A Lira da Verdade

Capítulo 35 - Noah


N

O

A

H

Noah observou em silencio enquanto Neal se sentava no braço do sofá com um copo d'água gelada na mão. Havia acontecido tantas coisas, se parasse para refletir... O mundo também poderia se acabar por causa de uma briga entre os deuses e a missão de impedir isso fora dada a três semideuses. E, o pior, dois eram "calouros", "novatos" - a maior responsabilidade, e a responsabilidade por eles, estava sobre os ombros de Noah e o moreno duvidava que conseguiria suportar aquilo por muito tempo sozinho. Ter o fardo de impedir o provável fim do mundo era enorme. E, fora isso, Noah amaldiçoava a si mesmo por não conseguir nem uma pista do que eles procuravam. Era relacionado a Apolo e a Hermes, os pais olimpianos de Neal e Karina, respectivamente. Mas nada entrava em sua cabeça. Nenhuma pista.

Noah foi impedido de continuar praguejando em sua mente sobre o que acontecera desde que ele salvara Karina dos cães infernais e tinha sido enviado em uma missão, - que, para o moreno, fora empurrada em cima de si, do loiro e da ruiva - na hora em que Karina acordou gritando e se sentou ereta no sofá, ofegante. Neal desequilibrou o copo de água e acabou molhando a camisa nova, o que podia ter sido engraçado se Karina não parecesse tão desesperada.

Noah colocou a mão em seu ombro, a acalmando.

– O que foi criatura?! – Ralhou Neal. Olhando para o copo que, antes, estava totalmente cheio. E depois fitando a camisa molhada.

– Karin, o que foi? – Noah perguntou sereno, tentando acalma-la.

– Eu... – A primeira reação dela foi ficar rubra. Desde quando Noah a tinha dado um apelido? Ela deixou isso de lado, respirando fundo e piscando os olhos para manter o foco na realidade. – Uhn...

– Você está bem. Está no Cairo, lembra? – Noah perguntou.

– Tive um sonho tão estranho...

Sonhos nunca são bons sinais não é? É como o Bá de um mago egípcio.

O.K, Bastet. Obrigado por lembrar.

Neal ofereceu seu copo de água a ela. Ele se retirou em direção a cozinha para pegar outro para si e dessa vez bebeu em pé, como se tivesse hesitante em chegar perto da ruiva para ela terminar de molhar sua camisa. Karina bebeu a água que lhe fora oferecida.

– Sobre o que? – Neal perguntou, se sentando.

– Depois. – Ela falou, se levantando. – Temos que ir. Agora.

– Para onde? – Noah se levantou também. Z piou, chateado por todos terem se erguido e o deixado no sofá, mas logo voltou a se acomodar no ombro do moreno e a alisar suas penas metálicas, calmo como sempre.

Neal resmungou algo como “só porque acabei de sentar” e também se pôs de pé. Karina pareceu tenta lembrar o nome ao mesmo tempo em que arrumava as mochilas chamuscadas, sujas e rasgadas.

– Essas não vão ajudar. – Noah falou. Ele foi até um quarto e jogou no sofá três mochilas velhas de escola. Uma delas com quatro bottons. Um de Link Park, Imagine Dragons e dois de One Ok Rock. E por incrível que pareça as mochilas eram todas pretas e com poucos detalhes.

– Isso é One Ok Rock? – Perguntou Karina.

– Sim. – Ele respondeu enquanto passava as coisas das usadas para as novas. Neal o ajudava ao seu lado. Ele tinha pegado o notebook que Noah tinha pedido e colocava na mochila dele junto com o livro de péssima fonte. Algum dia teriam de devolvê-lo a biblioteca. Algum dia, se não esquecessem desse fato.

– Que musica você gosta? – Ela perguntou, fazendo o mesmo com a mochila dos bottons.

– The Beginning. – Ele enfiou mais alguns casacos na mochila. O suficiente para os três. Quando estava tudo pronto se virou para ela enquanto Neal perguntava a Bes se ele ia ajudar em algo recebendo uma barrada não muito delicada do deus dos aões. Z tinha decidido fazê-los companhia antes de seguir boa parte da viagem dormindo nas mochilas.

– Lembrou pra onde ir?

– Grécia. Pelo... Pelosiono...

– Peloponeso? – Noah sugeriu, erguendo uma sobrancelha.

– Isso! Muito obrigada, Google Maps! Hm... Para a Arcádia. Em três dias. – Ela falou. – E eu sei o que estamos procurando.

Isso deixou todos em silencio. Noah continuou com os olhos cravados em Karina, que fechava o zíper da mochila. Ela reparou no olhar dele, e Noah notou que ela comprimira os lábios – gesto que ela fazia quando estava nervosa, como agora. Neal deu uma cotovelada de leve no moreno, abrindo um sorriso debochado.

– Uuhh, nosso Google Maps particular! - Neal brincou, recebendo um olhar ameaçador de Noah. Mas o moreno teve de rir junto, apesar de não ter apreciado o apelido da ruiva. - Se ela te deu um apelido eu também posso? Posso te chamar de tocha-humana?

– Claro - Noah se forçou a dar um sorriso não-assassino. - Se quiser morrer.

Neal recuou com as mãos para o alto. Noah se voltou para Karina novamente. A menina já tinha uma das mochilas nos seus ombros, pronta para sair.

– Karin, o que é que procuramos? O que é o objeto que acabou gerando essa confusão toda em que nos meteram?

– É uma lira. Ela apareceu no meu sonho. - Karina voltou a comprimir os lábios, novamente. - Uma lira bastante problemática. - resmungou ela em seguida.

– Que sonho? – Neal perguntou.

– Gente, depois! Temos três dias para chegar a Arcádia. Sabe como esse lugar é longe?! – Karina destacou o óbvio. Os garotos jogaram as mochilas sobre os ombros.

– Aposto que Noah sabe o quão longe é a Arcádia. Ele é nosso Google Maps, certo? - brincou Neal baixinho, mas permitindo que suas palavras chegassem aos ouvidos de Noah e de Karina. O moreno devolveu a ele um olhar cínico, abrindo um sorriso torto no rosto.

– Eu tô avisando Neal. Quem brinca com fogo muitas vezes se queima.

Neal riu baixo. - Bem, mas esse fogo não vai me queimar. Por que você não é doido para fazer isso, Noah.

– Garotos! Parem de discutir feito duas crianças! - Karina os repreendeu.

– Karin está certa. Temos que chegar à Grécia. Ela pode nos contar no caminho. Agora vamos. - Bes falou, pegando a atenção de todos ali presentes. - Não poderei acompanha-los quando chegarmos à Grécia. – ele resmungou. – Lá não é um lugar de um deus egípcio. E com toda essa confusão divina não acho que vão receber bem uma visita.

Karina não queria deixar Bes. Nem Neal ou Noah. Apesar de ele ter passado pouco tempo com eles, Bes se mostrou um grande amigo. Porém Noah concordou com a cabeça, fazendo um pequeno sorriso. Ele também entendia o deus egípcio, e Bes estava certo. Seria melhor evitar uma confusão enquanto o trio resolvia outra maior ainda.

– Obrigado, Bes. – Noah falou. Ele escreveu um bilhete a Tom e ainda passou na geladeira pegando duas enormes garrafas d’água geladas. Entregou-as a Neal e desceu do apartamento às pressas sendo seguido por Karina, o loiro e o deus dos anões. Z piou pelo desconforto de ter de se acomodar em algo em movimento, mas permaneceu quieto o resto do tempo.

– Como vamos para lá? – Neal havia feito uma ótima pergunta. Noah parou na calçada, observando em volta. Ele notou os carros estacionados na rua, até sua atenção se prender em um deles.

– Naquele trailer. – Noah apontou para o trailer branco detalhado em vermelho.

– Bom rapaz. – Bes respondeu. – Pena não ter um melhor. E invocar carros não é fácil.

– Você tem a chave? – Karina falou, ignorando Bes que falava sobre os carros que podia invocar.

– Segunda opção. – Ele abriu a porta com um chute. Ele mesmo se surpreendeu por abrir de primeira. O trailer realmente estava acabado, pois a porta dele mal trancava. Ele entrou depressa e se abaixou no banco do motorista.

– O que está fazendo? – Karina perguntou.

– Ligação direta.

Faiscou. Quando Noah viu que tudo estava pronto ele sentou no banco. O moreno agradeceu mentalmente por ser filho de Hefesto, pois seus dons de mecânica já o salvaram inúmeras vezes. Agora, o trailer estava ligado. Era velho, mas iria servir por hora.

– Estamos roubando? – Neal arregalou os olhos.

– Incrível! – Karina riu.

O loiro se virou pra ela.

– Não! Não é nada incrível!

– Vamos devolver. – Noah falou. – Mas se os deuses fizerem sua guerra não terá para quem devolver.

Neal resmungou algo, caminhando pelo trailer e deixando Karina olhando entusiasmada para frente à medida que o Cairo virava uma mancha borrada nas janelas. Noah gostava da presença dela, isso ele não podia negar. E não era só a presença dela que o encantava. A culpa também cresceu dentro de si, junto com o sentimento de paz que Karina provocava nele.

Mas, infelizmente, tinha de se concentrar para não atropelar ninguém por hora.