Acordou lentamente, com o som de passos rápidos, ainda distantes, pelas ruínas onde dormia.

— Que porra... - Bocejou, abrindo lentamente os olhos.

Se sentia fraca. Fazia quase um dia que não comia nada. E não tinha um centavo furado no bolso. "Porcaria...", pensou, levantando. Não fazia ideia de quem podia estar ali, mas era bom descobrir logo. Havia chegado à cidade na noite anterior, e não queria nenhum tipo de problema.

A medida que se aproximava, começava a discernir uma voz estridente e, até certo ponto irritante, enquanto a provável mulher cantarolava uma canção qualquer. A loira caminhava lentamente, sem querer chamar a atenção da outra.

Então, no segundo seguintes, fez-se o silêncio total.

A noxiana não gostou nem um pouco daquilo, ao entrar no salão onde a pessoa deveria estar.

— Alguém ai? - Perguntou, tendo certeza de que já fora percebida. - Só estou de passagem, não quero confusão... - Olhou ao redor, procurando qualquer sinal da figura. Também tirou o capuz que escondia seu rosto, para que ficasse melhor identificável. - Você pode sair, se quiser...

No segundo seguindo, uma risada estridente invadiu o salão.

— Hora hora! Alguém invadiu meu pequeno esconderijo secreto! - Disse, saindo detrás de uma pilastra.

Era uma moça realmente muito estranha. 20 anos, no máximo, com os cabelos longos, pintados com tinta barata numa coloração azulada, e uma série de tatuagens. Além disso, portava uma grande metralhadora, com uma cinta, que a deixava parecendo uma guitarra pendurada na lateral do seu corpo.

Deu uma risada longa, como se estivesse se divertindo muito com a inesperada companhia.

— A quem devo a honra? - Disse se aproximando, com um sorriso de hiena estampado na face.

A noxiana hesitou por um momento. Era difícil pensar em seu nome sem reviver o dia que gostaria de esquecer. Além disso, haviam várias pessoas que viriam em seu encalço, se descobrissem que estava viva.

— Por que não me diz o seu primeiro, e age como uma boa anfitriã?

A moça gargalhou, como se houvesse escutado uma piada genial.

— Sou Jinx! Não é óbvio? - Disse, fitando profundamente os olhos da outra, a espera de entendimento. Como ele não veio, a diversão se esvaiu do seu rosto, que logo assumiu um semblante de frustração.

— Eu deveria... conhecer você? - Perguntou, devolvendo um olhar duro. Não estava gostando nem um pouco daquela mulher, e pretendia se livrar dela assim que possível.

— Ahhhh... não! - Ela riu, dando um tapa na coxa e voltando a assumir o sorriso provocador de antes. - Tudo bem, esqueça isso.

"Aposto que é uma megalomaníaca", pensou, analisando o tipo de Jinx. "Provavelmente uma criminosa, que se diverte realizando atos insanos e escapando ilesa deles". Sua intuição não costumava falhar. E aquilo era mais um fato que a impelia a sair dali o quanto antes.

O estômago da loira deu um ronco alto, em seguida, fazendo Jinx curvar ainda mais seu arco de boca.

— Está com fome? - Ergueu uma sobrancelha, analisando-a melhor. - Você não é daqui, é?

— Como disse, estou de passagem. - Olhou para o outro lado. Não gostava de compartilhar suas fraquezas com os outros. - Agora, se me dá licença...

— Licença? Se jeito nenhum! Você é minha convidada! - Ela riu, piscando um olho. - Vou buscar um café da manhã caprichado!

— É muita bondade sua. - Sorriu falsamente. Não gostava de Jinx, mas não tinha condições de recusar comida, não no estado em que se encontrava.

— É o mínimo que posso fazer. Por alguém tão inteligente a ponto de ter encontrado meu esconderijo secreto. - Ela riu, quase docemente. - Espere um segundo. Eu já volto.

A exilada apenas a observou se afastar, cantarolando a passos rápidos. Logo, a presença de Jinx no ambiente desaparecera completamente, permitindo-a relaxar.

Estava fugindo a muito tempo. Dois anos, correndo sem parar, sem ontem ou amanhã. Não tinha mais forças para aquilo. A solidão lhe consumia completamente. Era hora de recomeçar em algum lugar, não mais como uma guerreira, mas sim como uma pessoa comum. Era o único jeito de deixar seu passado para trás.

Piltover parecia um bom lugar para aquilo. A Cidade Tecnológica havia se desenvolvido muito ao longo dos últimos anos, e era considerada um dos lugares mais promissores de Runaterra. Precisaria de um emprego, e de um lugar para ficar, o que, obviamente daria algum trabalho, mas...

Seus pensamentos foram rapidamente interrompidos por um som contínuo que cortou o silêncio do grande salão. Olhou ao redor, tentando identificar de onde vinha. Seus olhos foram fitando o teto da igreja, em busca da origem.

— Porra... - Comentou de modo arrastado, ao perceber a pequena bomba relógio, quase imperceptível, armada num canto afastado. O cronômetro marcada 11 segundos. E logo caiu para 10.

Não teve muito tempo para pensar. Saiu correndo em disparada. Foi impossível não associar o evento à corrida desesperada que efetuara na batalha de Noxus contra Ionia...

*********

A luta estava difícil. O espadachim cabeludo era muito rápido e extremamente técnico. E parecia estar se divertindo bastante com o combate.

— O que vai fazer? Seus companheiros estão sendo eliminadas. - Ele piscou, por detrás da máscara de gás. - Você não tem tempo...

Ela olhou ao redor. De fato, o bombardeio, somado às investidas das tropas ionianas, transformavam o campo de batalha numa verdadeira chacina. Quanto mais tempo demorasse para se livrar daquele homem, pior seria.

Estava ofegante. Muito mais do que deveria. E a espada começava a pesar em sua mão. Emitiu um tossido rouco, fazendo o homem balançar lentamente a cabeça para os lados.

— Tadinha... o veneno de Singed é realmente uma coisa traiçoeira... Você não tem muito tempo. - Ele lhe apontou a espada. - A propósito... meu nome é Yasuo.

— Não quero saber qual é seu nome!

— Imagino que uma lutadora tão formidável gostaria de saber o nome do homem que o derrotou. - Ele riu, e avançou com a espada em punho.

A troca de espadas foi franca e intensa, mas Yasuo se movia do modo mais rápido, empurrando a noxiana para trás.

Mais mísseis caíram no campo de batalha. Um, acertou o chão entre os duelistas, atirando-os longe. A moça gritou de dor, enquanto o ácido proveniente do projétil se espalhava por sua pele.

— AHHHHHHH! - Gritou, arrancando sua armadura, enquanto pulava ensandecida, a medida que se livrava das peças.

Era um tipo de dor diferente. O ácido corroendo sua pele. Ficou praticamente nua, com exceção das peças íntimas, e correu para longe do campo de batalha.

Pela primeira vez em sua vida, o medo começou a lhe dominar, implementando dúvidas em sua mente. Percebeu dois ionianos vindo em sua direção. "Ao menos Yasuo não está por perto...", pensou, enquanto os eliminava rapidamente, com a espada longa. Continuou correndo para longe, mordendo o lábio inferior, a medida que a dor aumentava.

Viu o mar, a frente, diante há um grande despenhadeiro. Ionia se localizava em uma ilha montanhosa, de modo que despenhadeiros como aquele eram comuns. Seria difícil voltar. Não importava. Se a dor do ácido pudesse ser amenizada pelo mar, valia a pena. Fechou os olhos e pulou.

*********

Ainda estava dentro da igreja quando ela explodiu. Fazia muito tempo que não precisava da magia de combate. Mas não podia abrir mão do conhecimento noxiano, naquele momento. Sequer teve tempo de pensar. O movimento foi quase automático. Contraiu as pernas, e usou o Impulso, técnica que lhe permitia dar um salto sobre-humano, literalmente voando vários metros para frente.

A queda no asfalto não foi agradável. Ralou bastante o rosto, e bateu o ombro com tudo, enquanto a construção demolia atrás de li. Mas no segundo seguinte, já estava em pé novamente, limpando o sangue com as costas das mãos, e uma fúria assassina no olhar.

— Ahhhhh, menina! Você não faz a menor ideia de com quem está lidando! - Vociferou para o ar, ensandecida.

Sua vida em Piltover não havia começado bem. Mas, se Jinx achava que podia tentar matá-la e sair impune, estava enganada.

Muito enganada.