Quando aceitou visitar os tios após muita insistência da irmã, Elizabeth não pensou que se sentiria tão bem. Ela precisava sim esfriar a cabeça e esquecer dos problemas, mas jamais imaginou que eles se resolveriam num passe de mágica, como no final de um livro ou filme. Tudo estava perfeito, tão perfeito que até assustava.

Após um longo almoço com direito a uma comida maravilhosa e uma conversa melhor ainda, Liz não poderia estar mais contente. Tudo estava se encaixando perfeitamente e era como se aquela cena fosse tão comum e familiar que por alguns segundos, ela temeu que fosse um sonho. Mas não era e ela sabia disso porque aquilo que ela sentiu quando Darcy puxou-a pela mão para acompanha-la novamente até a sala de estar foi real.

Estar ali com eles, como em uma reunião de família era sublime e Elizabeth sentiu-se literalmente nas nuvens. Estavam todos alegres e rindo dos causos que ela e Darcy contavam sobre o hospital e a conversa fluiu tão bem que de repente muitas horas já tinham se passado.

Liz saiu por alguns segundos e ficou apoiada na varanda observando o sol e o vasto campo que se estendia a sua frente. Darcy tinha ido ao banheiro e ela aproveitou aquele tempo para agradecer pelo dia. Sentiu a brisa suave em seu rosto e era como se sua pequena prece tivesse sido respondida. Até os céus estavam felizes por ela.

— Oi. – Darcy chegou por trás e segurou-a pela cintura, puxando-a para perto. Olhou na mesma direção que ela e em seguida plantou um beijo suave no canto da boca dela. – Está olhando o que?

— O sol. – Elizabeth respondeu sem tirar os olhos do horizonte. – A grama, o céu. Este lugar é tão lindo, não sei como você o trocou pela cidade.

— Eu nunca morei aqui. – Darcy respondeu enquanto brincava com uma mecha de cabelo de Elizabeth. – Comprei a propriedade depois que Georgiana sofreu o acidente.

— O que aconteceu? – Liz virou-se para ele e esperou alguns segundos antes de ele contar.

— Eu era residente na época. – Darcy suspirou, dava para ver na expressão dele como aquela história era dolorosa. – Morávamos na cidade, foi logo depois que meu pai morreu.

— Eu sinto muito. – Elizabeth queria abraça-lo e confortá-lo, mas sabia que se fizesse isso, era capaz de ele desistir de contar a história.

— Foi uma longa luta, ele já estava cansado. – Darcy respondeu um pouco chateado, apesar de não querer demonstrar. – Mas então, Georgiana era muito nova e estava passando por muita coisa. Além dessa história toda ela ainda estava com problemas na escola. Ela não aguentou a pressão e surtou.

Elizabeth se manteve quieta, apenas segurou a mão de Darcy para encorajá-lo e também para assegurar de que estava tudo bem e que agora ela estava lá. Ele não precisava mais guardar aquilo só para ele.

— E eu estava ocupado demais. – Ele sorriu de maneira cínica olhando para o nada. – Como sempre.

— Não se martirize. – A voz de Liz era doce. – Você faz isso pelas pessoas. É um ótimo médico e já salvou muitas vidas, não tem nada de errado em ser uma pessoa ocupada quando essa energia é focada para o bem.

Ele apenas olhou-a com doçura antes de continuar, agradecendo silenciosamente aquelas palavras.

— Ela arrumou um namorado que não fazia bem para ela e ao invés de ter calma e orientá-la, eu gritei com ela. Disse que ele era uma má influência e mandei que ela terminasse com ele e então Georgiana fugiu.

Elizabeth ficou abismada apesar de tentar não demonstrar. Como a doce e quase angelical Georgiana que ela tinha conhecido há algumas horas podia ser a garota problemática da história de Darcy? Ela estava mais para sua irmã, Lydia.

— Eles estavam em uma moto. – Darcy continuou, sua voz estava quase sem emoção. – E sofreram um acidente. Não foi tão feio assim, o garoto não sofreu um arranhão se quer. – Ele fez uma pausa dramática e continuou com a voz angustiada. – Mas a minha irmã? Ela foi jogada na calçada, bateu a bacia e a cabeça e ficou inconsciente.

Darcy se afastou um pouco de Elizabeth e se apoiou no corrimão de madeira que contornava a varanda da casa.

— E foi assim que ela se machucou? – Liz tentou acabar logo com a história, pois percebeu que Darcy ainda não tinha superado. Ele se sentia culpado por ter perdido a paciência e brigado com a irmã e Liz sentiu uma extrema empatia, já que por diversas vezes havia agido da mesma maneira com Lydia. Em uma nota mental, ela prometeu a si mesma que seria mais paciente com a irmã quando voltasse para casa.

— Em partes. Ela teria ficado boa se um médico que levasse o trabalho a sério a tivesse atendido na emergência, mas quem estava de plantão aquele dia? – A voz de Darcy estava carregada de raiva, era como se ele tivesse revivendo aquele momento e foi então que Elizabeth soube. Ela soube exatamente a quem Darcy estava se referindo.

— O dr. Wickham. – A voz dela saiu fraca apesar de não ter dúvidas de que aquela era a resposta correta.

— O dr. Wickham. – Ele repetiu com um sorriso amargo nos lábios. – Quando fiquei sabendo do acidente e que minha irmã estava sendo atendida ali, ignorei todos os protocolos e simplesmente invadi a sala de operação. Isso me rendeu uma suspensão e eu quase perdi meu emprego, mas foi a melhor coisa que eu fiz na minha vida. Wickham quase fez com que minha irmã perdesse o movimento das pernas completamente.

— E é por isso que você não gosta dele. – Liz concluiu após alguns minutos. Sentia que ele estava vulnerável e queria abraça-lo e nunca mais soltar, mas não o fez. De algum modo, sabia que aquilo feriria seu orgulho e não queria deixa-lo ainda pior.

— Não é um bom motivo? – Ele perguntou sério. Não estava sendo sarcástico, apenas precisava da aprovação dela.

— Claro que é! E não sei como você aguenta passar por ele todos os dias e ver aquele sorrisinho afetado dele. Eu já tenho vontade de pular no pescoço dele só pelo que ele me fez, imagino você.

Darcy puxou Lizzie para perto.

— Não que eu não tenha avisado. – Ele sussurrou no ouvido dela.

Elizabeth ficou feliz pois seu comentário tinha conseguido aliviar a tensão do momento.

— Por que você não me disse antes? Eu jamais teria chegado perto dele se soubesse!

— Naquela época, eu disse que ele era um médico negligente, você que não acreditou.

— Mas achei que você estava falando por pura implicância. – Elizabeth fez bico. – Não sabia de tudo isso.

— Preferi não interferir. – Ele respondeu. – Você é inteligente e eu sabia que mais cedo ou mais tarde descobriria quem ele é de verdade. Sem necessidade de intervenções.

— E é por isso que eu te amo. – Elizabeth jogou-se mais uma vez nos braços de Darcy. Em parte para esconder o rubor diante de uma fala tão espontânea que pegou até ela mesma desprevenida.

— É mesmo? – Ele ergueu a sobrancelha, estava surpreso com a confissão.

— Acho que essa não é a resposta certa. – Liz fez uma imitação de cara brava que o fez rir, pois lembrava um peixe baiacu.

— Ai, srta. Bennet, é por isso que eu te amo tanto.

Darcy sorriu e curvou-se para beijar Elizabeth. Dividir aquela história com ela tinha sido uma das melhores coisas que ele fizera. Estava tão mais leve e sentia-se tão mais próximo dela e ela dele que se soubesse teria feito isso antes, muito antes. Era engraçado como as vezes as coisas mais simples são tão importantes para um relacionamento.