HERMIONE

Rony se adiantou, com um sorriso satisfeito no rosto, afastando uma das cadeiras da mesa de jantar, para que eu me sentasse.

– McGonagall – falei, deduzindo o agora óbvio – entendi.

– Ela me fez prometer que sairíamos daqui sem fazer alarde, mas então permitiu que viéssemos – ele deu de ombros, enquanto eu me sentava, balançando a cabeça com incredulidade e rindo.

Olhei ao redor, absorvendo aquele ambiente tão conhecido e hospitaleiro. Pela primeira vez em dias, me sentia completamente segura.

Voltei minha atenção para o preto, dando uma colherada no petit gateau, enquanto Rony se sentava, e colocando na boca. O sabor era delicioso.

Um sorriso risonho se abriu em meu rosto.

– Sorvete – olhei para Rony, rindo.

Ele baixou o olhar, fingindo timidez, numa expressão adoravelmente envergonhada.

– Não me lembra nada – ele desconversou, não segurando e também sorrindo, antes de apanhar a garrafa de champanhe – servida?

Assenti, erguendo a taça, enquanto Rony a enchia.

– Essa era a surpresa? – perguntei, curiosa.

Rony me encarou, parecendo tenso.

– De todos os lugares... achei que precisávamos de um tempo só para nós – ele deu uma colherada no próprio prato, pensativo – sabe como é. Quando a poeira baixar, a chance de escaparmos do assédio do povo é mínima – ele riu – todo o mundo vai querer saber o que aconteceu... e, bom, adeus sossego, não é?

– Tem razão – dei um gole no champanhe, que estava tão bom quanto o petit gateau. Senti um arrepio agradável quando o líquido desceu por minha garganta.

– Você quer... – Rony mordeu o lábio – conversar... sobre o que aconteceu?

Olhei para o prato, indecisa.

Queria muito falar com Rony... desabafar. Ele não demonstrara curiosidade sobre descobrir porque eu não havia morrido ao ser atingida pela Maldição da Morte de Helen, ou talvez temesse que eu não quisesse lembrar.

No entanto, eu achei que, como Rony dissera, o mundo inteiro procuraria saber de tudo. E, tal como no fim de nosso sétimo ano, talvez fosse justo que eu me abrisse mais tarde, tanto para ele como para os demais bruxos. E a última coisa que eu queria ali, me sentindo tão bem, era relembrar coisas que perturbariam a minha mente até o dia seguinte.

– Não... – balancei a cabeça, erguendo a colher – tirando uma curiosidade... o que houve com Yara?

– Ah, sim... a Hawkes? – Rony lambeu a colher, revirando os olhos, o que em fez rir – adivinha só o que descobriram... a garota estava dominada pela Maldição Imperius.

Franzi o cenho. Então Yara não havia nos traído de verdade?

E eu achando que ela era uma cobra traidora... coitada dela.

– Está bem. Chocou-me agora.

– Bem, essa foi a intenção da Oliviene, pelo jeito – Rony brincou – Yara está viva e bem, mas, segundo Joseph, está sofrendo uma intimidação tremenda dos colegas.

– Que sorte – arrepiei-me. Estar dominado pela Maldição devia ser horrível.

Ficamos alguns minutos em silêncio, terminando de comer os petit gateaus.

Eu estava me sentindo bem, e irremediavelmente feliz.

Talvez fosse estar num lugar tão familiar e aconchegante, palco de tantos momentos maravilhosos. Ou talvez fosse a desinibição que a leve dose de álcool me fornecia, ou a perspectiva de que tudo finalmente ficaria bem. Ou, o mais provável, fosse a presença viva e tão tranquilizante de Rony ao meu lado.

Podia, finalmente, me esquecer de todas as trevas e angústias que me atormentavam. Não existia mais nada no mundo, exceto nós dois.

Mas estava começando a achar aquela distância entre nós insuportavelmente dolorosa.

E vi Rony se espantar, de um modo humorado, quando arrastei minha cadeira até a dele.

Levantei a taça em sua direção.

– Bem – brindei-o, sorrindo – á nossa futura fama.

Rony franziu a testa, rindo.

– E á falta de privacidade que essa droga vai trazer – ele bateu a taça na minha.

Terminei de tomar o champanhe, vendo Rony olhar para mim.

Estava me sentindo levemente tímida de vê-lo me encarando daquele jeito.

Não era o costumeiro olhar malicioso que Rony costumava me dar. Era profundo, admirado, como o de um jogador de Quadribol que estivesse finalmente vendo a Taça que tanto almejara.

Eu nunca ia me acostumar com aquilo... ver Rony me tratando como se eu fosse a última garota na face da terra. Era desconcertante... adoravelmente desconcertante.

Do nada, ele se levantou e inclinou a mão em minha direção.

– Vem cá.

Larguei a taça, confusa, segurando a mão de Rony.

– Rony... o que...?

Arfei, surpresa, quando ele me prendeu num abraço surpreendentemente doce.

– Tem ideia do como fiquei preocupado com você? – ele choramingou, afagando meus cabelos.

– Acho que sim – respondi, derretida com aquela demonstração de angústia e carinho. Acariciei seu rosto – vai ficar tudo bem agora, Rony. Eu sei que vai. Acabou.

Rony voltou a me olhar. Estremeci levemente ao ver a agonia pulsante em seus olhos.

– Os últimos dois dias pareciam um sonho. Tive tanto medo de acordar e você estar... se você tivesse... – ele guinchou – Hermione, se você tivesse... eu...

Aflita, tentando dissipar aqueles fantasmas que ainda o aterrorizavam, impedi-o de continuar com um beijo.

A necessidade, na forma como Rony retribuiu, foi quase palpável. Ofeguei baixinho quando seus braços voltaram a me segurar. Seus lábios, colados aos meus, pareciam lutar para extravasar toda a angústia e medo que haviam se acumulado em nós dois.

Abracei seu pescoço, implorando para eliminar uma distância que não existia.

Eu simplesmente precisava constatar que ele estava ali. Reconhecer cada centímetro de sua pele, sentir a segurança de seu corpo no meu. Minhas mãos abarcavam seu cabelo, como se quisessem garantir que Rony nunca escaparia.

Inclinamo-nos, ainda abraçados, até sentirmos a maciez do colchão atrás de nós.

Meu coração disparava, quase audível, enquanto sentia Rony acima de mim. Quando o ar finalmente nos faltou, ele simplesmente desceu o rosto para beijar meu pescoço. Minhas mãos abarcaram seus ombros, numa tentativa de suportar a onda de prazer e ternura que me inundavam.

Tentei me livrar da camiseta dele, que me impedia de sentir ainda mais a sua pele contra a minha. Como numa reação inconsciente, Rony desabotoou o vestido que eu usava, retirando-o suavemente por minhas pernas.

Ofegante, estremeci quando Rony distribuiu mais beijos pelo meu corpo, subindo até pousar a testa na minha.

– Ah, Hermione...

Sentia sua respiração arfante em minha pele, e o aroma de champanhe que ainda havia em sua língua.

Uma montanha de emoções pareceu desabar em mim. Tudo que sentira e aguentara durante aqueles meses aterradores parecia ter alimentado a necessidade de reafirmar a ligação entre nós, num único e atordoante ímpeto... o mesmo que parecia mover Rony agora.

Eu, naturalmente, ainda tinha um leve temor, quase irracional, do que poderia estar prestes a acontecer. E sentia que Rony estaria tão receoso quanto eu.

Porém, aquela necessidade falava mais alto do que qualquer medo.

Segurei suas mãos, postas ao meu redor, levando-as abaixo de mim.

Rony enrijeceu, reabrindo os olhos e parecendo espantado.

– Hermione... – ele fez menção de se afastar, mas eu segurei seu pulso.

– Rony... está tudo bem.

– Espere...- ele balançou a cabeça, parecendo amedrontado – não posso fazer isso.

– Não pode... ou não quer?

Rony balançou a cabeça, parecendo abalado.

– Não posso – a angústia varreu seu rosto, me deixando abismada – não suporto nem a ideia... de te desapontar... ou te machucar.

O espanto e o carinho que se espalharam dentro de mim foram quase sufocantes.

Todo aquele tempo... e ele sempre estava preocupado apenas comigo.

Não podia tirar a razão dele. Era realmente assustador. Eu mal sabia se estava pronta para aquilo.

Mas, talvez, fosse exatamente por aquele motivo que só podia ser feito se duas pessoas enfrentassem juntas.

– Você não vai fazer nenhuma das duas coisas, Rony.

– Como sabe? – o desafio em sua voz quase não foi percebido, tamanha sua ansiedade.

– Por que eu confio em você – sorri – nunca ficaria desapontada.

Rony voltou a negar com a cabeça, mas e segurei seu rosto, voltando a beija-lo.

Ainda hesitante, Rony me abraçou, acariciando minhas costas e pousando a cabeça em meu ombro.

Finalmente, percebi a fortaleza, que ele mantivera por tanto tempo intacta, enfim começando a se desfazer.

E percebi que a necessidade em mim era quase tão forte quanto a dele.

– Não está com medo? – admito que estremeci quando ele desafivelou o fecho em minhas costas.

– Acho que faz parte- suspirei, sentindo um arrepio quase indecente se estender dali para o restante de meu corpo.

Provavelmente, o ímpeto que nos guiava impedia que a vergonha nos inundasse.

E, mesmo assim, enquanto eu corava, completamente arfante, Rony se negou a focar tempo demais no que fazia, apenas olhando para meu rosto, enquanto tirava o que restava de minhas roupas.

Meu corpo estava tão sensível e quente quanto se estivesse em minha forma Wicca. Mas aquilo que me consumia era milhões de vezes mais volátil e poderoso do que qualquer conjuração.

O calor e as carícias de Rony inundavam minha pele como fogo, atingido cada uma de minhas terminações nervosas. A sincronia entre nós era palpitante, quase ameaçadora.

O pouco medo que eu ainda insistia em ter se desfez quando o encarei.

Embora algo muito mais irracional o guiasse, podia ver a preocupação desesperadora em seus olhos, e aquilo destruiu qualquer receio que eu ainda tivesse.

Se eu confiaria àquele garoto minha própria vida, por que não confiava nele agora?

Eu me sentia amada e protegida. E sabia que ninguém teria tanto respeito e carinho por mim como aquele rapaz que me olhava de modo tão atormentado.

Agora eu tinha certeza. Eu estava pronta para ama-lo de um modo muito mais profundo do que qualquer forma que eu já houvesse amado.

– Se... – ouvi-o sussurrar, tenso – se eu fizer alguma coisa errada... você me avisa?

Assenti, sentindo meus olhos ficarem úmidos de ternura. Como ele inda conseguia suprimir a própria vontade em detrimento da minha?

Segurei um pequeno soluço de carinho. Rony realmente não existia.

Abracei-o, pousando o rosto ao lado do dele.

– Está tudo bem, Rony.

Fechei os olhos, finalmente expurgando de minha mente todos os pensamentos que não dissessem respeito a nós dois.

Rony se inclinou, parecendo finalmente conformado, plantando em minha boca um beijo adoravelmente carinhoso.

Todas as fantasias aterrorizantes que eu tivera sobre aquele momento se desfizeram, assim que ele enlaçou meu corpo suavemente, antes de tudo finalmente acontecer.

Ainda assim, guinchei de surpresa, agarrando-me aos ombros de Rony, quando senti uma fisgada dolorida se espalhar por meu corpo.

Rony enrijeceu, voltando a me olhar, ofegante. Medo, choque e algo assustadoramente volátil se misturaram em sua expressão.

– Tudo bem...? – Rony indagou, em pânico.

Balancei a cabeça, me acostumando lentamente com a sensação. Arfei levemente, absorvendo o prazer estranho e pungente que deu lugar á dor.

– Calma... tudo bem... – ofeguei.

– Hermione... – sua voz, baixa e suplicante, pareceu enfim me tranquilizar.

Ainda trêmula com o misto de sensações atordoantes em meu corpo, voltei a beija-lo.

–Eu sei... eu sei – sussurrei.

– Ah, Hermione... – ele choramingou como um animal ferido, me colando impossivelmente ainda mais perto de seu corpo.

Eu podia descrever aquele momento das mais variadas formas, explorando um misto de estereótipos maliciosos ou falsos. Mas eu não pude me enganar.

Ali, unidos numa só carne, estávamos reafirmando tudo que já sabíamos existir. Se ainda havia alguma dúvida que eu era dele e que Rony era meu, estávamos acabando de destruir.

E foi natural. Foi doce, e tão bonito. Mil vezes mais perfeito do que eu sequer havia imaginado.

O prazer era só um bônus para as ondas maravilhosamente sufocantes de amor e segurança que nos engolfavam. Meus medos pareciam tão fúteis agora, sentindo toda a ternura nas carícias de Rony, entrelaçados intrinsecamente tento em corpo quanto em alma, usufruindo a certeza absoluta e fantástica do nosso amor.

Foi com este pensamento simples e extraordinário que senti o vértice da Terra parecer mudar de lugar ao meu redor, nos levando a uma dimensão que transcendia qualquer espaço físico. Podia estar no mundo terreno, mas sentia-me na mais elevada nuvem dos céus, completamente livre e feliz.

Eu suplicava, em meu coração, que Rony estivesse partilhando daquela avassaladora sensação.

E foi com um delírio maravilhado que absorvi seu abraço carinhoso, enquanto reabria os olhos e fitava os meus. O mar neles ameaçava me engolfar, tão turbulento quanto enfeitiçador, e percebi que, sim, ele também sentira.

– Hermione... – Rony pousou a testa na minha, arquejante, recitando meu nome como uma oração. Sentia o assombro e a felicidade dele no modo como voltou a me abraçar.

Exausta de êxtase, senti Rony se erguer, deitando-se ao meu lado e puxando meu corpo para um abraço, sem falar nada.

Não que fosse preciso. Tudo que ele queria dizer estava nas esferas ainda agitadas de seu olhar.

Queria dizer para Rony tudo que se passava em minha cabeça. Tudo que nossos corpos ainda não haviam dito com tanto fervor.

Mas seu estava tão cansada, tão maravilhada e tão feliz, que decidi que qualquer coisa que fosse dita agora estragaria aquele momento sublime, o qual eu nem imaginara - depois de tantos infortúnios - que viria a acontecer.

Aceitando o conforto de seus braços, dei-lhe um ultimo beijo, afagando seu rosto, antes de me aninhar em seu peito.

Fatigada de um jeito novo e satisfatório, adormeci, embalada por aquela noite inesquecível e pela presença confortante do garoto que eu tanto amava.