Aurora desceu as escadas, sorrindo como se estivesse feliz. Ela não via a hora de quebrar vagarosamente cada osso do corpo de cada pessoa presente naquele castelo, não via hora de por as mãos no pescoço daquele maldito padre comandante da igreja do reino.
Todos a acompanharam até a entrada do castelo, onde ela saiu. Os habitantes bateram palmas e se ajoelharam em reverência a princesa Aurora.


"Isso me dá nojo".

Aurora acenava de volta, cumprimentando todos ali presentes.
Depois de um tempo, fazendo a pequena conferência com os camponeses, a garota entrou de volta no castelo e foi conduzida ao seu antigo quarto que agora reformado.
Ela sentou-se na enorme cama, e chegou a estranhar seu próprio poder de se mover livremente sem as duas correntes presas aos seus braços. Ela refletia sobre sua vida, refletia sobre os motivos que Malévola tinha para fazer o que fez e ela logo iria descobrir. Refletia apenas com ela, tentando buscar uma espécie de paz interior.

– Anda pensando demais sabia ? - Aurora levantou-se um tanto assustada, não estava acostumada a receber visitas e muito menos a ouvir vozes que não fossem suas personalidades se confrontando.


– Não era você que não podia andar a toa pela cidade, garoto ? - Hiei estava sentado na janela, rodando duas pequenas facas, uma em cada mão. Ele usava roupas negras, uma camisa de mangas rasgadas que deixava os belos músculos do braço a amostra, uma calça e botas de soldado.

– Graças a sua libertação as pessoas foram pra casa pagar promessas com santos para quem se ajoelharam esse tempo todo pedindo pra garotinha se recuperar.


– Em vão. - argumentou estreitando os olhos para seu espelho e vendo seu reflexo, era era realmente uma garota muito bonita.


– É, parece que sim. - sorriu - Quando pretende ver Malévola ?


– Assim que as coisas se normalizarem, não posso extrapolar e sair da linha nas minhas primeiras duas horas de liberdade.


– Andei pensando sobre aquele seu poder... - Ele disse como se tomasse cuidado com cada palavra, ainda mais ao olhar para Aurora e ver os olhos azuis brilhando, como daquela vez.

- O que tem ele ? - Sorriu divertida ao ver o garoto dar alguns passos para trás, ela adorava causar medo nas pessoas, principalmente nele, que parecia muito destemido e sempre a enfrentava.

– É...estranho. Como funciona ?

- Me faz ver através dos medos das pessoas, eu posso saber quais são suas fraquezas, e antes da morte posso fazer uma pequena tortura alucinógena com esses tais medos. O outro poder é das bonecas...Se alguém me ferir, ele também vai ser ferido. Todos eles funcionam a partir do meu olhar.

– Você é estranha. - Ele sorriu, sentando-se na cadeira da penteadeira da garota.

– E você se vê como um ser muito normal não é ? - Rebateu colocando as mãos na cintura indignada pelo comentário inválido.

– Eu sou apenas um assassino, Bela.

- Interessante esse "apenas"...Você está em todos os jornais locais, é procurado por cinco países. Por que você mata ? - Ela perguntou enquanto sentava-se na enorme cama de casal, observando os braços com curativos recém feitos pelas damas de companhia que ela dispensou.

– Como assim ?

– Que motivos você tem pra matar ?

– Vingança. Quero me vingar do Clero e da Inquisição.

- Por que, exatamente ?

- Eles mataram minha irmã, a bruxa Brida. - Ele estava um tanto desconfortável em tocar naquele assunto, não gostava de se lembrar da morte da irmã. A inquisição havia invadido a casa do garoto em uma madrugada, dizendo que mãe e filha eram acusadas de exercer atos de bruxaria. Para livrar a mãe, a irmã disse que ela era a bruxa, e foi torturada e queimada na praça pública em frente ao castelo de Aurora.

– Destruir a inquisição e esquartejar aquele padre é uma das minhas maiores ambições.

– E quais motivos você tem pra isso ?

– Fui condenada 4 vezes a morte, passei por mais de 20 sessões de exorcismo e perdi a conta de quantas vezes fui amarrada em um tronco e chicoteada no intuito de arrancar o diabo do meu corpo, ou de me fazer confessar que sou bruxa.

– Você... - Ele pareceu incrédulo, ela não poderia ser uma bruxa.

– Como acha que eu petrifico as pessoas Hiei ?

– Mas...Como...?

– Eu não sei. Apenas sei que eu sou uma bruxa, uma bruxa negra.

– Então...A Princesa Aurora é uma bruxa ? - Ele disse divertido, por fim. Sempre que tinha oportunidade gostava de irritar Aurora, ele gostava do perigo.

– Interprete como quiser. - Ela rolou os olhos ao ver o garoto rindo – Até quando pretendo ficar aqui ?

– Está certou eu me retiro. - Riu com as mãos levantadas como um meliante se rendendo a prisão, que não deixou de fazer Aurora rir.

– Vejo você amanhã de manhã, quero ver Malévola.

– Não sei se posso... - Ele olhava para o chão enquanto estava pendurado na sacada.

– Não estou pedindo, estou mandando. - Cruzou os braços ajeitando-se na cama.

– Está bem, "Princesa"... - Ironizou enquanto sorria, e logo saiu rasgando o céu noturno em forma de uma enorme coruja.

Aurora olhou pela janela e sorriu, era confortável estar com aquele garoto irritante.