A Hora do Vampiro
Um desejo
- Ora, Kamui, você parece irritado – comentou a feiticeira, analisando o vampiro trajado de preto de cima a baixo.
Kamui cerrou os punhos, contendo sua raiva. Atrás de si estava seu irmão gêmeo Subaru, calado como sempre, os olhos perdidos na decoração daquele ambiente.
- E o que o traz a minha loja, Kamui? Se eu me recordo bem, há um tempo atrás dei para você e para seu irmão o poder de atravessar as dimensões – observou Yuuko, esticando as pernas pelo divã – Vocês tem novos desejos?
- Sim! – Kamui respondeu imediatamente, chamas faiscando em seus olhos – Tem algo que nós dois queremos muito.
O olhar da feiticeira pousou em Subaru.
- Você compartilha do mesmo desejo do Kamui?
- Eu... – Subaru abaixou a cabeça – Eu...
- Nem eu nem ele agüentamos mais aqueles caçadores nos seguindo por todos os mundos! – exclamou Kamui, cortando Subaru – Estamos cansados de viajar pelas dimensões! Queremos paz, sossego e tranqüilidade! Queremos que eles parem de nos seguir.
Yuuko ficou observando o jovem vampiro por um longo tempo. A raiva atravessava todo o seu corpo – um contraste com Subaru, que aparentava serenidade mesclado a uma certa tristeza.
- Hum... É claro que, para isso, há um preço.
- Pagaremos o que for.
Os lábios de Yuuko se curvaram em um sorriso.
- Certo, eu vou conceder esse desejo, mas... – um brilho de diversão passou pelo seu rosto – Só daqui a pouco.
- Hm? – estranharam Kamui e Subaru.
A feiticeira riu.
- Enquanto esperamos, por favor, sentem-se – disse, indicando o outro divã – Creio que não vai demorar. Querem um chá?
- Er...
- WATANUKI!!!!!! CHÁ!!!!!!!!
De um outro cômodo da loja, certamente a cozinha, reclamações de um garoto podiam ser ouvidas em bom tom. Yuuko balançou a cabeça, divertida.
Incertos, os gêmeos sentarem-se no divã.
- Yuuko-san... – começou Kamui – Estamos com pressa, queremos terminar logo com isso.
- Ora, Kamui, a paciência é uma virtude – lembrou a feiticeira, piscando para o jovem – Tenho certeza de que daqui a pouco eles vão chegar.
Kamui arqueou a sobrancelha.
- Eles...?
Watanuki entrou na sala, trazendo em suas mãos uma bandeja de chá.
- Já estava na hora, Watanuki! Eu, Kamui e Subaru quase morremos aqui de tanto te esperar...
- M-Mas eu não demorei quase nada! – começou o estudante, servindo uma xícara para cada vampiro, que aceitaram a bebida com receio – Você é muito folgada, Yuuko-san!
- Ora, Watanuki, por acaso eu pago você para me criticar?
- Eu nem tenho salário! – exclamou o jovem, estupefato – Era por acaso para eu ter um?
Yuuko sorriu, exibindo os dentes brancos em um sorriso cínico e divertido.
- Não. Você vai ser meu escravo durante um looooooongo tempo – ela piscou para ele – Pode se retirar agora.
Watanuki apertou a bandeja em suas mãos, controlando-se para não atirá-la na cabeça daquela feiticeira folgada e sem vergonha. Virou-se, caminhando na direção da porta.
- Depois nos traga saquê! – pediu Yuuko.
Watanuki não respondeu, contudo, grunhiu algumas palavras que não puderam ser entendidas, e então saiu da sala.
Novamente, Yuuko riu e olhou para os gêmeos.
- Não vão beber? O Watanuki reclama bastante, mas o chá que ele prepara é muito bom.
Subaru sacudiu a cabeça, educado.
- Er... Nós não estamos acostumados a beber chá... E nenhum outro tipo de bebida, além de...
- Entendo.
- Quanto tempo teremos que esperar ainda? – perguntou Kamui, a paciência no limite.
O sino da loja tocou, indicando que alguém havia acabado de chegar. As vozes de Maru e Moro, recebendo os clientes, podiam ser ouvidas da sala aonde a feiticeira e os gêmeos vampiros se encontravam.
Yuuko suspirou, sorrindo de modo enigmático.
- Chegaram.
As vozes se aproximaram mais, e, em seguida, Maru e Moro abriram as portas, revelando os dois clientes.
- Vocês! – gritou Kamui, ficando em pé, os olhos adquirindo um tom amarelado.
- Kamui, controle-se... – murmurou Subaru, tocando levemente o braço do irmão.
- Não com esses dois aqui!!!
Seishiro e Fuuma trocaram um rápido olhar, divertindo-se com a reação do vampiro.
- Ei, Kamui, quanto tempo, hein? – Fuuma balançou a cabeça, sorrindo – Bom, não sei se o mesmo tempo que passou para mim, passou para você... – ele levou o olhar para o segundo vampiro – Olá, Subaru-san.
Subaru não respondeu.
Kamui fuzilou os dois caçadores com o olhar.
- O que vocês dois estão fazendo aqui?
- Bem, essa é uma loja... Temos o direito de entrar aqui se quisermos – dessa vez fora Seishiro quem tomara a palavra. Ele sorriu, divertindo-se com a irritação de Kamui, contudo, seu olhar rapidamente pousou no rapaz encolhido no divã, a cabeça abaixada – Subaru-kun...
As bochechas de Subaru adquiriram um tom avermelhado, e o vampiro teve que se controlar ao máximo para não olhar para o caçador.
Em silêncio, Yuuko observava a cena desenrolar-se diante de seus olhos. Pensou em intervir, mas aquilo estava muito engraçado.
- O que vocês querem? – Kamui perguntou novamente, avançando na direção dos dois homens.
Nem Seishiro nem Fuuma responderam, apenas riram. Irritado, Kamui segurou Fuuma pela gola da camisa.
- Vocês dois não prestam! Coisa boa não deve estar acontecendo!
- Será? – disse Fuuma, segurando o braço de Kamui – É você quem está procurando por briga, Kamui. Se quiser começar uma luta agora...
- NÃOOOOOOOOO!!!!! – gritou uma voz – NADA DE BRIGAS!!! – Watanuki se aproximou, colocando-se entre Fuuma e Kamui – Se vocês brigarem aqui, tudo será destruído! – ele exclamou, ofegante – E adivinhem quem vai ter que limpar tudo depois? NADA DE BRIGAS!
Watanuki tomou o ar, normalizando sua respiração. Gotas de suor escorriam pelo seu rosto pálido e magro, escondido atrás dos óculos.
- Bom, acho que já podemos começar – disse Yuuko, colocando-se de pé.
- Finalmente... – grunhiu Kamui.
- Vocês quatro possuem desejos interessantes – observou a feiticeira, lançando ao quarteto um olhar misterioso – E o fato de se encontrarem aqui hoje não é uma coincidência. É o inevitável.
Os caçadores e os vampiros ouviam atentamente cada palavra de Yuuko. Kamui, silenciosamente, escondia a irritação – não queria saber de blá, blá, blá. Queria que a feiticeira realizasse logo o seu desejo, e que ele e Subaru ficassem livres dos caçadores para sempre.
O vampiro olhou para Fuuma e Seishiro, e, por um momento – um breve e curtíssimo momento – se perguntou qual seria o desejo dos irmãos, contudo, a curiosidade não demorou a deixá-lo.
- Os desejos que vocês possuem são complicados de realizar, mas não impossíveis. Porém, o preço não será baixo, e a força de vontade e a coragem se farão necessárias durante a caminhada. Estão de acordo com todas as condições?
- Sim! – Kamui praticamente gritou.
- Claro – disse Fuuma, olhando de canto para o vampiro.
- O preço não me importa – disse Seishiro, dando à feiticeira um de seus sorrisos diabólicos.
Subaru, timidamente, assentiu.
- Certo – disse Yuuko – Para realizar os desejos, eu preciso que vocês me tragam os dez lendários anéis de Kami.
Kamui arqueou a sobrancelha.
- Os dez o quê...?
- Os dez lendários anéis de Kami – explicou Yuuko, andando em volta do quarteto – Conta a lenda que Kami criou dez anéis místicos, contudo, para escondê-los da ganância do homem, Ele os espalhou pelas mais diversas dimensões. Então, se vocês quiserem ter os seus desejos realizados, precisam viajar pelas dimensões e me trazer esses anéis.
- Mas isso pode demorar muito tempo! – exclamou Kamui.
Yuuko exibiu um sorriso que parecia esconder um segredo desconhecido para Kamui.
- Por isso vocês vão viajar em duplas. Será mais rápido, e, quando os dez anéis tiverem sido reunidos, vocês automaticamente voltarão para essa loja.
Fuuma balançou a cabeça.
- Como saberemos que os anéis estão por perto?
Yuuko fez um sinal para Watanuki, que trouxe dois colares, os quais possuíam uma bela pedra como pingente.
- Quando um anel estiver por perto, essas pedras irão brilhar – explicou Yuuko, vendo que Watanuki entregara um colar para Kamui e outro para Seishiro –Viajar para outros universos é algo mais penoso do que vocês imaginam, mas creio que vocês quatro já possuem uma noção disso – Yuuko os fitou, o olhar portando um brilho enigmático – Pessoas que você conheceu em seu mundo ou em mundos que você visitou anteriormente, provavelmente levam vidas diferentes em outros universos. Além disso, é possível encontrar pessoas com a mesma aparência várias vezes em universos diferentes. Mas isso não quer dizer que elas dispensem o mesmo tratamento a vocês em todos os universos. Existem universos onde as palavras não funcionam. Existem universos com diferentes tecnologias, tradições e leis. Existem também universos repletos de criminosos, ou de assassinos, ou repleto de guerras. A sua jornada poderá passar por todos esses lugares – continuou Yuuko – Vai ser uma viagem arriscada, em busca desses anéis espalhados por inúmeros universos desconhecidos. Mas mesmo assim... Você estão firmes em sua decisão? – os quatro assentiram – Bom, tudo o que tinha para explicar, eu já expliquei. Se quiserem, podem começar a jornada agora mesmo.
Kamui suspirou.
- Certo. Vamos, Subaru.
- Não, não – disse Yuuko, mexendo o dedo indicador em sinal negativo – O Subaru não vai acompanhá-lo nessa viagem pelas dimensões. Kamui, seu parceiro de jornada será o Fuuma.
- QUÊÊÊÊÊÊ????????????????????????? – gritaram Fuuma e Kamui juntos.
Yuuko bateu palmas, divertindo-se como uma criança.
- E... Quem vai acompanhar o Subaru será o Seishiro.
O rosto de Subaru adquiriu um tom mais avermelhado do que o manto que cobria o divã de Yuuko; ao mesmo tempo em que um sorriso irônico atravessou o rosto de Seishiro.
- Nem pensar! – bradou Kamui, tremendo de ódio – Não vou deixar que o meu irmão viaje por aí com esse cara!
- Mas esse é o preço – disse Yuuko – Se não for assim, não poderei realizar nenhum dos desejos, Kamui. Os outros três já concordaram com as condições, falta apenas você.
Kamui cerrou os punhos, os lábios tremendo.
- M-Mas... Esse homem está perseguindo o meu irmão...
- Vai estar tudo bem, Kamui – disse Subaru gentilmente, colocando uma mão sobre o ombro do irmão – Não precisa se preocupar com nada. É pelo seu desejo...
- Subaru... – os olhos do vampiros pousaram furiosos em Seishiro – Eu aceito, mas tenho duas condições.
Seishiro deu de ombros.
- Fale.
- Você não pode em hipótese alguma tocar no um irmão se isso o deixar inconfortável e... Principalmente, em primeiro lugar, você não pode de jeito nenhum, nem mesmo no seu sonho, tentar beber o sangue dele.
Um brilho que Kamui não conseguiu decifrar passou pelos olhos do caçador. Seishiro curvou os lábios num sorriso assustador, e assentiu.
- Tudo bem.
- O Watanuki entregou um colar para o Kamui e outro para o Seishiro. Correto, cada dupla tem o seu. Vou enviá-los para as dimensões – avisou Yuuko, pondo-se na frente dos quatro – Fiquem pertos de seus parceiros.
Subaru, bastante envergonhado, se aproximou de Seishiro; Kamui, fervendo de raiva, se aproximou de Fuuma. É pelo meu desejo. É pelo meu desejo. Quando tudo isso acabar, não vou ter que ver nunca mais o rosto desses dois caçadores na minha frente. NUNCA MAIS!
- Será que cada um pode dar a mão para o seu parceiro?
- Hein?
Yuuko juntou as mãos, sorrindo.
- Quando vocês estiverem atravessando as dimensões, sempre se segurem um no outro, para não correrem o risco de se perderem.
Fuuma estendeu a mão para Kamui.
Pense no seu desejo, pense no seu desejo, PENSE NO SEU DESEJO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
Kamui segurou a mão do maior, a qual se fechou sobre a sua.
Subaru não se moveu, sentindo-se corar, e antes que pudesse fazer qualquer movimento, sentiu a mão de Seishiro fechar-se sobre a sua, e o seu rosto corou mais ainda.
Yuuko sorriu, murmurando algumas palavras, e dois círculos mágicos surgiram sob os pés de cada dupla. Subaru sentiu sua respiração ficar mais acelerada, e, no mesmo instante, sentiu a mão de Seishiro apertar a sua. A dimensão em volta de cada círculo começou a se distorcer, e, em seguida, as duplas desapareceram.
Yuuko juntou as mãos, levando o olhar para o alto.
- Faço votos para que a misericórdia e a felicidade sejam as luzes a guiarem os viajentes durante o caminhar nesta senda.
Watanuki arqueou uma sobrancelha.
- Er... Yuuko-san...
- Sim?
- Hã... Não teria sido melhor se a senhora tivesse deixado os irmão vampiros irem juntos, e os irmãos caçadores irem juntos, ao invés de fazer essa mistura que a senhora fez?
A serenidade atravessou o rosto da feiticeira.
- Era necessário que fosse dessa maneira, devido ao desejo que cada um almeja.
- Hum...
- E também...
- E também...?
Yuuko juntou as mãos, pulando de um lado para o outro, como uma criança de quatro anos.
- Yuuko-san...?
- Ficou mais legal desse jeito!!! Vai rolar muita história assim! – ela riu histericamente, o que deixou Watanuki meio assustado – Fazer o que se eu sou uma fangirl yaoi assumida?
- QUÊÊÊÊ???????????????????????
Ela lançou um olhar sedutor para Watanuki.
- Watanuki – murmurou com a voz rouca.
O estudante sentiu-se corar.
- Sim, Yuuko-san?
- E você e o Doumeki-kun, como estão?
Watanuki jogou-se no chão, se contorcendo de raiva.
- Eu desisto!
Yuuko riu.
- Traga o saquê para comemorarmos o início de uma história que promete muitas surpresas...
- Nada de saquê antes do jantar!
- Watanuki, seu malvado! – choramingou Yuuko, fazendo beicinho.
- Não é não!
- ONI!!!!! – ela gritou enquanto o rapaz deixava a sala.
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