Raymond Steele esperava ansiosamente a saída de suas filhas da escola. Afinal, ele tinha sua própria rotina. Todos os dias fazia questão de buscá-las para almoçarem juntos. Desde a morte de sua esposa vinha tentando se manter presente na vida delas e desde que chegaram à adolescência ele tem redobrado os seus cuidados.

Buscá-las se tornou uma boa desculpa também para garantir que elas não se desviassem do caminho com a desculpa de um trabalho de grupo surgido sem aviso prévio ou que tinham ido “tomar sorvete com uma amiga” quando na verdade estavam caindo na conversa de algum tarado disfarçado de estudante da high school.

Ele poderia parecer um pai exagerado, mas, seus quase vinte anos como ginecologista e obstetra, além de os incontáveis casos de adolescentes grávidas e abandonadas pelos pais de seus filhos, que aparecem frequentemente em seu consultório lhes dava a segurança de que estava fazendo o melhor para elas.

Pelo menos o jeito fechado e mal humorado de Ana o favorecia. Quando ela entrou na puberdade viveu a fase de ir a festas e sair com a galera e isso o fez arrancar muito de seus cabelos, mas assim como a versão “garota popular” apareceu, para seu total alívio, desapareceu e os vestidos e roupas justas foram substituídas por calças jeans e blusas de malha.

Seus cabelos agora estão sempre presos e a simples menção de um namorado a transforma em sua pior versão. Algo de grave tinha acontecido. Sua menina provavelmente teve seu coração quebrado, mas ela nunca quis falar sobre isso e ele nunca insistiu. Algumas coisas um pai não deveria saber.

O único problema com Anastásia é sua insistência em fazer faculdade longe de casa, o que implicaria no fato de ela ter que morar longe dos seus olhos e de sua proteção. Seu sonho é estudar literatura. Ana tinha herdado da mãe o amor pela leitura e ele não é o tipo de pai que pretendia frustrar os sonhos da filha, apenas gostaria que ela se mantivesse debaixo de suas asas.

Com Katherine, sua caçula, ele já sabia que perderia o restante dos cabelos que tinha sobrado. Se dependesse só dela, provavelmente já teria um moleque qualquer o chamando de sogrão.

Sua querida Kate é uma menina linda, não que Anastásia não fosse, mas a sua pequena puxou a doçura da mãe e o dom de cativar todos a sua volta e com certeza, não faltam pretendentes a ela.

Sua sorte foi ter tido a brilhante idéia de impor a regra de que Kate só começaria a namorar depois de Ana, exatamente por saber que era mais fácil o inferno congelar antes de sua filha mais velha se envolver com alguém. Ele achou mesmo que isso resolveria seus problemas, mas só criou mais confusão em sua casa e a guerra se armou entre elas.

Kate acha que a irmã é egoísta por não pensar nos desejos dela. Anastásia a manda se preocupar com outras coisas que não sejam rapazes e essa é a briga constante entre elas, principalmente porque Kate adotou para si o papel de “mãe” da irmã, mesmo sendo um pouco mais de um ano mais velha. Até dele ela toma conta para que se alimente adequadamente e se exercite.

Definitivamente entre os três Ana é a que possui o melhor coração, mesmo que seja difícil alguém chegar tão perto dela para perceber isso. Quando o sinal tocou, não demorou muito e elas apareceram. Kate visivelmente mal humorada vinha em sua direção pisando duro e com Anastásia revirando os olhos para ela logo atrás. E então ele já se preparou sabendo que seria um longo almoço.

Katherine se aproximou do carro e entrou se sentando no banco do carona, ao lado dele, lugar o qual, seguindo a hierarquia, era de Ana, por ser a irmã mais velha. Ela nada disse, só cruzou os braços bufando. O pai não teve tempo de perguntar o que estava acontecendo, antes que a filha mais velha se aproximasse e se debruçasse na janela onde a caçula estava.

— Eu acho que você está no meu lugar, irmãzinha. – Anastásia disse com ironia. Para ela pouco fazia onde se sentaria, pois o mais importante era se ver bem longe daquele lugar, mas a criancice de Kate e sua dificuldade em entender que ela só queria o seu bem estava começando a tirá-la do sério.

— Pai, você quer falar para essa bruta que eu não estou falando com ela e não pretendo voltar a falar depois da vergonha que ela me fez passar diante de meus amigos? – Bianca pediu sem olhar para a irmã.

— Amigos? Você chama aquele monte de hormônios e testosteronas ambulantes prontos para a cópula de amigos? – Ana perguntou enquanto perdia o restante de sua paciência.

— Só porque você é uma mal amada e que ninguém te quer por perto você quer me transformar em uma ogra como você. – Kate respondeu voltando sua atenção e raiva para a irmã.

— Katherine e Anastásia Steele! Eu realmente não sei se quero saber o que está acontecendo, mas de qualquer forma vamos terminar essa conversa em casa e principalmente a parte sobre cópula. – Ray gritou com as duas.

— Ana, por favor, entre nesse carro e vamos embora porque vocês já deram só no primeiro dia assunto para seus colegas falarem a semana toda. – ele concluiu voltando ao seu tom natural. A filha mais velha olhou a seu redor e viu seus colegas olhando a cena com atenção, principalmente José Rodrigues que a encarava com um sorriso debochado no rosto.

Ela devolveu o mesmo sorriso, enquanto apontava o dedo no meio para ele e entrava no banco detrás do carro, batendo a porta propositalmente. Ana já poderia ver o pai hiperventilando, mas naquele momento não estava nem aí.

Seu primeiro dia do último ano já tinha começado da pior forma possível e não estava em um bom momento para se preocupar com mais ninguém, além de seus medos e péssimas recordações.

Assim que entraram em casa, Ray fez as filhas se sentarem no sofá da sala e começou a inquisição, tentando entender o que tinha acontecido. Ele não teve tempo de decidir quem começaria a falar e sua caçula já começou a reclamar da irmã.

— O senhor não sabe o que ela fez. – Katherine apontou para a irmã que fingia ignorar tudo a sua volta. – Eu estava no recreio conversando com meus novos amigos e essa maluca apareceu e saiu me arrastando para longe deles e me fez passar a maior vergonha e para piorar me levou até a porta da sala e me buscou na saída, como seu fosse uma garotinha de doze anos de idade.

— Claro! Ter dezesseis anos te faz ser muito adulta. – Ana a interrompeu enquanto rolava os olhos e ganhava um olhar intimidador de seu pai que dizia que sua hora de falar chegaria.

— Paizinho. Eu já não posso ter um namorado, será que nem ao menos amigos eu posso ter? O senhor precisa fazer essa louca entender que ela não é minha mãe e não pode mandar na minha vida. – Kate chamou novamente sua atenção com o tom de voz que Ana conhecia bem.

Aquele com o qual sua irmã convence qualquer um de fazer qualquer coisa que ela queira. Foi difícil admitir que caçula dos Steele conseguia ser extremamente manipuladora. Mas fazer biquinho e voz de garota mimada para chegar aonde se quer era um jogo que duas podiam jogar e Ana já sabia exatamente o que fazer para evitar que Kate convencesse o pai a liberar sua aproximação de Rodrigues.

— Será que agora eu tenho o meu direito a defesa? – Anastásia pediu em um tom totalmente submisso.

— Por favor, Ana, eu gostaria muito de saber porque você constrangeu sua irmã diante de seus novos amigos, se eles não estavam fazendo nada demais além de conversar. Ou estavam? – Ray perguntou ainda envolto no transe que o olhar da caçula exercia sobre ele, antes de se lembrar de que não poderia ceder tão fácil.

— Claro que não pai! – Kate se apressou em se defender. – O que eu poderia estar na fazendo demais na hora do intervalo?

— As possibilidades são infinitas. – Ana respondeu com ironia, antes de voltar ao seu plano inicial de ganhar o apoio de seu pai. – Realmente a Kate não estava fazendo nada demais além de conversar, mas o que me preocupa pai é a inocência dela e por causa disso não conseguir perceber as intenções repugnantes que José Rodrigues tem ao olhar para ela como se fosse um pedaço de carne que ele deseja comer no jantar.

— Anastásia! – Katherine exclamou com o rosto vermelho de vergonha e raiva. – José em nenhum momento me faltou com respeito ou fez algum tipo de insinuação maldosa, dessas que você está insinuando.

— Por que estamos no primeiro dia de aula. Não dou um mês para que ele te convença que não tem nada demais em se pegarem as escondidas em uma das salas vazias daquela escola enorme, e que não tem nada demais em por as mãos na sua bunda, ou pegar nos seus peitos, assim como já aconteceu com a maior parte das garotas daquela escola, sem falar no que vem depois.

— Isso é mentira de um monte de recalcada que não aceita que o José não quer nada com elas e me admira muito, querida irmã que justo você acredite em todas as mentiras que as pessoas daquela escola contam. – Kate afirmou tentando virar o jogo a seu favor.

— Está duvidando de mim, irmãzinha? Procure saber quantas garotas tiveram seus corações e sonhos de amor eterno destruídos por aquele egocêntrico e que se acha a personificação do desejo de todas as garotas e você, pai, deveria procurar saber o nome do pai do filho de suas pacientes que chegam lá sofridas e abandonadas e eu tenho certeza de que alguma delas vai apontar José Rodrigues como o cara que “fez mal a elas”. – Anastásia envenenou a mente de Raymond.

— Isso tudo é mentira dessa rancorosa só porque ele olhou para mim e não para ela. – Kate gritou revoltada se desfazendo da imagem de injustiçada.

— Vocês duas chegam dessa discussão agora. – o pai gritou. – E quanto a você Katherine, até que eu tenha certeza de que esse senhor Rodrigues não sai por aí engravidando garotas indefesas eu não quero você perto dele, preferencialmente nem olhando para ele.

— Mas pai isso é injusto! – a caçula exclamou extremamente irritada.

— E Anastásia vai ficar responsável por me contar caso você descumpra minhas ordens. – ele completou ignorando a insatisfação dela, enquanto Ana comemorava silenciosamente.

— Você deve estar muito satisfeita em acabar com a minha vida, não é? – Kate perguntou para a irmã com os olhos rasos d’água, mas Ana também já conhecia aquele truque e não iria cair nele nunca mais.

— Se isso garantir que seu hímen continue intacto então sim, irmãzinha. Eu vou estar bem satisfeita. – Anastásia afirmou antes de pegar suas coisas e ir para o quarto. Kate fez o mesmo tentando fazer uma saída triunfal da garota desesperada, enquanto seu pai apenas se preocupava em anotar o nome de José Rodrigues.