A Bella E A Fera

2ª Fase: Capítulo 24


Meu primeiro pensamento após o impacto foi de que o prédio estava definitivamente desmoronando. Por essa razão, exasperada, aguardei que o telhado começasse a despencar ou que o chão se desfizesse abaixo de nós.

Entretanto, após o barulho estridente que os cacos de vidro emitiram ao entrarem em contato com o piso, não ouvi mais nada. O perpétuo silêncio preencheu o cômodo assim que a chuva de pequenos pedaços de vidro cessou.

Quando voltei a respirar e abri os meus olhos, me deparei com o rosto de Anthony bastante próximo do meu. Por alguns instantes, me vi perdida naquele mar cor de âmbar que eram os olhos dele. Seu corpo estava próximo demais do meu, sendo que a cada vez que seu peito descia com a respiração e sua roupa tocava a minha, meu corpo fazia questão de se arrepiar de cima a baixo. Os braços fortes formavam uma espécie de prisão ao meu redor. O cheiro da sua colônia misturava-se com o deu seu hálito, causando-me tontura toda vez que eu inalava aquela mistura de cheiros. Não mexi um músculo, tensa demais.

Permanecemos naquele estado por bastante tempo, apenas nos encarando. Eu tremia bastante, devido aos calafrios que o meu corpo traiçoeiro fazia questão de manifestar com a proximidade daquele homem egocêntrico. Minhas células pareciam queimar na pele. Argh! Mas que maldição.

Olhei um pouco para cima e encontrei os fios de cabelo rebeldes de Anthony cheios de cacos de vidro. Imediatamente, soltei um riso um pouco frouxo.

Quebrei o silêncio da pior forma possível, conclui.

— O que foi? – Ele perguntou, erguendo uma das sobrancelhas. Estava intrigado.

—Nada. – Engoli o riso. – É que a situação parece meio cômica e você ainda não saiu de cima de mim.

— Quem sabe, eu queria ficar assim por mais tempo. – Ele esboçou um sorriso presunçoso. Propositalmente, encostou o corpo ainda mais no meu, e tremi ainda mais. Suas coxas esmagavam as minhas e peito praticamente me cobria como uma manta.

— Se você tentar qualquer coisa, eu vou gritar e te meter a porrada.

Eu o ameacei. Era certo que minha consciência, a parte mais racional, bem como o meu corpo, ordenavam comandos diferentes para o meu cérebro. Mas não me importei. Apenas agi no calor do momento, confusa demais para raciocinar direito e tentar decifrar a série de acontecimentos.

Minhas palavras definitivamente quebraram o clima tenso que havia se manifestado ali. Imediatamente, Anthony se levantou e me ajudou a fazer o mesmo. Assim que coloquei os pés no chão, observei o local a nossa volta. O chão estava cheio dos cacos de vidro da janela, a qual costumava cobrir toda a parte da frente do escritório, que por sua vez, exibia toda a cidade, sem mais nenhuma proteção. O vento adentrou pelo local, gélido, e penetrou pelo tecido da minha roupa como se fossem navalhas, fazendo-me estremecer. Algo não estava certo. Desde quando vidros se partiam do nada, ainda mais num prédio? Será que houve um terremoto? Não era possível.

— Sua mão.

Ouvi a voz de Anthony e quase pulei de susto ao sair de meus devaneios. Ele, por sua vez, aproximou-se perigosamente e fez um gesto para segurar a minha mão. Rapidamente, me afastei dele, com medo da sensação que o seu toque poderia me causar.

E então o encarei bastante confusa. Não entendi o motivo de tanto medo, assim tão de repente.

— Você está sangrando, não seja burra. Deixe-me ajudá-la.

Olhei para baixo e encontrei a pele branca da palma de minha mão revestida de um liquido escarlate. Sangue, conclui, com um pouco de medo. Sangue que pingava em cima dos cacos abaixo de meus pés e deslizavam mais para baixo, formando uma pequena poça vermelha no piso. Nossa, o corte fora realmente feio.

Escutei um barulho alto atrás de minhas costas e ao olhar de soslaio, encontrei uma mulher muito alta, trajando um terninho cinza bastante elegante. Os cabelos louros estavam presos em um coque no alto da cabeça. A secretária de Anthony. Ela encarava o cenário a sua volta, com uma expressão de surpresa estampada no rosto.

— Mas que infernos aconteceu aqui? – Ela perdeu a compostura e soltou o palavreado ali mesmo.

Voltei a minha atenção para o Mason e encontrei uma expressão preocupada, bastante confusa. Ele havia parado no meio do gesto de pegar a minha mão para me providenciar cuidados médicos, por isso seus dedos encontravam-se estendidos em minha direção. Droga.

Como um homem podia parecer tanto com um anjo, principalmente quando tinha uma personalidade de tamanha crueldade?

Agindo sem pensar, eu dei as costas para ele e praticamente sai correndo pelo escritório afora. Ignorei os gritos de meu nome que ecoavam atrás de minhas costas, pois eu precisava sair dali o mais rápido possível. Não demorei muito para encontrar o elevador e assim que o fiz, tive sorte ao me deparar com as portas de ferro abertas. Entrei imediatamente e ao ficar de frente para a recepção, identifiquei Anthony correndo em minha direção, parecendo bastante preocupado.

— Não! – Berrei.

Ele imediatamente parou no lugar. Fitou-me bastante preocupado.

No painel cinza, apertei no botão que me levaria para a portaria e as portas de ferro deslizaram uma para o encontro da outra, fechando-me no pequeno espaço ao meu redor. Olhei uma última vez para Anthony.

Assim que senti o elevador descendo, apoiei as minhas costas na superfície de ferro e deixei que as lágrimas caíssem dos meus olhos. Não consegui identificar os sentimentos que borbulhavam no meu peito, muito menos a razão da minha ceninha.

Mas, que inferno. Minha vida definitivamente estava de cabeça para baixo, e eu nem ao menos sabia como concertá-la, pois não me lembrava dela. Algo muito estranho aconteceu e a entrevista de emprego definitivamente foi desastrosa, como os demais acontecimentos. O que eu diria para as pessoas que estavam contando comigo? Nora? Minha mãe? Qual foi a razão do vidro ter estourado? Por que Anthony me deixava daquele jeito, se eu nem ao menos conhecia o cara?

De repente, o elevador parou abruptamente, me jogando no chão. Cai com um baque. As luzes se apagaram e as portas de ferro se abriram. Olhei para fora e encontrei apenas mais escuridão. Um sentimento muito, mas muito ruim cresceu em meu peito quando ouvi os passes de uma pessoa, que parecia se aproximar cada vez mais. Oh, céus. Em um gesto automático, me espremi o máximo que pude no canto do elevador. Soltei um berro quando os passos se aproximaram a tal ponto que o seu dono entrou no elevador. Eu juro que podia destingir o contorno de seus sapatos, mesmo com a escuridão me cegando. Meu coração acelerou dentro do peito e pensei em sair correndo, ou atacar quem é que fosse. Mas tudo aconteceu muito rápido, pois em um momento, eu jurava que alguém estava ali, e no outro, as portas de ferro se fecharam novamente, as luzes se ascenderam e o elevador continuou descendo.

Ao olhar para cima, tudo me parecia normal, não havia ninguém dividindo o pequeno espaço comigo, exceto pelos rabiscos que revestiam o espelho, os quais não estavam ali antes. Lentamente, me levantei do lugar, curiosa para saber o que estava escrito. Ainda tremendo, e mesmo com a visão borrado devido às lágrimas, observei que o intruso havia deixado uma mensagem, traçada a batom.

“Mate Anthony ou alguém morre.”

Fiquei em estado de choque por alguns minutos, tentando raciocinar direito. Infernos, alguém realmente havia entrando no elevador junto comigo e resolveu me ameaçar. Entretanto, por que não me matou de uma vez? A não ser que queiram você viva para algo. Minha mente concluiu, bastante aflita.

Analisando mais de perto, a letra me parecia idêntica a do bilhete que eu havia recebido anteriormente.

Imediatamente, com a manga do meu blazer, lambuzei a ameaça impregnada no espelho, com o intuito de deixá-la indecifrável. Meus gestos eram rápidos e meio tremidos, o que só dificultou o processo. Quando me dei conta, as portas do elevador haviam se aberto, e ao olhar para fora, finalmente me encontrei na portaria. Meu estado não deveria estar dos melhores. Pelo menos, não de alguém que foi contratada.

Ao longe, no amontoado de pessoas muito bem vestidas, cada qual desempenhando sua função, enquanto um lustre enorme iluminava o local, encontrei um homem com as fardas de policial que cuidava de meus passos com um interesse bastante perceptível. Eu o reconheci imediatamente.

— Tyler!- Eu praticamente gritei.

***

Por sorte, ele me ofereceu carona para casa.

No caminho, fiquei em silêncio o máximo que pude. Eu não queria falar sobre o assunto, e ele pareceu respeitar, pois não perguntou sobre o meu estado deplorável, nem o porquê de eu estar no local que ele estava trabalhando.

Em resumo, no caminho todo, fiz silêncio e não quis pensar em nada, uma vez que minha cabeça estava prestes a estourar de dor. Mas algo interessante aconteceu. Quando olhei para a palma da minha mão direita, já preparada para encontrar um corte bastante feio, não vi nada de anormal, mas apenas uma mancha de sangue quase que imperceptível. Minha pele continuava lisa e branca, quase albina. Novamente, não quis pensar sobre.

Tyler me deixou na esquina da minha cabeça, pois havia recebido uma ocorrência e precisava chegar ao local para prestar socorro o mais rápido possível. Apenas concordei e lhe dei um beijo na bochecha, sendo que ele me abraçou, permanecendo por tempo demais com as mãos ao meu redor.

Descri do carro e me pus a caminhar, apreciando o clima agradável. Eu tinha que arranjar um modo do qual minha mãe não me visse chegando daquele estado, caso estivesse lá. Nossa... O que eu iria falar para ela? Na minha cabeça, não encontrei nenhuma desculpa boa o suficiente e principalmente, razoável. Olhei ao meu redor, com a sensação de estar sendo observada. Continuei andando, meio receosa.

Chegando até a minha casa, encontrei uma limusine estacionada em frente aos portões. Parei no mesmo instante quando meus olhos caíram sobre o sujeito escorado nela.

— Vamos conversar, Mel. – Anthony disse.

Merda.