A Bella E A Fera

2ª Fase: Capítulo 3


A batalha estava acontecendo.

Edward e Jasper estavam em algum lugar no fundo do quintal. Eu sabia que tinha como obrigação ajudá-lo, e que me preocupar com cada detalhe seria como dar pontos de graça ao meu oponente. Mas eu tinha minha irmã nos braços, e precisava colocá-la dentro da barreira para que ficasse protegida. Seria minha obrigação ficar atenta a qualquer tipo de acontecimento.

Meu coração batia a mil. Nessie estava com os braços em volta de meu pescoço e nossos cabelos ondulavam no ar junto ao vento. Tentei ser o mais rápida possível no gesto de me agachar e dar uma última olhada para o seu rosto. Finalmente a despedida. Eu odiava ter que dizer adeus.

Ah, aqueles olhos estavam me fitando. Senti a dor eminente em meu peito e tive que segurar as lágrimas que ameaçavam vir. Delicadamente, Nessie pousou sua mãozinha em minha bochecha e instantaneamente me encolhi com o toque.

– Não desista. – ela disse.

– Jamais. – prometi, colocando minha mão por cima da dela em despedida.

Quando percebi já era tarde demais. Meus olhos ficaram embaçados e não demorou muito para que meu rosto ficasse encharcado. Pisquei o mais forte que consegui, em uma tentativa inútil de expulsar o resto das lágrimas.

E quando abri os olhos novamente, inesperadamente encontrei Edward parado na minha frente. O toque de minha irmã se tornou inexistente, como se nunca tivesse acontecido. E ela já não estava mais em meus braços.

E lá estava eu: ajoelhada no gramado. Fraca. Fragilizada e inútil.

Edward estava de pé, segurando uma arma prateada apontada diretamente para minha cabeça.

Seus olhos dourados denunciavam que a Fera estava presente, assim como o sorriso diabólico estampado no rosto. Mesmo naquele instante, senti todas as emoções passarem por meu corpo. Todas traiçoeiras. Senti-me enjoada com a verdade: não importava qual fosse o estado de Edward, eu sempre o amaria e continuaria amando-o até minha morte.

Foi naquele exato momento que escutei o barulho ensurdecedor da arma. E em seguida, a dor misturada com a decepção.

Abri meus olhos.

Rapidamente, me sentei na cama. Minha respiração estava desenfreada. Pousei o dorso da minha mão na testa e fui surpreendida com uma quantidade exagerada de suor. Minha regata estava colocada no corpo, assim como o short.

Está tudo bem, Bella. Você ainda está na cabana, em um quarto que não é exatamente seu. Mas está segura. Garanti a mim mesma em pensamentos, sendo capaz de enxergar cada canto do quarto mesmo na escuridão.

Sorrateiramente, levantei-me da cama e meus pés pousaram em cima dos trapos que um dia foi um lindo vestido. Eu não estava com a menor vontade de me agachar e juntar, então o ignorei completamente. Fui em direção de minha mochila que estava caída no chão de madeira. Agachei-me, trazendo-a para o meu colo. Ao abrir o zíper, procurei desesperada por um prendedor de cabelo. Quando finalmente o achei no meio dos utensílios, amarrei um bom maço de cabelos em um rabo de cavalo que caiu praticamente em minha cintura. Com minha missão em procurar meu suposto parceiro eterno e minha irmã, dar uma parada no cabeleireiro era uma opção desclassificada.

Joguei a mochila no chão e saí do quarto. No outro cômodo – que aparentava ser uma sala -, encontrei Cory com a cabeça caída para frente, perdido em profundo sono. Ele continuava amarrado na cadeira. No sofá posicionado no canto da parede, estava Emmett. O peito estufado subia e descia em movimentos lentos. Suas mãos estavam por cima de uma arma.

Decidi que a melhor opção seria tomar um ar. Era a única coisa que realmente me acalmava quando eu tinha aquele tipo de pesadelo. Tomando todo o cuidado possível para não acordar Emmett, atravessei a sala nas pontas dos pés indo em direção à porta. Ao chegar lá, rapidamente girei a maçaneta e saí, torcendo para que a madeira não rangesse. Fiquei satisfeita quando isso não aconteceu.

Inspirei o ar puro que estava a minha volta e fechei os olhos, tentando controlar meus batimentos cardíacos que continuavam desenfreados. Não ouvi o barulho de nada por perto. Ou melhor, nenhum barulho suspeito por perto. Desde que eu havia herdado a suposta tatuagem das rosas, minha audição tinha ficado incrivelmente aguçada. Mesmo parada em frente à cabana, eu era capaz de ouvir a respiração de uma coruja por perto. Era lenta, como se estivesse sendo cautelosa na maioria do tempo. Pelo cheiro salgado, havia uma lagoa por perto, da qual estava rodeada por peixes procurando o que comer na superfície. Mais longe, um arranhar se manifestou entre as folhas, espalhando pedrinhas que deveriam estar no caminho. O andar do animal era sorrateiro, como se estivesse pronto para dar o bote. Só poderia ser um leão. Tum. Tum. Tum. Tum. Os batimentos cardíacos eram calmos. Sim. Estava procurando pela caça.

– Bella? – a voz de Alice se manifestou por de trás dos meus ombros.

Abri meus olhos e foquei minha atenção para o que estava acontecendo em minha volta.

– Alice. – me apressei em responder.

Ela se colocou ao meu lado e fitei seu rosto. Alice estava com os cabelos um tanto bagunçados, o que era surpreendente vindo da sua parte. Há meses atrás eu poderia jurar que ela acordava umas duas horas antes somente para se arrumar. Até mesmo suas roupas haviam mudado, optando sempre por cores neutras. A Alice de antigamente jamais aceitaria algo tão monótono vindo de seu guarda roupa. Rose era a única ali que se preocupava com a aparência. Certa vez, ela obrigou Alice a colocar uma roupa com um pouco de cor. Rosalie. Obrigando Alice a vestir algo mais... Vivo.

Mesmo de madrugada, Alice estava usando uma camisola preta. Era como se ela estivesse sempre vestida para o luto. Como se esperasse um velório.

Eu sabia que Alice estava despedaçada em mil pedaços. E não era a única.

A luz prateada da luz caía sob nossas cabeças, iluminando nossos rostos. Alice me fitou por alguns segundos e suspirou. Ela provavelmente estava se perguntando em que tipo de aberração a garota na sua frente havia se tornado. Eu já estava acostumada com aquele olhar questionador das pessoas a minha volta. Em seguida, sentou-se delicadamente em cima de algumas folhas espalhadas pelo chão. Fiz o mesmo.

O sereno nos cercava, fazendo com que a temperatura ficasse um tanto úmida e fria. Não me importei. Já Alice passou os braços em volta das pernas, ficando em posição fetal. O silêncio incômodo permaneceu por alguns segundos torturantes.

– Já sabe o que vai fazer? – ela perguntou.

– Não. – fui o mais sincera possível.

Eu realmente não sabia o que fazer. Afinal, segundo Cory, Edward sabia que eu estava a sua procura e mandará dois homens para me sequestrarem. Talvez até mesmo para me matarem. Ou Edward estava esperando a oportunidade para fazer isso pessoalmente.

Alice havia dito que era preciso apenas um beijo para que a Fera voltasse a adormecer. E finalmente Edward voltaria a ser meu. Mas isso seria por quanto tempo? Será que eu teria que viver todos os meus dias com medo que a Fera despertasse e acabasse com o meu conto de fadas? E Nessie? O que minha irmã tinha de tão importante? Além, é claro, de sua morte ser a chave para que eu e Edward vivêssemos felizes para sempre.

Droga. Às vezes, tudo parecia sem sentido. Eu tinha certeza que continuaria lutando até o fim, mas o problema era: existia felicidade no suposto fim?

Valeria à pena lutar se a batalha já estava perdida?

– Se Edward está por aqui, a melhor maneira de chegar até ele é por Cory. – concluí.

– Eu também estava pensando nisso. Cory deve ter alguma maneira de se comunicar com Edward novamente. Só temos que forçá-lo a fazer isso.

– E dizer para Edward que ele está comigo. E armar uma emboscada. – acompanhei o ritmo de Alice na construção do plano.

Cansada de ficar sem agir, levantei-me do chão. Era hora de interrogar Cory. Alice me acompanhou e inesperadamente passou os braços em volta dos meus ombros, aproximando-me de si para um abraço apertado. Retribuí o gesto. Foi estranho, para falar a verdade. Eu sabia que deveria sentir alguma coisa. Afeto, carinho, compreensão. Mas não.

Não senti nada.

Porém, foi o único gesto surpreendente que Alice realmente fez desde que saímos de Dark Roses. Ela estava perdida, e precisava de ajuda. Apesar de tudo, éramos amigas e passamos por muita coisa juntas. E algo me dizia que havia muito mais pelo o que passar.

Fiquei imobilizada e sem ação. Desde quando aquilo acontecia comigo?

Então, Alice se afastou e o olhou diretamente para mim.

– Não deixe as trevas te cercarem, Bella. Você é mais forte que isso. – murmurou, surpreendo-me com suas palavras.

Uni minhas sobrancelhas em sinal de confusão, exatamente como Edward fazia quando estava tentando compreender algo que não entrava em sua cabeça.

Meu coração se apertou e balancei a cabeça para os lados, em uma tentativa de afastar aqueles pensamentos de minha cabeça. Não era hora de tentar ser compreensiva, e sim de agir.

Dei as costas para Alice e abri a porta da cabana, sem me importar em fazer barulho ou não. Rosalie e Emmett acordariam a qualquer momento mesmo. Afinal, nosso prisioneiro faria muito barulho se fosse bancar uma de durão para cima de mim.

Atravessei o cômodo até ficar de frente para Cory que continuava adormecido na cadeira. Emmett levantou do sofá com um pulo. Rapidamente, passei os dedos em volta da corda que prendia o duende e com um único puxão, rompi o nó. O amontoado de corda caiu no chão. Bati com força no ombro de Cory, que levantou da cadeira com um pulo. Olhou confuso para os lados, até que sua atenção caiu para as mãos e finalmente se deu conta de que estava livre. Ergueu a cabeça, fuzilando-me. Além de careca, era baixinho.

– Está me dando liberdade? – perguntou com tom de desconfiança e um tanto sonolento.

Dei de ombros.

– Estou te dando a opção de escolha.

Cory pareceu confuso. Seus olhos desviavam de meu rosto para algo por de trás de meus ombros. Emmett, obviamente.

– Quem é que interrompeu meu sonho com o Rick Martin? – Rosalie se manifestou, bocejando. – Não consigo acreditar que aquele homem é gay.

Ignorei sua incomoda presença e avancei um passo em direção de Cory. Ele se afastou instantaneamente.

– O que você quer?

– Você tem como entrar em contato com Edward? – fui direto ao ponto.

Ele engoliu em seco.

– Não por telefone.

– Então como?

Cory ficou em silêncio. Ah, droga. Eu não queria ter que sujar minhas mãos com ele.

– Se eu te falar, minha vida vai estar condenada.

– Sua vida já está condenada, duende. – e acrescentei: - Se você não me contar, eu mesmo te mato. Se contar, Edward fará isso. E garanto, comigo será muito pior.

Seus olhos se arregalaram. Ele sabia que eu não estava blefando e não ousaria brincar com sua sorte em uma tentativa de me afetar com suas palavras.

Foi quando Cory reagiu.

Em um momento, ele estava parado na minha frente. Em outro, havia corrido em uma velocidade assustadora para o outro lado do cômodo, deixando uma fumaça verde por onde passava. Escutei o grito de Rosalie e rapidamente olhei em sua direção, em posição de ataque.

Cory estava com os braços em volta do pescoço de Rosalie. Ela estava com as mãos por cima do cotovelo dele, as unhas grandes fincadas na pele. Certamente em uma tentativa de tentar se livrar de suas garras. Alice estava paralisada na porta, os olhos caídos no duende. Emmett estava levantado na frente do sofá, mas não com a posição de machão de sempre. E sim de pura preocupação.

– Não faça nada do que vai se arrepender, duende. – Emmett vociferou.

– Eu não tenho nada a perder, não é mesmo? – apertou ainda mais o pescoço de Rosalie. Eu realmente fiquei preocupada quando suas bochechas ficaram vermelhas. – Se vou morrer, a humana patética também vai.

Percebi que Rose tentava puxar o ar, mas não conseguia, o que a fazia soltar um gemido de dor em cada tentativa. Querendo ou não, fui eu quem a tinha colocado naquela situação, e ela era a única que havia sobrado da família de Edward. Se chegasse a morrer, seria tudo minha culpa. E talvez nunca mais houvesse motivação para que a fera voltasse a adormecer.

–Você não deveria ter feito isso. – foi meu último aviso.

E então aconteceu em alguns segundos.

Começou com a ardência dolorosa em minhas costas. Minhas mãos formigaram e senti algo luminoso preencher todas as laterais de meu corpo, formando um campo magnético com nada mais do que pura magia. Focalizei minha atenção em Cory, que ainda me olhava espantado. Ele poderia ter corrido ou feito qualquer outra coisa. Só que aconteceu muito rápido. Talvez para mim tenha durado muito mais, pois fui capaz de sentir cada partícula de poder ferver. Mas ele não. A vítima só iria perceber quando acontecesse. Quando nada mais que a surpresa e o choque fizessem parte de suas últimas sensações.

O campo magnético saiu de mim, atravessando todo o cômodo em uma fração de segundos. Minha cabeça doeu como o inferno, mas não me importei. E Cory finalmente foi atingido pelo poder.

Dor. A palavra apareceu nitidamente em minha cabeça, misturada com as vozes das rosas.

Quando o campo atravessou seu corpo, ele gritou de dor e caiu no chão, se debatendo. Rose saiu correndo ao perceber que estava livre e se jogou nos braços de Emmett, que a segurou e a protegeu.

Fui me aproximando de Cory, que continuava a se debater no chão. Seus olhos estavam revirados nas órbitas. Eu estava furiosa. Ninguém machucava as pessoas que eu me importava e saíam livres. Não mais. E não que a loira vadia fosse importante para mim.

À medida que eu me aproximava de Cory, minha cabeça doía menos. O campo magnético estava ligando a mim e ao duende caído no chão. Por esguelha, pude ver vários laços de puro poder. Esticavam-se à medida que eu me afastava, e uniam-se em várias camadas quando eu me aproximava.

Quando cheguei perto o suficiente dele, me concentrei para que todo aquele poder voltasse para mim e o campo magnético parasse de machucar Cory. Precisou de muita atenção e dor de cabeça para que aquilo realmente tivesse fim. Fiquei preocupada quando senti que eu não estava no controle daquilo. Mas logo me esqueci de tal hipótese ao ver que Cory tinha parado de se debater no chão.

Agachei-me e passei minha mão em volta de seu pescoço, levantando-me enquanto o levava comigo. Ele estava suado. E não pesava nem um pouco. Era como se eu estivesse levantando um tijolo.

– Será que vou ter que te ensinar como se deve tratar uma mulher? – as palavras saíram raivosas de minha boca.

– Vai ter uma f-f-f-festa hoje na c-c-c-idade. De máscaras. Em homenagem ao casamento da filha do presidente. É lá que Edward me mandou encontrá-lo. Ele estará lá. – Cory desembuchou, sem fôlego.

Sorri ironicamente e o soltei com toda força no chão. Não me importei com o som que escutei de alguns ossos quebrados.

– Bem, parece que teremos uma festa para ir, então. –anunciei, olhando de Alice que estava parada na porta com os olhos arregalados para Emmett e Rosalie que continuavam abraçados.

Cory tossiu e voltei minha atenção para ele. Quis sentir pena, qualquer coisa, mas eu simplesmente não conseguia.

O duende tentou se levantar do chão e caiu de costas no mesmo instante. E então começou a rir enquanto sangue saía de sua boca.

– Eu espero que você esteja preparada para essa festa.

Resolvi ignorá-lo, dando-lhe as costas. Eu estava pronta para começar a andar em direção do meu quarto quando fui interrompida pela voz de Cory.

– Só não se esqueça de desejar felicidades a Edward pelo pedido de casamento. Ele e a filha do presidente serão muito felizes.

Engoli em seco quando percebi finalmente um sentimento percorrendo meu coração, sufocando-o: decepção.

E mais dor.