ele me puxou mais para si.

-A “hora” do almoço? Quer dizer que TODOS almoçam agora? –Minha voz deve ter saído angustiada, especialmente porque eu estava angustiada. Toda a escola me veria com Thiago.

-Claro. Não se preocupe Ellie. Todos vão ver minha... Garota comigo. –Thiago hesitou um pouco antes de falar “garota”. E eu também esperava que eu pudesse chegar a ser algo mais, como “namorada”.

Na hora senti os lábios macios e doces de Thiago em minha boca. Correspondi, mas, quando ele queria um beijo de língua, parei.

-É melhor irmos, ou não vamos almoçar. –Digo e dou mais um selinho nele.

Fomos andando rumo à cantina, e senti as mãos de Thiago em minha cintura. Ele estava andando atrás de mim, me envolvendo. Vimos Will e Lizzie na entrada da cantina.

-Onde vocês estavam? Tivemos aulas sozinhos e o Joe quase matou a gente! –Reclamou Lizzie. –Poxa! Vocês fazem falta! –Will abraçou-a e sussurrou algo em seu ouvido. –Ei! Por que o meu irmão está te abraçando por trás? –Ela gritou. –Não acredito! Viu Will? Eu disse que os dois tinham alguma coisa a mais.

-A culpa não é minha se o T. não me conta mais as coisas. –Will fingiu desapontamento. –Achava que fôssemos melhores amigos...

-Acho que agora terá que dividir sua atenção com Ellie. –Lizzie disse. Até agora, Thiago e eu só rimos. –E Ellie, não me exclua! Você não sabe o quanto é horrível ter que aturar esses dois por anos a fio! –Ela me bateu de leve.

-Ai! –Fingi dor. –Não faz isso, Lizzie. E, para acabar com seus pensamentos maliciosos, eu e o Thiago não... Não somos namorados.

-É Lizzie. Eu e Ellie só estamos juntos. Nada demais. –Me desanimei um pouco depois desse “nada demais”. Mas não deixei Thiago perceber.

-Vamos almoçar? –Sugeri.

Todos nós entramos na cantina e percebo as pessoas nos encarando. Thiago ainda está atrás de mim, e seus braços me envolvem. Viro-me um pouco para sua camisa e a agarro, procurando conforto. Ele prontamente acaricia minha cintura.

-Calma linda. –Paralisei ao ouvir isso. Era a primeira vez que Thiago me chamava por alguma coisa tão íntima. –Não há nada de errado conosco. –Ele depositou um beijo em meu pescoço e eu me arrepiei. Ele me fez esquecer todos os meus receios com relação aos alunos nos encararem. Servimos nossa comida e almoçamos sem grandes problemas ou constrangimentos.

Ao terminar nosso almoço, Thiago me leva de volta à biblioteca.

-Mais algum assunto no qual você queira se aprofundar? –Ele pega muitos outros livros e senta-se à mesa redonda que utilizávamos antes.

-Na verdade, eu queria aprender mais sobre o cotidiano da escola. Eu ainda ame perco nos corredores, não sei nada sobre a história desse povo e fico muito perdida na maioria dos assuntos sobre Caçadores. –Thiago vai a uma estante e me traz um livro fino.

-Aqui tem algumas coisas. Eu te aconselharia ler esse livro. Mas pode me perguntar agora.

Pensei um pouco. Eu tinha muitas perguntas, mas era melhor começar pelo mais simples.

-Existe algum mapa da escola?

Thiago me mostrou toda a construção. As áreas comuns, os andares, os salões... Tudo.

-E... Como surgiu essa ordem toda?

-Foi pouco depois da Mensageira. É mais ou menos como a história de Jesus. Ele morre e alguns dos seus seguidores espalham sua lenda e montam sua igreja. Com a Mensageira foi parecido. Ela tinha alguns amigos e eles aprenderam uma ou duas coisas com ela e desenvolveram as teorias. Todo o processo foi lento, mas chegaram ao ponto de controlar os elementos ao seu redor. Na época, havia um sacerdote que controlava o mundo espiritual e usava-o para os mais diversos motivos: ver o futuro, pedir aconselhamento astral... Tudo. Mas as pessoas perceberam que não era uma boa idéia deixar um homem com tanto poder e decidiram que o melhor seria que ele ensinasse mais pessoas. E assim foi, e cada aprendiz criou um círculo de quatro amigos para praticar magia. Esses amigos se desenvolveram mais e formaram os Grandes, cada um controlando um elemento. Nós temos que descobrir com qual elemento cada um se identifica no nosso grupo. Os que não formaram círculos foram os chamados Independentes, que, com o tempo, se tornaram os Caçadores. Esses Caçadores eram contratados para algumas missões, mas os Grandes decidiram “adotá-los”. Eles se especializavam em um elemento e dominavam-no por completo. E, quanto ao Conselho, era preciso saber muito dos elementos e desenvolver alguma coisa, quase como no Mestrado hoje em dia, era preciso acrescentar algum conhecimento à sua dominação. Já para se tornar diretor, era preciso ter sido um Grande e ter se aposentado, o que acontece quando a geração seguinte se forma na escola. Houve um distúrbio na geração anterior e...

-Era a geração dos meus pais, não era?

-Sim. Seus pais e a mulher do tio Joe morreram. Ele não fala disso, mas conta conosco para cuidar da Oceania no futuro. O continente que tem mais Grandes é a Europa, que chega à ter um em cada país. –Thiago olha no relógio. –É melhor irmos agora.

Ele nos levou ao meu quarto e entrou comigo. Deu-me um beijo de leve.

-Hum, hoje eu tenho jogo com o Will e uns caçadores, quer vir?

-Jogo de...?

-Futebol. Quer? –Ele me abraça, mas abre um espaço para eu pensar.

-Claro.

-Claro que não! –Lizzie entra. Como ela sabe de tudo o que eu faço? Primeiro o filme, agora isso. –Ela é minha hoje! Compras meu bem. Você nem venha me dizer que não tem dinheiro, eu sei da sua fortuna e da mesada, e, se você não tivesse, eu pagava tudo! Eu só quero companhia!

-Lizzie, deixa ela... –Will entrou.

-Privacidade existe, sabiam? –Thiago disse, me abraçando.

Eu pensei. Era melhor sair com a Lizzie, para conversar. Sem contar que comprar me parecia mais legal do que ver caras correndo atrás de uma bola.

-Eu vou com você, Lizzie. Só me dá um tempo para eu me arrumar. –Eu me desfiz dos braços de Thiago. Fui ao banheiro e deixei-os lá conversando.

Quando saí, eles ainda estavam lá. Eu fui ao closet e coloquei uma saia branca de algodão leve, uma sapatilha vermelha e uma blusa mais coladinha vermelha. Fiz uma trança e peguei minha bolsa azul.

-Onde você pensa que vai com essa blusa? –Thiago em disse.

-Ao shopping. Vamos comprar lá, não é Lizzie?

-Com essa blusa e essa saia não.

-Por quê? –Olhei para baixo. A saia era larga e rodada, e a blusa era cavadinha e com alcinhas, mas não indecente. –O que há de errado com minhas roupas?

-São chamativas. Não vou me sentir bem com você sozinha por aí com essas roupas. Você e Lizzie ainda são meninas! Sair sozinhas com essas roupas! Não vou ficar tranqüilo.

-Bom, pois eu não vou mudar minhas roupas.

-Então você não me deixa escolha. –Ele inspirou fundo antes de prosseguir. –Will, não vamos ao jogo. Iremos ás compras.

-O quê? –Dissemos Will, Lizzie e eu.

-T., não vamos fazer isso! Essa pelada ta marcada há semanas! –Disse Will, exasperado.

-Maninho... Essa é uma tarde feminina! –Apoiou Lizzie.

-Thiago, vai jogar com o Will e seus amigos. Eu tenho dinheiro e quero comprar mais roupas para mim, nós nos vemos aqui à noite e saímos. Vai ficar tudo bem. –Juntei-me ao grupo.

-Ellie, você não vai sair assim, é uma roupa muito curta, e duas garotas sozinhas não é boa coisa. Por acaso foi chato no filme ontem, Lizzie?

-Tudo bem, não foi, mas... –Ela foi cortada.

-Sem “mas”. Se Ellie não quer mudar de roupa eu não mudo meus planos.

-Ellie, põe um macacão... –Brincou Will.

-Não. Agora eu quero ir ás compras. –Disse Thiago.

Fomos todos no C5 Airscape de Lizzie, Com Thiago dirigindo e Will e Lizzie aos beijos no banco de trás. Chegamos ao Shopping em pouco tempo.

-Ellie, vem. –Thiago me puxou e passou os braços ao meu redor, parecia tentar evitar que os meninos me olhassem.

-Eu quero começar por uns jeans. Vamos à loja no segundo piso? Jeans & More? –Disse Lizzie, puxando Will. No caminho pude perceber Thiago mais atento do que o comum, ele olhava para todos os meninos no Shopping.

-Thiago, alguma coisa errada? –Sussurro para ele. Thiago estava realmente com inveja dos garotos que olhavam para mim? Isso era no mínimo encorajador. Chegamos à loja que Lizzie queria, evitando que ele respondesse à minha pergunta.

Um atendente bem humorado vem em nossa direção.

-Em que posso ajudá-los? –Ele diz, olhando para mim e Lizzie, ignorando os garotos. Will apenas aperta Lizzie mais contra si, enquanto Thiago me encosta totalmente contra ele.

-Quero todos os tipos de jeans: boyfriend, skinny, corte reto, flare... –Lizzie tomou as rédeas.

-Claro. Eu sou Lucas, sigam-me por favor. –Ele nos levou a uma seção de jeans femininos. –Que número?

-Eu sou 38. E você Ellie? –Lizzie perguntou.

-38 também. –Digo, olhando uma calça capri.

-Jura? Que dez! A gente pode trocar roupa!

Lucas nos traz os mais variados tipos de calças, e nós vamos aos provadores. Nunca vi um provador tão grande assim. Eu e Lizzie dividimos um e os garotos ficaram lá fora.

-Acabaram? Queremos ver como ficaram. –Diz Lucas. Como será que Thiago estava reagindo com essa frase? “Para de besteira, Ellie. Nem namorados vocês são”.

Saímos e fazemos um pequeno desfile. Até as mulheres da loja vieram opinar coisas como: “Esse está largo”, “Esse valoriza os quadris”, “Muito apertado”...

No fim decidi levar quatro calças e Lizzie optou por sete jeans que ficaram perfeitos nela. Lucas tentou nos dar seu telefone, mas os garotos o impediram, por sorte nossa.

-Agora eu quero ver sapatos! De salto, rasteiras, sapatilhas... Tudo! –Disse Lizzie. Os meninos estavam carregando nossas sacolas, poupando-nos do esforço.

Entramos em uma loja famosa e com preços razoáveis.

-Quanto você calça Ellie? –Perguntou Lizzie, olhando o salto gigantesco de um sapato preto.

-37, e você? –Pergunto olhando uma sapatilha vermelha com detalhes delicados.

-37! Que sorte! Mais uma coisa para dividirmos!

Dessa vez, pela loja só ter atendentes mulheres, os meninos opinam em mais coisas, e Thiago insiste em me dar três sapatos que eu gosto e três bolsas. Ainda assim, eu pago por mais dois sapatos e quatro cintos. Lizzie leva oito sapatos, dois cintos e cinco bolsas, Will paga por tudo.

A rotina se segue em mais duas lojas, uma de vestidos de festa e outra de blusas variadas.

-Ai, estou com fome! Agora só faltam as lojas de saias, shorts, pijamas, maquiagem, perfume, acessórios, biquínis e lingerie! Vamos comer sanduíches mega-calóricos! Temos que aproveitar porque semana que vem começam os Jogos! –Disse Lizzie.

-Que Jogos? –Pergunto.

-A escola chama o Conselho para avaliar nosso desempenho. A melhor forma de fazer isso é os Jogos. Cada uma das casas dos quatro elementos joga contra as outras, e o vencedor joga contra nós. Nós nunca perdemos, mesmo sem você. A casa do Ar tem 34 vitórias, a da Água, 45, a da Terra, 67 e a do fogo, 78. Nós não contamos a luta contra nós. –Disse Will em tom instrutivo.

-E de quanto em quanto tempo ocorrem os Jogos? –Pergunto.

-Depende. Os Conselheiros podem ordenar quantos Jogos quiserem por ano. Normalmente varia entre cinco e sete. Esse será o primeiro desse ano, além de ser o primeiro com a equipe dos Grandes completa. –Prosseguiu Will.

Comemos e vamos ás lojas de saias, shorts, maquiagem, perfumes e acessórios. Em um determinado momento eu e Lizzie precisamos ajudar os meninos a carregarem todas aquelas sacolas.

-É essa a loja! –Lizzie me puxa para dentro de uma loja de pijamas. Parecia o mundo da seda e do cetim.

-Acho que nessa loja eu e o T. vamos nos divertir, não é amigo? –Disse Will.

-Muito Will. Deixa que agente escolha as roupas e vocês provem. –Thiago deixou minhas sacolas ao meu lado e voltou uns dez minutos depois com algumas roupas para os mais variados gostos. –Ellie, me espera uns minutos antes de decidir o que vai levar?

-Claro. Aonde você vai? –Pego as roupas das mãos dele.

-Ao banheiro.

Ele sai e volta depois de uns quinze minutos. Escolhemos uns conjuntos juntos. Lizzie e Will opinam também. Não podemos provar as roupas nessa loja. Will e Thiago começam a discutir a possibilidade de outra festa do pijama, para que possamos estrear as camisolas. É estranho reparar isso, mas noto que Thiago age como se fosse mais que meu amigo, quase como se fôssemos... Namorado e namorada. “Para de besteira, Ellie! Vocês se conhecem há menos de uma semana!”.

-Agora os biquínis. –Lizzie nos leva á uma loja de marca brasileira; e eu escolho uns e levo outros escolhidos por Lizzie e Thiago. Há algumas saídas e uns sete biquínis.

-E, por último, lingerie. –Diz Will, antecedendo a Lizzie.

Entramos em uma loja com peças para todos os gostos. Thiago opina muito mais nessa loja do que em qualquer outra.

-Nós deveríamos ir à praia também, não é T.? Os biquínis que as garotas levaram não devem ficar guardados. –Will fala, agarrando uns dez conjuntos para Lizzie. Thiago não escolhe nenhum, mas opina em todos os que eu pego.

Compro mais uns dez conjuntos e Lizzie decide encerrar o dia de compras, alegando estar satisfeita. Era evidente que ela estava mais cansada do que qualquer outra coisa, tendo em mente que ela caminhou com saltos a tarde inteira. Até os meninos compraram umas camisas, calças, tênis e até óculos de sol.

Dirigimos para a CCCM e cada um vai ao seu quarto para guardar as compras. Olho no relógio e constato que ficamos comprando mais de sete horas seguidas. Desde o fim do almoço até o Shopping estar quase fechando. Tomo um banho e ponho uma camisola nova, de algodão branco. Thiago bate à porta (da varanda, diga-se de passagem).

-A camisola ficou boa em você. –Ele entra, vestindo apenas uma calça de moletom.

-Obrigada. –Fico meio tímida, sem saber bem o que fazer. Thiago foi ciumento, divertido, prestativo, amigo e... Agiu mesmo como se fosse meu namorado hoje. Eu queria que ele de fato fosse, mas considerei que minha mente poderia estar me pregando peças.

-Ah, amanhã eu vou ver o Jake, logo depois do enterro. Quer vir? –Ele tenta puxar assunto.

-Claro, claro que quero. Está tudo bem com você Thiago? Quer dizer, eu sei que ele era seu amigo e “bem” é a última definição que eu deveria te dar, mas...

-Eu estou agüentando. –Ele olha ao redor. –Quer ver TV? Tem um filme bom passando hoje...

TOC TOC.

-Gente! Parece que o professor Max foi ferido, venham logo! –Gritou Will. Belo momento esse para o tal de Max se ferir! Não dava para esperar mais um minutinho? Eu quase teria uma noite ótima vendo filmes com Thiago definida! Thiago me puxa pela mão, correndo mais do que qualquer outro aluno.

Fomos do corredor até o hall de entrada, onde um homem musculoso e bronzeado estava no chão gemendo como um bebê.

-Afastem-se! –Gritou Joe, passando com os outros professores e as enfermeiras. Abrimos caminha na multidão e vimos que o Max tinha um corte que ia de seu pescoço à sua perna esquerda. Um corte que deixava seus órgãos à vista. As meninas da frente se contorciam de nojo, e algumas professoras também. Lizzie abraçava Will.

-Não há chance, Joe. É um corte além de minhas habilidades de cura de água. As outras enfermeiras só piorariam o corte com seus elementos. Tudo o que ele pode fazer é esperar a morte.

Algumas pessoas se desesperaram, e Max estava inconsciente. De repente eu senti minha cabeça doer. Lá vinham os pensamentos, justo agora! A doente não devo ser eu, e sim o tal de Max! Então sinto falta da explosão comum quando eu escuto a mente dos outros. Não, isso é outra coisa.

-Saiam! –Antes que eu perceba o que eu estou fazendo, eu me vejo abrindo espaço entre os demais. Afasto a enfermeira e Joe, e me ajoelho acima da cabeça de Max.

-O que você está fazendo? Vai matá-lo! –Disse a enfermeira.

-Não. Não vai. –Disse Joe. Ele confiava em mim, e eu não iria desapontá-lo. Minha mente entrou em uma espécie de transe, como se eu visse tudo sem controlar meu corpo. Num segundo eu soube o que fazer.

Peguei a cabeça de Max entra minhas mãos e depositei-a em meu colo. Primeiro ar. Utilizei o ar para colocá-lo reto no chão e abrir as feridas o máximo possível. Ele gemeu e os alunos todos se calaram, esperando para ver o que eu faria. Água. Tirei toda uma essência do corpo dele, o veneno de alguma criatura. Terra. Misturei água e terra para purificá-lo com ervas e encantos que eu nunca pensei que sairiam de minha boca. Fogo. Fechei o corte com uma rajada de fogo que fez Max urrar. Por fim, o mundo espiritual.

-Max, me ajude... –Peguei a cabeça dele entre as mãos. Perdi a noção de tempo e espaço. –Max, volte... Volte...

Um berro me trouxe de volta. Max abrira os olhos e me encarava.

-Como...? –Disse ele. Os olhares ao meu redor estavam ainda mais espantados. –Eu ouvi uma voz me chamar... Trazer-me para cá, era você?

-Sim. –Quem mais poderia ser? Uma gota de suor descia pelo meu rosto.

-Ela falou outra língua. Uma que eu não ouvia há um bom tempo. –Disse Joe, aproximando-se. –Ela é a aluna da qual eu te falei.

-Mesmo sem me conhecer, você em ajudou.

-Não foi nada... –Começo.

-Vem, Ellie. –Thiago chegou e em levou ao meu quarto. Bem na hora, eu já estava tonta por usar tanto dos meus poderes e ainda por cima precisava responder ás frases de Max...

Thiago me levou ao meu quarto. Ele fechou a porta.

-Tudo bem? Quer algum remédio?

-Não. Estou bem.

Thiago não disse mais nada. Ele me assentou no chão e ficou ao meu lado. Ligou a TV e vimos um filme realmente assustador, sobre exorcismos e coisas assim.

Prestei pouca atenção no filme, Thiago estava passando as mãos em meu cabelo e me fez dormir antes do fim.