A Escolhida

Capítulo 5 - Segredos revelados


Sarah não conseguia acreditar no que acabara de ouvir. "Ele está me perseguindo?" começou a se perguntar enquanto encarava Nicholas, como se fosse fugir a qualquer momento.



– Eu sei que isso parece muito estranho, mas tenho uma explicação. - disse ele, tentando tocá-la no rosto.

Sarah desviou o rosto e começou a entrelaçar os dedos novamente.

– Você faz isso quando está nervosa ou aflita.



– O que? - perguntou Sarah.

– Entrelaça os dedos... Você faz isso para se acalmar.

Sarah assentiu e olhou para ele, exigindo respostas para aquela noite. Realmente é bem estranho, Nicholas sair, tarde da madrugada com chuva, para vigiar a casa de Sarah e depois entrar em um cemitério. Isso já era demais.

Nicholas abaixou a cabeça e ficou olhando para seus pés, começou a meche-los de um lado para o outro. Depois de alguns minutos sem dizer nada, ele a fitou e em meio á lágrimas percorrendo lhe o rosto, disse:

– Minha mãe morreu há dois anos.

Sarah ficou de queixo caído. Ela já havia sentindo a morte do pai, e acreditava que, se acontecesse novamente, ela não choraria. Seu pai morrera quando Sarah fez três anos, na sua própria festa de aniversário, seu pai se atrasou no trabalho e em razão da agitação de chegar a tempo no aniversário de sua filha, sofreu um acidente de carro. Sarah não se lembrava direito do que houve depois, sua mãe ficou muito resentida após o o acidente e por isso, se mudou para outra cidade, só agora, depois de quase treze anos, ela tomou coragem para retornar á cidade natal de Sarah. A mãe dela acredita que, por essa razão, Sarah se tornou fechada e pouco falante, passou a não emitir suas emoções e deixou de transparecer suas fraquezas, fazendo de tudo para ninguém notá-la.

– Sinto muito. - disse ela.

Nicholas a envolveu em um abraço e, com a cabeça pousada em seu ombro, soluçando, disse:

– Ela morreu de câncer no pulmão tarde da madrugada, não sei a hora exata, mas ontem fez exatos dois anos em que ela se foi. - afirmou ele, apertando-a um pouco mais, já havia parado de chorar. - Ela morreu enquanto me via dormir, sempre fazia isso, se sentia mais segura quando ficava perto de mim e Dennis. Por isso, desde o ano passado, eu vou ao cemitério no final da rua, onde ela está enterrada, e a vejo dormir, assim como ela fazia comigo. É um tipo de retribuição á todo trabalho que ela teve. - ele a soltou devagar.

– É um gesto bonito, você vai todas as noites?

Nicholas negou balançando a cabeça.

– Vou uma vez por ano, mas Dennis nunca vai, diz que se sente mal por ir. - Nicholas suspirou e retirou uma mexa da franja de seu rosto. - Ontem, eu só fiquei fitando sua casa para saber se estava acordada, mas não vi nada.

– Eu estava, mas quando saí, já tinha perdido você de vista.

– Tudo bem. - concordou ele, estendendo o braço. - Vamos para a aula, já estamos atrasados.

A única aula em que Sarah não morria de tédio era a de Filosofia. O professor era um velho cafona, mas interessante. Os alunos o chamava de Pança, devido á sua barriga de chopp, bem, ele até que era legal. Sarah gostava de como ele via a vida de um jeito não científico, acreditava que, a resposta para tudo estava dentro de nós, inclusive a razão de nossa existência. Isso sempre fazia Sarah pensar, ela nunca havia feito nada de glorioso e para se orgulhar, então, para quê ela havia nascido? Essa pergunta a atormentava todos os dias. Sr. Broomberg, o professor de Filosofia, costumava dizer que só descobriríamos o sentindo de nossa vida em nossa morte, mas se isso fosse verdade, não faria a menor diferença, afinal, nós já estaríamos mortos mesmo, não existiria nada que a gente poderia fazer para mudar isso. Então, aos olhos de Sarah, a vida era completamente inútil, já que só se pode interpretá-la ao final da mesma. A vida faz você ficar dando voltas e voltas nela, e em toda nova volta, um mistério é revelado e assim, surge outro em seu lugar, talvez essa seja a graça dela. Sarah começou a achar o quão estranho era o fato de ficar pensando na razão da vida, independente de conseguir ou não descobrir isso, ela teria que vivê-la. Então, Sarah resolveu desviar sua atenção e escolheu o cordão de sua mãe que balançava em seu pescoço. Aquele cordão era a prova de que alguém havia realmente se importado com ela, a amado, pelo menos , uma pessoa.

Sarah começou a balançar o cordão entre os dedos, mas parou quando viu Nic fitando-a. Passaram-se alguns minutos e depois de vários momentos encarando Nicholas também, Sarah desistiu e começou a desenhar em seu caderno. Começou desenhando uma espécie de pássaro em um galho de uma imensa árvore, mas o desenho, aos poucos, foi se tornando rabiscos pretos que nada demonstravam. O sinal já havia tocado alguns minutos atrás. Sarah levantou-se da carteira e apanhou sua mochila.

– Sabe, você poderia parar de me encarar assim.- ela disse, escondendo o colar debaixo da blusa.

– Eu até poderia, mas não quero. - confessou-o abrindo um largo sorriso. - E esse colar, por que o escondeu?

– Sempre querendo saber de tudo, não é mesmo? - Sarah ergueu os olhos para Nic. - Foi de minha avó que passou para minha mãe e que passou para mim. Minha mãe me obriga a usá-lo, ela diz que é uma relíquia preciosa. - acrescentou.

– Então, porque o esconde? - perguntou Nicholas, confuso.

– Eu só não gosto dele.

Sarah fechou seu caderno e o segurou por baixo dos braços. Nicholas ficou em silêncio por alguns instantes e depois finalizou:

– Te levo em casa.

Eles desceram as escadarias do prédio superior e alcançaram o pátio. Estava frio, como de costume, mas o dia estava claro. Sarah remexeu suas luvas pretas e soltou seus cabelos que estavam presos a um rabo de cavalo, deixando caírem sobre seus ombros. Sarah costumava usar bastante preto e cores escuras, mas ela era linda, incrivelmente linda e misteriosa. Nicholas passou o braço direito por cima de seus ombros e desceu até a cintura, a apertando contra o corpo dele, continuaram a andar até o portão do colégio.

– Achei que precisava disso. - disse ele rindo á toa.

Normalmente, Sarah se irritaria com isso, mas dessa vez não, na verdade ela havia gostado e isso a preocupava. Olhou de relance para Nic e depois dirigiu seu olhar para baixo. E se ela estivesse apaixonada por ele? Não, não poderia ser, logo a Sarah apaixonada? Isso era como uma missão impossível. Mas ela não conseguia negar que sentia alguma coisa diferente por ele.

Nicholas a soltou e se encostou em uma árvore próxima. Sarah ficou em sua frente, Nic segurou a mão dela e eles começaram a conversar.

– Posso ver o desenho que você fez durante a aula?

Ela negou com a cabeça. Nicholas fez uma careta e Sarah retrucou dizendo que isso não iria funcionar. Nic levantou os braços como se quisesse dizer "você venceu".

– Não conseguia decifrá-lo. - Sarah disse.

– Me deixe ver, posso te ajudar.

Sarah suspirou e abriu sua mochila para pegar o caderno, o entregou a ele e voltou a balançar seu cordão.

– O que era pra ser isto? - Nic perguntou.

– Um pássaro.

– Muito bem, posso ver as asas aqui... Mas se você virar de cabeça para baixo me lembra um portal. - ele disse, fuçando todo o desenho.

– Um portal? Você está louco, Nic.

Nicholas sorriu pra Sarah e riu.

– Você me chamou de Nic.

Sarah ignorou o que ele disse e pegou o caderno, fechou-o e guardou-a em sua mochila. Ela se virou para ir embora, mas Nicholas a puxou pela cintura e tascou um beijo com intensidade.

Sarah deu alguns passos para trás e começou a correr, com medo do que poderia acontecer com ela, dentro desse sentimento estranho que estava sentindo. Correu até seus joelhos doerem de tanto esforço, parou quando chegou á sua casa e desabou no quintal mesmo.

Estava cansada e confusa, começara a chorar ali mesmo, ficou parada atordoada com essas emoções, até que uma sensação ruim de solidão e desespero começou a brotar dentro dela, alguma forma de força interna a machucava por dentro, uma dor no peito a invadiu, lágrimas continuavam escorrendo de sua face e a queimavam quando tocavam lhe o rosto. Ela tentou gritar de dor, mas nenhum tom saiu de sua boca, gritou o nome de Nicholas e de sua mãe, mas em nada adiantou. Sarah percorreu os olhos até o céu e percebeu que inúmeras nuvens negras iam se aproximando mais e mais, ela desejou sair dali, não se importava como, só queria ir embora. Suas pernas e braços estavam travados, seu corpo suava e tremia de medo, tristeza, ódio, solidão e desespero, tudo ao mesmo tempo. O céu se fechou todo, as nuvens o havia dominado. Sarah se sentia fraca, parecia que seu corpo estava morrendo e logo deixaria de existir. A única coisa que restou para ela fazer foi fechar os olhos e esperar que tudo ficasse bem. Foi o que ela fez.