A Escolhida
Trinta e dois
Haruno Sakura
Era ascendente: seis de novembro de 1523, Quinta-feira.
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Conheço a personalidade do Sasuke. Gosto do jeito que ele é, e jamais iria pensar em "mudar o seu jeito". Seria tolice. Qualquer pessoa que soubesse que há algo entre nós ficaria decepcionada pelas atitudes dele. Exceto por mim. Sei que ele tem dado a mim uma devida atenção, mesmo que ninguém perceba isso. É a forma que ele demonstra. E eu gosto dela assim. E é exatamente o que está acontecendo nesse momento.
Mais cedo, um guarda havia aparecido no meu quarto dizendo que a sala da aula de leitura somente hoje seria em um local diferente. Achei peculiar, tenho de admitir, mas não me importei muito. Quando cheguei lá estava Sasuke. Disse que o professor estaria ocupado hoje. Tolice. Apenas pelo seu olhar, desviando dos meus, demonstra que é apenas uma desculpa, e que ele não conseguira admitir. Afinal, se ele não pudesse vir mesmo, por que mudamos a sala?
Sua didática é boa, como sempre — embora ainda fosse um pouco mais desconectada que a do professor usual. Mas gosto de sua companhia e a diferença não altera no meu aprendizado. Assim que ele termina de me ensinar, observo um sorriso contido em seus lábios.
— Você melhorou muito.
— Tenho ótimos professores. — fiz questão de exaltar ambos, o que não passa despercebido por Sasuke.
Ele parece realmente orgulhoso de mim, e esse sentimento me contagia. Dizem que é muito mais lento aprender a ler, mas já consigo entender a maioria das escrituras. Ainda não tenho uma velocidade de leitura boa, mas já posso ler algo, ainda que demore um pouco.
— Acho que o que é ótimo é a aluna. — ele diz, pensativo. — Você aprende rápido demais.
— Obrigada. — não sei bem o que dizer, por ficar sem graça.
Não tenho o costume de ser elogiada. Assim que saímos da sala, como combinamos antes de começar a aula, vamos caminhar um pouco juntos. Mais uma ação diferenciada que percebo em Sasuke-kun: ele, diferente das outras garotas que anda de braços e entrelaçados, anda comigo de mãos dadas. Sinto sua mão quente e acolhedora. Além de macia, diferente da minha, que é calejada pelo trabalho no distrito.
— Como você está? — pergunto, mas não pelo protocolo de socialização; eu realmente quero saber o seu bem estar.
— Cansado. — Sasuke-kun é sincero comigo e mesmo que eu prefira que não esteja exausto, fico feliz de não omitir o seu estado.
— Imagino a quantidade de burocracias deves passar por dia. — comento em tom neutro. — Falando nisso... Eu posso pegar emprestado algum livro do acervo real?
Sasuke-kun me olha um pouco interrogativo. Ele pondera por pouquíssimo tempo, e pela sua expressão, duvido que seja uma resposta que me desagrade muito.
— Sim. Bem, depende de qual livro... Alguns são restritos à família real, mas o restante está a disposição de vocês.
— Estava pensando em ler livros de filosofia, sociologia, política... — respondo pensativa. — Esses não são proibidos, certo?
— Claro que não. — seu olhar é de surpresa. — Sakura, você... Realmente está disposta a fazer isso?
Sei bem o que ele me indaga. É sobre aprender a ser uma pessoa mais intelectual, para caso algum dia eu seja a escolhida tenha um conhecimento que ajude a governar o país. Não é impossível; reis, rainhas e governantes no geral são apenas pessoas, no fim das contas. Tenho consciência de que não é um caminho fácil, contudo. Aliás, o que é fácil nessa vida mesmo?
— Sim. Eu tenho certeza.
Algo no olhar de Sasuke-kun fica diferente. Acho que se trata da intensidade vinda dos seus olhos. Como se me visse agora de uma forma diferente. E eu gosto disso. Porque sei que ele está me reconhecendo como uma pessoa capaz. Ao mesmo tempo, não deixo de ficar bastante envergonhada. Sinto as minhas bochechas queimarem, mas não desvio o forte olhar.
— Eu realmente aprecio tudo o que está fazendo. — claro, não era só por ele ou por nós.
É por todos do meu distrito: pelos rebeldes como Konan, por Hinata e todas as pessoas, no geral.
Sasuke-kun sorri para mim. Um sorriso não tão largo — isso não é típico dele — mas um sorriso de lado, genuíno. Ele leva as suas mãos até a minha bochecha e as acaricia de forma leve e cuidadosa. O meu rosto esquenta um pouco mais e a minha barriga embrulha, sentindo a típica sensação de borboletas no estômago. Acho que entendi o que significa estar apaixonada agora.
— Sasuke-kun... — sussurro.
Tenho muitas coisas a dizer a ele. Agradecimentos, no geral. Obrigada por fazer parte da minha vida. Por me ensinar a ler, me proporcionar momentos extraordinários, dar a chance que eu preciso para ser o que eu gostaria, por ser meu amigo e por ter me feito sentir o que é gostar de alguém de verdade. Talvez isso tudo não seja o suficiente, palavras não podem preencher essa sensação de gratidão, felicidade e afeto. E é por esse motivo que levo os meus lábios ao dele. E quando nos beijamos, sei que estamos conectados de alguma forma. Sinto que ele entende o que eu sinto e o que eu quero dizer a ele.
Quando paramos de nos beijar, continuo muito próxima a ele. Coloco os meus braços em torno dele, o abraçando, e sinto a sua presença e o seu cheiro. Sasuke-kun é um pouco mais contido que eu, mas ele retribui o abraço e ficamos assim por um bom tempo.
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— Hoje foi um bom dia. — afirmo, feliz, para Hinata.
Ela ergue a sobrancelha, intrigada, mas não me pergunta diretamente o motivo. Talvez por sua irmã estar ao seu lado. Elas estavam engatando uma conversa normal, até que a mais velha havia me visto e chamado. Era estranho ver Hanabi socializando como uma pessoa normal. Verdade seja dita, às vezes me esqueço que ela é apenas um ser humano.
— Fico feliz por ti, Sakura-san.
— Falas como uma garota apaixonada. — zomba Hanabi. — Paixão só dá dor, arrependimento e amargura.
Não tenho coragem para retrucar. É verdade, afinal de contas. Ao menos a primeira parte. Fico imaginando o porquê dessa resposta negativa sem me preocupar muito com ela. Já Hinata se importa e não parece gostar muito da atitude da irmã. É uma das raras vezes que a vejo se impondo sem gaguejar ou corar.
— Hanabi-neesama, não seja tão dura. Um dia, quando se apaixonar, verás que não é bem assim.
O sorriso zombeteiro fica um pouco mais sombrio, e ela solta uma risada seca, mas ainda zombeteira.
— Hah, eu duvido muito.
— Tem tantos homens em Konoha... Ou até mesmo no país do arroz. — quando Hinata vê meu olhar inquisidor, ela explica. — Nossa família vem de lá. Meu tio avô é o governante.
— Não tenho interesse em homens. — Hanabi descarta a possibilidade.
Claro, pelo sorriso maldoso, o interesse é apenas em infernizar a vida alheia. E talvez a da própria família, já que disse que gostaria de destruir os Hyuga. Dito isso, Hinata ainda parece ser bastante protegida, o que fico aliviada.
Vendo que a conversa fica mais pessoal, falando sobre amores, decido terminar o meu dia. Despeço-me das duas rapidamente e vou até meu quarto. Amanhã poderia ser um longo dia, escolhendo livros para ler. Pela primeira vez.
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