A Bibliotecária

Capítulo 1 - Um Nome


Calmamente, ela virava as páginas, sem nem mesmo um único ruído. Por mais que aparentasse tranqüilidade, seus olhos perolados transmitiamtoda a ansiedade que ela sentia agora. Ela queria saber o que iria acontecer, obviamente. Ah! Quem diria que aquele livro, que não aparentava nada em especial poderia ser tão interessante. Seu coração batia cada vez mais rápido, á medida que ela se aproximava do clímax daquele capítulo. Ela mal conseguia se conter, ao avançar nas letras negras no papel branco. Tantas emoções eram descritas ali, emoções que ela só conhecia graças aos livros, seus insubstituíveis companheiros.

Sentada na pequena mesa destinada as bibliotecárias, a garota lia incessantemente. Ao lado dela, duas pilhas de livros, que ultrapassavam a altura da sua cabeça. A mais alta, era dos livros que ela já tinha ido, naquela semana, e a outra eram os livros que ela ainda pretendia ler, o mais rápido possível. Desde o dia em que se candidatou ao trabalho de meio período na biblioteca da escola, ela já tinha lido praticamente todos os livros dali, e todas as semanas chegavam novos livros, que ela logo se antecipava em ler. Os mais antigos, que iriam ser destruídos, ela levava para casa, reformava, e os mantinha na sua pequena biblioteca pessoal, jamais permitiria a destruição de tantas histórias, afinal, todo livro tem algo que quer passar a frente, e ninguém tinha o direito de acabar com isso.

Ela era sozinha, não tinha amigos, mas não se sentia solitária. Ela tinha seus livros. Não precisava de pessoas para preencher o vazio no seu coração, não precisava das experiênciasda vida para ser feliz. Já havia vivido muitas existências na pele de inúmeros personagens. Já conhecia tudo que a vida tinha para proporcionar. Não era necessário mais do que isso.

Ela estava feliz.

Não.

Ela estava satisfeita.

Conformada, talvez.

-

— Com licença...– uma polida voz masculina pode ser ouvida. A Bibliotecária não se mexeu. Havia ouvido o chamado, mas não conseguia interromper a leitura, estava na melhor parte...

— C-com licença... – ele insistiu, um pouco incerto da saúde da estudante á sua frente.

— Como posso ajudar? – ela finalmente respondeu, com a voz fraca, e um imperceptível suspiro de descontentamento. Levantou a cabeça, fitando com desinteresse aquele que havia interrompido a sua leitura. Olhando assim de perto, o garoto poderia ser uma reprodução exata do protagonista da história que ela andara lendo. Os olhos azuis, assim como os cabelos escuros e lisos que envolviam o rosto pálido. A expressão calma, ainda que muito vívida.

— Eu só quero devolver esse livro – ele estendeu a mão com o objeto, que ela pegou prontamente.

— Hai. É só assinar aqui, Arkadius – ela levou a mão à boca rapidamente ao notar o que havia feito. Sem pensar, chamou o garoto a sua frente pelo nome do personagem do livro.

“Idiota. Idiota! Ele deve pensar que eu sou idiota! Mas é claro, é exatamente isso que eu sou... Aaanh o que eu faço?!”

Por sorte o garoto estava falando no celular e não havia prestado atenção no que ela dissera. A bibliotecária suspirou aliviada.

— Certo, eu vou com você depois. Me encontra lá na frente, OK? O que? Eu to saindo da biblioteca agora, é bem perto. Não faz nenhuma besteira Naruto, espera eu chegar aí! Aah! Idiota!

Ele assinou o papel apressado e saiu correndo.

— Mashiro Moritaka – ela recitava inconscientemente enquanto terminava de preencher a ficha de devolução – certo... acho que é isso por hoje... tenho que fechar.

Ela guardou o livro que estava lendo na bolsa e se preparou para encerrar as atividades da biblioteca. Fechou todas as portas e janelas, e foi guardando os livros que estavam espalhados nos seus respectivos lugares. Já havia decorado todos os lugares de cada um deles, já não precisava andar com o mapa embaixo do nariz.

Naruto...

Estranhamente, aquele nome ecoava em seus pensamentos.

Pegou uma caneta o bolso do uniforme e anotou no pequeno bloquinho que sempre levava consigo aquela palavra.

— Naruto. É um bom nome, eu gosto... talvez eu o use quando escrever meu romance – ela falou sozinha, e suas palavras ecoaram na grande sala vazia. Falar sozinha era apenas um dos hábitos que ela adquirira depois de tanto tempo sem contato exterior, ela já estava completamente acostumada a não ter respostas.

Depois de terminar a arrumação, ela juntou suas coisas e rumou à saída.

O céu rosado e a luz tênue indicavam a iminente chegada da noite, porém para ela, isso já não tinha mais nenhum significado.

Apenas mais um dia comum que se encerrava.

Sua vida já não se passava mais em dias, a passagem do tempo era insignificante. A vida da pequena bibliotecária era contada em páginas. Em capítulos.

E nada mais importava.